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Eutanásia: para ou contra?

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Por:   •  8/4/2014  •  Artigo  •  3.182 Palavras (13 Páginas)  •  300 Visualizações

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Eutanásia: A favor ou contra?

De um lado estão aqueles que defendem a vida como bem supremo. De outro, os que sustentam a liberdade de escolha como direito inerente. Por trás deste embate está um pensamento dualista que opõe vida e morte e não distingue viver de sobreviver

Por Scarlett Marton

Scarlett Marton é professora titular de Filosofia contemporânea da Universidade de São Paulo (USP)

Basílica de São Pedro, no Vaticano. A doutrina moral da igreja católica condena a eutanásia por considerar que a vida é um dom de Deus e por isso é sagrada e inviolável em todas as suas fases e situações

A eutanásia tornou-se uma questão central nos debates de Bioética na atualidade. Em geral, distingue-se a eutanásia da ortotanásia e da distanásia. Por eutanásia entende-se a conduta médica que apressa a morte de um paciente incurável e em terrível sofrimento.

Por ortotanásia designa-se a suspensão dos meios medicamentosos ou artificiais de manutenção da vida de um paciente em coma irreversível. E, por distanásia, aponta-se o emprego de todos os meios terapêuticos possíveis, inclusive os extraordinários e experimentais, num paciente terminal.

Enquanto com a ortotanásia se aceita o processo natural de morrer, com a distanásia, pela obstinação terapêutica, se provocam distorções. Num caso, permite-se ao paciente ir ao encontro da morte; no outro, a ele se impõe um tratamento insistente, desnecessário e prolongado, sem nenhuma certeza de sua eficácia.

Com a eutanásia, adianta-se a morte, atendendo à vontade expressa e manifesta do paciente, no sentido de evitar sofrimentos que ele julga insuportáveis ou de encurtar uma existência que acredita penosa e sem sentido.

Vista por alguns como um suicídio assistido, a eutanásia inscreve-se numa situação em que o paciente quer morrer, mas, por incapacidade física, não consegue realizar sozinho o seu desejo. Aliás, no seu sentido etimológico, eutanásia significa "boa morte". Ela se diferencia radicalmente da distanásia, que importa em submeter o paciente a quaisquer condições para mantê-lo vivo.

Mas também se diferencia da ortotanásia que, chamada às vezes de eutanásia por omissão, implica decidir não conservar a vida do paciente por meios artificiais. Distinguem-se ainda diversos tipos de eutanásia: ativa, se a morte é provocada, ou passiva, se ela advém por omissão; voluntária, quando o paciente expressa e manifesta a vontade de morrer, ou involuntária, quando um indivíduo, grupo ou sociedade decide pôr fim à vida do paciente, sem que este exprima e manifeste a sua vontade (é o caso, por exemplo, de deficientes mentais, dementes ou inconscientes).

Entre nós, aceita-se a distanásia; no direito brasileiro, não se considera, neste caso, a conduta médica ilícita nem culpável. Admite-se, sob condições, a ortotanásia; julga-se a conduta médica lícita do ponto de vista jurídico, quando não significa a redução do período natural de vida do paciente nem caracteriza abandono do incapaz. Rejeita-se categoricamente a eutanásia; como conduta típica, ilícita e culpável, ela caracteriza homicídio, sendo indiferente que o paciente com ela concorde ou mesmo por ela implore.

"Se quiseres poder suportar a vida, fica pronto para aceitar a morte"

FREUD

Na antiguidade greco-romana, reconhecia- se o direito de morrer; era o que permitia aos doentes desesperançados pôr fim à própria vida, contando por vezes com o auxílio de outrem. Com o cristianismo introduziu-se a noção de sacralidade da vida, passando-se a concebê-la como um dom de Deus a ser preservado; foi o que levou à extinção das práticas dos antigos.

No século XVII, com Francis Bacon, a questão da eutanásia migrou para o domínio da medicina; começou-se a usar o vocábulo para expressar a ideia de que cabia ao médico aliviar os sofrimentos dos doentes tanto para curá-los quanto para proporcionar-lhes uma morte tranquila.

Mas com o direito moderno, a eutanásia assume caráter criminoso, uma vez que viola a proteção irrecusável da vida. Concebendo-se a vida como o bem jurídico mais valioso, o bem inalienável e intransferível por excelência, entende-se que ela é o direito primeiro da pessoa humana, direito esse que se deve proteger acima de todos os demais. Tutelado pelo Estado até contra a vontade do indivíduo, julga-se tratar-se de um direito absolutamente indisponível.

Ora, impondo-se como dogma, "a vida a qualquer preço", contribui bem mais para encerrar a discussão do que para promovê-la. Não quero dizer com isso que julgo ilegítimo ou inadequado recorrer aos valores religiosos para refletir sobre a questão da eutanásia. Pretendo apenas assinalar que não é o meu propósito aqui levá-los em conta.

Há um paradoxo: apesar da luta a todo custo para prolongar a sobrevivência, há vidas desprovidas de valor, como a de idosos e debilitados, que acabam isolados do convívio social

Vida como dever

Seja por julgar que se deve preservar um dom de Deus ou por entender que se tem de fazer jus à dignidade humana, há quem defenda que toda vida humana merece ser vivida.

Ora, tomar a vida como bem supremo implica não só proibir categoricamente a eutanásia, impedindo o paciente de pôr termo a sofrimentos insuportáveis, como também aderir à distanásia, impondo a ele sofrimentos ainda maiores causados pelos tratamentos fúteis e pela obstinação terapêutica.

Considerar a vida o direito primeiro da pessoa humana implica, também, que não se permita que tomem parte da discussão acerca da eutanásia todos os que são por ela afetados (além do paciente, os familiares e amigos, os grupos e segmentos sociais).

E seria possível ainda argumentar que, em nossa sociedade, o "valor sagrado da vida" não evitou que se aceitassem as guerras, a pena de morte e a legítima defesa, sem falar no extermínio dos animais.

É preciso ainda notar que, ao defender "a vida a qualquer preço", adota-se um modo de pensar dualista, opondo-se a vida à morte. Privilegia-se um dos termos da oposição em detrimento do outro, dispondo-se a tudo fazer pela vida contra a morte. Excluindo-se o seu contrário, converte- se então o direito de viver em dever.

O direito de morrer se basearia no princípio de autonomia. Toda pessoa tem o direito de tomar decisões acerca da própria vida

Defensores da eutanásia, por sua vez, argumentam

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