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Linguagem e hemisférios especializados: neurobiologia da linguagem e das funções laterais

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Por:   •  20/4/2014  •  Tese  •  1.922 Palavras (8 Páginas)  •  542 Visualizações

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A Linguagem e os hemisférios especialistas: A neurobiologia da linguagem e das funções lateralizadas

Os distúrbios da fala e da compreensão

Desde o passado remoto os médicos têm observado a ocorrência de distúrbios da fala e da compreensão verbal em indivíduos que sofrem lesões do sistema nervoso. Como já vimos, um grande avanço foi propiciado por Paul Broca no século XIX, ao descobrir em vários pacientes que a lesão causadora desses distúrbios está situada no hemisfério esquerdo, ocupando uma região da face lateral do lobo frontal. Broca chamou o distúrbio que descobriu de afemia, mas o termo que ficou consagrado na literatura médica foi afasia, criado por Sigmund Freud (1856-1939).

Recebem o nome de afasia alguns dos distúrbios da linguagem falada. Estes são extremamente comuns, causados por quase a metade dos acidentes vasculares cerebrais, pelo menos na fase aguda. Os neurologistas, entretanto, distinguem as afasias propriamente ditas de outros distúrbios que interferem com a linguagem.

Entendem como afasias os distúrbios da linguagem devidos a lesões nas regiões realmente envolvidas com o processamento lingüístico. Outras alterações da linguagem, entretanto, podem derivar de lesões que atingem o sistema motor, o sistema atencional etc., coadjuvantes, mas não determinantes da linguagem.

Neste caso, não são consideradas afasias. Por exemplo: um doente com paralisia do nervo facial pode apresentar distúrbios da fala porque não consegue mover adequadamente os músculos da face. Ao contrário, os portadores de afasias podem perder a capacidade de falar sem apresentar qualquer deficiência no funcionamento da musculatura facial.

As afasias primárias podem então ser classificadas de acordo com a natureza dos sintomas apresentados pelos pacientes, e correspondem também à região cerebral atingida. Quando a lesão incide sobre a região lateral inferior do lobo frontal esquerdo o paciente apresenta uma afasia de expressão (ou afasia de Broca).

Sem déficits motores propriamente ditos, torna-se incapaz de falar, ou apresenta uma fala não-fluente, restrita a poucas sílabas ou palavras curtas sem verbos (fala telegráfica). O paciente se esforça muito para encontrar as palavras, sem sucesso.

Quando a lesão atinge uma região cortical posterior em torno da ponta do sulco lateral de Sylvius do lado esquerdo, o quadro é inteiramente diferente, e o paciente apresenta uma afasia de compreensão (ou afasia de Wernicke1). Quando um interlocutor lhe fala, o indivíduo não parece compreender bem o que lhe é dito.

Não só emite respostas verbais sem sentido, como também falha em indicar com gestos que possa ter compreendido o que lhe foi dito. Sua fala espontânea é fluente, mas usa palavras e frases desconexas porque não compreende o que ele próprio está dizendo.

Como a prosódia é compreendida, o paciente entra na conversa nos momentos certos porque percebe que o interlocutor pausou; além disso, sabe que o interlocutor lhe perguntou algo pela modulação característica da voz. A Figura 19.10 ilustra um exemplo relatado por um outro neurologista, que perguntou a uma afásica desse tipo qual o seu trabalho:

1 Carl Wernicke (1848-1904), neurologista alemão que primeiro descreveu a afasia de compreensão e elaborou o primeiro modelo científico do processamento neurolinguistico.

Queria lhe dizer que isso aconteceu quando aconteceu quando ele alugou. Seu... seu boné cai aqui e fica... Ele alu alguma coisa. Aconteceu. Em tese os mais gelatinosos estavam com ele para alu... é amigo... parece é. E acabou de acontecer, por isso não sei, ele não trouxe nada. E não pagou.

As áreas atingidas pelas lesões estudadas por Broca e Wernicke receberam nomes que os homenageiam (área de Broca, área de Wernicke), mas a sua delimitação anatômica permaneceu vaga em virtude da variabilidade das lesões, que dependem quase sempre dos territórios de irrigação sanguínea atingidos em cada caso.

Além disso, não é precisa a correlação dessas áreas definidas por lesões e sintomas com os critérios citoarquitetônicosG dos anatomistas. Recentemente, entretanto, a área de Broca tem sido considerada restrita ao terço posterior do giro frontal inferior esquerdo, e a área de Wernicke, ao terço posterior do giro temporal superior esquerdo, incluindo a parte oculta no assoalho do sulco lateral de Sylvius (conhecida como plano temporal – veja adiante).

O estudo cuidadoso das afasias realizado ainda no século XIX por Wernicke levou-o a elaborar um modelo singelo de processamento neural da linguagem, e a prever a existência de outros tipos de afasias, ainda desconhecidas na ocasião e relatadas posteriormente.

Wernicke raciocinou que se a expressão da fala é função da área de Broca, e se a compreensão é função da área que levou seu nome, então ambas devem estar conectadas para que os indivíduos possam compreender o que eles mesmos falam e responder ao que os outros lhes falam.

De fato, existem conexões entre essas duas áreas lingüísticas através de um feixe de fibras imerso na substância branca cortical, chamado feixe arqueado. Wernicke previu que a lesão desse feixe deveria provocar uma afasia de condução, na qual os pacientes seriam capazes de falar espontaneamente, embora cometessem erros de repetição e de resposta a comandos verbais. Os afásicos previstos por Wernicke foram observados muitos anos depois.

O diálogo representado na Figura abaixo foi descrito por um neurologista sobre seu cliente, durante um teste de repetição. Obviamente, o doente compreendeu o que o neurologista disse, mas como não foi capaz de repetir, emitiu uma frase diferente de sentido equivalente.

Neurologista: O tanque de gasolina do carro vazou e sujou toda a estrada.

Paciente: A rua ficou toda suja com o vazamento do tanque do carro.

O modelo neurolingüístico de Wernicke considerava que a área de Broca conteria os programas motores da fala, ou seja, as memórias dos movimentos necessários para expressar os fonemas, compô-los em palavras e estas em frases. A área de Wernicke, por outro lado, conteria as memórias dos sons que compõem as palavras, possibilitando a compreensão.

Bastaria que esta área fosse conectada com a primeira para que o indivíduo pudesse associar a compreensão das palavras ouvidas com a sua própria fala. Esse modelo simples fez bastante sentido durante muitas décadas.

Afinal, a área de Broca é adjacente à área pré-motora, em região bastante próxima da representação somatotópica da face em M1. Desse modo, faz todo sentido supor que ela seja responsável pela programação dos movimentos

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