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O Velho Paquetá

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Por:   •  16/4/2014  •  1.678 Palavras (7 Páginas)  •  287 Visualizações

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Parte I

Não havia nada na geladeira, as roupas que vendi só me renderam um pão e um pouco de café. Fui ao mercado vestindo apenas um pijama, pois não tinha outra roupa. A atendente parecia não perceber o que eu vestia, me olhou apenas com um sorriso discreto, parecia não estar interessada em mim. Depois de procurar entre as caixas de leite disponíveis, escolhi a mais barata.

Chegando em casa, ligo a televisão, está sendo transmitida a tradicional corrida da cidade, o começo dela, para dizer a verdade. Um senhor de 70 anos se prepara para correr enquanto é entrevistado, o velho é ex-ator e ex-boxeador, segundo ele. Lembrei de já tê-lo visto correndo pelas ruas do bairro (será ele mesmo?), quando disse a cidade onde morava, não tive dúvidas.

Pensei em entrevistá-lo para conseguir alguma grana no jornal onde trabalhava e decidi pesquisar sobre sua vida. Lendo os jornais e revistas na biblioteca, descobri que o velho havia realmente sido ator e que protagonizou, em outros tempos, um filme de velho-oeste. A intenção era se parecer com as obras de Sérgio Leone, mas acabou por lembrar mais os filmes de Mazzaropi.

O velho trabalhou durante toda a infância e juventude em plantações na zona rural, até o dia em que adquiriu uma pequena propriedade e se casou. Quando seus ganhos como agricultor se tornaram insuficientes, se arriscou a lutar boxe, ganhando inclusive alguns campeonatos locais, época em que foi apelidado de “Paquetá”. Decidiu se aposentar das lutas quando lhe ofereceram um papel no tal filme.

A conversa ao telefone se iniciou com uma mulher dizendo, num tom áspero e desagradável, que seu marido não se encontrava no momento, pedi

para deixar o recado. No dia seguinte, pela manhã, o próprio velho me ligou, num tom sereno e educado, perguntando sobre o que se tratava a ligação. Aceitou de imediato minha entrevista, com a condição de ser feita na minha própria casa.

Lembrei da minha pequena sala do apartamento e de seu péssimo estado, não havia condições de receber uma visita, o chão estava todo esburacado e o sofá caindo aos pedaços. Resolvi então cobri-lo com papelão e sacolas de supermercado. Para realizar a entrevista, pedi emprestado uma roupa de um amigo, companheiro do jornal onde trabalhava.

No dia seguinte, pela manhã, a campainha tocou, estavam à porta o velho e sua esposa, que me despertou imediata antipatia. Convidei-os a sentar e ofereci uma bebida, mesmo sabendo que não tinha nada a oferecer, por sorte recusaram. Comecei com algumas perguntas, que eram sempre respondidas de forma agradável e descontraída pelo velho. Quando a mulher me pediu para ir ao banheiro, lembrei da imundice em que se encontrava, indiquei o caminho assim mesmo.

Enquanto a mulher usava o toillet, o velho relutou um pouco quando perguntei sobre o filme, disse que não poderia revelar todos os detalhes. Fiquei curioso com essa observação, perguntei a razão e ele me respondeu que, apesar de não mencionar isso a nenhum outro jornalista, me falaria por ter despertado nele certa afinidade e simpatia, agradeci sua confiança.

“Jamais usei nenhum tipo de droga” - disse ele. No entanto, a pedido dos próprios produtores do filme, se viu obrigado a vender pequenas quantidades dessas substâncias em sua antiga barraca na feira, para que ele pudesse ser custeado e produzido. A razão para agir dessa forma foi que sua família estava passando por dificuldades. “Não tive outra escolha” – disse o velho.

Quase encerrando a nossa conversa, quando a sua mulher ainda saía do banheiro, o velho me olhou e disse que eu saberia exatamente o que eu poderia divulgar na entrevista, acenei que sim. Quase aos berros, a velha chega até minha sala dizendo que o banheiro estava pior do que de uma rodoviária, ri discretamente.

Antes de saírem, o velho ainda me disse que oferecia melhores condições para sua família hoje em dia, e que sua filha estava agora trabalhando numa mercearia. Perguntei o nome da loja e soube que era o lugar onde havia feito minhas minhas compras anteriormente (vestindo apenas um pijama). Resolvi não mencionar esse detalhe, mas descobri quem trabalhava lá, se chamava Megan.

Minha entrevista com Paquetá foi divulgada no jornal do dia seguinte, imaginei como seria a vida do velho se transformada em um filme, tão surpreendente era a sua história. Isso me fez lembrar de um antigo sonho da época da faculdade, queria me tornar um cineasta, mas abandonei a ideia quando comecei a trabalhar com o jornalismo, cujos ganhos mal garantem a minha sobrevivência.

A época do inverno estava se aproximando, minha família me convidou para viajar e passar uma temporada num hotel fora da cidade, aceitei de imediato o convite. A pousada em que ficamos era realmente muito bela e confortável e, por decisão do dono, tinha até mesmo um seguro contra incêndios, que indenizava o proprietário e ressarcia os hóspedes do hotel.

O valor que seria pago ultrapassaria em muito o necessário para realizar um filme. Pensei na idéia de fraudar um incêndio e lembrei da história do velho Paquetá, que ajudou sua família vendendo entorpecentes numa determinada época de sua vida - mas são situações muito diferentes - concluí. Escrevi em meu diário como realizaria tal feito, apesar de não ter coragem de realizar o sinistro.

No dia seguinte resolvemos andar pelo parque e conhecer toda a cidade. Ao término do passeio pegamos o caminho de volta, foi quando percebemos ao longe uma movimentação incomum próximo ao hotel. Quando chegamos ao local, descemos rapidamente do carro, os bombeiros estavam tentando apagar as últimas chamas sobre a pousada. Fui questionado sobre a presença de um diário entre os escombros, quando disse a quem pertencia, fui preso pela polícia.

A fiança foi fixada num valor que minha família não estava disposta a pagar, tamanha era a desconfiança. Liguei para o velho Paquetá, que ouviu minha versão sobre o caso, ficou sensibilizado pela minha história e feliz com minha ideia do filme. Perguntou o valor da fiança e estabeleceu como condição

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