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O Rodoanel

Por:   •  18/9/2017  •  Trabalho acadêmico  •  10.266 Palavras (42 Páginas)  •  211 Visualizações

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2 – O RODOANEL E O GOVERNO DE MÁRIO COVAS NO ESTADO DE SÃO PAULO

Através da evolução do processo de estruturação da cidade de São Paulo e de sua região metropolitana, abordada no capítulo anterior, é possível identificar a construção paulatina de um modelo de mobilidade/acessibilidade. Constituído principalmente pela ação pública, esse modelo baseia-se na perspectiva da expansão ilimitada do tecido urbano, na prioridade dada ao transporte sobre rodas, na contínua ampliação de avenidas e rodovias como eixos indutores da expansão, conjugadas num esquema radioconcêntrico, e no casamento permanente entre a evolução desse modelo e a abertura de novas frentes de negócios para o capital privado.

Favorecido pelo papel regional exercido, primeiramente, pela cidade de São Paulo e, nas últimas décadas, pela sua região metropolitana, esse sistema de mobilidade/acessibilidade vem sendo reafirmado tanto em planos viários, urbanísticos, metropolitanos etc. quanto por projetos e obras implementados pela ação pública. Uma das mais recentes e representativas iniciativas nesse sentido é justamente o Rodoanel, cuja trajetória será abordada neste capítulo.

2.1        –        A        “lata        do        lixo”        e        os        fluxos        de        políticas        como instrumentos de análise da trajetória do Rodoanel Mário Covas

Para compreender a lógica que permeia a trajetória de definição e implementação do Rodoanel, serão mobilizados dois modelos analíticos: o modelo proposto por Cohen, March e Olsen (1972) e aquele proposto por Kingdon (1984). Espera-se, com eles, ser possível apontar e entender os

principais fatores e mecanismos que determinaram a entrada em definitivo do Rodoanel na agenda decisória governamental.

O primeiro modelo, conhecido como “garbage can model” ou “modelo da lata de lixo” (COHEN, MARCH, & OLSEN, 1972), foi formulado numa tentativa de explicar situações decisórias que fugiam dos procedimentos esperados pelo paradigma racional de tomada de decisões. Sintetizados por Marques (2013) e por Allison e Zelikow (1999), os modelos que compõe este paradigma induziam a um suposto encadeamento lógico em que objetivos de um ator em resolver determinada situação/problema levam à formulação de um leque de alternativas. Cada uma destas alternativas traz uma gama de consequências, as quais são devidamente ponderadas pelo tomador de decisão, que então escolhe aquela alternativa cujas consequências possibilitam a melhor satisfação de seus objetivos e metas. Para Cohen, March e Olsen (1972), a experiência vivida em organizações demonstrava, muitas vezes, justamente a inexistência desse encadeamento.

Although it may be convenient to imagine that choice opportunities lead first to the generation of decision alternatives, then to an examination of their consequences, then to an evaluation of those consequences in terms of objectives, and finally to a decision, this type of model is often a poor description of what actually happens (COHEN, MARCH, & OLSEN, 1972, p. 02).

Assim, ao contrário do que vinha sendo formulado – problemas levam a soluções, que levam a uma decisão – para os autores essas etapas muitas vezes se superpõem ou podem se encontrar até mesmo invertidas. Além disso, o tomador de decisão tem restrições de diversas naturezas: cognitivas, técnicas, administrativas, operacionais etc. Essas restrições podem desempenhar grande influência no processo de tomada de decisões, tornando- se o gestor consciência delas quando de fato assume, por exemplo, o mandato para o qual foi eleito. Nesse momento, ele fica ciente das condições já existentes, das soluções previamente formuladas e verifica suas possibilidades de atuação.

To understand processes within organizations, one can view a choice opportunity as a garbage can into which various kinds of problems and solutions are dumped by participants as they are generated. (…) In the garbage can model a decision is an outcome or interpretation of several relatively independent streams within an organization (COHEN, MARCH, & OLSEN, 1972, p. 02). Para entender os processos dentro das organizações, pode-se ver uma oportunidade de escolha como lixo em que vários tipos de problemas e soluções são despejados pelos participantes à medida que são gerados. (...) No modelo de lixo, uma decisão é um resultado ou interpretação de vários fluxos relativamente independentes dentro de uma organização

No caso de um governo estadual, seria como se o novo governador, ao assumir sua cadeira, pegasse uma lata de lixo para olhar o que o antecessor deixou, desamassasse os papéis de soluções previamente elaboradas e visse o que poderia efetivamente ser feito diante das restrições que encontra ao assumir o cargo. Não são, portanto, necessariamente os problemas que levam à escolha das soluções, que por sua vez levam às decisões. Soluções existentes também levam à escolha de problemas. Portanto, “o processo de decisão ocorria ao contrário, com os gestores escolhendo o problema a enfrentar em função das capacidades administrativas já instaladas e existentes” (MARQUES, 2013, p. 09).

Subverte-se, dessa forma, o modelo convencional em que a tomada de decisão seria considerada um processo linear, um encadeamento lógico e sequencial, para apontar que, em muitos casos, soluções e problemas nascem dissociados uns dos outros.

A major feature of the garbage can processes is the partial uncoupling of problems and choices. Although decision making is thought of as a process for solving problems, that is often not what happens. Problems are worked upon in the context of some choice, but choices are made only when the shifting combinations of problems, solutions, and decision makers happen to make action possible. Quite commonly this is after problems have left a given choice arena or before they have discovered it (COHEN, MARCH, & OLSEN, 1972, p. 16).

Uma característica importante dos processos de lixeira é o desacoplamento parcial de problemas e escolhas. Embora a tomada de decisões seja pensada como um processo para resolver problemas, isso geralmente não é o que acontece. Os problemas são trabalhados no contexto de alguma escolha, mas as escolhas são feitas apenas quando a mudança de combinações de problemas, soluções e decisores acontece para tornar possível a ação. Muitas vezes, isso ocorre depois que os problemas deixaram uma determinada arena de escolha ou antes de descobrirem isso

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