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Há um Significado Neste Texto?

Por:   •  11/9/2023  •  Resenha  •  1.700 Palavras (7 Páginas)  •  41 Visualizações

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RESENHA1 João Victor de Castro Alves França Livro: Há um significado neste texto? (São Paulo: Vida, 2001) Autor: Kevin Vanhoozer Em seu trabalho, o autor se propõe a tratar dos desafios do pós-modernismo no campo da hermenêutica. Partindo de pressupostos cristãos explícitos, ele argumenta a favor da íntima e indisassociável relação entre a teologia e a hermenêutica, propondo que a crise interpretativa em que estamos inseridos tem sua origem no abandono do que ele chama de uma “hermenêutica trinitária”. Uma vez que Deus é morto, ocorre também a morte do próprio autor do texto, o que torna a relação entre este, o seu texto e os leitores extremamente turva, não definida e subjetiva. Isto é, a perda do significado do texto tem suas origens em um problema de natureza teológica. Nesse sentido, a abordagem de Vanhoozer é predominantemente apologética. Isso fica evidenciado na divisão das duas partes principais do livro. Na primeira, o autor analisa a hermenêutica secular explicitamente não cristã, se focando na desconstrução do autor (capítulo 2), texto (capítulo 3) e leitor (capítulo 4). Ao contrário do que poderia se esperar de um autor cristão, Vanhoozer submete o seu leitor a uma análise detalhada e profunda sobre os pensamentos de autores como Gadamer e Derrida, interagindo com eles de forma não somente a tecer críticas, como também a apresentar os pontos positivos de seus pensamentos, quando estes existem. No capítulo 2, Vanhoozer traça um histórico do papel do autor na determinação do significado de um texto, começando quando este era quem que o comandava e o controlava, exercendo um papel autoritativo. Assim, o significado de um texto seria anterior e independente ao seu processo interpretativo. Em oposição, Vanhoozer destaca o trabalho de Jacques Derrida cujo pressuposto na leitura de um texto era o ceticismo hermenêutico, em que a leitura era realizada com a dúvida de que a verdade do autor poderia ser encontrada. Como consequência desta filosofia, a Bíblia perderia qualquer capacidade de falar aos seus leitores e de, consequentemente, ser relevante. 1 Resenha apresentada ao Instituto Aubrey Clarck como parte avaliativa da matéria de Hermenêutica Avançada do mestrado em Teologia Sistemática. Ao tratar da desconstrução do texto no capítulo seguinte, Vanhoozer argumenta em favor de que a morte do autor irá esvaziar o texto de seu significado que será substituído pelo pelo arbítrio e caprichos do leitor. Vanhoozer concorda com o pósmodernismo na sua crença de que encontrar todo o significado não é possível. Porém, ele se recusa a aceitar a indeterminação desse significado. Assim, apesar da impossibilidade de um conhecimento total do texto, poderíamos ter um conhecimento adequado acerca dele. No capítulo 4, Vanhoozer argumenta que, uma vez que tanto o autor como o texto foram esvaziados de suas respectivas autoridades, resta apenas ao leitor dar significado ao texto. Assim, um texto só terá significado quando o leitor o fornecer a ele. A consequência é o pluralismo interpretativo em que cada leitor tem o seu significado do texto. O que ocorre na prática é que o leitor se apropria do texto, em vez de se concentrar em aplicá-lo a sua realidade. Na segunda parte do livro, Vanhoozer traz a resposta ao desconstrucionismo dos autores seculares: a ressurreição do autor (capítulo 5), a redenção do texto (capítulo 6) e a reforma do leitor (capítulo 7). No capítulo 5, o autor procura ressuscitar a figura do autor, recolocando-o na posição de autoridade em relação ao texto, isto é, o significado registrado no texto parte do autor e é por ele determinado. A permanência e imutabilidade do significado do texto estaria vinculado ao registro. O destaque deste capítulo é o “resgate” da excelente obra de E. D. Hirsch que trata sobre o significado e significância de um texto. O primeiro diz respeito ao que o autor disse e a segunda às aplicações do que foi dito, estas sim podem ser variáveis e guardam relação com o contexto em que os leitores estão inseridos. Porém, como Vanhoozer deixa claro, a significância não pode influenciar o significado do texto. Pelo contrário, a significância é dependente do significado. Procurando a redenção do texto (capítulo 6), Vanhoozer apresenta a tese de que o bom entendimento de um texto não pressupõe que esse entendimento tem que ser completo, basta que seja adequado. Considerando a natureza básica da própria comunicação entre seres humanos, deve haver um entendimento de um texto pelo simples fato dele ter um autor, que tinha intenções definidas ao escrevê-lo, se utilizando, para isso, de um meio de comunicação usual, no caso a escrita, para transmitir o significado do texto. Enquanto o autor é a origem do significado, o texto em si seria o meio pelo qual esse significado se mostra acessível aos leitores. Por fim, Vanhoozer trata da reforma do leitor, no capitulo 7. Uma vez que o autor foi colocado como a fonte de autoridade de um texto, deve haver uma submissão do leitor, não somente a ele, mas ao instrumento que o autor deixou para ser compreendido que é o texto, que não deveria ser um espelho no qual o leitor vê a si mesmo, suas experiências e pressupostos. Pelo contrário, o texto é um espelho que reflete o autor do texto. O leitor não pode tirar à força um significado do texto que não está nele. Pelo contrário, ele deve prestar atenção ao que o texto diz, sob pena deste se configurar apenas em uma mera projeção sua, o que configura uma forma de idolatria. De uma forma geral, o livro de Vanhoozer possui pontos positivos relevantes. Primeiramente, a iniciativa de defender que todo texto possui um significado inalterado, se utilizando de forma explícita de pressupostos bíblicos, em meio à corrompida mentalidade pós-moderna de nossos tempos, apesar de não ser nova, certamente é algo não tão comum de ser feito, especialmente no nível de competência e erudição de Vanhoozer. Principalmente, quando consideramos que o autor dialoga com as obras dos autores seculares em um nível bastante satisfatório, quando consideramos a sua proposta. Da mesma forma, Vanhoozer acerta ao permear todo o seu trabalho com a hermenêutica trinitária, vinculando o fracasso do pós-modernismo em lidar com o texto ao seu abandono de Deus, evocando, ainda que não intencionalmente, a realidade de julgamento de Deus apresentado em Romanos 1. Sua tese de que todo ato interpretativo é um ato teológico é uma consequência direta dessa convicção. Outro acerto digno de destaque é a sua abordagem do papel do Espírito Santo no ato interpretativo e na hermenêutica como um todo. Rejeitando o ponto de vista de Gadamer de que não há uma separação entre o significado textual e a história de sua recepção e seus efeitos, Vanhoozer coloca o Espírito Santo como aquele que irá orientar o leitor do texto bíblico ao seu sentido literal ou à única interpretação de seu significado, ao mesmo tempo em que trabalha no leitor o aspecto da sua significância, aplicando-o às diferentes audiências ao longo dos séculos, tornando o texto significativo e relevante em nossos dias. Entretanto, o trabalho do autor é eivado de alguns problemas. Um dos mais relevantes é a sua evidente posição aliancista,que o faz tecer críticas infundadas aos dispensacionalistas, que são tratados como hermeneutas ingênuos em virtude do seu suposto literalismo exacerbado. O que Vanhoozer ignora é que a literalidade no sistema dispensacionalista não ignora a aplicação de metáforas, simbologia e quaisquer outras ferramentas não literais, comuns na linguagem extra bíblica, apenas que ela não espiritualiza determinadas passagens com o intuito de encaixar um determinado sistema eclesiológico/escatológico, como fazem os próprios aliancistas. Nesse ponto, todos os argumentos de Vanhoozer perdem a sua credibilidade em virtude da hermenêutica problemática dos aliancistas que não tem consistência na aplicação do método históricogramatical. Nesse ponto, toda a defesa que ele faz do significado fixo e único do texto é destruída pela aceitação de um sistema teológico que se baseia em uma espiritualização arbitrária e descabida, que visa ir ao encontro de uma tradição denominacional. Porém, o grande problema do livro de Vanhoozer é o próprio método de abordagem escolhido. Apesar de ser embasado de forma clara em uma teologia bem fundamentada, o livro de Vanhoozer se enquadra mais em uma categoria de “apologética filosófica”. Em sua boa intenção de dialogar com os filósofos seculares (um dos pontos positivos citados anteriormente), Vanhoozer se perde em análises sem fim e intelectualmente complicadas destes escritores apenas para chegar a conclusões que as Escrituras já nos mostraram de forma bem mais simples, direta e, por incrível que pareça, profunda. Todos os autores não cristãos que o autor aborda podem ser enquadrados no disposto em Romanos 1:21-22: “Porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato. Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos.” Em outras palavras, mesmo pintados com um verniz de brilhantismo acadêmico intelectual, os argumentos desses filósofos não passam de exteriorizações maquiadas de sua rebeldia contra Deus. Loucura travestida de sabedoria. Uma proposta muito mais interessante teria sido abordar os trabalhos desses autores à luz de textos bíblicos como o que citamos anteriormente, respondendo, por exemplo à seguinte pergunta: como a obra de Derrida se encaixa no perfil do julgamento de Deus por abandono descrito em Romanos? Como a ideias desse filósofo influenciam a sociedade a ser entregue cada vez mais à sua idolatria e afastamento de seu criador? O papel desses sistemas filosóficos abordados pelo autor em nossa sociedade como um todo, no meio acadêmico e até na igreja é inegável. Porém, o cristão comum não vê essa conexão porque os textos desses autores são simplesmente muito complexos para serem lidos. Vanhoozer perdeu uma ótima oportunidade de dialogar com esses homens, não nos bancos acadêmicos e nas salas de aula, mas nos bancos das igrejas de bairro e nos escritórios de seus pastores e líderes. Em virtude disso, por mais bem escrito ou argumentado e relevante que seja a obra do autor dentro do contexto pós-moderno em que estamos inseridos, para a maioria do corpo de Cristo, ela não possui significância porque, infelizmente, essa mesma maioria responderia da seguinte maneira à pergunta que dá o título ao livro (Há um significado neste texto?): “pode até ter, mas não consigo identificar qual é.”

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