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República Federativa do Brasil

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Por:   •  22/11/2014  •  Tese  •  1.300 Palavras (6 Páginas)  •  145 Visualizações

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Não há, em doutrina, definições consistentes do que seja o «Direito Penal do Trabalho». Se nos coubesse definir, diríamos que, em sentido objetivo, o Direito Penal do Trabalho é o segmento do Direito Penal especial predisposto à tutela jurídica fragmentária ("ultima ratio") da dignidade humana da pessoa trabalhadora e da organização geral do trabalho. Por evidente, não tem autonomia científico-dogmática, enciclopédica ou acadêmica, nem se desprende do Direito Penal. É apenas uma sua especialização (como também é, p.ex., o Direito Penal Econômico e o Direito Penal Ambiental [03]), sem maiores pretensões. Nada obstante, por essa própria natureza interseccional, tende a encruzilhar, tanto no processo legislativo como nas operações hermenêuticas, princípios inerentes ao Direito Penal (taxatividade, culpabilidade, fragmentariedade, insignificância, etc.) e princípios próprios do Direito do Trabalho (primazia da realidade, irrenunciabilidade; menos freqüentemente, princípio da proteção e princípio da continuidade da relação de emprego). E aqui, justamente, reside a sua maior riqueza. Afinal, sem essa percepção axiológica, jamais será mais que uma noção sem conseqüências [04].

No entanto, admitir a existência de um «Direito Penal do Trabalho» é admitir a possibilidade constitucional de criminalização em sede de ilícitos laborais e afins. Em tempos de Direito Penal mínimo, de abolicionismo penal e de recorrentes processos legislativos de descriminalização (como recentemente se viu, no Brasil, em sede de delitos contra os costumes [05]), isso não é pouca coisa.

Afinal, o valor social do trabalho, pensado in abstracto, engendraria importância bastante para desafiar a tutela penal estrita? Aliás, seria o legislador ordinário ― entre nós, por força do artigo 22, I, da CRFB ― um agente criador plenamente livre para estabelecer sanções penais às condutas que bem lhe aprouvessem, sem qualquer parâmetro superior?

CLAUS ROXIN (1997, pp.51-58) respondeu bem a tais questões. Na percepção do catedrático alemão, os processos legislativos de criminalização não se guiam ao inteiro talante do legislador ordinário. Há, nos Estados Democráticos de Direito, um programa penal constitucional, do qual o legislador não pode se desviar sensivelmente. É dizer: nem tudo pode ser criminalizado. Essa tese ― que se ensaiou noutras paragens e já se tem por adquirida em boa parte das doutrinas estrangeiras (inclusive no Brasil) ― atende bem aos propósitos do garantismo penal (LUIGI FERRAJOLI, 2000, pp.353-367) e promove, ao mesmo tempo, uma superfetação da chamada «teoria constitucional do direito penal». E é bom que seja assim. Previnem-se, por essa via, intromissões indevidas do Estado na esfera individual (como ocorrem, p.ex., nos países que criminalizam atos homossexuais entre maiores e capazes, ou naqueles sistemas que outrora profligavam a miscigenação racial, conquanto as respectivas Constituições fossem silentes a respeito).

Nessa linha de idéias, ROXIN vale-se de exemplos históricos e lições análogas para identificar quatro grupos principais de «objetos» que não devem se servir do Direito Penal. Na perspectiva constitucional-garantista, o Direito Penal não pode se prestar a (a) cominações penais arbitrárias (como na lenda de WILHELM TELL, preso pelo «crime» de não reverenciar em praça pública o chapéu do governador GREßER, nos tempos da dominação austríaca); (b) finalidades puramente ideológicas (a exemplo dos tipos penais abertos que grassaram durante o regime alemão nacional-socialista, voltados a punir tudo o que atentasse contra o Volkgeist, i.e., o «espírito do povo»); (c) repressão a meras imoralidades (como os tipos incriminadores de certas modalidades de atos sexuais); (d) guarida de preceitos penais que criem ou assegurem desigualdade entre seres humanos (como nos tipos penais segregatórios ou de «apartheid», já referidos há pouco).

É fácil perceber, todavia, que o trabalho humano ― e a sua organização público-coletiva ― não pode ser reduzido a nenhuma dessas categorias. Afinal, insista-se ainda uma vez, o trabalho é uma projeção da personalidade humana do trabalhador, confundindo-se com a sua própria vida em sentido dinâmico (supra). Ou, se com ela não se confunde, é um seu atributo indissociável. Trabalha-se para viver; e, não raro, vive-se para trabalhar. São mundialmente conhecidas as estatísticas do sistema japonês de relações de trabalho, a apontar, no século XX, vertiginoso aumento do «tempo de empresa» do trabalhador (i.e., do tempo em que o trabalhador permanece no meio ambiente de trabalho, cumprindo ordens ou aguardando-as, em detrimento do convívio familiar), chegando aos limites do «Karoshi» (= morte por exaustão laboral). Sob tais circunstâncias, admitir a tutela penal para inibir as agressões mais contundentes à dignidade do trabalhador (trabalho escravo ou degradante, assédio sexual ou assédio moral intenso, sujeição negligente a risco iminente de dano físico, etc.) é admiti-la para, direta ou indiretamente, proteger a vida; e, antes dela, a condição mesma de auto-realização integral do indivíduo (FERNÁNDEZ, 1998, p.424).

Mas não é só. O trabalho não é constitucionalizado apenas em seu valor humano, mas também ― e sobretudo ― em seu valor social (artigo 1º, IV, da CRFB). É, indiscutivelmente, um bem jurídico-constitucional inerente à gama de Constituições democráticas contemporâneas, em todo o seu espectro ideológico (desde as mais liberais até aquelas mais engajadas socialmente, próprias de Estados outrora designados como «Estados de Direito Democrático» ― veja-se, por todos, J. J. GOMES CANOTILHO ―, em contraposição aos meros «Estados Democrático de Direito»). Aliás, vem sendo assim desde pelo menos a Constituição mexicana de 1917. Logo, o trabalho é um item inexorável dos panteões constitucionais contemporâneos, ao menos nos países de tradição democrática. Nesses, constituirá, sempre, objeto útil do programa penal constitucional.

Assim é que, no Brasil, pode-se buscar

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