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Por:   •  23/6/2013  •  3.661 Palavras (15 Páginas)  •  333 Visualizações

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Sociologia das Relações Internacionais

Marcel Merle

Trabalho de Fundamentos de Sociologia para as Relações Internacionais

Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ

Nome: Juliana Braz Coutinho

Introdução

Marcel Merle, sociólogo francês, viveu de 1923 até 2003, e publicou sua obra “Sociologia das Relações Internacionais” no ano de 1974. Nesta obra o autor apresenta três concepções de estudo das relações internacionais.

Merle começa a falar a respeito da contribuição da sociologia para o conhecimento dos fatos sociais, que foi a inserção da sistematização fundamentada em rigorosas observações. Isso melhora o conhecimento dos fatos, ao passo que surgem análises mais profundas, que podem até dar origem a outras problemáticas, e assim ampliar o estudo e promover mais conhecimento. Da mesma forma ocorre com os fatos internacionais. Ou seja, para compreender as relações internacionais é fundamental a sistematização, conceituação e teoria.

Até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, o estudo das relações internacionais estivera a cargo de diplomatas, historiadores e juristas. Após essa data, houve uma maior preocupação em estudar as relações internacionais como um campo de estudo específico e autônomo, definir com precisão os limites da realidade das relações internacionais, e produzir um dispositivo conceitual que resultasse em análises que fossem além das produzidas pela história diplomática ou direito internacional público.

Merle aponta que, apesar disso, naquela época em que escreveu seu livro, na França ainda era privilegiada a pesquisa empírico-descritiva, que a sociologia ainda não tinha penetrado nos estudos das relações internacionais. Isto é, o trabalho deles era pautado na simples descrição dos fatos, sem um aprofundamento. Seu estudo se dava como ramo de outras disciplinas. No entanto, temos alguns autores franceses, como Pierre Renouvin (1893-1974), que foi o percussor das críticas à história diplomática, e criou o conceito de Forças Profundas, que dizia que não são apenas os Estados que estão em causa, mas também os povos, os agentes econômicos, o conjunto das circunstâncias históricas, entre outras forças, ou seja, ia contra a visão dos historiadores e juristas, e não seguia essa linha apenas empírico-descritiva dos fatos.

Para mostrar a unidade dos problemas internacionais, Merle busca inspiração na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, onde as relações internacionais constituem uma disciplina autônoma. Os sociólogos reúnem os fatos, e a partir deles, tentam estabelecer leis ou destacar explicações de alcance geral. A teoria é um meio de melhor aprender a realidade, e a teorização deve relatar a totalidade do real, o que requer o uso de múltiplos instrumentos de análise. O fato em si não quer dizer nada, deve-se explicar o fato e contextualizá-lo. É importante ressaltar que, a análise do fato depende da interpretação do observador, que é condicionada pelo ponto de vista adotado pelo mesmo. O autor enfatiza que a abordagem das relações internacionais deve ser global e sistemática. A sociologia das relações internacionais tem como objetivo explicar o conjunto dos fenômenos internacionais.

Apesar de muitos autores se deterem a mera descrição dos fatos, sem dar a eles uma interpretação teórica, há outros que tem uma conduta inversa. Eles alegam a impossibilidade de juntar e classificar sobre uma base puramente empírica a totalidade dos fatos das relações internacionais, o que provém ao mesmo tempo da insuficiência e do excesso de informações disponíveis. O que Merle quer dizer é que muitas vezes as informações são filtradas, não são disponibilizadas em sua totalidade, são incompletas, distorcidas e dispersas. Além disso, existem aquelas as quais a população não tem o menor acesso, sobretudo quando se trata de encontros internacionais sigilosos. Ao mesmo tempo, há um volume excessivo de informações, e não existem informações “neutras”. Assim, os meios de comunicação são obrigados a fazer uma triagem, hierarquização e interpretação de notícias que recebem, o que irá privilegiar certos fatos em detrimento de outros. É preciso consultar várias fontes para confrontar as diversas interpretações e assim tentar chegar mais próximo da realidade.

Outro ponto importante é que mesmo a história, solidamente apoiada no estudo de fatos, continua se modificando a medida que o estudo das sociedades atuais ajuda a compreender fenômenos sociais do passado. Assim também acontece na interpretação dos fatos do presente. Entre a massa dos fatos sociais, quais são significativos? Não é possível responder essa pergunta, pois está intimamente ligada com a visão de cada observador. Isso tudo nos remete à visão Kantiana de que o objeto é necessariamente submetido ao sujeito. A realidade, tal como ela é, em sua essência (noumeno) é incognoscível. Contudo, podemos conhecer o modo como ela aparece (fenômeno), posto que o modo de seu aparecimento não dependerá só dela, mas do sujeito também. Portanto, jamais conhecemos as coisas em si, mas somente tal como elas nos aparecem.

Merle expõe diferentes concepções das relações internacionais justamente para ressaltar a importância de considerar as representações individuais e coletivas que se interpõe entre os fenômenos e sua apresentação didática. Cada uma das concepções apresentadas no livro tem uma visão global e coerente dos fenômenos internacionais, porém, chegam a conclusões contraditórias, o que o autor afirma ser de grande proveito. Ele divide estes conceitos em torno de três tendências principais: o conceito clássico, o conceito marxista e o conceito sociológico de inspiração anglo-saxônica. Aqui irei abordar o conceito marxista.

O conceito Marxista

I – O conceito de Marx

Marx escreveu para dar conta de uma realidade mundial, mas não elaborou uma teoria das relações internacionais. O estudo desse conceito impõe-se pela sua grande adesão no mundo ao longo dos anos e também pelo fato de a teoria marxista romper com a teoria clássica do Estado de Natureza Hobbesiano. É preciso ressaltar a distinção entre a teoria inicial de Marx das aplicações ou interpretações posteriores a ele. Ao falar de “marxismo”, consideramos obras como as de Lenin, Mao Tsé-tung e Trótski, que, como veremos mais adiante, não seguem fielmente as considerações de Marx. Para nos referirmos apenas ao Marx, usamos o termo “marxiano”. Marcel Merle é marxiano, porém, no seu texto, ele abordará também o marxismo.

Para Marx, a sociedade é comandada pelas relações de produção e pelos antagonismos de classes que delas decorrem diretamente. A sociedade é uma estrutura que se subdivide em infraestrutura e superestrutura. A infraestrutura, que é a base da sociedade, está pautada na economia, ou seja, na maneira pela qual os homens se organizam para produzir, distribuir e consumir. Já a superestrutura são os níveis da sociedade: político, jurídico e cultural. O Estado, suas instituições e suas políticas, são elementos de uma superestrutura de dominação político-ideológica, que atua na defesa dos interesses do capital. Isso significa que os Estados não são neutros, são instrumentos a serviço da classe dominante, a burguesia, que fortalece seu poder e contem a subida do proletariado. A maneira que se organiza a economia vai determinar como as leis, o poder e os valores vão se estabelecer na sociedade.

Marx diz que “a religião é o ópio do povo”, pois ela aliena. O mundo celeste é o resultado de um protesto da criatura oprimida contra o mundo em que vive e sofre. Ou seja, procura-se um refúgio no mundo divino porque o mundo em que o homem vive é desumano. O proletariado é manipulado pela burguesia, e a sociedade pensa o que ela quer que pense. Quando o proletariado toma consciência dessa manipulação, há a revolução.

O marxismo é um idealismo, deseja criar um mundo igualitário, harmônico e pacífico, deseja mudar a realidade. Mas como mudar a realidade de exploração? Através da luta de classes (disputa entre dominantes e dominados). Quando o proletariado conseguir virar a situação a seu favor, estabelecerá uma ditadura provisória para aniquilar os mantedores da sociedade burguesa, ao virar contra eles o aparelho opressivo do Estado. Revolução significa mudança completa, o fim do oprimido e do opressor. O Estado continua existindo para administrar a divisão igualitária, mas, a medida que a revolução vai avançando, e os antagonismos de classes desaparecendo, o Estado fica cada vez menos necessário, e se pode pensar no “definhamento do Estado” , ou seja, a supressão de qualquer instituição opressiva e a instauração de relações sociais livres e harmoniosas.

De acordo com a tese do materialismo histórico defende-se que a evolução histórica se dá pelos confrontos entre diferentes classes sociais decorrentes da exploração do homem pelo homem. No final da Idade Média, quando houve o desenvolvimento do comércio, as relações servis começaram a desempenhar um papel de entrave ao desenvolvimento das forças produtivas, provocando assim uma implosão dentro do sistema e originando outro novo: o capitalismo. Compreende-se, então, que o capitalismo nasceu a partir das contradições do sistema feudal, e que a burguesia (classe dirigente), ao criar a sua oposição, o operariado, engendrou também o seu futuro extermínio, cavando a sua própria cova. Desse modo, Marx sustenta que a transformação da sociedade é inelutável e que resultará da dinâmica própria ao sistema capitalista. É interessante notar que, dentro da lógica do socialismo, o Estado capitalista ia definhar porque o capitalismo não ia dar conta do bem estar da sociedade, e na lógica do liberalismo, o Estado também definharia, mas num estado mínimo, e por outro motivo: o de não mais interferir na economia.

Para Marx, as relações internacionais não se dão no interesse de Estados como representantes de toda a Nação, mas sim no interesse da burguesia nacional que se apropria do Estado. Ou seja, os entendimentos, as alianças, as rivalidades ou os conflitos nas relações internacionais, não expressam os verdadeiros interesses das sociedades nacionais como um todo. Isto porque não existe uma sociedade nacional no sentido próprio do termo. Qualquer sociedade nacional, sob o regime capitalista está dividida entre os interesses antagônicos do capital, de um lado, e do trabalho, de outro. A partir disso, depreendemos que os governantes agem conforme é benéfico para os detentores de capital, e, portanto, para compreender os fenômenos internacionais deve-se analisar os cálculos dos atores econômicos por trás dos governantes.

A lógica do liberalismo é de destruir barreiras entre os países, para a expansão do capitalismo, e isso gera uma inevitável internacionalização. Porém, quando o capitalismo se tornar universalmente expandido, os conflitos que gera entre detentores da força de produção e detentores da força de trabalho se tornarão insolúveis, e a revolução deve surgir da autodestruição do capitalismo chegado ao cume de seu poder. Isso explica o pensamento de Marx de apoio à expansão e êxito provisório do capitalismo, pois ele achava que era a melhor maneira de apressar a revolução.

A revolução deveria ser um fenômeno internacional, e para apressá-la, Marx investe na tomada de consciência de seus companheiros de luta: “Proletários de todos os países, uni-vos” (Manifesto Comunista). Por outro lado, ele reconhece que no estágio inicial seja normal que o proletariado de cada país deva, antes de tudo, liquidar sua própria burguesia. Assim, o triunfo proletário no interior de um país, teria alcance internacional ao quebrar um dos elos do capitalismo. O fim dos antagonismos de classes no interior das nações determinaria o fim da hostilidade entre as nações. Assim podemos perceber que, apesar de Marx não ter elaborado uma teoria das relações internacionais, ele com certeza contribuiu para o pensamento das mesmas, buscando a paz e igualdade mundial. A harmonia nas relações internacionais, a paz verdadeira, jamais seria o resultado de tratados firmados entre capitalistas. Somente quando os representantes da força de trabalho se unissem num pacto internacional é que paz seria confiável e duradoura. Raymond Aron, teórico clássico, diz que a visão de Marx é um “otimismo catastrófico”. De fato, suas predições sobre a autodestruição do capitalismo não se concretizaram.

II – O Marxismo à prova dos fatos

A ideia de Marx é uma coisa, as interpretações posteriores a ele, outra. Marx achava que o capitalismo devia chegar ao máximo desenvolvimento para só depois ter a revolução que levasse ao socialismo, e acreditava que o proletariado inglês que começaria a revolução, pois o capitalismo na Inglaterra era o mais desenvolvido. No entanto, a revolução começou na Rússia, em 1917, um país pobre e feudal. Como fazer a revolução num país feudal? Lenin teve que dar passos pra trás, ou seja, fazer reformas capitalistas para capitalizar a Rússia e assim viabilizar o socialismo.

Porém, essa revolução não poderia ter se iniciado na Rússia, porque a tese inicial de Marx e Engels deixa claro que a revolução deve ser universal, acontecer simultaneamente em todos os países civilizados, como Inglaterra, França, Alemanha, e assim teria maior repercussão sobre os outros países do mundo. Tendo começado na Rússia, a revolução não se espalhou como deveria, e o país ficou isolado num mundo de países capitalistas. Não tinha como dar certo. Os dirigentes soviéticos eram obrigados a fazer concessões no interior, para firmar sua autoridade, assim validando o “direito a autodeterminação” das nacionalidades reagrupadas no antigo império russo, pactuando com o nacionalismo. Como é um conceito burguês, poderia se tornar um fator de dissociação do novo Estado socialista. Mais ainda: para avivar a chama revolucionária para o mundo, os dirigentes soviéticos apelam para o sentimento nacionalista dos povos oprimidos pelo domínio capitalista.

Alguns marxistas como Rosa Luxemberg já criticavam o modo como a URSS fazia a revolução. O Estado socialista estava parecendo com o burguês, apelando para o nacionalismo, que era visto como alienação, criação de valores comuns para manipular a população, para a manutenção de sua soberania e seus interesses. A própria URSS pediu para entrar na Liga das Nações, sociedade burguesa. Em 1941, entra na guerra, ao lado das democracias ocidentais contra a Alemanha nacional-socialista. Nada em seu comportamento jurídico e político permite distingui-las dos outros Estados capitalistas. O desenvolvimento do socialismo no século XX levou a distorções do pensamento marxista. A tese do socialismo num só país serviu para encobrir a restauração de uma política fundada sobre a defesa do interesse nacional, e afastou as exigências imediatas da revolução mundial. As coações da política vencem a lógica do esquema revolucionário.

Merle argumenta que, talvez, Trotsky tivesse razão quando escreveu que a teoria do socialismo num só país é a única que se opõe de maneira profunda à teoria de revolução permanente. Renunciar a uma atitude internacional leva ao messianismo nacional. Assim, fica claro que o socialismo num só país contribuiu para a invalidação e distorção da teoria inicial de Marx.

O autor aponta corretamente que, no entanto, a multiplicação de Estados Socialistas também não resolveu os problemas da teoria marxista. Além dos naturais conflitos entre países capitalistas e socialistas, surgiram também conflitos entre os próprios países socialistas entre si, mostrando que o advento do socialismo não pôs um fim aos antagonismos nacionais. As disputas entre Moscou e Pequim são um exemplo, seja por conflito de interpretação doutrinária ou rivalidade de influências para garantir o controle do movimento comunista internacional. O quadro estatal foi mantido para a organização das democracias populares na Europa do Leste, em Cuba e na China, e o fato nacional foi cuidadosamente respeitado. O Estado não esmoreceu, o apego à língua, ao solo, e às tradições nacionais impediram a fusão numa vasta comunidade socialista, provando que a solidariedade proletária não é tão fácil de realizar no plano internacional.

III – O estado atual das teorias marxistas

Antes de tudo, é importante ressaltar que este livro é de 1974, então talvez o termo “atual” não se aplique aos dias de hoje.

Apesar do acordo sobre o objetivo a atingir, que é a revolução mundial, através do entendimento do capitalismo e a superação do mesmo, há um desacordo quando se trata dos meios para atingir este objetivo, que Merle aponta com muita clareza. Na medida em que as divergências de análise partem de lugares diferentes e refletem interesses contraditórios, é lícito questionarmos a validez de certos postulados como o de responsabilizar o imperialismo como única causa da guerra e o internacionalismo proletário como o único remédio.

Ao analisar os pontos comuns entre os países socialistas, percebemos que ao falar de fatos internacionais, eles convergem na ideia de que a contradição de classes (burguesia x operariado) foi elevada ao nível do Estado e do sistema mundial, tornando-se assim a contradição fundamental nas relações internacionais. Também convergem na forma de organização, o marxismo fala de conflito em escala universal contra o capitalismo, e que a solução é o socialismo para acabar com a exploração e criar uma sociedade mais justa.

Analisando os pontos de divergência, vemos que existem três linhas de pensamento: a da União Soviética, a da República popular da China, as tendências mais moderadas do eurocomunismo ou ainda nacional-comunismo, e esta última poderia ser chamada também de “terceiro-mundismo”, porque reinterpreta a teoria marxista privilegiando o ponto de vista dos países subdesenvolvidos. Primeiramente, observamos a divergência no que diz respeito à separação do mundo, que para a URSS é entre capitalismo e socialismo, oeste x leste. Para China entre os povos oprimidos e os países imperialistas, onde o próprio social-imperialismo soviético ocupa lugar de destaque, para os comunistas europeus seria entre o capitalismo e um socialismo nacional, e para os defensores do terceiro mundo, entre o centro (núcleo do capitalismo) e a periferia (povos explorados do terceiro mundo), ou ainda norte x sul.

Analisando o segundo ponto de divergência vemos que, para a URSS, a prova de força pode ser global e pacífica, para os chineses a guerra é inevitável, os comunistas europeus também querem respeitar o equilíbrio entre as grandes potências, e é dos terceiro mundistas que surgirá a explosão revolucionária.

Por último observamos que, a estratégia da URSS era manter o equilíbrio com os EUA, dando preferência à defesa militar e a diplomacia. Já a China, tenta primeiro garantir sua independência econômica e sua segurança militar, e apoia os países subdesenvolvidos para livrarem-se da dominação das superpotências. Os partidos comunistas europeus apostam no sentimento nacional para consolidar sua posição interior, e os terceiro mundistas, na ação direta contra seus próprios governantes.

Além dessas correntes mais representativas existem outras, porém essas já bastam para exemplificar as divergências na execução da teoria marxista. Com tudo isso, podemos chegar a conclusão que o mundo socialista talvez não fosse tão pacífico quanto Marx achou que pudesse ser.

IV – Apreciação crítica

Merle aponta uma importante observação a respeito de Marx, ao dizer que ele contribuiu para desvelar um aspecto totalmente deixado de lado na sua época: a interdependência dos fenômenos econômicos e políticos, internos e externos, e de discernir através da aparente incoerência dos fatos, a marcha em direção à universalização das relações internacionais.

De fato, sua teoria se mostrou muito certa em vários aspectos, como por exemplo, o crescimento acelerado da concentração de empresas e do papel importante das multinacionais. Porém, alguns pontos contribuíram para por em dúvida suas ideias, como a pluralidade de interpretações do marxismo. A revolução do proletariado foi feita de forma diferente da que Marx imaginava, que seria na Inglaterra, e não em um país agrário e feudal como a URSS e a China, o que corroborou para o fracasso da revolução mundial.

Outro problema foram os conflitos entre os países capitalistas e socialistas, que por meio de rivalidades nacionais, busca pelo poder e autodeterminação, os países socialistas estavam se comportando como Estado-Nação, típico capitalista no cenário de anarquia internacional. Além da invalidação da tese que o fim dos conflitos de classes levaria ao fim dos conflitos internacionais à medida que os próprios países socialistas lutavam entre si. A defesa do interesse nacional e a luta pelo poder levavam vantagem sobre as exigências do internacionalismo proletário. Os neo-marxistas são obrigados a renegar a URSS e seus aliados, culpados de “revisionismo”, e a transferir as esperanças da revolução para as explosões partindo da periferia explorada que estourarão o centro do sistema mundial.

Marx também errou ao subestimar o fator político, ou seja, a importância do exercício da política, e, o uso da tecnologia, que criou um poder muito grande, como a bomba, questão fundamental do equilíbrio de poder. Uma tese formulada no século XIX, onde as relações eram relativamente simples, não se adequam ao mundo contemporâneo.

Considerações finais:

O capitalismo se revigorou após a crise de 29 a partir da criação do “Estado do Bem-estar social”, incialmente na Inglaterra (30-80). Ele existiu porque havia um adversário, o socialismo. O estado do bem-estar social era uma forma de mostrar que não havia necessidade de fazer uma revolução, pois havia o estado do bem estar social. O kenesianismo, estado como interventor, foi criado aí, baseando-se na ideia de qualidade de vida. Nos EUA, a partir do New Deal, foi instaurada a mesma ideologia. Mas no geral, o capitalismo não foi criado nessa doutrina do bem estar social. Agora existem muitas crises na Europa, pois o Estado do bem estar social foi desmantelado, e voltou o liberalismo clássico, do Estado mínimo. Isso ocorreu a partir da queda do socialismo real, com o fim da URSS. Passada a ameaça, volta o capitalismo selvagem.

A leitura deste capítulo é muito importante porque Merle mostra as ideias de Marx e o porquê de não ter dado certo. Marx achava que com o fim dos antagonismos de classes e disputas pelo poder e dominação, a sociedade internacional viveria em paz. Porém, suas ideias não se concretizaram por uma série de motivos já citados anteriormente, sendo as principais delas a pluralidade de interpretações do marxismo, a revolução iniciada num país onde o capitalismo não tinha atingido seu ponto máximo, e o isolamento desse país no meio do mundo capitalista, além de algumas questões que Marx não levou em conta, como o fator político, os nacionalismos, e a tecnologia.

A atenção dada ao conceito Marxista como concepção no estudo das relações internacionais se dá pois, para Marx, o proletariado seria uma categoria social universal e, portanto, a teoria marxista só pode ser entendida do ponto de vista do internacionalismo. Apesar dele não ter criado uma teoria das relações internacionais ele abordou de maneira nova esse tema.

Ao final do capítulo, Merle deixa uma questão: “Mas é possível um conceito neutro das relações internacionais?” Após a leitura do trabalho aqui desenvolvido, tudo nos leva a crer que não existe uma análise livre de ideologias. A obra de Marx contribuiu significativamente para desfazer a ilusão de que seria possível assumir uma posição de neutralidade em relações internacionais. Em nenhuma situação, seja ela real, empírica, ou teórica, abstrata, iremos encontrar valores que nos permitam construir uma verdadeira ética das relações internacionais.

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