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Do Estado De Direito Ao Estado De Justiça

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Por:   •  20/10/2014  •  7.925 Palavras (32 Páginas)  •  440 Visualizações

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Do Estado de Direito ao Estado de Justiça

RESUMO

Estado de Direito é um termo que normalmente designa a autoridade e a influência da lei sobre a sociedade. À luz da história, duas principais modalidades de Estado de Direito podem ser identificadas: a formalista e a substantiva. No Estado de Direito do tipo substantivo, que reflete a experiência das modernas democracias ocidentais, a marca decisiva é a adesão à doutrina dos direitos naturais e ao sistema de direitos humanos que congregam as ideias de justiça compartilhadas pela maior parte dos povos e nações do mundo no estágio atual da civilização humana.

Palavras-chave: Estado de Direito. Direitos Fundamentais. Estado Constitucional. Estado de Justiça.

1 Introdução

No discurso político e acadêmico, Estado de Direito é uma categoria frequentemente utilizada, mas nem sempre com igual significado. De acordo com Ferrajoli (2003, p. 13, tradução nossa), em sentido amplo, Estado de Direito designa qualquer "[...] ordenamento em que os poderes públicos são conferidos pela lei e exercitados nas formas e com os procedimentos legalmente estabelecidos"1. Por outro lado, em sentido estrito – e também forte –, Estado de Direito designa aqueles "[...] ordenamentos nos quais todos os poderes públicos estão sujeitos à lei, não apenas com relação às formas, mas também com relação aos conteúdos"2 (FERRAJOLI, 2003, p. 13, tradução nossa). Nessa acepção, apenas são considerados Estados de Direito os ordenamentos em que todos os poderes, especialmente o legislativo, estão vinculados a preceitos substantivos estabelecidos por meio de normas constitucionais que prestigiam a divisão de poderes e os direitos fundamentais (ZAGREBELSKY, 2002, p. 21-34). Ferrajoli (2003) observa que ambos os conceitos descrevem realidades políticas diferentes. O primeiro refere-se ao modelo positivista do Estado de Direito de caráter formalista, que surge com o nascimento do Estado Moderno a partir da centralização da produção jurídica. O segundo corresponde ao modelo neoconstitucionalista do Estado Constitucional de Direito, ou Estado Constitucional, produto da difusão na Europa, após a Segunda Guerra Mundial, das Constituições rígidas e do controle de constitucionalidade das leis infraconstitucionais. Segundo Ferrajoli (2003), os dois modelos refletem experiências históricas, ocorridas no continente europeu, decorrentes da alteração de paradigmas da estrutura do direito, da ciência jurídica e da jurisdição. Neste artigo, pretende-se explicar e explicitar as notas distintivas dessas duas versões de Estado de Direito, a fraca e a forte, a formalista e a substantiva, as quais serão referidas ao longo da exposição, em atenção a objetivos de maior claridade, simplesmente pelos termos Estado Legal de Direito e Estado Constitucional de Direito.

2 O Estado Legal de Direito

O Estado Legal de Direito está em íntima conexão com o advento do Estado Moderno, que se forma na Europa entre o século XIII e o fim do século XVIIII. O Estado Moderno se apresenta basicamente como uma unidade de comando das relações de vida num espaço territorial relativamente amplo, realizada por meio da concentração do poder de ditar normas de comportamento e de sancionar a conduta ilícita. Consolida-se quando a monarquia finalmente se impõe ao modo de configuração político-jurídica típica do medievo, marcada pela existência concomitante de uma pluralidade de estruturas de poder, com destaque para a Igreja Romana – cuja liderança clerical afirmava a supremacia dos cânones divinos por ela revelados – e para o senhor feudal, que no círculo de sua propriedade exercia um domínio autônomo. A unidade jurídico-política viabiliza-se através do monopólio da força, que se traduz pelo exercício exclusivo do poder de legislar (monopólio da legislação) e de julgar (monopólio da jurisdição) no espaço territorial das novas comunidades nacionais. Implicando a redução do conteúdo do direito às leis e decisões emanadas do poder estatal, o monopólio da força retira a quaisquer outros pretensos poderes, sobretudo o eclesiástico, o direito de organizar a vida em sociedade e, assim, assegura a edificação de um único ordenamento vinculante.

Com efeito, diz Ferrajoli (2003, p. 15, tradução nossa), no direito anterior, ou pré-moderno, não havia tradição ou formação legislativa, mas apenas jurisprudencial e doutrinária, ou seja,[...] inexistia um sistema unitário e formalizado de fontes positivas, mas, ao contrário, uma pluralidade de fontes e ordenamentos procedentes de instituições diferentes e concorrentes – do Império, da Igreja, dos príncipes, dos municípios, das corporações – nenhuma delas com o monopólio da produção jurídica3.

O reconhecimento de uma norma como jurídica não dependia da sua fonte de produção, mas de sua racionalidade intrínseca ou da justiça dos seus conteúdos.

Com o ocaso do mundo medieval e o ingresso na era moderna, a ordem político-jurídica muda radicalmente, sobretudo pela afirmação do princípio da legalidade como critério de identificação do direito válido e existente, independentemente de sua valoração como justo. Uma norma jurídica não é mais válida por ser justa, mas, exclusivamente, por ter sido "posta" por uma autoridade dotada de competência legislativa. Verifica-se aí a inversão do princípio jusnaturalista, até então vigente, veritas, non auctoritas facit iudicium. Agora, diz-se que auctoritas, non veritas facit legem, princípio do positivismo jurídico do Estado Legal de Direito. Hespanha (2005, p. 341) assinala, a propósito, que a nova ordem política chega à sua fase de institucionalização depois do período "programático e experimental" correspondente à metodologia jusnaturalista da sociedade medieval. Ele registra que, no plano jurídico, "[...] esta fase caracteriza-se pelo movimento legalista e, sobretudo, pela tendência codificadora". (HESPANHA, 2005, p. 341)

O Estado qualifica-se então como uma organização na qual o direito é assimilado à lei, que passa a ser considerada, de acordo com Goyard-Fabre (2002), em seu componente formal e não em seu componente material. Nas lições de Ferrajoli (1999), o Estado adota o princípio da superioridade da lei, equivalente ao princípio jacobino da onipotência do legislador, e, portanto, do parlamento como órgão de soberania popular, que não encontra nenhum limite, senão formal, para a produção normativa.

Canotilho (1999) ressalta, na mesma linha de pensamento, que o Estado de Legal de Direito incorpora a ideia do primado

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