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A CURA PELAS BACTÉRIAS

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Por:   •  12/3/2015  •  1.633 Palavras (7 Páginas)  •  523 Visualizações

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O estudo dos micro-organismos em nosso corpo revoluciona o diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças como obesidade, câncer e diabetes

Rita Loiola

Estudos recentes mostram que nosso corpo possui cerca de 500 bactérias desconhecidas (Thinkstock/VEJA)

Em nosso corpo, há dez bactérias para cada célula. Juntos, esses 100 trilhões de micro-organismos pesam em torno de 2 quilos — cerca de 500 gramas a mais que nosso cérebro. E é a partir desses minúsculos, mas poderosos, micróbios que uma revolução está acontecendo na medicina. A identificação e estudo do microbioma humano — nome dado a esse conjunto de bactérias — pode, em menos de uma década, transformar o diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças como obesidade, câncer, diabetes ou transtornos mentais.

"Em pouco tempo, vamos tomar medicamentos compostos de bactérias para tratar a depressão, em vez de Prozac", afirma o médico e neurocientista John Cryan, que estuda a relação entre o microbioma humano e o cérebro na Universidade College Cork, na Irlanda. "Estamos estudando o funcionamento disso em humanos, mas os resultados são promissores e a ciência está avançando tão rápido nesse campo que, em um ou dois anos, deveremos ter publicações científicas capazes de produzir esse tipo de droga."

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Projeto Microbioma Humano — O conhecimento sobre as bactérias que nos compõem é recente. Pelo menos desde o início do século XX os cientistas sabem que as bactérias que vivem em nosso corpo ajudam na digestão e na absorção de energia. O que os pesquisadores não sabiam é que o número de micróbios convivendo conosco era tão vasto e que sua atuação vai além da quebra e produção de substâncias em nosso corpo, podendo ser determinante no combate de doenças e até em nosso comportamento.

O ponto de partida para essa descoberta foram dois estudos publicados em 2004 sobre a atuação desses micro-organismos no comportamento e no desenvolvimento de quadros de obesidade. Pesquisadores japoneses mostraram que camundongos biologicamente alterados para crescerem sem nenhuma bactéria exibiam níveis muito elevados de hormônios do stress. Nos Estados Unidos, uma equipe de cientistas mostrou que o mesmo tipo de camundongo tendia a ser mais magro que os animais normais — e ganhava peso se recebesse as bactérias de um camundongo comum. Foi o gatilho para que diversos grupos ao redor do mundo se interessassem pelo assunto, que poderia ser o elemento que faltava para a compreensão de doenças crônicas como diabetes ou Alzheimer.

Três anos depois, os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês) começaram o Projeto do Microbioma Humano, com o objetivo de mapear todas as bactérias de nosso organismo. Usando o conhecimento de sequenciamento de DNA do Projeto Genoma, também do NIH, 80 instituições de pesquisa mostraram que somos formados de mais bactérias que células. Essas primeiras informações, publicadas em 2012, serão compiladas e decifradas até 2015, quando termina o programa que já consumiu 153 milhões de dólares (cerca de 350 milhões de reais) do governo americano. Na Europa, um consórcio entre instituições de oito países começou em 2008 o mesmo trabalho.

Em conjunto, os dados desses dois projetos provocaram a explosão do número de estudos sobre o impacto das bactérias na saúde humana. No ano de 2004, o site PubMed, que compila publicações científicas reconhecidas internacionalmente, registrava 166 estudos. Só nos oito primeiros meses de 2014, foram publicadas 2.141 pesquisas sobre o assunto — doze vezes mais que há dez anos.

"Vivemos uma nova compreensão do que são as doenças e a manutenção da saúde", diz o gastroenterologista Dan Waitzberg, professor da Universidade de São Paulo (USP). "Estudos recentes mostraram que nosso corpo possui cerca de 500 bactérias que jamais tinham sido vistas. Esse é um campo extremamente desconhecido e que está trazendo muitas revelações para a medicina."

Evolução médica — De acordo com Waitzberg, o conhecimento que virá da análise e interpretação do microbioma terá impacto profundo em todos os campos da saúde. "Em cerca de cinco anos, máquinas mais potentes de sequenciamento de genes poderão fazer o mapa da composição das bactérias de cada indivíduo. Com ele, será possível melhorar o diagnóstico e a prevenção de doenças, pois a falta ou multiplicação de alguns grupos de micróbios pode indicar a presença ou o potencial desenvolvimento de enfermidades", diz o médico.

Além disso, o conhecimento do tipo de bactérias presentes em nosso corpo também produzirá novos medicamentos para tratar enfermidades que ainda são um desafio para os cientistas, como diabetes ou câncer. A aposta dos cientistas é em probióticos, isto é, bactérias vivas consumidas na forma de iogurte, leite fermentado e cápsulas, normalmente usados para melhorar a digestão, ou em medicamentos que combinem tipos específicos de bactérias para agir diretamente nas enfermidades. Os cientistas já sabem que pessoas com câncer de cólon têm alterações importantes nas bactérias desse segmento do intestino. Assim, equilibrar esse microbioma por meio de uma drágea poderia ser uma maneira de prevenir a incidência da doença e impedir seu crescimento.

"Nos próximos três anos, haverá muitos probióticos novos no mercado — já há alguns na Anvisa, aguardando a aprovação. Eles serão um apoio para a dieta, que tem grande influência no microbioma e será modulada de forma a melhorar a saúde e prevenir doenças", afirma Waitzberg.

Outro campo promissor é o que está sendo estudo pelo grupo do epidemiologista brasileiro Luis Caetano Antunes, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro. Em uma pesquisa publicada no fim de julho na Revista da Sociedade Americana de Microbiologia, Antunes demonstrou como uma substância produzida por um dos grupos de bactérias presentes no intestino é capaz de barrar a infecção causada por Salmonella.

"Essas moléculas produzidas pelos micróbios do nosso corpo que impedem infecções traz grande potencial terapêutico. Da mesma forma que elas impedem a Salmonella, poderiam combater qualquer outro tipo de infecção", diz Antunes. "São trilhões de bactérias, milhares de espécies que podem gerar centenas de novos produtos interessantes

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