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Crimes apaixonados: onde o sofrimento começa e a violência começa?

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Por:   •  25/9/2014  •  Artigo  •  2.069 Palavras (9 Páginas)  •  266 Visualizações

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Crimes Passionais: Onde termina a paixão e começa a violência?

Sempre que quisermos conhecer de fato uma questão, temos que, desde logo, começar por entender todo o universo que circunscreve nossa curiosidade. O tema de nosso trabalho é bastante claro e objetivo, muito embora, seu título guarde para nós um certo eufemismo.

Conquanto, ainda que o título nos pareça inadequado, ao mesmo passo, é insignificante a forma com que nomeamos o evento factual em si, quando o que realmente nos interessa é compreender melhor e com propriedade toda a dimensão dessa conduta, bem como, a propagação de seu resultado. O resultado ao qual nos referimos não se restringe ao delito de homicídio, estando no leque desta análise, a lesão corporal e moral.

Nos parece extremamente impossível tecer qualquer tipo de comentário sobre os delitos passionais, sem antes, entender o que significa o termo “paixão” inserido neste contexto. E, este nosso intuito tem uma tendência epistemológica. Sim, neste primeiro momento devemos compreender o que é a paixão. De sorte, paixão e amor não se confundem, diferem em seu objeto de desejo, distam em suas motivações.

Contudo, surge-nos um ponto antecedente, àquele que precede as causas e os sentimentos humanos, que é o próprio sujeito titular da ação. Quem é o homem? Quem é este ser capaz dos mais diversos sentidos e antagônicos sentimentos?

Nos parece propício dizer que, nossa análise não pode lançar mão do princípio da causalidade, porque na observação empírica do elemento humano não há margem para previsibilidade, tampouco, para prognósticos.

E mesmo sob o enfoque jurídico, nunca haverá como encartar no rol de nossas certezas a forma pela qual se empreenderão os atos e atitudes que perfazem a conduta humana, pois, é elementar que haja uma orientação pessoal, intrinsecamente concebida e observada por seu titular, e, nisto consiste todo o grau de imprevisibilidade. Embora, por inúmeras vezes nos defrontamos com certas ilações convencionadas ao homem médio (homo medius1), que ganha significância por retratar o conhecimento, sentimento e comportamento da maioria que compõe a sociedade. Todavia, já percebemos ser impossível criar ou delimitar um “homo medius” quando se tem como elemento direcional e coordenador uma sociedade constituída por indivíduos distintos e únicos. As pessoas não se confundem essencialmente umas com as outras, as personalidades não se repetem, portanto, os critérios não podem ou não conseguem ser os mesmos. Daí porque, não haverá como afirmar a existência de uma propensão no agir humano. Haverá sempre algo latente ou velado, porém, inerente à introspectividade de sua natureza, pois, cada indivíduo é universo único e pessoal.

E, é dentro desta órbita de singularidade, Hanna Arendt, com muita propriedade, nos revela a distinção entre a “aparência e a realidade”, demonstrando a impossibilidade de se conhecer o íntimo de uma pessoa, a menos que se pudesse empreender um processo de desprivatização ou desindividualização, noutras palavras, haverá sempre uma obscuridade, uma espécie de incerteza quanto às forças da vida íntima, as paixões do coração, os pensamentos da mente e os deleites dos sentidos.2

A paixão é um sentimento, que segundo François Fourier, se compõe por uma força matricial tríplice: aprimoramento, competição e mudança. Razão pela qual, o reconhecimento do sujeito “apaixonado” é o que possibilita vislumbrar a forma pela qual se expõem seus afetos, o modo pelo qual se exteriorizam e ganham a dinâmica dos acontecimentos no mundo dos fatos. Embora, de acordo com o sentido filosófico encontrado nas enciclopédias, a paixão possa ser descrita como um sentimento despertado por desejos veementes, nos parece mais cabível descrevê-la como uma energia sinestésica que tende ao esgotamento, esvaindo-se sucumbente.

De acordo com a mitologia grega, conhecida também através da narrativa de Homero, vemos na “Odisséia de Ulisses”3 uma reflexão sobre as emoções, sentimentos e afetividades. E, mais precisamente, no Canto XII, vemos o heróico protagonista vivenciar a sujeição quase que torturante à própria vontade, a par de uma imensurável vulnerabilidade de suas razões. Ou seja, Homero nos ilustra a circunstância em que o próprio Ulisses perde a direção e o comando de seu agir, rendendo-se à supremacia de suas paixões.

De posse destas colocações, vemos surgir uma coerência, mas nunca, uma justificativa, que talvez nos reporta à compreensão da conduta delitiva no campo passional, porque pudemos verificar que o sentimento da paixão é indominável, e se revela no ser como uma ebulição febril, capaz de desnortear, e porque não, surpreender.

Mais recentemente, a Lei 11.340/2006, veio tratar da violência doméstica e familiar, e por utilizar-se destas palavras demonstra-se abrangente. Porém, vê-se que a atividade legiferante voltou-se uma vez mais a coibir a violência praticada, principalmente, contra a mulher. A letra da lei nos aponta que o agente não possui qualquer qualidade especial a destacá-lo, podendo a prática do delito advir de qualquer elemento da entidade familiar. Lembrando que, familiar é tudo que participa de nossa intimidade, que desfruta de nosso convívio, com quem temos elo de afetividade, afinidade ou ligação profunda. Melhor dizendo, estão abrangidos pelo termo ‘familiar’ todos aqueles com quem, de certo modo, temos ou deveríamos ter, uma cumplicidade afetiva.

Mas, se é certo que a preocupação legislativa é com as maiores necessidades sociais, posto que, se o estado não pode de pronto atender a todas, algumas se mostram prioritárias, e ensejam a atenção de um atendimento imediato. Portanto, a violência que suplanta ou ignora sentimentos e afeições, hoje, continua sendo uma problemática atual, e mais, permanece em caráter progressivo.

Em tempos passados, os crimes passionais alcançaram notoriedade e ganharam a mídia através de capacidade inventiva de grandes juristas, capazes de desnaturar traços de um caráter egoísta e covarde presentes no agente delitivo, permutando-os pela comoção propositadamente angariada àquele vitimado por uma violenta emoção. Sim, em sua maioria, as teses defensivas pautaram por questões de um momentâneo descontrole emocional, desequilíbrio desencadeado por um comportamento reprovável do “ser amado”. Tão reprovável, a ponto de torná-lo merecedor de um castigo, embora, o castigo desejado ensejasse ser tão gigantesco quanto à desonra e a indignidade sofrida, e para tanto, em equivalente proporção, só mesmo a morte.

Hoje, caem por terra

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