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Poesia Vadia

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Por:   •  29/4/2014  •  1.636 Palavras (7 Páginas)  •  232 Visualizações

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Não falam de outra coisa. "O livro, quando é que podemos ler o livro?", pergunta, sorridente, Marisol, a irmã mais velha de Valter Hugo Mãe (VHM). A cada lançamento o entusiasmo não esmorece. "É sempre uma excitação", garante. E um orgulho também, partilhado pela família, que se junta hoje para um jantar (só não veio o irmão). Faltam poucos dias para se poder falar livremente do livro, divulgá-lo no Facebook, comentá-lo nas conversas de café, lê-lo de enfiada, como fazem sempre. Só Flor, a irmã mais nova do escritor, está mais tranquila. Teve o "privilégio" de o ler em "fascículos", ao ritmo dos capítulos que lhe iam chegando às mãos. O sorriso espelha o seu entusiasmo. "É um romance muito forte", diz, aumentando ainda mais o interesse da mãe, Antónia Rodrigues Alves, e divertida inveja de Marisol. Uma das suas sobrinhas é que não teve meias medidas. "Encontrou o meu exemplar lá em casa", brinca Flor. "E ainda não o largou". A comida está prestes a ser servida e Valter descansa os espíritos mais curiosos: "Não se preocupem, esta semana vão poder ler tudo".

O entusiasmo que a sua família demonstra não é muito diferente do que tem rodeado o lançamento de A Desumanização. É uma das grandes apostas deste ano literário, o trunfo que a Porto Editora guardou para a rentrée, depois de ter oficializado um namoro antigo ao integrar o escritor no catálogo do grupo. Ao seu correio, quer eletrónico, quer em papel, não param de chegar reações às suas crónicas, intervenções públicas e romances. Também do Brasil chegam boas novas. Com A Máquina de Fazer Espanhóis, VHM foi o vencedor do Prémio PT de Literatura, para obras de todos os países de língua portuguesa, ficando ainda em primeiro lugar na categoria de romance. E este ano vai voltar a estar entre os finalistas do galardão, um dos mais importantes do Brasil, a par do Jabuti (este só atribuído a livros brasileiros). Não faltam ainda convites para festivais e outros encontros literários, a que nem sempre sabe dizer que não. Nos próximos meses vai estar no Egito, na Islândia, no Brasil (duas vezes), no Uruguai, Moçambique, Inglaterra, França (duas vezes) e na Alemanha, onde os seus livros estão a ser traduzido e publicados com grande sucesso.

Deste sucesso, garante a família, Valter nem sempre tem consciência. É frequente, dizem entre sorrisos as irmãs e a mãe, estar toda a gente a olhar para o autor de O Remorso de Baltazar Serapião, que lhe valeu, em 2007, o Prémio José Saramago, e disso ele não se aperceber. O escritor sente, no entanto, que é tratado de uma forma especial. E aprecia o gesto. "As pessoas falam comigo como se me conhecessem há muito tempo. Talvez seja por causa das crónicas do JL", afirma. "Às vezes é bom, outras vezes atrapalha-me, porque estendem-me a mão, sentem-se à vontade comigo, querem abraçar-me e tomar conta de mim durante um bocado". Mas reconhece: "É incrível que me abordem e partilhem comigo o que eventualmente não partilham com mais ninguém". E que "acreditem" em si, no que diz e no que escreve. Foi isso, de resto, que mais o comoveu, por exemplo, no Festival Literário de Parati, onde, em 2011, levou a plateia às lágrimas. "Não pode haver recompensa maior do que a de alguém desconhecido que, numa manifestação honesta, imediatamente se compadece com o que estamos a dizer. É isso que eu colho de praticamente todos os meus leitores, a garantia de que receberam a mensagem e que a entenderam como verdadeira".

Como diz a família: "O Valter está dentro de todos os livros. E as pessoas percebem isso".

A ILHA DE CAXINAS

O sucesso, contudo, não impede que VHM se sinta por vezes, tantas vezes, uma ilha. O seu novo romance é fruto dessa sensação, não só por se passar na Islândia, a ilha de todas as suas fantasias, mas também por a esses pedaços de terra rodeados de mar o escritor associar a solidão. De resto, a epígrafe do livro, retirada do romance Gente Independente, de Halldór Laxness, o único Prémio Nobel da Literatura islandês, sublinha isso mesmo: "Um homem não é independente a menos que tenha a coragem de estar sozinho".

Esse é o movimento de Halldora, a narradora de A Desumanização. É dela esta ideia, que também podia ser de Valter. "Aprender a solidão não é senão capacitarmo-nos do que representamos entre todos". Para si, não é só o facto "de a escrita ser um exercício de solidão". É também "a certeza de que por mais acompanhado que esteja, por mais gente que me procure, a comunicação, como dizia Wittgenstein, é impossível". Nunca ninguém chega perto o suficiente, diz, e acredita "frustrantemente" nisso. "Todos os afetos são apenas tentativas e até certo ponto estamos enclausurados". Como as personagens de A Desumanização.

Felizmente as ilhas não têm de viver sozinhas. Podem formar um arquipélago convocando para si outras ilhas. É o que VHM faz. Não abandona essa necessidade de estar só, essa vontade de ter coragem de encarar a solidão de frente, como viu tantas vezes acontecer na Islândia. Mas chama assim o que é mais seu. A família é a sua primeira ilha. As Caxinas, a segunda. É por estas ruas, em Vila do Conde, ali junto à Póvoa de Varzim, que nos mostra com prazer, que se sente mais à vontade. Anonimamente, até. "As Caxinas são a minha normalidade", diz. "Nas minhas viagens tenho sempre um limite. Ao fim de sete dias começo a pensar que Nova Iorque não chega aos calcanhares das Caxinas. Aqui não preciso de parecer inteligente, nem chique, posso abandalhar-me à vontade, ser eu próprio". Nas ruas que vão dar ao mar, onde ainda vive a sua mãe, toda a gente o conhece. No café Homem do Leme, que antes, com o nome Cadilhe, foi dos seus pais durante muitos anos, nos restaurantes da cidade,

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