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O TESTEMUNHO DOS SOBREVIVENTES HOLOCAUSTO

Por:   •  28/7/2021  •  Artigo  •  3.497 Palavras (14 Páginas)  •  119 Visualizações

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O TRAUMA E A LITERATURA PÓS-HOLOCAUSTO

“Apenas os mortos viram o fim da guerra” (Platão)

Amanda MIOTTO[1]- UNICAMP

RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo apresentar o processo traumático pós Shoah[2], apontando como a memória, ainda que traumática, seja (re) significada na condição de quem testemunha, e como, a necessidade de testemunhar é necessária para a reconstrução da verdade sobre os campos de concentração. A evocação do trauma é um processo dolorido, no entanto, o ato da recordação frequente tende a tornar tal evento catastrófico, em uma forma aperfeiçoada de experiência e constituir-se como estereótipo de verdade.

PALAVRAS – CHAVE: shoah; trauma; Literatura.

  1. INTRODUÇÃO

O século XX foi um século de guerras e extermínio, marcado pela ferida do Shoah e suas atrocidades. Um período de ideais políticos austeros, sombrios e totalitários. Muito se discute os rumos que a Europa tomou ao longo do século XX, diante das guerras e do antissemitismo instaurado na Alemanha hitlerista. A ascensão de Hitler e a propagação dos ideaiss nazista transformaram a Alemanha no espaço de favorável ascensão antissemitista, que consequentemente seria marcada pelo extermínio de milhões de judeus.

Reavaliar o pós Shoah, após o término da Segunda Guerra Mundial, é ainda um enfrentamento presente na conjuntura atual. O testemunho das vítimas dos campos de extermínios nazista, ainda que sejam escritas ou faladas, representam a volta à experiência traumática, o encontro de si mesmo, a reconstrução de uma história pessoal, de maneira que seja possível reencontrar uma saída para o trauma e reconstruir um futuro, mesmo que as dores e as feridas estejam abertas.

A memória do Shoah tem sido recorrente entre os judeus para buscar uma integralidade entre seus membros, como também, torna-se preponderante no pós-guerra com a divulgação das narrativas de testemunho. Cabe ressaltar, que o conceito de testemunho concentra em si uma série de questões que sempre polarizaram a reflexão sobre a literatura, colocando em questão as fronteiras entre o literário, o fictício e o descritivo.

Dessa forma, buscaremos construir um percurso elucidativo do trauma, de acordo com o conceito de repetição de Freud, descrita em seu livro Além do Principio do Prazer, e, também, discorrer sobre a literatura de testemunho.

  1. TRAUMA E LITERATURA

Freud nos apresenta em seu livro Além do Principio do Prazer (1920), a teoria da neurose de guerra, que é desenvolvida dentro de uma reflexão sobre as pulsões. Na psicanálise alcança uma posição sólida e concisa, quando ao interessar-se pelas neuroses de guerra e pelas neuroses traumáticas em tempos de paz, Freud observa o fenômeno da repetição do trauma em sonhos, cuja observação caminha no sentido de dar conta dos eventos traumáticos de guerra. A compulsão à repetição parece, portanto, como algo capaz de deter, ainda que temporariamente, a elevação do principio do prazer como mecanismo regulador do aparelho psíquico.

Toda experiência dolorosa, de acordo com Freud, ao invés de evocadas como lembranças ou reminiscências, são compulsivamente repetidas, com toda sua carga de sofrimento. Assim, o inconsciente elabora mecanismos de defesa, como a angustia que é a expectativa de perigo; o medo sobre um determinando objeto ante ao qual amedrontamos; e o terror, representando o estado em que ficamos diante do perigo.  Dessa forma, o sonhar é a repetição e manifesta-se como compulsório, pois repetir é procurar obter o controle da situação e, também, preparar o indivíduo para resistir aos traumas futuros, desenvolvendo a angustia, e assim, prevenindo-o para eventos traumáticos. Ressaltando, portanto, os estudos de Freud referente aos sonhos, que observou a ocorrência na neurose traumática, tendo como  característica o sintoma de que doente sempre retorna à situação do acidente, da qual desperta o renovado terror.” [3]

Primo Levi relata em seu livro É isto um homem? [4], o sonho que se repete no campo de Auschwitz. Ele sonha com a sua volta, com a felicidade imensa de contar aos próximos o horror já passado e ainda vivo e, de repente, percebe com desespero, que ninguém o escuta, os ouvintes levantam-se e vão embora, indiferentes. Esse repetir no sonho de Levi é, para Freud, o que está reprimido como vivência atual, tornando consciente o que antes estava inconsciente. Dessa maneira, Freud salienta o Eu consciente e o pré-consciente, que estão a serviço do princípio do prazer, pois, o intuito é evitar o desprazer que seria liberado pelo reprimido, levando o indivíduo ao princípio da realidade, para, assim, conseguir a aceitação desse desprazer. Afinal para Freud, “a compulsão de repetição, causa desnecessariamente desprazer do Eu, pois traz à luz atividades de impulsos instintuais reprimidos e também, experiências do passado que não possibilitam prazer”.

Essa forma de compulsão à repetição era realmente o aspecto assumido pelo retorno do recalque. Uma força pulsional que produz a repetição da dor, o que traduz a impossibilidade de escapar de um movimento regressivo, quer seu conteúdo seja desprazeroso ou não.

Dessa maneira, ainda que a guerra tenha acabado os traumas do pós-guerra são presentes na atualidade, pois os sobreviventes vivem “a situação de quase morte”, retornando ao passado traumático. A necessidade de mostrar ao mundo e aliviar tal sofrimento, fez com que nas últimas décadas viesse á tona os testemunhos como forma de narrativa, uma maneira de revelar o horror dos campos de concentração e sair do período de latência, cuja vivência traumática pode atingir décadas, revelando-se tempos depois à neurose traumática. A experiência traumática para Freud é aquela que não pode ser totalmente assimilada enquanto ocorre o testemunho, pois o ato de testemunhar seria não tanto dos fatos violentos, mas da resistência da compreensão dos mesmos. Assim, a resistência para compreender tanto dor e sofrimento leva a pessoa traumatizada a um choque com o real, pois desloca o real como aérea de sombra: testemunha-se via de regra, algo de excepcional e exige um relato[5].

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