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AS TEMPORALIDADES DA INFÂNCIA

Por:   •  17/9/2017  •  Artigo  •  4.516 Palavras (19 Páginas)  •  246 Visualizações

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TEMPORALIDADES DA INFÂNCIA  

Pedro Almeida[1]

Resumo: Neste artigo trabalhamos o conceito de infância relacionado à temporalidades, mais especificamente a duas concepções de tempo: chrónos e aión. A partir de Kohan (2004), é possível observar  a infância relacionada a estas duas concepções gregas de tempo, na primeira, ela é entendida  como categoria geracional, relacionada ao tempo cronológico, na segunda, a infância  é entendida pela perspectiva da poesia e/ou filosofia, a qual vê a infância relacionada a outra temporalidade, não mais inerente à criança, e sim a um estado de alma que irrompe como potência no ser humano. Neste artigo abordamos estas duas temporalidades da infância e traçamos aproximações e distanciamentos entre elas para mostrar o quão distintas e ao mesmo tempo complementares, podem ser as abordagens da infância para a literatura científica contemporânea.  

Palavras-chave: infância, filosofia, tempo e perspectiva.

Apresentação

O que é infância? Esta é uma pergunta aparentemente fácil de ser respondida, e a resposta a este questionamento tem sido largamente difundido na sociedade contemporânea, popularizando um determinado conceito de forma tão homogênea que muitas pessoas têm absoluta certeza de suas afirmações quando se referem ao significado da infância. Desta forma, diversas são as teorias que tem se apropriado de tudo aquilo que historicamente se construiu acerca do que é a infância, em busca de apresentar de maneira científica e detalhada toda a as suas singularidades e especificidades.

Para os estudos de etimologia o nascimento da palavra infância está relacionado às normas e ao direito desenvolvidos na Grécia antiga, por isso muito mais relacionado ao domínio da respública, do que ao âmbito privado ou familiar. Como visto na seguinte passagem que descreve o sentido da palavra Infans:

“Esse termo está formado por um prefixo privativo in e fari, ‘falar’, daí seu sentido de ‘que não fala’, ‘incapaz de falar’. Tão forte é seu sentido originário que Lucrécio emprega ainda o substantivo derivado infantia com o sentido de ‘incapacidade de falar’. Porém, logo infans -substantivado- e infantia são empregados no sentido de ‘infante’, ‘criança’ e ‘infância’, respectivamente. De fato, é desse sentido que se geram os derivados e compostos, todos de época imperial, como infantilis, ‘infantil’; infanticidium, ‘infanticídio’, etc.” (KOHAN, p.26, 2003)

Aqui fica claro que a ideia de que, no seu nascimento, a palavra ‘infância’ está associada a uma falta, a uma ausência, que é inscrita no marco de uma incapacidade. Mas este trabalho não busca uma origem e desenvolvimento etimológico da palavra infância, e sim traçar dois guias conceituais para o entendimento da infância, onde os conceitos elaborados na literatura científica são mais relevantes que o senso comum.

A preocupação de pesquisadores com o que é ou poderia ser a infância não nasceu neste ou no último século, os gregos foram os pioneiros na arriscada tarefa de explicar, entre outras coisas, os fenômenos sociais, e nestes se inclui a infância. A partir da análise das obras de Platão torna-se claro o desenho de um  conceito de infância. De acordo com o filósofo brasileiro Kohan (2004), esta infância desenhada pelas ideias de Platão, é compreendida como a primeira fase da vida, uma etapa, um período que tem início e fim determinados cronologicamente, onde será constituída toda a estrutura comportamental futura do indivíduo. Segue-se, sobretudo a esta compreensão da infância, a ideia de que tal etapa caracteriza-se pela possibilidade e pela potencialidade de um vir a ser. É o período inicial de um desenvolvimento contínuo, mas que apresenta uma singularidade específica em relação às outras etapas da vida. Esta singularidade característica da infância reside, sobretudo, no fato de que, embora durante toda a vida as pessoas estejam passíveis à mudança é na infância em que este processo se dá de forma mais significativa. Esta compreensão da infância como um período cronológico da vida humana se solidificou historicamente atingindo as sociedades contemporâneas com poucas modificações, ou seja, sua base conceitual foi resguardada.

A ideia de tempo, seja ela cronológica ou não, é essencial para os conceitos de infância aqui apresentados. De acordo com Kohan, dentro do vocabulário grego encontra-se mais que uma palavra para referir-se ao tempo. A primeira e mais popularizada é “chrónos”, que nomeia o tempo que se transcorre de forma sucessiva e contínua. Ou seja, “[...] O tempo é, nesta concepção, a soma do passado, presente e futuro, sendo o presente um limite entre o que já foi e não é mais (o passado) e o que ainda não foi e, portanto, não é mas será (o futuro). (KOHAN, 2004, p. 54).

A segundo vocábulo grego encontrado, e já não muito utilizada na atualidade é “aión” que expressa enquanto conceito a intensidade do tempo da vida humana, designando uma noção de tempo que não é passível de ser numerada e nem apresenta uma linearidade sucessiva. Kohan, no texto Lugares da Infância: Filosofia, comenta que esta concepção de tempo designada pela palavra “aión” propõe, entre outras coisas, que o tempo da vida pode se desenvolver de uma forma que não siga necessariamente uma lógica numerável como aquela sugerida por “chrónos”. Assim, esta outra compreensão de temporalidade se assemelharia ao modo de fazer de uma criança, onde os fatos aparentemente não apresentam muita relação, e a lógica temporal ordenada pelos números ocorreria como uma brincadeira de criança. Esta comparação deve-se à forma como uma criança relaciona-se com o tempo. Para ela o que conta em relação a um determinado tempo transcorrido não é a duração cronológica sucessiva e contínua desse tempo, mas a intensidade da duração, do momento. Seria esta a “dimensão aiónica” do tempo. Ou, melhor dizendo, uma infância do tempo e dos fatos.

        A partir destas duas categorias de tempo encontradas na cultura grega é que pôde-se desenvolver este artigo, enxergando a infância por óticas distintas, o que nos leva a dois conceitos de infância, dois entendimentos distintos mas coexistentes, pois a existência de um não aniquila a existência do outro. Nomeei estes dois entendimentos distintos do mesmo objeto como: Infância chrónos e  Infância aión.

Infância Chrónos

A importância da construção do conceito de infância teve um grande avanço com os estudos do pesquisador francês Philippe Ariès. Com a publicação da obra História Social da Criança e da Família, em 1960, ele formula um novo olhar historiográfico para o sentimento de infância no mundo ocidental, a compreendendo como socialmente construída durante a época moderna, e destacando aspectos desde a consciência da infância até as especificidades da criança, ou seja, aquilo que a diferencia do adulto.

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