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O que é etnocentrismo. Everardo Pereira Guimarães Rocha

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Por:   •  10/12/2013  •  Resenha  •  1.998 Palavras (8 Páginas)  •  1.609 Visualizações

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ROCHA, E. P.G. O que é etnocentrismo. 10 ed. São Paulo, SP Editora Brasileira, 1994.

Everardo Pereira Guimarães Rocha (Rio de Janeiro, 1 de outubro de 1951) é um antropólogo brasileiro Realiza estudos e pesquisas sobre a narrativa publicitária, o consumo e a comunicação. Atualmente é professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação do Departamento de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. É doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (1989) e mestre em Antropologia Social também pelo Museu Nacional da UFRJ (1982). Desde a década de 1980, contribui para o surgimento e consolidação do campo da Antropologia do Consumo no país. É, ainda, mestre em Comunicação pela Escola de Comunicação da UFRJ (1979) e graduado em Comunicação Social pela PUC-Rio (1975). Em seus trabalhos, Everardo Rocha articula os campos da Antropologia e da Comunicação, sendo indicado como um dos primeiros antropólogos no Brasil a se dedicar às pesquisas sobre o consumo. Participou da pesquisa de roteiro para o filme Quilombo, de Cacá Diegues.

Em seu primeiro capítulo o autor já leva o leitor o conceito de etnocentrismo “[...] é uma visão de mundo com a qual tomamos nosso próprio grupo como centro de tudo, e os demais grupos são pensados e sentidos pelos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência[...]” P.7.

Rocha nos leva a entender que o que assusta é o fato de pessoas que se vestem, comem, e agem de um modo oposto ao dito “eu” conseguem sobreviver à sua maneira mesmo sendo diferente e isto é algo sentido na maioria das culturas: a aversão ao diferente.

Explica que o etnocentrismo surge no contexto da colonização da América, e usa como justificativa ideológica para muitas das atitudes formadas. Quando a civilização ocidental conheceu a “outra” cultura, conheceu de forma etnocêntrica.

Grandes partes das atitudes tiveram justificativas, como a ideia que era preciso levar a cultura europeia para civilizações, para torná-las melhores. Ele conta uma estória sobre o pastor que foi conhecer e conviver com os índios e comprou diversas coisas para levar para os integrantes da tribo. Para ele, comprou um relógio dos mais modernos e cheio de funções. Chegando à tribo ele distribuiu seus presentes, e durante alguns meses em que ele já estava lá convivendo, um índio se interessou pelo seu relógio. Após muita insistência o pastor acabou cedendo e dando o relógio para o índio.

Em um determinado momento o índio chamou o pastor e mostrou o relógio dele pendurado em um galho cheio de ornamentos, servindo de enfeite.

O pastor certo tempo depois, em seu escritório, olhou para parede de seu escritório que estava cheio de arcos, cocares etc. Nesse momento ele se lembra do índio e dá um grande sorriso pelo que o índio tinha feito com o seu relógio, “que índio bobo” pensou.

Esse foi um tipo de etnocentrismo “leve”, o pastor riu do índio, e não percebeu que ele tinha feito a mesma coisa. O padre não percebe essa atitude, ou seja, para ele, o arco do índio pode ser deslocado da cultura dele e colocado com o enfeite, porem o relógio dele não, porque o relógio dele é “melhor”.

O que ele não percebeu, é que os objetos mudaram de sentido na cultura de ambos.

A nossa cultura além de ser etnocêntrica (como toda cultura), ela é colonizadora. Ela coloca o etnocentrismo como motivo para tomar/dominar as outras culturas, até mesmo usando a força para valer o nosso etnocentrismo.

O autor fala que essa visão etnocêntrica está no cotidiano e está nos livros didáticos, e isso tem um poder muito forte. A identidade “do outro” no livro, pode ser manipulada.

Ele cita exemplos em que o índio é “alugado” na História do Brasil para aparecer por três vezes em três papéis diferentes.

Primeiro ele era “selvagem” no descobrimento, “criança” na catequese e no final “herói” na ideologia nacional.

Assim são as sutilezas, violência, persistências do que chamamos de etnocentrismo. E esses exemplos se multiplicam no cotidiano, nos jornais, revistas, cinema, rádio e etc.

Ele fala também que nos livros, o índio é visto como indolente, como preguiçoso. Principalmente no trabalho da lavoura canavieira.

Na época do descobrimento os índios eram vistos como preguiçosos que não gostavam de trabalhar da mesma maneira dos portugueses. Depois passaram a ser vistos como almas boas e inocentes, como crianças que precisavam da catequização dos padres para sua proteção. Por último, uma vez que a identidade indígena já estava sendo associada à formação do povo brasileiro estes resolveram olhar para o índio como os heróis que valorizavam a liberdade.

Tendo tratado dos conceitos e exemplos do etnocentrismo Everardo Rocha aborda a questão da relativização cultural. Uma frase que nos ajuda a entender esse conceito de forma clara é esta: “as verdades da vida são menos uma questão de essência das coisas e mais uma questão de posição.” Estaremos relativizando quando passamos a compreender os procedimentos do outro utilizando um melhor ponto de vista, olhando para suas práticas como procedimentos que estão inseridos em sua cultura de origem.

O que chama a atenção nesse capítulo inicial é que o autor coloca essas questões de forma prática e clara de tal maneira que um público de leitores leigos nas ciências sociais pode entender com facilidade os conceitos tratados.

O autor começa o segundo capítulo mostrando os primórdios da Antropologia enquanto ciência. Pra ele o conceito de evolução do séc. XIX foi um marco para o pensamento acadêmico daquela época. Na era das grandes navegações e dos descobrimentos de novos mundos a mentalidade era de que os povos aborígenes (nativos americanos ou escravos) não poderiam considerados seres humanos.

Com a ideia de evolução crescendo eles passaram a olhar as diferenças culturais desta perspectiva evolucionista. Segunda Everardo Rocha a evolução é “é a transformação progressiva no sentido da realização de algo latente [...]. ‘’É o desenvolvimento obrigatório de uma determinada unidade que revela, pelo processo evolutivo, uma segunda forma mostrando sua potencialidade.” (p.26). Assim passou-se a explicar as diferenças do ‘outro’ porque ele estava em processos de evolução diferente do ‘eu’. Ou seja, o ‘outro’ já não era considerado como inferior ao humano. Ele era incluído na raça humana, porém estava em um estágio mais remoto na escala da evolução. Os principais expoentes dessa antropologia evolucionista foram Edward Tylor, George Frazer e Lewis Morgan.

A grande questão era como haveria de ser definido o padrão para medir o nível de evolução de cada cultura. Para elucidar esse ponto Rocha cita a definição que Tylor dá sobre cultura: “Cultura é este todo complexo que inclui conhecimento, crença, arte, leis, moral, costumes e quaisquer outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro da sociedade.” (P.30) [grifo acrescentado]. Os pensadores da época então definiram que esses itens sociológicos eram a régua pela qual as culturas seriam classificadas em: selvageria, barbárie ou civilização.

Obviamente não podemos deixar de fazer referência a esta perspectiva acadêmica como sendo altamente etnocêntrica. Em todo esse processo de avaliação da evolução das sociedades foi usado como padrão de medida a sociedade do pesquisador. Se todas as culturas do mundo eram classificadas em selvagens, bárbaros ou civilizados é claro que o pesquisador incluiria sua própria sociedade na civilização afirmando com isso que as demais sociedades ainda não chegaram no nível da sua sendo, portanto, menos evoluídas.

Rocha destaca com muita propriedade que, do ponto de vista do etnocentrismo, não há nenhuma diferença entre a mentalidade colonialista do séc. XVI e a mentalidade evolucionista do sec. XIX. Ambas partem do pressuposto de que a minha cultura é a melhor e por isso todas as outras devem ser avaliadas com os meus valores.

No capítulo 3 Everardo Rocha fala sobre como a Antropologia progrediu em suas formulações. Deixando as ideias evolucionistas esta ciência passou para o difusionismo tendo como seu principal representante o alemão Frans Boas que fez escola nos Estados Unidos. O grande dieferencial de Boas foi que ele percebeu a necessidade de estudar as sociedades em si mesmas, sem usar o Ocidente como referencial de análise. Vale a pena citar a declaração que Rocha faz a respeito da inovação de Franz Boas: “Foi ele o primeiro a perceber a importância de estudar as culturas humanas nos seus particulares. Cada grupo produzia, a partir de suas condições históricas, climáticas, linguísticas e etc, uma determinada cultura que se caracterizava por ser única.” (p.40)

Essa mentalidade que valorizava a particularidade de cada uma das culturas levou também a uma mudança no conceito de História. O que antes era visto como a História da humanidade – pois todas as sociedades eram descritas na escala da evolução partindo da História do ocidente – passou a ser visto como um conjunto de histórias de cada sociedade. A perspectiva de Boas ajudou a valorizar a construção histórica particular de cada povo.

Talvez uma das características mais peculiares de Boas foi o fato de ele estudar o passado de uma sociedade para entender seu presente. Um exemplo claro desse fato é o livro “Casa Grande e Senzala” de Gilberto Freyre. Segundo Rocha quem lê esta obra vai perceber que “a antropologia Social se faz em larga medida na observação de universos microscópicos, pela análise de pequenos quadros do cotidiano, pelo estudo meticuloso do detalhe da prática social.” (p.44). Ou seja, Gilberto Freyre (que foi aluno de Franz Boas) mostra que é possível entender toda a sociedade brasileira olhando para os pontos microscópicos da relação entre os senhores de engenhos e os escravos. O grande problema desse tipo de abordagem é o reducionismo. Não é possível julgar toda uma sociedade complexa partindo de pontos isolados do passado.

Radcliff-Brown foi um outro grande nome da antropologia moderna. Ele discordava dos princípios do difusionismo de entender a cultura de determinada sociedade a partir de um estudo de sua história passada. “Para ele a escola especulativa, conjetural, contrastava fortemente com sua proposta de estudo funcional das sociedades.” (p.59). A Antropologia Funcional, levantada por Radicliff-Brown estuda a sociedade do outro em seu momento atual, sem se preocupar com seu passado histórico, até porque estudar uma sociedade do ponto de vista histórico é valorizar a História, algo que somente a sociedade ocidental de pensamento linear valoriza.

Essa nova perspectiva de fazer antropologia desencadeou a necessidade da visita ao campo. Não era mais suficiente estudar uma sociedade a partir do gabinete. Agora era necessário o antropólogo ir a campo, “morar, experimentar a existência junto ao ‘outro’. Conhecer a diferença, experimentando-se a si próprio como diferente, por estar fazendo ‘trabalho de campo’ no mundo do ‘outro’”. (p.65)

A partir daí Bronislaw Malinowski assume a dianteira da Antropologia tornando-se o primeiro a ir ‘in loco’ fazer pesquisa de campo. Este era até então uma prática impensável para a época até que ele choca seus leitores na introdução do seu livro “Os Argonautas do Pacífico Ocidental” dizendo: “imagine-se o leitor, sozinho, rodeado apenas por seu equipamento, numa praia tropical próxima a uma aldeia nativa, vendo o barco que o trouxe afastar-se no mar até desaparecer de vista”. (p.69).

Os trinta e um meses que Malinowski passou entre os Trobiand marcaram o início da prática da pesquisa de campo onde o antropólogo se aventura a viver no mundo do outro para entender melhor suas práticas. No entanto esse conhecimento do outro não estaria completo se o pesquisador não pudesse voltar os olhos para sua própria sociedade e passar a entende-la melhor depois desta experiência com a alteridade. “O voo alto de Malinowski na sociedade do ‘outro’ consegue finalmente fechar o ciclo e repensar o próprio ‘eu’”. (p.71)

Ao olhar para o outro do ponto de vista do outro para, então, depois olhar para si Malinowski tornou possível a comparação relativizada as práticas culturais são entendidas dentro da própria cultura e comparadas com práticas de outras culturas. Ambas são postas em oposição sendo analisadas por seus próprios parâmetros. Essa seria a potencialidade máxima da relativização.

Everardo Rocha termina seu livro fazendo um apelo aos seus leitores para que eles fujam do etnocentrismo e que passem a valorizar a cultura do outro pelo simples fato de que, no contato com os outros o observador pode conhecer-se a si mesmo.

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