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Distúrbios alimentares

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Por:   •  24/8/2014  •  Seminário  •  1.808 Palavras (8 Páginas)  •  296 Visualizações

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Quando fui convidada a discorrer sobre este tema, com o objetivo de ligá-lo aos transtornos alimentares, fiquei me questionando até que ponto pode a imagem especular ser influenciada pelo ambiente e como a construção da imagem especular pode gerar um transtorno alimentar, ou se é a imagem especular, no caso o corpo social, que gera o transtorno alimentar? O que vem primeiro, o ovo ou a galinha?

Para tentar resolver a questão, fui buscar nos primórdios do desenvolvimento do esquema corporal e em seguida, da imagem especular, se num determinado ponto desse desenvolvimento estamos suscetíveis às influências externas, pela não construção e desenvolvimento de um ego integrado, mas de um ego esfacelado e muitas vezes simbiótico na relação com os primeiros objetos.

Segundo Françoise Dolto (1992), o esquema corporal especifica o indivíduo enquanto representante da espécie, quaisquer que seja o lugar, a época, ou as condições nas quais ele vive; é o interprete da imagem do corpo, permitindo a objetivação de uma subjetividade; estrutura-se pela aprendizagem e experiência; é em parte inconsciente, mas também consciente.

Trocando em miúdos, estamos falando sobre a filogênese (desenvolvimento da espécie) e da ontogênese (desenvolvimento de cada sujeito, dependendo da sua história de vida). Assim, o esquema corporal vai se desenvolver de qualquer modo, independente da vontade ou não do sujeito; já que todos nós estamos fadados a um desenvolvimento neuromotor inerente à própria espécie. E a partir desse esquema corporal, das experiências sentidas e vividas, vamos construindo uma imagem especular, que se objetiva, isto é, se torna consciente, no momento em que o representamos, no desenho da figura humana, por exemplo.

Quando chega um paciente em nossa clínica, com uma demanda motora, um dos aspectos que iremos investigar é o esquema corporal: ele já o desenvolveu, sabe nomear as partes do corpo, sabe desenhar uma figura humana? Na realidade, o que estamos investigando não é o esquema corporal, mas a imagem corporal, que é a representação do corpo e da imagem que fazemos desse corpo, isto é, a imagem que temos de nós mesmos; porque o esquema corporal vai se desenvolver por meio das sensações interoceptivas, proprioceptivas e exterioceptivas.

Dolto (1992) ainda nos chama a atenção para a seguinte questão: se o esquema corporal, é em princípio, o mesmo para todos os indivíduos, a imagem corporal é peculiar a cada um, porque está ligada ao sujeito e a sua história; pode ser considerada como a encarnação simbólica inconsciente do sujeito desejante e é específica de um tipo de relação libidinal.

A imagem não está imbuída de sensações, mas é o símbolo das percepções e dos sentimentos. Somos a única espécie de seres vivos que de frente para um espelho, reconhecemos que a imagem refletida nele é apenas um símbolo e fazemos graça. Outras espécies, como a do chimpanzé, quando confrontados com o espelho, passam a mão por trás do mesmo e desistem, porque não se reconhecem como refletidos no mesmo. Mesmo nós humanos, levamos dois anos para compreender que a imagem especular é somente uma representação, um reflexo de nosso corpo num espelho e ela se desenvolve a partir da relação mãe-bebê, passando a ser um sujeito desejante, porque nos vemos também através dos olhos do outro.

A imagem corporal é o que se vive numa relação, por isso é sempre dinâmica. Na sócio-psicomoticidade Ramain-Thiers, não se utiliza espelho na sala onde será realizada a sessão de movimento, para não se quebrar a imagem corporal que irá sendo construída durante a execução dos movimentos. Porque para Simonne Ramain, a imagem corporal é construída por meio da conscientização das possibilidades do movimento e da postura corporal.

A imagem corporal, advinda da imagem especular, é a cada momento, memória inconsciente das vivências relacionais e, ao mesmo tempo, ela é atual, viva, em situação dinâmica, dependendo do papel que estamos desempenhando num determinado momento, camuflável ou atualizável na relação aqui e agora, por qualquer expressão “linguageira”: desenho, modelagem, criação musical, plástica, assim como a mímica e os gestos.

A imagem corporal pode ser expressa em qualquer tipo de linguagem. Na África, há uma tribo onde a mãe grávida, compõe uma canção para o seu filho que irá nascer. E esta canção é cantada em seu nascimento, quando aniversaria, quando dá os primeiros passos, quando entra na escola, quando se forma, quando se casa… Nos acontecimentos mais importantes de sua vida, acompanhando-o até no seu velório e enterro, como um registro, uma marca, uma imagem sonora de sua existência.

Estamos falando da imagem de base, a que permite à criança uma mesmice de ser, em uma continuidade narcísica ou em uma continuidade espaço-temporal que permanece e vai se preenchendo desde o nascimento, apesar das mutações da vida e dos deslocamentos impostos ao corpo e, a despeito das provas que ela é levada a submeter-se.

Esta imagem de base é a que já nasce com o indivíduo desde o namoro dos pais e se abre no, que Winnicott chama de espaço potencial. Garante ao sujeito a mesmice de ser, porque ele se reconhece como pertencente ao grupo familiar e ao seu ambiente. Será narcisizado pelos pais porque foi querido, foi desejado. Os pais também abrem um espaço temporal para se dedicarem a esta criança.

Para Winnicott (1983), a imagem corporal será desenvolvida ou não, por meio da função materna. A mãe capaz de alimentar o seu bebê é aquela cuja função de alimentar vai além da necessidade biológica, de sobrevivência. Faz parte da função materna segurar o seu bebê, envolvê-lo, contê-lo. O sentimento de estar vivo, de se reconhecer como tal, se dá primeiro pelo toque da mãe no corpo do bebê. O limite do seu corpo, o seu contorno é dado pela mãe. Se não há um limite dado pela manipulação, aparece a sensação de estar a diluir-se.

A mãe considerada suficientemente boa é aquela que se envolve com o seu bebê e a princípio não se diferencia dele; mas aos poucos vai se voltando para outros interesses e deixa o bebê viver como um ser diferenciado, independente dela. O diluir-se é uma das questões levantadas pelas anoréxicas, quando a imagem de base não foi instalada.

Winnicott também vai falar da função do espelho: “Sou visto, logo existo”. Para que alguém se veja, é preciso que antes tenha sido visto pelo outro. Quando o existir de uma criança é visto e compreendido por alguém, é devolvida, como a face refletida em um espelho, a evidência de ter sido percebida como existente evidência de que tanto

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