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Os Direitos Humanos Na Perspectiva De Hannah Arendt

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Por:   •  13/8/2014  •  2.119 Palavras (9 Páginas)  •  813 Visualizações

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Os Direitos Humanos na perspectiva de Hannah Arendt*

Renata Romolo Brito**

Resumo: Este artigo objetiva analisar a fundamentação dos direitos humanos de acordo com a filosofia de Hannah Arendt, tomando como referência a perspectiva histórica da filósofa em As Origens do Totalitarismo. Buscamos, porém, iluminar essa perspectiva com base em uma de suas obras mais filosóficas, A Condição Humana, para aprofundarmos a compreensão dos conceitos de condição humana, ação, liberdade e igualdade e sua relação com a idéia de dignidade – fonte dos direitos humanos.

Palavras-chave: Direitos Humanos, condição humana, dignidade.

Abstract: This article aims to analyze the basis of the human rights according to Hannah Arendt’s philosophy. Although this article is based on Arendt`s book Origins of Totalitarianism, which has a historical perspective, we aim to enlighten this perspective with one of her most philosophical works – her book The Human Condition – in order to better comprehend the concepts of human condition, action, liberty and equality; all concepts connected with the idea of dignity – the basis of human rights.

Keywords: Human rights, human condition, diginity.

Em sua obra Origens do Totalitarismo, Hannah Arendt analisa as experiências e as condições que possibilitaram o surgimento de uma forma de opressão política que, em sua essência, difere de todas as outras: o totalitarismo1.

Para compreender do fenômeno totalitário, segundo Arendt, não podemos mais confiar inteiramente na forma tradicional de conceber o passado, posto que uma ruptura na tradição tornou impossível explicar o conseqüente em razão do antecedente. Essa ruptura, trazida a termo pela experiência inédita de campos de concentração e fábricas de morte2 , faz com que não possamos mais nos aproveitar do passado de forma completa. Ainda assim, pela sua filosofia, é fundamental que nos voltemos para o passado para compreendermos o presente – para o passado e não para a tradição –, em um processo de reapropriação seletiva de fatos que podem esclarecer o presente depois de recuperados do esquecimento e re-iluminados pela nova visão retrospectiva3 . Dentre os fatos analisados por Arendt nessa obra, analisados com uma nova perspectiva afastada da perspectiva tradicional, nos concentraremos primeiramente na questão dos direitos humanos, para melhor desenvolvermos os conceitos de condição humana, ação política, liberdade e igualdade dentro da filosofia arendtiana.

Hannah Arendt aponta que os direitos humanos, conforme declarados no século XVIII, trazem um problema já em sua fundamentação. Segundo Arendt, a Declaração dos Direitos do Homem significou o prenúncio da emancipação do homem, porque foi a partir daquele momento que ele se tornou a fonte de toda a lei. Em outras palavras, o homem não estava mais sujeito a regras provindas de uma entidade divina ou assegurada meramente pelos costumes da história, mas que havia se libertado de qualquer tutela e que era dotado de direitos simplesmente porque era Homem4 . Dessa forma, esses direitos eram tidos ou mesmo definidos como inalienáveis, pois pertenciam ao ser humano onde quer este estivesse.

A definição de direitos humanos como direitos que emanam do Homem ou de uma idéia de homem – isto é, de um ser abstrato e indefinível –, entretanto, opõe-se à condição humana da pluralidade, essencial à ação e a dignidade humana. Nesse sentido, o indivíduo isolado5 continua sendo homem, porém ao separar-se do espaço público e da companhia de outras pessoas, ele não pode mais se revelar e confirmar sua identidade. De fato, na filosofia arendtiana, são as relações estabelecidas no espaço público com os diversos homens que representam a atividade dignificadora do ser humano. No espaço público, o homem iniciará relações únicas, marcadas por sua existência unívoca e iluminadas por suas particularidades. Nessa esfera, cada ação têm sua importância exatamente porque é fruto da atividade livre de cada indivíduo específico, revelando a identidade única e singular daquele que age. A ação política, advinda da liberdade e da singularidade de cada um, revela o seu agente aos demais, e confirma para si mesmo quem de fato ele é.

Sem essa revelação, o homem não mais faz parte da história, e após a sua morte, nada existe que possa recuperar sua existência ou sua memória. Sem a companhia dos iguais, a relação do eu com o mundo se parte pela falta de ratificação do senso comum. Por isso, é apenas quando o indivíduo está em companhia de outros homens diferentes de si, em um espaço público, é que ele realmente age, confirmando sua singularidade e sua identidade com o advento de relações inéditas que refletem a si mesmo, como agente unívoco na totalidade da comunidade humana. E é somente nesse momento que ele atualiza sua dignidade.

O indivíduo sozinho, excluído da teia de relações humanas, fica despido da própria dignidade humana, justamente porque nada do que ele faça ou deixe de fazer terá importância. Seus atos não atingirão o resto da comunidade humana e passarão como se não tivessem existido.

Essa situação de isolamento e separação da comunidade, em realidade, afeta as características particulares da vida humana consideradas essenciais, segundo Hannah Arendt, desde Aristóteles: o homem fica despido da relevância da fala (e comandar o pensamento e a fala sempre foram marcas de separação do ser humano dos demais animais); e fica despido do relacionamento com outras pessoas (afetando-se a idéia do homem como “animal político”).6

Sob esse ponto de vista, a fundamentação dos direitos humanos em uma idéia de homem, abstrata e universal, que exclui qualquer particularidade e singularidade dos homens que existem no mundo real, vai de encontro à própria atividade dignificadora do ser humano: a ação. A ação é política em sua natureza, pois é a interação peculiar do ser humano concreto e singular com outros homens tão concretos e diversos quanto existem em uma comunidade real. E é precisamente por essa característica que cada indivíduo, concreto e singular, emana dignidade; porque é único, e não uma cópia homogênea e substituível de uma natureza genérica. Na perspectiva arendtiana, os direitos humanos, que deveriam ser reflexo da dignidade do homem, pensados de forma a independerem da pluralidade humana, perdem o próprio sentido de dignidade.

Essa contradição entre os direitos humanos conforme pensados desde o século XVIII e a

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