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Aborto

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Por:   •  8/4/2014  •  Projeto de pesquisa  •  5.663 Palavras (23 Páginas)  •  296 Visualizações

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Aborto

Mary Anne Warren

1. Introdução

Será que as mulheres têm o direito de interromper uma gravidez não desejada? Ou estará o Estado habilitado (senão mesmo eticamente obrigado) a proibir o aborto intencional? Deverão alguns abortos ser permitidos enquanto outros não? O estatuto legal do aborto decorre diretamente do seu estatuto moral? Ou deverá o aborto ser legalizado, mesmo que seja algumas vezes, ou mesmo sempre, moralmente errado?

Estas questões suscitaram intensos debates ao longo das duas últimas décadas. Curiosamente, em grande parte do mundo industrializado o aborto não era considerado um crime até que uma série de leis antiaborto foram promulgadas durante a segunda metade de século XIX. Por essa altura, os proponentes da proibição do aborto realçavam os perigos clínicos do aborto. Por vezes também se argumentava que os fetos são seres humanos a partir do momento da concepção e, como tal, o aborto intencional seria uma forma de homicídio. Agora que os avanços médicos tornaram os abortos, quando corretamente efetuados, mais seguros que os partos, o argumento clínico perdeu toda a força que alguma vez possa ter tido. Conseqüentemente, o ponto central dos argumentos antiaborto mudou-se da segurança física das mulheres para o valor moral da vida do feto.

Quem defende o direito de as mulheres escolherem o aborto respondeu de diversas formas ao argumento antiaborto. Examinarei três linhas de argumentação da perspectiva do direito de escolha: 1) que o aborto deve ser permitido pois a proibição do aborto leva a conseqüências altamente indesejáveis; 2) que as mulheres têm o direito moral de escolher o aborto; e 3) que os fetos ainda não são pessoas e, como tal, ainda não têm um direito substancial à vida.

2. Argumentos conseqüencialistas a favor do aborto

Se avaliarmos a moralidade das ações pelas suas conseqüências, podemos construir um forte argumento contra a proibição do aborto. Ao longo dos tempos as mulheres têm vindo a pagar um terrível preço pela ausência de métodos contraceptivos e abortivos seguros e legais. Obrigadas a dar à luz muitos filhos a intervalos excessivamente curtos, as mulheres eram freqüentemente muito fracas e morriam jovens — um destino comum na maioria das sociedades anteriores ao século XX e, ainda hoje, em grande parte do Terceiro Mundo. A maternidade involuntária agrava a pobreza, aumenta as taxas de mortalidade nos bebês e nas crianças e obriga as famílias e os estados a grandes esforços econômicos.

O aperfeiçoamento dos métodos de contracepção veio aliviar de alguma forma estes problemas. No entanto, nenhuma forma de contracepção é ainda 100% eficaz. Além disso, muitas mulheres não têm acesso a qualquer tipo de contracepção, seja por não poderem pagar, ou por não se encontrar disponível no sítio onde vivem ou por não estar disponível a menores sem a autorização dos pais. Em quase todo o mundo, trabalhar por um salário tornou-se uma necessidade para muitas mulheres, tanto solteiras como casadas. As mulheres que têm de ganhar o seu sustento sentem a necessidade de controlar a sua fertilidade. Sem esse controlo é-lhes praticamente impossível obter o grau de educação necessário para um emprego digno, ou é-lhes impossível combinar as responsabilidades da maternidade com as do seu emprego. Isto é uma verdade tanto para as sociedades socialistas como para as capitalistas, pois em ambos os sistemas econômicos as mulheres têm de lutar com esta dupla responsabilidade de trabalhar em casa e fora de casa.

A contracepção e o aborto não garantem a autonomia reprodutiva pois muita gente não pode ter (ou adequadamente educar) qualquer criança, ou pelo menos tantas quantas desejariam; outras ainda são involuntariamente inférteis. No entanto, quer a contracepção quer o aborto são essenciais para as mulheres que queiram ter o mínimo de autonomia reprodutiva, algo que é perfeitamente possível nos dias de hoje.

A longo prazo, o acesso ao aborto é essencial para a saúde e sobrevivência não apenas das mulheres e das famílias, mas também dos próprios sistemas sociais e biológicos dos quais todos dependemos. Dada a insuficiência dos atuais métodos contraceptivos e a falta de acesso universal a esses métodos, se quisermos evitar um rápido crescimento populacional é necessário que se recorra a algumas práticas de aborto. A menos que as taxas de crescimento populacional diminuam nas sociedades empobrecidas em que estas continuam altas, a mal-nutrição e a fome crescerão para níveis ainda mais assustadores que os actuais. Até poderia haver comida suficiente para alimentar toda a população mundial, se ao menos aquela fosse mais eqüitativamente distribuída. Contudo, isto não permanecerá assim indefinidamente. A erosão dos solos e as alterações climatéricas causadas pela destruição das florestas e pelo consumo dos combustíveis fósseis ameaça reduzir a capacidade que a terra tem de produzir comida — talvez drasticamente — já na próxima geração.

Mesmo assim, os opositores do aborto negam que o aborto seja necessário para evitar tais conseqüências indesejáveis. Algumas gravidezes são causadas por violações ou incestos involuntários, mas a maior parte resulta aparentemente de comportamentos sexuais voluntários. Por conseguinte, os opositores do aborto afirmam freqüentemente que as mulheres que procuram abortar se "recusam a assumir responsabilidades pelos seus próprios atos." Segundo o seu ponto de vista, as mulheres deveriam evitar ter relações sexuais heterossexuais a menos que estivessem preparadas para levar a cabo uma gravidez daí resultante. Mas será esta uma exigência razoável?

As relações sexuais heterossexuais não são biologicamente necessárias para a sobrevivência ou para a saúde das mulheres — nem dos homens. Pelo contrário, as mulheres celibatárias ou homossexuais são menos vulneráveis a contrair cancro cervical, Aids, assim como outras doenças sexualmente transmissíveis. Nem sequer é claro que o sexo seja necessário para o bem-estar psicológico tanto das mulheres quanto dos homens, apesar de a crença em contrário ser generalizada. É, no entanto, algo que as mulheres acham extremamente agradável — um fato que é moralmente significativo para a maior parte das teorias conseqüencialistas. Além disso, faz parte do modo de vida escolhido pela maioria das mulheres em todo o lado. Em alguns sítios, as mulheres lésbicas estão a criar formas de vida alternativas que parecem servir melhor as suas necessidades. Mas para a maior parte das mulheres heterossexuais a escolha de um celibato permanente é muito difícil.

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