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Música: Explicatio Textus, Prædicatio Sonora

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Por:   •  3/3/2014  •  1.880 Palavras (8 Páginas)  •  532 Visualizações

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Música: Explicatio Textus,

Prædicatio Sonora

Quando Martinho Lutero referiu-se à música de boa qualidade como eficiente veículo para

explicação do texto, serva, portanto, e não espetáculo por si mesma, estava, na verdade,

refletindo parte do pensamento de sua época: música boa agradava a Deus, música má

agradava a Satanás, independente de ela estar associada ao culto ou não. Os critérios

que definiam a qualidade e a conseqüente utilidade da música eram absolutamente

claros. Falava-se, assim, objetivamente, em música própria para adoração a Deus e em

música objetivamente imprópria para o serviço litúrgico.

Se Lutero enfatizava a importância da anunciação da Palavra de Deus através da prédica

no culto, entendia que boa música poderia fixar as verdades teológicas anunciadas. É

neste contexto que deve-se entender sua concessão: "Depois (ao lado) da teologia, à

música o lugar mais próximo e a mais alta honra".(1) É que, para ele, teologia e música

pertencem-se, relacionam-se estreitamente, já que música é veículo apropriado para

anunciar a Palavra de Deus, e o faz de forma especial, em sons. Entendeu Lutero que do

maravilhoso presente divino (donum divinum et excellentissimum) dado exclusivamente

aos homens, a união dos sons vocálicos (vox) à palavra (sermo), de música e canto,

deviam ser corretamente utilizados para que esses mesmos homens adorassem seu

Deus.(2)

"As notas musicais vivificam o texto".(3) Elas intensificam a força da palavra. Na tradição

musical reformada luterana, a música revela o texto. Ela o explica (explicatio textus).

Nesse sentido ela deverá ser uma espécie de exegese, uma explanação do texto, um

"sermão em sons" (prædicatio sonora). Segundo Lutero, "Deus mesmo fez com que o

evangelho fosse anunciado com música".(4) O cântico congregacional só atingirá seu

objetivo se a Palavra de Deus puder ser anunciada, absorvida e preservada pelo povo por

meio dele.(5) É este o "cântico popular" defendido por Lutero para o culto. Um cântico

que explicasse o evangelho para o povo e o interiorizasse. "Cântico popular", neste

contexto, não se refere à música profana da época, se considerada música má, e

portanto, agradável apenas aos ouvidos de Satanás. A música que se canta no culto deve

"fortalecer e intensificar o Santo Evangelho e também impulsioná-lo".(6)

• Boa música, música má

O conceito de "qualidade", ou a definição do que seria bom ou mau no que se referia à

música, era, nos séculos XVI a XVIII, bastante objetivo e claro. Falava-se em música boa

e má usando-se parâmetros muito bem determinados e que iam além da beleza do

produto final, da intenção de quem o produzira e, até mesmo, da finalidade da obra.

No ano de 1700 foi editado em Hamburgo uma espécie de método de estudo para o

Baixo-cifrado, técnica musical bastante comum na época. O editor, Friedrich Erhard Niedt,

escreveu no prefácio:

...a finalidade e a razão de toda música devem ser somente a glória de Deus e a

recreação sadia da alma. Onde isto não é levado em conta, não há música propriamente,e aqueles que abusam desta nobre e divina arte são "musicantes" do demônio, pois

Satanás tem seu prazer em ouvir tais coisas infamantes. Para ele, tal música é boa o

suficiente, mas para os ouvidos de Deus, são berros infamantes. Quem deseja, na sua

profissão de músico, ter a graça de Deus e uma consciência limpa, não desonra esta

grande dádiva de Deus, pelo seu abuso.(7)

Niedt nos revela aqui parte do pensamento corrente do seu tempo e que, por sua vez, era

uma síntese do pensamento dos dois séculos anteriores. Seguindo-se seu raciocínio, toda

música, mesmo a secular, devia ser escrita "para a glória de Deus". Para isso, devia

preencher, naturalmente, alguns requisitos. Se o fizesse agradaria a Deus. Mas se não o

fizesse, agradaria a Satanás, mesmo que houvesse sido composta para agradar a Deus!

• O Princípio da ordem e do número

No período do barroco, "boa música" estava associada ao princípio da ordem e do

número. Falava-se em "harmonia sonora", uma arte baseada em regras bem

determinadas. O princípio da ordem, musical ou não, era divino. O princípio do caos,

musical ou não, era satânico. Satanás era, aliás, o principal desestruturador da ordem

divina. A música que recebia aceitação e aprovação como "boa" era aquela possível de

ser racional e intelectualmente decodificada. Devia "falar ao intelecto". Quando isto

acontecia, então podia-se falar em uma verdadeira Ars, ou seja, em Arte no sentido mais

restrito da palavra. A Ars Musica baseava-se no princípio da ordem e do número. Se não

o fosse era objetivamente

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