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Projeto Reviravolta Na Nissan

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Por:   •  20/5/2014  •  4.504 Palavras (19 Páginas)  •  550 Visualizações

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Projeto Reviravolta na Nissan

Saiba como Carlos Ghosn, um brasileiro, salvou a montadora japonesa.

Em março de 1999, Louis Schweitzer, CEO da Renault, ligou-me para saber se eu não gostaria de ir a Tóquio liderar uma reviravolta na Nissan, a combativa gigante automotiva do Japão. As duas empresas haviam acabado de selar uma aliança estratégica pela qual a Renault assumiria 5,4 bilhões de dólares de dívida da Nissan em troca de uma participação acionaria de 36,6%. Juntas, as duas montadoras se tornariam a quarta maior fabricante de veículos do mundo. No papel, o acordo fazia muito sentido para ambas as partes. A força da Nissan na América do Norte preenchia uma lacuna importante para a Renault, ao passo que o capital desta última reduzia a dívida colossal da Nissan. Os pontos fortes de cada uma delas também se complementavam: a Renault era conhecida por seu design inovador e a Nissan, pela qualidade de sua engenharia.

Para o sucesso da aliança, porém, eram preciso que a Nissan começasse a crescer e se tornasse um negócio produtivo, e foi por isso que Schweitzer me ligou. Tivemos de tomar algumas decisões polemicas sobre o fechamento de fábricas na Europa, algo muito difícil para uma empresa francesa tradicionalmente controlada pelo Estado. Não era a primeira vez que eu passava por um desafio semelhante. Nos anos 80, como chefe de operações da subsidiaria brasileira da Michelin, tinha de lidar com taxas de inflação completamente ensandecidas. Em 1991, como CEO da Michelin na América do Norte, fui incumbido de conduzir a fusão da empresa com a fabricante de pneus americana Uniroyal Goodrich, num momento em que o mercado entrava em recessão.

A Nissan, contudo, era um caso completamente à parte. Havia oito anos que a empresa lutava para voltar ao azul. Suas margens eram visivelmente baixas. De acordo com os especialistas, a Nissan perdia 1000 dólares em cada carro vendido nos Estados Unidos por falta de competitividade da marca. Não tardou para que eu descobrisse que os custos de aquisição na empresa eram cerca de 15% a 25% maiores que os da Renault. Outro fator que sobrecarregava ainda mais esse custo tão oneroso era a capacidade instalada, que excedia em muito suas necessidades. Só no Japão, as fábricas produziam praticamente 1 milhão de veículos a mais do que a empresa vendia por ano.

As dívidas da Nissan, mesmo depois dos investimentos da Renault, somavam 11 bilhões de dólares (para facilitar o entendimento do leitor, trabalharemos sempre com a taxa de câmbio de fim de setembro de 2001 – isto é, aproximadamente 120 ienes para 1 dólar). Era, sem dúvida, uma situação que não dava à empresa muita escolha: ou virávamos o negócio 180 graus, ou a Nissan deixava de existir. Além disso, a situação era extremamente delicada. Em todas as reviravoltas empresariais, sobretudo as conduzidas em cenários de fusões ou alianças, o sucesso não se limita apenas a mudanças fundamentais na organização e nas operações da empresa. É preciso proteger também a identidade da companhia e a autoestima do seu pessoal. Esses dois objetivos – mudanças e salvaguarda da autoestima – podem facilmente entrar em conflito. Conseguir realizar as duas coisas é tarefa árdua e, por vezes, de equilíbrio bastante precário. Era esse exatamente o caso da Nissan, Afinal de contas, eu não passava de um estranho – vinha de fora e não era japonês – e, por isso mesmo fui recebido inicialmente com muito ceticismo pelos gerentes e funcionários da empresa. Eu sabia que se tentasse ditar regras de cima para baixo o tiro sairia pela culatra e todo o meu empenho só contribuiria para minar o moral e produtividade dos empregados. Contudo, se eu me comportasse passivamente, a empresa afundaria ainda mais.

Hoje, menos de três anos depois, fico satisfeito em poder dizer que a transformação da Nissan continua a produzir resultados excelentes. A empresa recuperou a lucratividade, e sua identidade é cada vez mais forte. Como isso foi possível? Por dois motivos fundamentais. Em primeiro lugar, em vez de impor um plano que ressuscitasse a empresa, mobilizei os gerentes da própria Nissan por meio de equipes funcionais formadas por funcionários dos mais diversos setores, e pedi a eles que identificassem as mudanças radicais a ser feitas e as implementassem. Em segundo lugar, a Renault sempre respeitou a cultura da Nissan, permitindo que a empresa desenvolvesse uma nova cultura corporativa baseada no que a cultura nacional do Japão tem de melhor. Nas próximas páginas, discutirei mais detalhadamente esse processo de transformação e a cultura da Nissan. No entanto, para compreender efetivamente sua história, é preciso entender, antes de mais nada, a forma surpreendente com que a empresa se desvinculou de seu passado.

Rompendo com a tradição

Quando cheguei à Nissan, no final da década de 90, a forma de fazer negócios da empresa era terrivelmente prejudicial ao seu desempenho. Não havia dinheiro, o que a impedia de fazer os investimentos de que tanto necessitava em sua já ultrapassada linha de produtos. Os primeiros carros que a empresa lançara no Japão e na Europa, o March (ou Micra, na Europa), por exemplo, já tinham quase nove anos. A concorrência, por sua vez, lançava um produto novo a cada cinco anos. O primeiro carro lançado pela Toyota nesses mercados tinha menos de dois anos. O March havia passado por algumas modificações cosméticas no decorrer de anos. Mas, basicamente, competíamos por 25% do mercado japonês e um percentual semelhante do mercado europeu com um produto antigo. As demais linhas de produção enfrentavam problemas parecidos.

O motivo pelo qual a Nissan deixara de investir no desenvolvimento de seus produtos era simples: economia. Pressionada por perdas operacionais persistentes e por uma dívida cada vez maior, a empresa estava permanentemente em dificuldades financeiras. Não era preciso que fosse assim. Na verdade, a Nissan tinha muito capital – o problema é que ele estava preso a investimentos financeiros (que em nada contribuíam para seu negócio) e também as propriedades, sobretudo em parcerias de keiretsu. O sistema keiretsu é uma das características mais duradouras do cenário econômico japonês. Por meio dele, as empresas industriais tem participação acionaria em outras companhias. Acredita-se que isso promova a lealdade e a cooperação mutua. No caso de grandes empresas, o portfólio chega à casa dos bilhões de dólares. Quando cheguei à Nissan, descobri que a empresa possuía mais de 4 bilhões de dólares investidos em centenas de empresas diferentes.

Acontece que a maior parte dessas participações acionárias era pequena demais para que a Nissan pudesse impor algum tipo de alavancagem administrativa a

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