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SONETO: INSPIRAÇÃO E LABOR

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Por:   •  29/5/2014  •  1.159 Palavras (5 Páginas)  •  293 Visualizações

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SONETO: INPIRAÇÃO E LABOR

Jaime Adilton Marques de Araújo

Dentre os mais antigos debates, capazes de gerar inacabáveis grupos de estudo e discussões, está, sem dúvida alguma, a árdua tarefa literária dos poetas. Há quem pense que se trata tão-somente de inspiração, enquanto que outros julgam que tudo não passa de esforço e trabalho, casado com uma certa habilidade na arte de versejar. Em se tratando do soneto, esta discussão ganha ainda mais importância, pelo esforço requerido de seus cultores para atender a um modelo que é, a um tempo, exigente e sintético.

Inspiração! Os arroubos dos poetas de todas as épocas, fazendo petições às musas e aos deuses e rendendo-lhes homenagens, justificam essa crença generalizada de que, sobre as suas cabeças, há um halo inapagável que os liga a uma fonte inspiradora.

Como exemplos, citamos dois poetas famosos, de muitos que poderiam ser juntados, para respaldar a afirmação: No poema Navio Negreiro – Tragédia no mar. Antônio Frederico de Castro Alves (1847/1871), nosso “Poeta dos Escravos”, instava sua musa a que se fizesse presente num momento poético, para que falasse por ele na denúncia à degradação humana:

Dize-o tu, severa musa,

Musa libérrima, audaz!...”

E mais adiante, no mesmo poema, ordena que ela se cale e chore diante da trágica imagem de negros acorrentados:

Silêncio, Musa... chora, e chora tanto

Que o pavilhão se lave no teu pranto!...”

Outros exemplos, recolhemo-los de Luis de Camões (1525?/1580), que ora invoca as Tágides (ninfas do rio Tejo), pedindo-lhes inspiração, ora, contrariado, pede que a Musa pare de inspirá-lo:

E vós, Tágides minhas, pois criado

Tendes em mim um novo engenho ardente,

Se sempre em verso humilde celebrado

Foi de mim vosso rio alegremente,

Dai-me agora um som alto e sublimado,

Um estilo grandíloquo e corrente,

Porque de vossas águas Febo ordene

Que não tenham inveja às de Hipocrene.

Os Lusíadas, Canto I, 4

Não mais, Musa, não mais, que a lira tenho

Destemperada e a voz enrouquecida,

Idem, ibidem, Canto X, 145

Labor! Com menos frequência, é a verdade, mas em poetas e críticos encontram-se manifestações a descrever longos lapsos de concentração dos artífices do verso, sempre na busca da melhor forma, até encontrar o ponto certo, onde, no dizer, de Wilson Volpato, “não dá para mudar nada porque o poema desmorona. Mudar por quê, se é aí que a calda pega ponto?”

É também o que pensa o poeta venezuelano Juan Liscano (1915/2001), no depoimento que segue, apartado de uma entrevista:

Tens razão, dizes que o poeta é toda a literatura: pensa, escreve, escreve, pensa; corrige e apaga, volta a escrever etc.... Às vezes suas correções são um equívoco, às vezes o escrito merecia ser reescrito. O que me parece é que a poesia não pode ser concebida como um ato puramente semiótico, puramente textual, porque então perde vibração e contágio. Seria uma lápide.

Schlafman vai na mesma linha, desmitificando a presumida liberdade poética e , por conseqüência, impondo limites à inspiração: “...nenhum verso é livre para o homem que deseja fazer bom trabalho.”

Vê-se que o fazer poético não é empreitada fácil, embora esteja longe de representar sofrimento. Afinal, escoimar o poema de eventuais imperfeições, arredondá-lo à sua bitola é prazeroso ao autor, pois só ele, e mais ninguém, pode gozar a antevisão da obra bem acabada. Tão prazeroso que, em geral, as pessoas nem reparam no esforço que se esconde por trás de cada verso. É o que Valéry denominou de “suprema volta do espírito para sua obra”:

Voltemos aos poetas. Como disseram de musas e deusas, digam-nos eles, em versos, de suas dificuldades de composição. Bilac nos fala de lima, oficina, ourives, defeitos... – todos termos a dar conta de um fazer solitário, antes que seus versos ganhem as praças em recitais memoráveis:

Torce, aprimora, alteia, lima

A frase; e, enfim,

No verso de ouro engasta a rima,

Como um rubim.

Quero que a estrofe cristalina,

Dobrada do jeito

Do ouvires, saia da oficina

Sem um defeito. 79

De Bilac é também o soneto A um Poeta, instrumento de que se serve para passar adiante a preocupação com o bem fazer, com o burilar e, assim, só dar à luz versos bem acabados, mas tendo a habilidade de esconder do leitor “os andaimes do edifício”:

Longe do estéril turbilhão da rua,

Beneditino, escreve! No aconchego

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