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Entraves da Regularização Fundiária no Brasil

Por:   •  10/10/2019  •  Artigo  •  9.877 Palavras (40 Páginas)  •  131 Visualizações

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Introdução

Neste artigo concentraremos nos entraves que influenciam na gestão do processo de regularização fundiária de assentamentos irregulares de baixa renda. A partir disso, temos o intuito de chamar atenção para a complexidade do conjunto de ações que integram uma política de regularização fundiária. Ou seja, além das ineficiências em relação às respostas do Estado ao problema, somam-se as complexidades próprias do processo em si.

Destacam-se dificuldades como aquelas relacionadas; à capacidade institucional do Estado brasileiro (carência de recursos e corpo técnico, que limitam a capacidade de formulação e internalização das políticas públicas); à fragilidade do conhecimento e da base de informações sobre a questão fundiária; à complexidade do sistema cartorário brasileiro, aos entraves de ordem jurídica (ausência de leis, existência de leis que dificultam a regularização fundiária); à complexidade dos assentamentos irregulares precários (relacionadas ao processo de urbanização gradual, à morfologia do tecido urbano, ao elevado adensamento construtivo/populacional e a sua constante transformação), entre outros.

Evidentemente, a todas estas questões somam-se ainda aquelas de caráter estrutural, como aquelas que restringem o acesso à terra a população trabalhadora ou a proposital indisciplina registral e seletiva (e violenta) regularização do solo. Entretanto, embora reconheçamos que estas questões se relacionem diretamente com as citadas, elas não constituem o foco deste artigo. Não pretendemos esgotar o debate acerca das dificuldades da gestão da regularização fundiária, não é tarefa para um único pesquisador e também não é o objetivo central deste artigo. Enfocamos dimensões jurídica e administrativa, sem ignorar, no entanto, as questões urbano-ambiental e social. Embora entendamos ainda que os entraves variem de acordo com o contexto geográfico, tentaremos nos ater a questões que tendem a representar empecilhos em todo o território nacional, porém em virtude do recorte definido, correrei um risco quase proposital de generalizar com base no estado de São Paulo.

Este artigo baseia-se em três fontes: bibliografia, minhas experiências profissionais[1], bem como entrevistas com especialistas e gestores públicos[2].

Tendo em vista apresentar a discussão de forma didática, elaboramos uma trajetória hipotética de um processo de regularização fundiária de interesse social. Dissertaremos como cada um dos entraves se expressa em cada uma das etapas deste processo. Para elaboração do caso hipotético, consideramos um assentamento consolidado (portanto sem a necessidade de realização de obras de infraestrutura). Durante a simulação serão apresentadas situações que poderiam dificultar a sua efetivação.

A trajetória hipotética foi dividida em oito etapas[3], detalhadas na sequência: (1) Elaboração de cartografia básica; (2) Regularização da base fundiária; (3) Elaboração do cadastro físico; (4) Elaboração do cadastro social; (5) Projeto de Regularização Fundiária (Regularização Administrativa); (6) Parcelamento do solo no Cartório de Registro de Imóveis (CRI); (7) Titulação da posse e/ou propriedade e (8) Regulação Urbana e o direito à cidade.

Este artigo foi originado de um capítulo da dissertação de mestrado defendido em dezembro de 2017 em Planejamento e Gestão do Território – PGT na universidade federal do ABC[4] e atualizado após sua apresentação no Seminário Nacional sobre Urbanização de Favelas (III UrbFavelas).

Cabe destacar que a nova lei de regularização instituiu procedimento administrativo para a regularização fundiária, mas que na nossa interpretação não interfere nas etapas aqui apresentadas.

  1. Elaboração da cartografia básica

A cartografia básica consiste na ação de realizar um registro gráfico do assentamento: seus limites, confrontantes, equipamentos públicos, a hidrografia (córregos, nascentes), interferências de risco (como linhas de transmissão, oleodutos, gasodutos, a vegetação arbórea), edificações, sistema viário, alinhamento de quadras e lotes e a infraestrutura implantada. Este registro é comumente elaborado por meio do Levantamento Planialtimétrico Cadastral – LePAC.

Na cidade hipotética, a equipe da prefeitura possui topógrafos e o trabalho social foi eficiente, não havendo dificuldades na execução. As famílias receberam os técnicos e os cachorros estavam presos.

Situações que poderiam dificultar a elaboração da cartografia básica:

Deficiências relacionadas à capacidade institucional constituem um dos principais entraves nesta etapa, tanto com à inexistência de corpo técnico, como a dificuldade para realizar contratações. Uma das gestoras entrevistada de Piracicaba relatou que a ausência de profissionais de topografia para contratação é o grande entrave da regularização fundiária naquele município.

Outra dificuldade referente a esta etapa, apontada novamente pelas gestoras de Piracicaba e também Osasco, refere-se aos riscos relacionados à segurança. Foi relatado, por exemplo, um caso de furto de equipamento de topografia em um assentamento de Piracicaba, no entanto, as entrevistadas alertaram que não haviam iniciado o trabalho técnico social.

A nova lei de regularização fundiária (13.465/17) condiciona ao projeto de regularização fundiária, em seu artigo 35, a existência do Levantamento Planialtimétrico Cadastral. Em situações onde a densidade das moradias não é alta, é possível pensar em alternativas técnicas desta representação, como a utilização de imagens aéreas (drones entre outros) garantindo uma representação gráfica fiel do território. Entendemos que a legislação federal ao exigir essa peça técnica, tende a restringir alternativas tecnológicas que poderiam facilitar sua execução, tirando do município a prerrogativa de avaliar a necessidade conforme cada caso.  

  1. Regularização da base fundiária:

Essa ação foi apontada como um dos principais entraves por todos os seis municípios entrevistados[5]. Dividimos a explicação dessa etapa em quatro passos, a fim de apresentar de forma mais didática: (1º) Pesquisa documental; (2º) Delimitação da poligonal do assentamento e elaboração da planta de sobreposição; (3º) Elaboração de atos normativos e (4º) Disponibilização da base fundiária.

A nova legislação incluiu um procedimento administrativo que ao iniciar a regularização fundiária o município deve classificar a modalidade de REURB (Regularização Fundiária Urbana) e “após Instaurada a Reurb, o Município deverá proceder às buscas necessárias para determinar a titularidade do domínio dos imóveis onde está situado o núcleo urbano informal a ser regularizado” (Brasil, art. 31, 2017).

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