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Guerra Fria

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Por:   •  26/9/2013  •  4.835 Palavras (20 Páginas)  •  746 Visualizações

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HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos. O breve século X (1914-1991). São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 223-234.

GUERRA FRIA

Os 45 anos que vão do lançamento das bombas atômicas até o fim da União Soviética não formam um período homogêneo único na história do mundo. Como veremos nos capítulos seguintes, dividem-se em duas metades, tendo como divisor de águas o início da década de 1970 (ver capítulos 9 e 14). Apesar disso, a história desse período foi reunida sob um padrão único pela situação internacional peculiar que o dominou até a queda da URSS: o constante confronto das duas superpotências que emergiram da Segunda Guerra Mundial na chamada "Guerra Fria".

A Segunda Guerra Mundial mal terminara quando a humanidade mergulhou no que se pode encarar, razoavelmente, como uma Terceira Guerra Mundial, embora uma guerra muito peculiar. Pois, como observou o grande filósofo Thomas Hobbes, "a guerra consiste não só na batalha, ou no ato de lutar: mas num período de tempo em que a vontade de disputar pela batalha é suficientemente conhecida" (Hobbes, capítulo 13). A Guerra Fria entre EUA e URSS, que dominou o cenário internacional na segunda metade do Breve Século X, foi sem dúvida um desses períodos. Gerações inteiras se criaram à sombra de batalhas nucleares globais que, acreditava-se firmemente, podiam estourar a qualquer momento, e devastar a humanidade. Na verdade, mesmo os que não acreditavam que qualquer um dos lados pretendia atacar o outro achavam difícil não ser pessimistas, pois a Lei de Murphy é uma das mais poderosas generalizações sobre as questões humanas ("Se algo pode dar errado, mais cedo ou mais tarde vai dar"). À medida que o tempo passava, mais e mais coisas podiam dar errado, política e tecnologicamente, num confronto nuclear permanente baseado na suposição de que só o medo da "destruição mútua inevitável" (adequadamente expresso na sigla MAD, das iniciais da expressão em inglês – mutually assured destruction) impediria um lado ou outro de dar o sempre pronto sinal para o planejado suicídio da civilização. Não aconteceu, mas por cerca de quarenta anos pareceu uma possibilidade diária.

A peculiaridade da Guerra Fria era a de que, em termos objetivos, não existia perigo iminente de guerra mundial. Mais que isso: apesar da retórica apocalíptica de ambos os lados, mas sobretudo do lado americano, os governos das duas superpotências aceitaram a distribuição global de forças no fim da Segunda Guerra Mundial, que equivalia a um equilíbrio de poder desigual mas não contestado em sua essência. A URSS controlava uma parte do globo, ou sobre ela exercia predominante influência – a zona ocupada pelo Exército Vermelho e/ou outras Forças Armadas comunistas no término da guerra – e não tentava ampliá-la com o uso de força militar. Os EUA exerciam controle e predominância sobre o resto do mundo capitalista, além do hemisfério norte e oceanos, assumindo o que restava da velha hegemonia imperial das antigas potências coloniais. Em troca, não intervinha na zona aceita de hegemonia soviética.

Na Europa, linhas de demarcação foram traçadas em 1943-5, tanto a partir de acordos em várias conferências de cúpula entre Roosevelt, Churchill e Stalin, quanto pelo fato de que só o Exército Vermelho podia derrotar a Alemanha. Havia indefinições, sobretudo acerca da Alemanha e da Áustria, as quais foram solucionadas pela divisão da Alemanha segundo as linhas das forças de ocupação orientais e ocidentais e a retirada de todos os ex-beligerantes da Áustria. Esta se tornou uma espécie de segunda Suíça – um pequeno país comprometido com a neutralidade, invejado por sua persistente prosperidade, e portanto descrito (corretamente) como "chato". A URSS aceitou com relutância Berlim Ocidental como um enclave dentro de seu território alemão, mas não estava preparada para lutar pela questão.

A situação fora da Europa era menos definida, a não ser pelo Japão, onde os EUA desde o início estabeleceram uma ocupação completamente unilateral que excluía não só a URSS, mas qualquer outro co-beligerante. O problema é que o fim dos velhos impérios coloniais era previsível e, na verdade, em 1945, considerado iminente na Ásia, mas a futura orientação dos novos Estados pós-coloniais não estava nada clara. Como veremos (capítulos 12 e 15), foi nessa área que as duas superpotências continuaram a competir, por apoio e influência, durante toda a Guerra Fria, e por isso a maior zona de atrito entre elas, aquela onde o conflito armado era mais provável, e onde de fato irrompeu. Ao contrário do que ocorrera na Europa, nem mesmo os limites da área sob futuro controle comunista podiam ser previstos, quanto mais acertados de antemão por negociações, ainda que provisórias e ambíguas. Assim, a URSS não queria muito a tomada do poder pelos comunistas na China, mas ela se deu assim mesmo.

Contudo, mesmo no que depois veio a ser chamado de "Terceiro Mundo", em poucos anos as condições para a estabilidade internacional começaram a surgir, quando ficou claro que a maioria dos novos Estados pós-coloniais, por menos que gostasse dos EUA e seu campo, não era comunista; com efeito: a maioria era anticomunista em sua política interna e "não alinhada" (ou seja. fora do campo soviético) nos assuntos internacionais. Em suma, o "campo comunista" não deu sinais de expansão significativa entre a Revolução Chinesa e a década de 1970, quando a China estava fora dele (ver capítulo 16).

De fato, a situação mundial se tornou razoavelmente estável pouco depois da guerra, e permaneceu assim até meados da década de 1970, quando o sistema internacional e as unidades que o compunham entraram em outro período de extensa crise política e econômica. Até então, as duas superpotências aceitavam a divisão desigual do mundo, faziam todo esforço para resolver disputas de demarcação sem um choque aberto entre suas Forças Armadas que pudesse levar a uma guerra e, ao contrário da ideologia e da retórica da Guerra Fria, trabalhavam com base na suposição de que a coexistência pacífica entre elas era possível a longo prazo. Na verdade, na hora da decisão, ambas confiavam na moderação uma da outra, mesmo nos momentos em que se achavam oficialmente à beira da guerra, ou mesmo já nela. Assim, durante a Guerra da Coréia de 1950-3, em que os americanos se envolveram oficialmente, mas os russos não, Washington sabia que pelo menos 150 aviões chineses eram na verdade aviões soviéticos com pilotos soviéticos (Walker, 1993, p. 75-7). A informação foi mantida em segredo, porque se supunha, corretamente, que a última coisa que Moscou queria era guerra. Durante

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