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Sobre a revolução - hannah Arendt

Por:   •  21/7/2017  •  Relatório de pesquisa  •  3.412 Palavras (14 Páginas)  •  333 Visualizações

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Sobre a Revolução

4. Fundação I: Constitutio libertatis

1.

No quarto capítulo de “Sobre a Revolução”, Hannah Arendt destaca dois aspectos como sendo determinantes para que o movimento de restauração dos antigos direitos e liberdades evoluísse para uma revolução: o fato de que existiram homens no Velho Mundo que sonhavam com a liberdade pública, e a existência de homens no Novo Mundo que provaram a felicidade pública. Além disso, os americanos concordariam com Robespierre acerca do objetivo supremo da revolução e sobre a tarefa do governo revolucionário, que são a fundação da liberdade e a instauração de uma república, respectivamente. Arendt destaca, entretanto, que talvez fosse o contrário, e que Robespierre era quem estava sob a influência do curso da Revolução Americana no momento em que escreveu os “Princípios do Governo Revolucionário”, uma vez que juntamente à revolta armada das colônias americanas e à Declaração de Independência, elaborou-se rapidamente as constituições em todas as treze colônias, como uma espécie de surto espontâneo entre a guerra da libertação e a luta pela independência, a qual fora a condição para a liberdade.

Mais adiante, Arendt ressalta que o acontecimento que norteou o sucesso da Revolução Americana se deu no fato de que a vitória não culminou "numa infinidade de nações, crimes e calamidades [...]; até que finalmente as províncias exaustas se afundassem na escravidão sob o jugo de algum conquistador afortunado”, apontando ainda que esse é o destino de uma rebelião a qual não se segue uma revolução. Além disso, a autora busca demonstrar que os historiadores, em divergência com os cientistas políticos, tendem a suprimir que “o fim da rebelião é a libertação, ao passo que o fim da revolução é a fundação da liberdade”, dando ênfase ao primeiro estágio e objetivando dramatizar a sua versão dos fatos. Tal tendência está relacionada à teoria de que as constituições são derivadas da força de reação, o que impede o pleno desenvolvimento da revolução e refere-se à Constituição dos Estados Unidos como sendo o resultado de acontecimentos contrarrevolucionários. Para Arendt, a não distinção entre libertação e liberdade é o equívoco dessa teoria, uma vez que se não vierem acompanhadas pela constituição da liberdade recém-conquistada, as rebeliões e libertações tornam-se fenômenos fúteis.

As novas constituições revolucionárias, para a autora, possuem pouquíssimo conteúdo novo ou mesmo revolucionário, e ainda que a noção de governo constitucional não possua aspectos revolucionários em seu conteúdo, trazendo apenas o significando de que o Estado é limitado por leis e tem o dever de garantir as liberdades civis, isso é um problema maior para o contexto ao qual Arendt se insere. Tais liberdades civis seriam de natureza negativa, não proporcionando uma maior participação no governo, mas visando a trazer uma maior salvaguarda contra esse mesmo governo. Outro aspecto complicador para que se identifique o elemento revolucionário na criação de uma Constituição pode ser encontrado na análise das revoltas posteriores às revoluções setecentistas, as quais se dividem em dois tipos: aquelas que se tornaram permanentes, sem realizar seu próprio fim, que é a fundação da liberdade, e aquelas que, após o ápice da rebelião, acabaram por dar início a um governo “constitucional” que garante liberdades civis, mas sendo uma monarquia, ou mesmo uma república, não passa de um governo limitado. As constituições de tais governos não resultam de revoluções, mas, aos olhos do povo, de seu fracasso, pois têm como objetivo deter a onda revolucionária. Limitam, então, não só o poder do governo, mas também o poder da revolução.

A ordem terminológica da análise do tema também é um problema, visto que a palavra “constituição” é ambígua, sendo encarada de forma diferente nos mais diversos países. Dessa forma, torna-se impossível o uso do mesmo nome e a espera dos mesmos resultados das “constituições” dos governos não revolucionários e das nações em que todo o povo constituiu um novo corpo político. Extrai-se dessa última definição a necessidade de ao todo tempo serem iniciadas atividades que visem a levar de volta ao povo o projeto de Constituição, uma vez que o princípio de que é o povo que deve "dotar o governo de uma Constituição, e não o inverso" se encontra estabelecido. À diferença entre as constituições que são um ato do governo, daquelas construídas sob a soberania do povo, soma-se uma outra diferença mais difícil de ser percebida, que é a acentuação dada à desconfiança no poder enquanto tal dos homens do Novo Mundo em relação aos homens do Velho Mundo. Assim, baseando-se na ideia de que o homem não deve receber poder ilimitado para não se tornar corrompido, viu-se a necessidade de conceder ao próprio governo o dever de frear o impulso humano por esse mesmo poder. Aqui, Arendt cita Madison, o qual afirma que "é de grande importância numa república não só proteger a sociedade contra a opressão de seus governantes, mas também proteger uma parte da sociedade contra a injustiça da outra parte para resguardar os direitos dos indivíduos ou da minoria... contra as combinações de interesses da maioria”.

Os fatores que embasam o conteúdo concreto de uma constituição, para a autora, não se encontram na simples salvaguarda das liberdades civis, mas no estabelecimento de um novo sistema. Tendo isso em vista, a Revolução Americana, sob direcionamento dos fundadores, não tinha como ponto central a limitação do poder, mas como estabelece-lo e instaurar um novo. Arendt aponta que tal questão é carregada de controversas devido ao papel desempenhado pela “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” durante a Revolução Francesa, em que tais direitos foram de fato a base de sua fundação. Adiante, retornando à análise americana, tem-se que as constituições estaduais que precederam a Constituição da União tinham como objetivo a criação de novos centros de poder, recorrendo-se ao que chamavam à época de “ciência política”, a qual tentava descobrir "as formas e combinações de poder nas repúblicas". Com isso, procurando aprender sobre a constituição do poder, desenvolveu-se certo fascínio pela obra de Montesquieu, que segundo a autora exerceu um papel para a Revolução Americana quase tão importante quanto Rousseau para a Revolução Francesa, defendendo que, na esfera política, poder e liberdade devem caminhar juntos.

Passando a analisar a separação dos poderes, Hannah Arendt lembra que, mesmo que Montesquieu

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