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O REVÉS DE CANUDOS

Por:   •  5/2/2017  •  Artigo  •  6.941 Palavras (28 Páginas)  •  509 Visualizações

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O “REVÉS DE CANUDOS”: A BATALHA DE 3 DE MARÇO DE 1897

Maria Olívia G. R. Arruda[1] – Doutora

UNIP-Universidade Paulista

livgarcia@uol.com.br 

RESUMO: A batalha travada pela expedição de Moreira César, em 3 de março de 1987, em Canudos, foi decisiva para que o governo federal decidisse enviar cerca de 6000 soldados que massacraram o arraial e a população que nele habitava. Este artigo pretende mostrar a rede discursiva que sustenta o discurso euclidiano de Os sertões, baseado especificamente em A Luta,  Expedição Moreira César,  partes I a VI e nas reportagens dos jornais O Paiz, de 2 a 9 de março de 1897, e O Estado de São Paulo, de 7 a 14 de março de 1897, cuja rede discursiva sobre os acontecimentos de Canudos evidencia a literariedade da obra euclidiana. Este trabalho é apenas o esboço de uma análise que pode ser aprofundada nos aspectos estético-literários que diferenciam a narrativa da obra euclidiana da linguagem jornalística.

Palavras-chave: Canudos; Euclides da Cunha; Moreira César.

ABSTRACT : The Canudos battle waged by  Moreira Cesar´s expedition , on March 3, 1987,  was decisive for the  6000 soldiers' sending by federal government  that massacred the village and the population that  inhabited in it. This article intends to show the discursive net that it sustains the euclidean speech  of Rebellion in the Backlands, specifically based on the third part of The Fight, about the  Moreira César Expedition, parts I to VI, and in the newspapers reports  of  O Paiz, from 2 on March 9, 1897, and O Estado de São Paulo, from 7 on March 14, 1897, whose discursive net about Canudos events highlights the literary value of the euclidean work. This work is just a outline of an analysis that can be deepened in the aesthetic-literary aspects that differentiate the euclidean narrative from journalistic language.

 Keywords: Canudos; Euclides da Cunha; Moreira César.

Em 14 de março de 1897, Euclides da Cunha escrevia ao amigo João Luís:

Creio que como eu estás ainda sob a pressão do deplorável revés da Canudos aonde a nossa República tão heroica e tão forte curvou a cerviz ante uma horda de fanáticos maltrapilhos. Que imensa, que dolorosa, que profunda e que esmagadora vergonha, meu caro João Luís! (GALVÃO, GALOTTI, 1997, p. 103)

Nesse dia, o jornal O Estado de São Paulo publicara os telegramas recebidos da Bahia, com os detalhes do que ocorrera na batalha que culminara com a morte do Cel. Moreira César e do Cel. Tamarindo e centenas de soldados. Moreira César, até então, era considerado imbatível e ninguém duvidava que ele tomaria Canudos e acabaria com aquela revolta... Até ele estava cheio de certeza da vitória que não aconteceu.

O episódio mereceu um capítulo de Os sertões, A Expedição Moreira César, em que o bravo coronel foi descrito como um tipo físico que “surpreendia tanto admiradores quanto adversários”, pois era uma “figura diminuta – um tórax desfibrado sobre pernas arcadas em parêntese”, o que o tornava “organicamente inapto para a carreira que abraçara” (CUNHA, 2002, p. 422).

“Pálido, alongado pela calva em que se expandia a fronte bombeada, e mal alumiado por olhar mortiço, velado de tristeza permanente”, no aspecto físico em nada revelava a “energia surpreendedora e temibilidade rara de que dera provas” (CUNHA, 2002, p. 422).  O militar sofria de uma doença, a que Euclides atribui as suas decisões impulsivas que colaboraram para a derrota da expedição. O texto euclidiano o descreve de “temperamento desigual e bizarro de um epilético provado, encobrindo a instabilidade nervosa de doente grave em placidez enganadora” (p. 424). A fama de implacável e impiedoso contra os adversários vinha da atuação que tivera na Revolução Federalista (1893-1895), em que participara do fuzilamento de militares e civis.

Euclides atribui a “partida caprichosa” do batalhão comandado por Moreira César, de Monte Santo a Canudos, feita na véspera da data marcada para tal, “de improviso”, e o ataque após três dias de marcha, com os soldados exaustos pela caminhada, como consequências da mente de um epilético. Para o escritor, a epilepsia “alimenta-se de paixões” e “solapa surdamente as consciências”, levando o doente a rompantes heroicos ou às vezes criminosos. Este teria sido o motivo que levara Moreira César àquele ataque mal planejado, resultando na morte de tantos soldados, inclusive a dele.

O coronel seguira para a Bahia em 3 de fevereiro de 1897, com o 7º Batalhão de Infantaria, que estava sob o comando do Major Rafael Augusto da Cunha Mattos; com uma bateria do 2º Regimento de Artilharia, sob o comando do Capitão José Salomão Agostinho da Rocha e um esquadrão do 9º de Cavalaria, com o Capitão Pedreira Franco. Uniram-se depois ao 16º Batalhão, que se encontrava em São João Del Rei, dirigido pelo Cel. Sousa Meneses e o 9º de Infantaria, do Cel. Pedro Nunes Tamarindo, além de um pequeno contingente da força estadual baiana.

Euclides afirma que os batalhões seguiram para Monte Santo, mas na véspera da chegada, Moreira César sofreu uma forte crise epilética e os cinco médicos que o acompanhavam alertaram-no para a impossibilidade do ataque naquelas condições. As operações militares sofreram, por isso, “desde o primeiro passo nos caminhos todos os erros e inexplicáveis descuidos e inexplicável olvido de preceitos rudimentares” (CUNHA, 2002, p. 431), na avaliação do escritor. Os engenheiros militares tiveram apenas uma semana para “conhecer a paragem desconhecida e áspera” (p. 432), o que lhes impossibilitou a melhor escolha de pontos estratégicos.

Então Euclides começa a apontar as falhas táticas e de planejamento dessa expedição: as rápidas anotações levaram o coronel à escolha de um novo caminho, ao leste do Cambaio, que se desviasse da zona montanhosa, sem a determinação de pontos defensáveis, para o caso de um assalto dos canudenses. Nessa rota teriam que abrir caminho pela caatinga, sob o peso de carregamentos de água, e vencer um “extenso areal de 40 km” (CUNHA, 2002, p. 434). Optaram por levar uma bomba artesiana, sem conhecer a possibilidade de existência de água naquele inóspito terreno a ser vencido. Seriam 150 km “ante o despovoamento e a maninhez da terra” (p. 434), sem a garantia mínima de uma base de operações.

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