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Vico: tempo e história Andre Luis Joanillo

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Por:   •  6/2/2015  •  Seminário  •  7.891 Palavras (32 Páginas)  •  270 Visualizações

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Vico: o tempo e a história

André Luiz Joanilho

“Uma vida obscura” é o título do primeiro capítulo do livro de Robert Caponigri sobre a vida de Giambattista Vico. Este pensador nunca pôde obter o sucesso que tanto buscou na sua carreira acadêmica, trabalhando sempre num posto secundário na Universidade de Nápoles e, também, não pôde prever o sucesso que alcançaria, posteriormente, a sua principal obra, A Ciência Nova. Ela entusiasmou Michelet, Croce, Dilthey e, até mesmo, James Joyce, que lhe fez referência em Finnegans Wake. Foi lida e elogiada por Marx, tendo vários admiradores entre historiadores e pensadores, e ainda é estudada nos círculos historiográficos. Suas proposições acerca da história, do tempo, da poesia, encontraram ressonância em muitos trabalhos dos séculos seguintes. No entanto, a despeito do quase desconhecimento por parte de intelectuais de sua época por seu trabalho, Vico continuou tentando — até a sua morte, em janeiro de 1744 —, fazer-se conhecido.

Nascido em 23 de junho de 1668, era filho de um modesto livreiro de Nápoles, o que lhe proporcionou, desde cedo, o contato com os livros e com as leituras. Talvez, cioso dos estudos de Vico, seu pai o fez aprender as letras e estudos clássicos com vários preceptores jesuítas. No entanto, ele sempre fugia para ler, durante várias horas, sozinho, os livros que seriam objetos de comércio do seu pai. De compleição física fraca, somente de vez em quando brincava com outros meninos, tendo machucado a sua perna numa dessas vezes, o que lhe rendeu um pouco de dificuldade para caminhar. Esses estudos foram suficientes para que ele se tornasse tutor, em 1686, dos filhos de Domenico Rocca, um nobre de uma cidade — Vatolla — um pouco distante de Nápoles, e pôde empreender um estudo mais sistemático dos filósofos antigos e contemporâneos. Junto à propriedade, Vico tinha uma boa biblioteca à sua disposição e terminou seus estudos de direito na Universidade de Nápoles, em 1694, como Doutor em Lei Canônica e Civil.

Em 1695, de retorno à Nápoles, freqüentou círculos epicuristas e cartesianos, que lhe permitiram contato com as mais recentes produções filosóficas européias, correntes renegadas posteriormente por ele, pois não ficava bem, face à Igreja dominante na Universidade, ser adepto de tais idéias em voga naquele momento, principalmente nos últimos anos do século XVII, quando a Inquisição ganhou força ao condenar dois de seus amigos pelas suas pregações anti-Igreja. Porém, Vico nunca deixou de ser influenciado por essas vertentes de pensamento, sendo sempre visível certo sensualismo epicurista na sua compreensão da linguagem e da metáfora, e certo materialismo racionalista na compreensão de como se processa a história.

Aliás, várias vezes, Vico ignorou trabalhos escritos que poderiam comprometê-lo com os poderosos. Relata-nos Isaiah Berlim que um complô, a favor da Áustria, engendrado por adversários do domínio espanhol sobre Nápoles, foi descoberto. “Em 1702, Vico publicou um relato da conspiração, denunciando seus participantes como criminosos e traidores”. Em 1707, os austríacos tomam o reino das duas Sicílias e Nápoles dos espanhóis. No ano de 1708, “ele publicou um volume comemorativo, que não fazia qualquer referência ao trabalho anterior e elogiava os dois chefes conspiradores como mártires e patriotas. Em 1734, Nápoles foi reocupada pela Espanha. O novo governante, Charles de Bourbon, foi devida e humildemente congratulado por Vico, à cabeça de uma delegação enviada pela Universidade de Nápoles”. Constância em relação aos poderosos destronados não era uma das virtudes do nosso autor.

De qualquer forma, Nápoles, em finais do século XVII, vivia um momento de grande efervescência científica e cultural, período chamado de Risorgimento, apesar dos olhares vigilantes dos vice-reis espanhóis e da Inquisição. Vico não deixou de se entusiasmar pelas idéias correntes naquele momento, e chegou até mesmo a escrever poesias em conformidade com a moda filosófica: ‘Canzone in morte di Antonio’ e ‘Affetti di un disperato’. Essas obras foram devidamente esquecidas por ele, devido ao caráter pouco afeito aos padrões universitários e eclesiásticos vigentes, e proximidade com os círculos de jovens pouco quistos pelos criadores de padrões.

Em 1699 Vico assumiu a cadeira de Retórica na Universidade de Nápoles, após concurso. Para um jovem, um posto promissor, mas não satisfatório, pois era secundário em relação a outros postos docentes, e os ganhos relativos à atividade deixavam sempre a desejar. De qualquer forma, Vico pôde dedicar-se ao estudo do direito que, naquele momento, ultrapassava o simples campo jurídico, enveredando pela filosofia. Ele sempre almejou uma colocação melhor no quadro da universidade e seus estudos eram parte desse esforço.

Suas primeiras obras filosóficas resultaram de discursos solenes feitos para marcar o ano escolar. Ele foi escolhido seis vezes para fazê-los, entre 1699 e 1708, o que resultou nas obras Orazioni Inaugurali, na qual disserta sobre vários autores de sua época, e De nostri temporis studiorum ratione, na qual desenvolveu um estudo sobre Bacon, um de seus autores preferidos, ao lado de Grotius, Platão e Tácito, dos quais se declarou tributário, conforme sua própria autobiografia. Com relação a essa obra, Vita di Giambattista Vico scritta da se medesimo, de 1724, há uma nota interessante. Gênero extremamente raro na época, ela foi fruto da tentativa do conde Gianartico de Porcía em possuir um compêndio dos principais pensadores italianos de sua época. Assim, por meio de um amigo comum, foi pedido a Vico que escrevesse uma obra sobre si, para que fizesse parte do compêndio pretendido. Dessa forma, ele nos legou a sua formação intelectual, pelo menos aquela que queria legar à posteridade. Nesses primeiros textos, vão se delineando os temas e os autores que terão lugar na sua obra definitiva, A Ciência Nova. Título pretensioso, que indicava o desejo de Vico em formular uma nova forma de se pensar cientificamente, isto é, ele tinha para si uma idéia de que estava fundamentando a ciência de sua época em novas bases de compreensão.

Ao mesmo tempo em que ingressava na Universidade, em 1699, Vico se casava e teria diante de si todos os problemas e preocupações que um simples pai de família poderia ter. Teve oito filhos e uma imensa dificuldade em manter em dia o orçamento doméstico, devido aos baixos salários. O seu filho mais velho lhe deu muitos transtornos, pois vivia envolvido em brigas e confusões com a polícia da cidade. Diante dessas dificuldades, ele se dedicou cada vez mais aos estudos e leituras e, ao final de sua vida, teve certa recompensa, ao fazer

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