TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

A Governança

Por:   •  4/10/2016  •  Trabalho acadêmico  •  2.343 Palavras (10 Páginas)  •  191 Visualizações

Página 1 de 10

3 A Governança

A modernização do Estado que ocorreu nos últimos anos foi, principalmente, uma reforma interna, voltada para o mercado, para a gestão na prática, para o cumprimento de metas com o objetivo de obter mais eficiência. Isso se deu a partir de um reconhecimento que o Estado estava em crise e que seu funcionamento deveria ser repensado. As reformas administrativas que ocorrem no Brasil, discutidas anteriormente e o esgotamento de um paradigma burocrático fizeram com que discussões acerca 24 da Governança e da governabilidade entrassem na pauta, pois a questão da reforma do Estado possibilitou rever papéis, rever mecanismos de funcionamento, funções e cargos. O momento de transformação impôs novas exigências à sociedade como um todo, incluindo aí seus diversos segmentos (FERREIRA, 1996). O termo Governança traduz no âmbito do setor privado, o modo de realização de atividades administrativas, de atividades de controle de ainda, o modo de interação entre as partes envolvidas no negócio e isso abrange as políticas que são adotadas pelas organizações privadas, a estratégia e até mesmo a cultura (PALUDO, 2012). No âmbito público a Governança traduz o modo como as prioridades governamentais são definidas, as decisões tomadas e de que maneira os cidadãos e as instituições interagem. Além disso, a Governança pode ser compreendida como a competência ou a capacidade do Governo em decidir as políticas públicas, ou ainda pode ser considerada como a capacidade financeira e capacidade administrativa do Governo em sentido amplo (PEREIRA, 2007). É de se destacar, em linhas gerais, que dependendo do modelo de Estado a Governança vai ter um caráter determinante. Por exemplo, em um Estado com traços clientelistas/patrimonialista a Governança vai realçar o uso da máquina pública em prol de interesses privados, a relação de favoritismo. Já em um Estado Neoliberal/Gerencial a Governança vai realçar as privatizações, Estado Mínimo, foco nos resultados, práticas da administração empresarial, cidadãos como clientes, terceirização e repasse das atividades do Estado para Terceiro Setor. Por fim, em um Estado participativo, democrático/deliberativo, a Governança vai realçar uma pluralidade de atores que atuam na promoção das políticas públicas, descentralização política e flexibilidade. A Governança gerencial está intimamente ligada com os preceitos da Nova Gestão Pública que chegou ao Brasil com Bresser Pereira no governo de Fernando Henrique Cardoso, nos anos 1995, em um momento crítico de repensar a gestão pública brasileira, tendo em vista que o modelo burocrático não estava mais dando conta das demandas sociais. No Reino Unido, esse modelo de Administração Pública derivou da revolução de Margareth Thatcher, momento da queda do Muro de Berlim. Em outros países também se observou um movimento no mesmo sentido como na Austrália, Nova Zelândia e Canadá. Deve-se ressaltar ainda que a Governança tem a ver com mensurabilidade, já que não dá para pensar em transparência das ações de Governo sem pensar em comparação e medida. Deste modo, o conceito de transparência deve permitir ao 25 receptor das informações tomar decisões a partir daquilo que ele enxerga. No entanto, deve-se questionar: qual é o resultado da governança pública? O que o gestor faz que está beneficiando o cidadão? O gestor público está operando ativos públicos de diferentes setores como o meio ambiente, a cultura, a educação e a segurança. O resultado de sua ação é aquilo que vemos como uma melhora ou piora de prática de Governança. Esse núcleo de ações vai impactar a estratégia pública, vai ser o fazer acontecer de cada setor. A partir dessas ações é que decorre a satisfação do cidadão: mais saúde, mais educação, mais segurança e mais transparência nas ações, por exemplo. A Governança tem a ver também com competência técnica, já exemplificada anteriormente como a capacidade gerencial, financeira e técnica propriamente dita e tem nos agentes públicos e nos servidores públicos a sua fonte de origem (PALUDO, 2012). Ademais, deve-se ressaltar que a governança é instrumental já que é o braço operacional da governabilidade. Neste sentido Araújo (2002) afirma que ela pode ser traduzida como outra face de um mesmo processo, ou seja, como os aspectos adjetivos ou instrumentais da governabilidade. Além disso, a Governança é também considerada um instrumento de governabilidade para a realização dos fins do Estado. Neste sentido, ela pressupõe condições mínimas de governabilidade, pois em situações de crise ou grave ruptura institucional, que afetem a governabilidade, a Governança ficará comprometida, em virtude do seu aspecto instrumental. Em 1995, foi lançado no Brasil o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado – PDRAE, Governo de Fernando Henrique Cardoso. Por tratar-se de um documento institucional elaborado pela Câmara da Reforma do Estado vinculada à Presidência da República, este não possuiu um autor individual, sendo produto do trabalho deste organismo. O grande coordenador deste processo - pela posição de Ministro da Administração e Reforma do Estado e pelo fato de ser um dos maiores teóricos na área no Brasil e próximo ao Presidente - foi Luiz Carlos Bresser Pereira (ARAÚJO, 2002). Segundo este Plano, o governo brasileiro não carecia na época de “governabilidade” ou seja, de capacidade conferida pela sociedade civil para governar, dada a sua legitimidade democrática advinda da consagração eleitoral e o apoio partidárioparlamentar com que conta. O que o governo enfrentava, contudo, era um grave problema de governança, pois a sua capacidade de formular/implementar as políticas públicas era limitada pela rigidez e ineficiência do aparelho burocrático do Estado. É importante deixar claro aqui também a distinção entre governabilidade 26 e a governança que o autor Pereira (1998) comenta em uma de suas obras, na qual tece explicações sobre este Plano, as suas raízes e orientações teóricas e o trabalho que executou diante do extinto MARE. Ele diz de maneira textual que a governabilidade e a governança são conceitos mal definidos, tendo em vista que a governabilidade traduz uma capacidade política de governar derivada da relação de legitimidade do Estado e do seu governo com a sociedade e a governança traduz a capacidade financeira e administrativa, em sentido amplo, de um governo implementar políticas. Serão tratados a seguir alguns aspectos destacados da Governança, tomando por base o Relatório Cadbury do International Federation of Accountants – IFAC (2001). 3.1 Dimensões da Governança Segundo a proposta da International Federation of Accountants – IFAC (2001) adaptado do Cadbury Report, a Governança possui três dimensões: Transparência, Integridade e Accountability (dimensão: prestação de contas). Em relação à transparência, isto é muito mais do que acesso à informação pelo cidadão. O cidadão deve ficar mais opinativo e questionador a partir das informações que lhes são oportunizadas. Tal informação deverá ser o motor-chave para a facilitação de seu entendimento sobre o processo decisório da Administração Pública. Além disso, essa transparência vai ser a base para a Accountability, além de permitir uma verificação da má gestão e corrupção a partir de indicadores como a ineficiência, a baixa eficácia, a confiança e a participação “informada” do cidadão. Em relação à dimensão integridade, esta compreende procedimentos honestos e perfeitos. É baseada na honestidade, objetividade, normas de propriedade, probidade na administração dos recursos e na gestão dos negócios de cada entidade. Já em relação à Accountability, sob a ótica da prestação de contas, esta dimensão traduz um processo em que as entidades do setor público e seus agentes são responsáveis por suas decisões e ações, incluindo a administração dos fundos públicos e todos os aspectos de desempenho, e submissão ao escrutínio externo apropriado. Deve-se salientar, no entanto, que uma das dimensões mais importantes da Governança Pública é a relativa à prestação de contas. É o mesmo dizer que uma lei para um jurista não significada nada se ela não possui uma pena. Governança que não possui a dimensão prestação de contas, não é boa Governança. Aqui vamos perceber que esta dimensão é que vai fazer a diferença. 3.2 A Governança Pública 27 Ocorre que, devido aos descontentamentos dessa modernização Estatal é que surgiu um novo modelo: a Governança Pública (public governance), com o intuito de regular as relações de troca entre os setores público e privado, entre Estado, mercado e sociedade (KISSLER E HEIDEMANN, 2006). Além de incluir a participação do mercado e da sociedade civil nas decisões essa nova Governança seria uma espécie de ponte entre os interesses desses atores e a governabilidade, pois, a Governança ultrapassou de fato todos os aspectos operacionais de políticas, incluindo mecanismos de agregação de interesses, de decisões políticas, de redes informacionais e de definições estratégicas (ARAUJO e GOMES, 2006). Assim, surgem novos termos nos discursos como alianças, parcerias, cooperação entre governos, entre mercado e sociedade, nas três instâncias de governo. É de se destacar também que esses novos termos são oriundos dessa nova Governança que, contemplou a possibilidade de múltiplas participações (diversos atores) na tomada da decisão governamental, bem como na implementação e no controle de políticas públicas, gerando um sentido de corresponsabilidade. Deve-se ressaltar, porém que a interação entre Governo, Mercado e Sociedade Civil deve ser sempre estudada de forma ampla. A sociedade é dinâmica, portanto, movimentos sociais são dinâmicos, e, em muitas vezes, as teorias não conseguem acompanhar essa dinamicidade, tendo em vista que há articulação de relações sociais (ação coletiva) e influências e escolhas comportamentais que vão influir diretamente nesses movimentos (SCHERER WARREN, 2012). Tais movimentos vão então impactar nas outras interações, fazendo com que a Governança Pública seja fluida e coerente com os anseios sociais. Além disso, se percebe que essa Governança Pública trouxe mais participação para a esfera pública não estatal, incitando mais a sociedade civil a se autoorganizar. Além disso, tal Governança propiciou um deslocamento de legitimidade, de um poder constituído para canais institucionalizados de participação popular. Essa participação popular, então, representou um processo de cogestão ou coprodução, combinando democracia direta e democracia representativa, fazendo com que a própria sociedade civil chancelasse a legitimação do Estado e seu papel de ente regulador da relação dos diversos atores sociais e políticos (GRIN, 2008). Contudo, deve-se ter sempre cautela quando se estuda o conceito de sociedade civil. Scherer Warren (2012) comentou que em sociologia política referido conceito é compreendido sob uma ótica tripartite da realidade, ao separar Estado, mercado e sociedade civil e isso deve ser repensado, tendo em vista que poderá haver conflito dentro dessas esferas e não poderiam ser consideradas isoladas da realidade. 28 Nem todas essas “realidades” são reais se percebidas de forma fechada. 3.3 A Governança Eletrônica A Governança Eletrônica é outro instituto proveniente das discussões de Governança. É considerado recente, já que abarca o termo de Governo Eletrônico. Não se pode deixar de mencionar aqui algumas de suas peculiaridades, tendo em vista sua relevância no novo século. Deve-se ressaltar que as novas tecnologias vêm sendo utilizadas como instrumentos para o incremento da Governança Pública e destacam-se a divulgação de informações públicas, a facilitação de acesso aos serviços públicos, o suporte à elaboração de políticas públicas e a abertura de canal para a participação do cidadão no processo decisório. Neste sentido, vai se percebendo na atualidade que o fortalecimento da cidadania está se dando também nesse âmbito eletrônico. É como se se tal canal fosse um potencializador de boas práticas de governança e catalisador de mudanças profundas na estrutura governamental, além de propiciar mais transparência tanto para o cidadão quanto para o próprio governo (RUEDIGER, 2003). A Governança Eletrônica engloba, portanto, políticas, estratégias e recursos necessários à efetivação do Governo Eletrônico, para sua utilização político-social. Através de meios eletrônicos promove a interação entre governantes e governados (PALUDO, 2012). Ademais, é de se destacar que as “redes” são formas utilizadas pela Governança Eletrônica para facilitar, ou melhor, propiciar maior participação cidadã no meio público, bem como propiciar canal de luta pela solução e atendimento das suas demandas. As redes permitem, portanto, horizontalizar a articulação de demandas e se servem das modernas tecnologias de informação para disseminar seus posicionamentos, denúncias e propostas, como referencial cada vez mais legítimo da presença de uma emergente sociedade civil global (JACOBI, 2000). Além disso, cumpre ressaltar que tradicionalmente os estudos se focam no papel do Estado e nos seus poderes. Ocorre que é preciso ir além, já que o Estado reflete a organização e a correlação de forças que interagem – forças essas oriundas de diversos novos atores e que constituem a sociedade do novo século. Essa sociedade do novo século assume então uma nova configuração, podendo ser caracterizada como uma Sociedade em Rede (CASTELLS, 1999). Um estudo já realizado por Damázio (2012) analisou como essas novas temáticas oriundas 29 da Governança representam novas “aberturas” e que proporcionam uma “invasão” dos saberes nos espaços que eram restritos a um saber oficial e, assim significam um conjunto mais amplo de intervenção política por parte da sociedade. Além disso, é importante ressaltar que as novas tecnologias proporcionam um ambiente propício para a Governança em rede, já que cresce o número de associações da Sociedade Civil em âmbito nacional e de Organizações NãoGovernamentais, pois, articulam-se ganhando mais liberdade e legitimidade nesse cenário democrático. Por um lado, é de se destacar que se o Governo Eletrônico busca cumprir sua função de informar os cidadãos sobre os investimentos realizados pelos governantes, facilitar sua vida por meio do acesso a documentos, reclamações e solicitações de seu interesse com mais transparência, por outro lado tal instituto só possibilita a ação do cidadão após a tomada da decisão pelo governante. É como se houvesse um déficit de representatividade política nessa forma de decisão, porque falta transparência em todas as tomadas de decisão (ROVER e MEZZAROBA, 2010). Essa sociedade do novo século está se tornando, portanto, cada vez mais complexa em virtude da multiplicidade de atores e forças. É necessário consolidar alianças que assegurem sinergia, a partir da ampliação da consciência de cidadania, de democracia, de Governança, de Governança Pública e Governo Eletrônico, bem como da proposição de soluções criativas e inovadoras que garantam legitimidade e viabilidade às transformações exigidas por essa sociedade. Adiante será tratado sobre o instituto da Accountability. Será realizado um breve relato sobre tão importante instrumento que surgiu durante os discursos reformistas do Estado, bem como serviu como dimensão de Governança. Não há mais que se falar em Reformas do Estado, participação cidadã, Governança, Governo Eletrônico, transparência, sem se falar neste instituto multidimensional e complexo.

...

Baixar como (para membros premium)  txt (15.7 Kb)   pdf (101.4 Kb)   docx (13.5 Kb)  
Continuar por mais 9 páginas »
Disponível apenas no TrabalhosGratuitos.com