A Ciencia Não Mata Deus

Vida: o filme Moacyr Scliar

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O mundo não passa de um palco, disse Shakespeare. Se à época já existisse o festival de Gramado, o bardo faria uma comparação melhor: o mundo é um filme. Melhor ainda: a vida é um filme. Em alguns casos, superprodução, com cenários luxuosos, mansões, palácios; em outros casos, cinema alternativo, feito com uma câmera na mão e muitas dívidas no bolso. Às vezes, trata-se de longa metragem - Matusalém que o diga; às vezes é encurtado pela brutalidade da existência, a doença, a violência.

        Roteiro não existe. Só descobrimos o que vamos fazer quando já estamos em cena, e aí a improvisação é a regra. Os equívocos se sucedem a todo instante, criando um clima de suspense ou de comédia de pastelão. Quanto ao diretor, as opiniões divergem. Há diretor? Quem é? Pode ser que um diretor exista, sim, dirigindo o filme, mas lá de cima - o que é ótimo para cenas panorâmicas, mas menos adequados para quem quer ser guiado de perto, como acontece com a minoria. Se não há roteiro não podemos saber qual será o nosso papel. Há atores e atrizes principais, e todos sonhamos com esta posição de glória e fortuna, mas, no geral, toca-nos a posição de humildes extras. Figuramos em cenas de multidão. Somos aqueles que têm de deitar no chão quando o banco é assaltado. Ou aqueles que aplaudem das arquibancadas. Ou aqueles que trabalham em imensas fabricas, em imensos escritórios. Raramente o nosso nome figurará na lista dos créditos (dos débitos, sim).

        Gostaríamos que o nosso filme fosse premiado, sobretudo no Festival da Eternidade. Mas este está sendo constantemente adiado. No ano 1000 as pessoas pensaram que havia chegado o fim dos tempos, e aquela seria uma boa ocasião para o veredito final - mas o cinema ainda não existia, o que talvez tenha contribuído para adiar o grande evento. No ano 2000 a hipótese foié levantada, mas com menos convicção.

Se, pelo menos, o nosso filme tivesse um final feliz - mas o que é, mesmo, um final feliz? O cinema tem resposta para estas questões, a vida não. A vida nem sequer garante reprise. No máximo, podemos nos contentar com as pipocas.

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