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A Invenção do Nordeste e Outras Artes

Por:   •  15/12/2018  •  Ensaio  •  1.753 Palavras (8 Páginas)  •  160 Visualizações

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ALBUQUERQUE JR, D. M. A Invenção do Nordeste e outras artes. Recife: FJN, Ed. Massangana; São Paulo: Cortez, 2006.

Albuquerque JR propõe um novo olhar para o Nordeste, desconstruindo a idéia de uma região fruto das condições naturais, o autor busca o descobrimento do Nordeste enquanto um recorte espacial, definido, sobretudo, pelas práticas discursivas. Pensando o Nordeste como uma produção histórica que tem sua origem bem definida  no final da década de dez, Albuquerque JR desconstrói os discursos que deram visibilidade e definiram uma identidade nordestina resultante das condições geográficas e climáticas, do domínio dos negros pelos brancos e do homem enquanto produto do meio bem como de um território instituído como lugar do atraso, do rural e do passado persistente em oposição ao um Sudeste como espaço de progresso.

Através da análise das diversas práticas discursivas, demonstra que o Nordeste é uma instituição cultural e social e que os próprios nordestinos são nordestinizados e se nordestinizam pelo discurso, longe de serem vítimas, eles participam ativamente da produção histórica e cultural do seu território. Segundo o autor, os nordestinos costumam se colocar na posição de vítimas do discurso discriminatório que institui o Nordeste como uma região excluída e incivilizada, porém isso acaba fazendo do nordestino agente de sua própria discriminação, um ponto de apoio para ela, já que os nordestinos também estão no poder e também são agentes discursivos.

Não se deve fazer apenas uma inversão entre Sul desenvolvido e Nordeste subordinado, mas sim procurar entender as relações de poder e saber que produziram estes discursos, inverter os papéis (os discursos) e dizer o que o Nordeste não é, de nada resolve a questão, é preciso antes, entender os porquês e as implicações deste estereótipo na produção imagético-discursiva da região.

O Nordeste foi construído como uma psedo-unidade, por discursos regionalistas que criam a idéia de uma região homogênea e agem de forma padronizadora e muitas vezes apagadora das diferenças. Albuquerque Júnior, em seu livro “A invenção do Nordeste e outras artes” toma os discursos não como documentos de uma verdade sobre a região, mas como “monumentos de sua construção”, entende as regiões como produtos dos discursos regionalistas, na medida em que compreende que a linguagem institui o real assim, entende a região enquanto  “um grupo de enunciados e imagens que se repetem, com certa regularidade, em diferentes discursos, em diferentes épocas, com diferentes estilos e não pensá-la como uma homogeneidade, uma identidade presente na natureza” (ALBUQUERQUE JR 2006). Por isso, alguns enunciados se constituíram como representações da essência do Nordeste e identidade regional estereotipada que sustenta rede de poder.

Segundo Albuquerque Jr a região não é uma unidade que contém uma diversidade, mas é produto de uma operação de homogeneização, que se dá na luta com as forças que dominam outros espaços regionais, por isso ela é aberta, móvel, atravessada por diferentes relações de poder. O regionalismo aparece, por isso, muito mais do que uma ideologia de classes dominantes, ele produz efeitos de verdade que vão sendo incorporados pela população como uma verdade sobre a identidade regional.

O Nordeste surge como reação às estratégias de nacionalização que esse dispositivo da nacionalidade e essa formação discursiva nacional-popular põem em funcionamento; por isso não expressa mais os simples interesses particularistas dos indivíduos, das famílias ou dos grupos oligárquicos estaduais. Ele é uma nova região nascida de um novo tipo de regionalismo, embora assentada no discurso da tradição e numa posição nostálgica em relação ao passado. O Nordeste nasce da construção de uma totalidade político-cultural como reação à sensação de perda de espaços econômicos e políticos por parte dos produtores tradicionais de açúcar e algodão, dos comerciantes e intelectuais a eles ligados. Lança-se mão de topos, de símbolos, de tipos, de fatos para construir um todo que reagisse à ameaça de dissolução, numa totalidade maior, agora não dominada por eles: a nação. Unem-se forças em torno de um novo recorte do espaço nacional, surgido com as grandes obras contra as secas. Traçam-se novas fronteiras que servissem de trincheira para a defesa da dominação ameaçada. Descobrem-se iguais no calor da batalha. Juntam-se para fechar os limites de seu espaço contra a ameaça das forças invasoras que vêm do exterior. Descobrem-se “região” contra a “nação” (ALBUQUERQUE JR, 2006)

A elite intelectual nordestina precisa então, fundar uma representação original para a região, numa tentativa de construção e organização de símbolos que se constituíssem como seus códigos fixos, ordenando um conjunto de visões que estabelecessem certas características estáticas para ela.  Neste processo de “ordenação simbólica” para o Nordeste, alguns acontecimentos contribuíram de forma decisiva para a elaboração discursiva da região. Entre eles, a seca de 1877-79 foi o primeiro e o mais crucial (foi a primeira vez que este fenômeno natural passa a ter repercussão nacional através da imprensa). Era preciso representar a verdade da região para lutar por recursos frente ao governo de federal que possibilitassem a sobrevivência num local de seca e miséria.

Em decorrência da seca de 1877, foram criados os órgãos: IOCS (Inspetoria de Obras Contra as Secas) em 1909, que se torna um local institucional de fermentação do discurso regionalista em e, em 1919, a IFOCS (Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas, atual DNOCS – Departamento Nacional de Obras Contra as Secas) que institucionaliza o termo “Nordeste” como a área de atuação do órgão e que contava com a participação de intelectuais e políticos que tentavam construir uma imagem e um texto mais homogêneo para a região. A principal função desse órgão era racionalizar os investimentos públicos da área, já que se entendia o problema do Nordeste como sendo a seca.

É importante perceber ainda que a divisão territorial oficial do Brasil em regiões já tenha ocorrido desde 1940 formulada pelo IBGE, há várias outras divisões territoriais, culturais e econômicas na região, uma delas sendo crucial: a divisão entre o sertão e o litoral das cidades como Fortaleza e Recife, para onde os retirantes migram em busca de trabalho em abundância. A construção discursiva desta alteridade em certa medida se dá através de uma comparação do sertão com as cidades de maior porte do próprio território nordestino. Se esta alteridade campo|sertão x cidade|litoral se dá no seio do próprio território da região em construção, aos poucos, como parte do processo de formação de uma identidade nacional, vão se tornando cada vez mais evidentes indícios da construção de uma identidade para o Nordeste tendo como alter o Sudeste desenvolvido: instala-se no Brasil uma percepção do Nordeste como atraso em oposição a um Sudeste em franca expansão.

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