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Orfismo, a redenção de Dioniso?

Por:   •  8/9/2015  •  Trabalho acadêmico  •  2.950 Palavras (12 Páginas)  •  151 Visualizações

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Este trabalho, intitulado: “Orfismo: a redenção de Dioniso?”, já sugere bem o meu proposito nessa comunicação. Para que fique claro o objetivo e a ideia que tracei para tal, farei a explanação do que era o Dioniso antes do Orfismo, retratando aqui o Dioniso das Bacantes de Eurípedes e do culto público, e confrontarei ele com o Dioniso Órfico, presente, principalmente, nas Rapsódias[1], assim, não utilizarei outros documentos, como o Papiro de Derveni ou as lâminas de ouro. Portanto, a metodologia utilizada será o da história comparada; a partir dela poderemos tirar a conclusão ou não de que houve uma redenção ou uma modificação na representação do deus Baco.

Utilizarei dois documentos distintos para retratar um mesmo deus, distintos pelo fato de representarem séculos diferentes e espaços distintos: público e privado. É certo que a tragédia euripidiana é representada no século V antes de nossa Era, mas não podemos falar o mesmo das Rapsódias; a datação deste documento é por vezes mais complicada. Alberto Benabé, a partir do conteúdo encontrado no documento, atribui-lhe “uma data ligeiramente anterior ao 100 a.C, melhor que entre I e II d.C.” (BARNABÉ, 130). Enquanto ao espaço em que os documentos fazem referência, para este curto estudo, eles não serão apresentados.

Nas Bacantes, Dioniso é entoado como neto de Cadmo, e filho de Zeus e Sêmele. Segundo a narrativa, a estirpe cadméia não o reconhece como deus, ignora e ironiza o fruto desta copula: Dioniso. Para suas tias e avô, Dioniso não nascera de Zeus, Sêmele teria sido seduzida por algum mortal, e colocando a responsabilidade da gravidez em Zeus, a moça teria sido fulminada pelo seu raio. É por negar a divindade que Tebas, ou qualquer outra cidade, era epidemizada pelo deus, que por tal ultraje lançava-lhe sua fúria.

Primeira cidade na Hélade, foi Tebas que soltei ululante! As mulheres revesti da pele do corço e em suas mãos depus o tirso, dardo de hera envolto. Já que as irmãs de minha mãe – as que menos o deviam ter feito – diziam que Dioniso não nascera de Zeus, e que Sémele, seduzida por qualquer mortal, ao grande deus imputava a mácula em seu leito (astuciosa mentira de Cadmo!), e que de haver propagado as falaciosas núpcias a fulminara Zeus, por isso mesmo para fora de portas as toquei com o aguilhão da insânia. (EURÍPEDES, vv. 23-43)

Este é um dos motivos pelo qual Dioniso é conhecido como o deus transgressor, dos desvios, da persuasão, da manía, Dioniso é o elucubrador das mulheres, estas que vão à montanha saudar “Évoe!”. Assim, o deus, a partir de todo o seu furor, traz aos homens e mulheres seu culto. Além disto, o deus é visto como estrangeiro, ele é o deus de lugar nenhum. “Dioniso não para, é um permanente continuum. Incorpora a ideia de acaso. É presentidade. É eterna procura, nunca chega.” (FORTUNA, 2005: 19)

Contudo, mesmo com essa característica transgressora, o deus é dual, na própria tragédia das Bacantes, aparece com máscara de kadmeîos e Lusios. O primeiro Dioniso se reporta ao limite do espaço urbano. Quando concebido como neto de Cadmo, ou seja, filho de Sêmele, o deus é entendido como uma potência purificadora e, por esse motivo, é nomeado kadmeîos. Enquanto o segundo, Lusios, é o Dioniso tebano que, acompanhado por sua mãe Sêmele, liberta os homens. (DETIENNE, 1988: 42-47) No próprio enredo trágico, Dioniso afirma: “Aprenderá assim que o filho de Zeus, Dioniso, sendo para os homens o mais benigno dos deuses, também é o mais terrível” (vv. 848). Mas o que aparecerá no orfismo? Com qual das múltiplas faces Dioniso será apresentado?

Primeiro deve-se sublinhar de que orfismo trataremos nessa comunicação, afinal o orfismo surge, na Grécia, segundo Anselmo Carvalho de Oliveira, por volta do século VI antes de nossa Era. Deste modo, o orfismo, e cada documento vinculado a este, trata de um período específico e tem mitos próprios. Para tratar do orfismo e do Dioniso órfico, nesta comunicação, utilizarei as Rapsódias, poemas anteriores ao século I antes de nossa era. Feito isto, é preciso retomar aqui o mito de Orfeu e fazer a devida relação entre o poeta e o deus.

Para tal, recordaremos a narrativa de Orfeu no Hades; a qual narra Apolodoro, em 140 antes de nossa era. Segundo a narrativa, o poeta Orfeu persuade Hades, Plutão, a deixar que leve Eurídice, sua esposa morta por uma picada de cobra, do submundo. O deus concorda, contudo, determina que Orfeu não poderá olhar para trás, confiando, portanto, que sua esposa o estará seguindo até o fim de sua jornada, porém Orfeu não foi capaz de cumprir o acordo, e, ao olhar para trás, para certificar-se da presença da mulher, esta regressa ao Hades. (GUERRA, 142). Em seguida, a narrativa

afirma que Orfeu inventara os mistérios dionisíacos e morrera despedaçado pelas Mênades. Diodoro da Sicília, no primeiro século anterior a nossa era, apresenta como pequena modificação a de ter Orfeu encantado Perséfone com sua música, a fim de persuadi-la a libertar Eurídice. Diodoro aponta, inclusive, a similaridade entre o cantor e Dioniso, o qual também descera ao Hades, contudo, com o intuito de libertar sua mãe, Sêmele. (GUERRA, 142- 143)

Pausânias, no século II de nossa era, atribui a Orfeu um conhecimento e proliferação do mistério, só não afirma se são os mistérios Dionisíacos. Em relação a morte de Orfeu, esta ganha duas hipóteses: na primeira, “Orfeu teria persuadido muitos homens a acompanharem-no em suas andanças, o que despertara a ira das mulheres trácias a planejarem sua morte” (GUERRA, 2008, 143); na segunda, o poeta é morto pelo raio de Zeus, como punição por revelar os mistérios aos profanos.

No entanto, há outra variante do mito a Orfeu, esta é descrita por Higino no século II da nossa era. Segundo este o deus da vinha, Dioniso, se sentiu ofendido por Orfeu, pois, quando este se encontrava no mundo dos mortos, não lhe prestou honras, como aos outros deuses; assim,

tempos depois, quando o poeta regozijava-se com sua lira próximo à Trácia, o deus suscitara a fúria das bacantes contra ele, as quais o mataram e desmembraram. As musas, então, recolheram e enterraram seus membros e, posteriormente, colocaram no céu, desenhada nas estrelas, a lira do poeta entre as constelações. (GUERRA, 143-144)

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