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A Saga Do "pioneiro" No Sertão Dos "bichos Do Mato"

Tese: A Saga Do "pioneiro" No Sertão Dos "bichos Do Mato". Pesquise 860.000+ trabalhos acadêmicos

Por:   •  25/12/2014  •  Tese  •  8.846 Palavras (36 Páginas)  •  226 Visualizações

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A saga do “pioneiro” no sertão dos “bichos do mato”:

A produção do espaço no Sudoeste do Paraná e o silêncio da História.

Resumo: Este artigo tem por intenção descrever algumas das trajetórias da colonização do Sudoeste do Paraná, categorizado nos documentos históricos como “sertão”. Apesar de habitado por caboclos, o Sudoeste foi considerado como uma região de “vazio demográfico” pelo Estado que favoreceu uma onda de migração à região. Ao momento que esses vão desenvolvendo práticas capitalistas na região, ocorre também uma negação do modo de sobrevivência do caboclo. Discutindo a territorialidade e a afirmação do migrante na região, o artigo evidencia a relação desse com o “outro”, assim como a resistência das práticas sociais e culturais do caboclo na região.

Palavras-chave: Sudoeste do Paraná, caboclos, gaúchos, territorialidade.

The “pioneer” trajectory in the "forest’s animals" sertão region:

The production of space in the Southwest of Paraná’s State and the History's silence.

Abstract: This article has for intention to describe any trajectories of the caboclo people in the Southwest of the Paraná state categorized in the historical documents like “sertão”. The caboclo people have lived in this area but that was considered like a “demographic emptiness” region by Paraná’s State government which benefited a migration wave to the region. When these migrants developed capitalist practices, a negation of the caboclo’s people sobrevivence model has occurred. Discussing the territoriality and the affirmation of migrants in the region, this article evidences the migrant’s relation with the “other people” and the social and cultural resistance practices of caboclo people.

Keywords: Southwest of Paraná, caboclo people, gauchos, territoriality

Em meio às matas de araucárias do Paraná, caracterizadas por invernos rigorosos com geadas frequentes, verões quentes e chuvas frequentes encontramos o tal sertão do Paraná. Assim chamado pelas autoridades políticas que trocavam correspondências abordando a necessidade de sua ocupação, se destacava como uma região marcada por uma rica biodiversidade de fauna e flora1.

O homem branco, derrubando árvores milenares, dizimando espécies nativas, fazendo e alastrando picadas, atravessava aquelas matas até encontrar a mulher indígena. Pega a laço, essa via seu pai e irmãos serem assassinados, e era violentada. Desse tortuoso encontro, os laços consanguíneos geravam um ser mestiço de pele amarronzada. Com o passar dos anos, além da cor, sua pele passava a ser demarcada pela lida do mato até ser encontrado pelos costumes trazidos pela sociedade do homem branco.

Entre ser aculturado e fazer persistir os costumes dos povos da mata, o caboclo se forma por seus saberes e práticas. Este artigo tem por objetivo analisar a formação étnica e histórica do caboclo no Sudoeste do Paraná, suas relações interétnicas com representantes do processo colonial desde o final do século XIX passando pela criação da Colônia Agrícola Nacional General Osório (CANGO) em 1943 e da “Frente Pioneira” até aspectos de sobrevivência desse povo no contexto atual. Em todo esse período, a memória de algumas instituições priorizou o trabalho do migrante na região em detrimento de um silêncio em torno do caboclo.

Roceiros e safristas cuidam a horta, sua fonte de alimentação, ou desenvolvendo roças de milho para as “safras” de porcos. Mateiros e sertanistas trabalham na lida com animais silvestres como porcos-do-mato, onças e tatus extraindo suas peles e usufruindo inclusive de suas carnes. Posseiros e imobiliários desenvolvem e comercializam por um baixo preço suas terras sem receber nenhuma documentação do governo por as terem administrado. Religiosos e curandeiros, promovem um culto próprio em contato com a natureza, extraindo dela ervas para chás e desempenhando a medicina popular na região.

Figura 1: Dona Elza no seu quarto de orações (acervo próprio).

I. “Cor de cuia”: Bugreiros, violência sexual e mestiçagem - A origem do caboclo no sertão do Paraná.

“Eu não aceito nada errado

vim lá do meio do mato,

faço tudo direitinho,

e a ninguém eu desacato.

A mágoa eu não trago no peito

inveja não tenho não

tenho paz e muito amor

que são coisas do sertão”.

(trecho da música “Caboclo”

de João Lopes)

A romantização da vida simples e humilde dos povos sobreviventes da terra é algo frequente na música popular. Essa representação positiva da vida do outro dedilhada nessa canção e em outras modas de viola não podem ser omitidas, mas sim analisadas. Assim como não podemos aqui deixar de omitir o consequente e tortuoso encontro do colonizador com as povoações nativas.

Antes de falarmos sobre as trajetórias caboclas no sertão do Sudoeste do Paraná, seria interessante discurtirmos a terminologia da palavra “caboclo”. O termo vem do tupi caa-boc, "o que vem da floresta" ou de kari’boca, "filho do homem branco" (CASCUDO, 1954). Logo, na visão desse autor, o termo dialoga com o meio onde esse ser vive e com sua origem mestiça. Mas isso não é um ponto final na pesquisa, outras definições se fazem presentes e ao invés delas nos evidenciarem uma resposta pronta, nos invocam diversas dúvidas. Antônio Cunha encontrou o termo caboclo presente em uma etimologia controvertida na representação de textos portugueses desde o século XVII e em textos literários do século XIX. A primeira acepção remete o caboclo como ser “semi-aculturado”, as fontes oficiais do Estado lusitano cedem a esses povos teor pejorativo e depreciativo. Desde o século XIX, a abordagem transita entre cronistas, literários e viajantes que almejaram heroicizar aquele que fora gerado nos interiores do Brasil. Entre a mestiçagem do colonizador com o indígena, o “caboclo adquire a acepção, ainda viva hoje, de homem do sertão, caipira, roceiro” (CUNHA, 1978, p. 80).

Durante a década de 1970, o francês Pierre Monbeig, realizou diversas incursões pelo país abordando uma Geografia

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