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RESENHA LACAN E A EDUCAÇÃO

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Por:   •  29/9/2013  •  3.996 Palavras (16 Páginas)  •  978 Visualizações

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A Psicanálise Lacaniana e a Educação

JUSTO, José Sterza. A Psicanálise Lacaniana e a Educação. In CARRARA, Kester. (Org.). Introdução à psicologia da educação. São Paulo: Avercamp, 2004. pp 36 – 52.

Por Eronildes Benevides da Silva

Jacques Lacan foi discípulo de Freud, porém um rebelde que provocou inúmeros incômodos. A primeira dissidência de Lacan ocorre em 1953, quando, com vários outros psicanalistas, abandona a Sociedade Psicanalítica de Paris, filiada à SIP, e juntos fundam a Sociedade Francesa de Psicanálise (SFP) como uma organização independente.

Dez anos depois, a nova sociedade será também abalada por um grande impasse. Em função de interesses diversos, surge na SFP a intenção de filiar-se à SIP, porém, tal pretensão esbarra na exigência, por parte desta última, de que Lacan seja excluído da lista dos analistas distintos. A maioria aceita tal imposição e Lacan acaba sendo expulso em 1963. No ano seguinte, cria sua própria entidade: a Escola Freudiana de Paris.

Em 1969, Lacan encabeça a defesa de uma proposta de formação de analistas relativamente diferenciada da tradicional, conferindo maior autonomia aos candidatos e gerando uma crise de tal monta que acabou por provocar, em 1969, a saída de um grupo de psicanalistas da escola por ele dirigida. Os dissidentes fundam o Quarto Grupo, em alusão ao número de fracionamentos do movimento psicanalítico francês. Porém, o gesto mais contundente ocorre em 1980, quando Lacan, também no meio de uma crise, dissolve sua escola para criar outra, a Escola da Causa Freudiana, que perdura até hoje.

O propalado retorno a Freud, significando a correção de desvios desvirtualizadores da sua obra, atribuídos a seus discípulos, será insistentemente afirmado como a principal finalidade do movimento lacaniano e constituir-se-á no grande mote de atração de novos adeptos.

A leitura de Freud por Lacan será profundamente marcada pela Linguística, substituindo o clássico modelo biológico presente na base da fundação da Psicanálise pelo modelo antropológico-cultural. Assim, o inconsciente – conceito central da teoria psicanalista – passa a ser entendido não como uma instância psicológica localizada no ponto de contato entre o somático e o psíquico, mas como estruturado pela linguagem e na relação do sujeito com o “Outro”.

Dessa forma, o inconsciente nasceria da inscrição do sujeito na linguagem, inscrição essa dada pelo contato com seus semelhantes e por sua inserção na cultura, ou seja, no universo dos signos, das significações, num mundo codificado, constituído fundamentalmente por significantes – sons, imagens visuais, olfativas, táteis; enfim, aquilo que transporta significados (ideias, conceitos e representações).

Enquanto linguagem, as produções do inconsciente estão sempre referidas a um “outro”, estão sempre dirigidas a um destinatário e cunhadas pela presença desse outro no discurso. Na verdade, o inconsciente não está nem no indivíduo nem fora dele, mas exatamente no espaço da relação que se estabelece entre o “Eu” e o “Outro”.

A noção do nascimento do inconsciente não no biológico mas na cultura, no contato do sujeito com o “Outro”, mediado pela linguagem é uma das principais contribuições da teoria lacaniana à Psicanálise.

O fato de o homem não ter a parte principal de sua conduta determinada pela herança biológica o torna capaz de criar, inventar e ser agente de sua própria história. O não-saber inicial do homem propiciará um saber praticamente ilimitado a ser construído ao longo de sua história. Será justamente a falta de um saber pronto sobre sua existência que o lançará à busca desenfreada do conhecimento.

A principal especificidade reside no fato de que no homem os instintos são plásticos, flexíveis, podendo ser modificado com a experiência, enquanto no restante dos animais são mais fixos e estereotipados, admitindo pouca ou nenhuma modificação ao longo da vida ou do processo de desenvolvimento tanto filo como ontogenético.Vale dizer: a espécie humana modifica substancialmente suas disposições inatas, assim como cada indivíduo também o faz ao longo de sua vida, enquanto os outros animais mantêm seus padrões herdados de comportamento, com maior rigidez, tanto na história da espécie como no curso da vida de cada indivíduo.

É possível verificar que os “instintos” humanos são bastante flexíveis em relação aos objetos que elegem para a realização de sua finalidade última: a remoção da excitação ou a satisfação da necessidade. Nos outros animais, objetos, objetivos e zonas erógenas são muito mais fixos, estabelecendo um padrão na espécie. Os órgãos genitais característicos de cada espécie assumem a primazia como zonas erógenas, assim como um outro indivíduo da mesma espécie é geralmente eleito como objeto preferencial e a cópula, a serviço da fecundação, comumente se estabelece como objetivo único.

Porém, o mais surpreendente, no caso do ser humano, é a possibilidade de surgirem condutas contrárias às exigências pulsionais. Segundo Reich (1975) o ser humano é capaz de contrariar as demandas de suas pulsões a ponto de renunciar completamente à sua satisfação ou exceder-se na busca do prazer. No caso dos animais, há uma maior adequação entre a necessidade e as buscas de satisfação.

No ser humano a pulsão, enquanto representação mental, enquanto fenômeno psicológico, assume autonomia em relação ao biológico, abrindo caminho para as variações quanto aos objetos, objetivos, zonas erógenas e grau de realização de um desejo. Justamente essa plasticidade da pulsão possibilita ao homem criar representações, instituir-se como ser da linguagem, vislumbrar alternativas, descolar-se dos determinismos das necessidades biológicas brutas e, assim, ser alçado à condição de sujeito produtor de cultura.

A herança do ser humano, portanto, não é uma herança biológica, mas cultural. Não são os comportamentos herdados ou inatos que direcionarão a conduta do homem ao longo de sua vida, mas as heranças culturais, igualmente determinantes, porém que permitem sua metabolização pelo sujeito.

O pensamento e a linguagem funcionariam aí como uma peça fundamental. Por intermédio deles é que tanto o acabamento da experiência como sua transmissão seriam possíveis. Refletir a experiência, dar-lhe significados, movimentá-la para o passado e para o futuro, contá-la e recontá-la seriam tarefas indispensáveis para a apropriação e a transmissão da herança. Portanto, não apenas os eventos, mas o contexto geral que lhes dá significação constitui o bem mais precioso da herança. Não

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