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O PROBLEMA DA EXTRINSECAÇÃO FÍSICA DA ARTE

Por:   •  7/11/2017  •  Resenha  •  4.176 Palavras (17 Páginas)  •  570 Visualizações

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OS PROBLEMAS DA ESTÉTICA - Capítulo 8: A Matéria Artística
Luigi Pareyson


1. O PROBLEMA DA EXTRINSECAÇÃO FÍSICA DA ARTE:

- Artes Liberais (Poesia) X Artes Servis (Pintura e Escultura - necessidade do corpo para a execução manual em que elas consistem)
- O processo de 'espiritualização', foi iniciado no renascimento, e culminou no romantismo, que em cada arte acentuou o aspecto interior e espiritual da pura criação;
- Antítese no modo de conceber a produção da obra de arte:
        De um lado: a
acentuação da criatividade puramente interior, até a desvalorização de         qualquer aspecto extrinsecativo;
        De outro: a
reivindicação cada vez mais resoluta do aspecto executivo da arte, até a         exaltação do puro ofício e a redução da arte a uma forma de artesanato;
- De Schopenhauer a Croce esta espécie de 'espiritualismo estético' organiza-se com a máxima coerência. A arte é uma atividade puramente interior e espiritual: é essencialmente conhecimento, contemplação e intuição. Em suma, a produção de arte se esgota na figuração de uma imagem puramente interna, e com esta nada tem a ver a atividade sucessiva, que exterioriza num corpo físico;
- Contra essa teoria levantou-se desde o início uma decidida polêmica, dirigida a reivindicar o caráter corpóreo e físico da obra de arte. O que era necessário reivindicar era o caráter artístico da extrinsecação,
no sentido de que toda operação destinada a dar um corpo à imagem faz parte integrante do processo artístico, longe de ser artisticamente indiferente, ou secundária, ou supérflua;
- Esta reivindicação foi energicamente feita por muitas correntes francesas contemporâneas, segundo as quais fazer arte não significa intuir, conhecer, contemplar, mas fazer, produzir, realizar: mais precisamente 'fazer' no significado mais intenso do termo, isto é, produzir um objeto real, físico, material;
(A obra de arte não é uma figura somente espiritual e interna, mas é o objeto físico, uma realidade sensível, uma coisa entre as coisas, e isto vale não apenas para os monumentos, ou as estátuas, ou as telas, a que dão lugar as artes visuais, mas também para a música e a poesia, onde o aspecto físico e sensível consiste na sua realidade auditiva e sonora.)
- Certamente uma doutrina como esta se encontra exposta ao perigo de reduzir a arte a simples ofício ou a um artesanato, embora superior. Se primeiro absorvia o fazer numa atividade puramente espiritual, agora arrisca anular toda atividade espiritual em favor do simples fazer e realizar;
- Encontramo-nos diante de uma antítese para qual a arte seria ou FANTASIA ou OFÍCIO: ou sonho ou artesanato, ou pura interioridade ou simples extrinsecação, ou figuração somente espiritual ou mero produto técnico, ou imagem puramente interior, ou apenas objeto físico;
-  Uma explicação da arte está ligada à possibilidade de mostrar nela, figuração interior e operação executiva, atividade espiritual e extrinsecação física, idealidade e sensibilidade, longe de se contraporem ou de se sucederem, ou de se anularem uma na outra, coincidem, pelo contrário, sem resíduo;
*Atividade Espiritual e Extrinseção Física

2. NECESSIDADE DA EXTRINSECAÇÃO FÍSICA NA ARTE:

- A presença de um elemento físico é indispensável para a arte, quer ele apareça maciço e evidente como nas pedras da arquitetura, quer ele se atenue até quase desaparecer como nas páginas de um romance, onde o aspecto semântico das palavras prevalece sobre sua consistência fonética, sem no entanto cancelá-la;
- A arte é necessariamente extrinsecação, porque só e precisamente por seu caráter físico e sensível ela se especifica, distinguindo-se da artisticidade genérica que é inerente a toda a vida espiritual;
- A beleza não é, de per si, sensível;
(A perfeição de um raciocínio, a elegância de uma demonstração, a harmonia de pensamento - casos de beleza puramente intelectual, privada de qualquer elemento sensível.)
- A beleza artística, por sua vez, é sempre sensível, e é exatamente a presença de um elemento sensível o que torna possível a especificação da arte: a arte propriamente dita tem necessidade de uma matéria como esteio de sua especificação;
- O corpo físico da obra de arte não é apenas um cômodo memorial ou um instrumento de comunicação, útil fim que se deseja, mas não artístico de per si, porém é a realidade mesma da obra, a sua existência viva;
- Basta nos colocarmos, só por um instante, no ponto de vista do artista, para nos darmos conta da necessidade de uma extrinsecação física: o artista não se limita a almejar e sonhar, mas pretende dar vida a uma forma que viva de per si, destacada dele, objeto entre objetos;
- Mesmo sendo possível manejar seu corpo sem fazer caso de sua qualidade de arte, é, no entanto impossível apreender seu valor artístico sem, precisamente, ter em conta aquele corpo;
* O artista pretende dar vida a uma forma que viva 'per si', que tenha autonomia;

3. COINCIDÊNCIA DE FISICIDADE E ESPIRITUALIDADE NA OBRA DE ARTE:

- O ato artístico é todo extrinsecação, e o corpo da obra de arte é toda a realidade dela;
- As obras de arte são figuras espirituais: imagens que têm um significado humano, que falam à mente e ao coração, que transmitem sentidos interiores e profundos. Mas o aspecto espiritual e interior das obras de arte não é alguma coisa que transcenda o seu aspecto sensível e a sua realidade física, porque, antes, coincide imediatamente com eles;
- Reencontramos aqui o princípio da coincidência de espiritualidade e fisicidade na arte, que tinhamos encontrado a propósito da inseparabilidade, ou melhor, da identidade de forma e conteúdo na arte;
- Grande parte da magia e do mistério da arte consiste exatamente nesta convergência de espiritualidade e fisicidade, que faz da obra um corpo e um espírito, uma coisa e, juntamente, um valor;
- A magia da obra de arte não é a convergência, ou a copresença, ou a mediação da sua espiritualidade e da sua fisicidade, mas a coincidência destes dois termos: o fato de na obra não existir nada de físico que não seja significado espiritual, nem nada de espiritual que não seja presença física;


4. O PROBLEMAS DA MATÉRIA DA ARTE:


- O termo 'matéria' teve, referido à arte, alguns significados.
        Por um lado, se entende tudo aquilo que existe antes do artista, quer se refira de modo geral, à espiritualidade onde ele se move, seus sentimento, crenças, pensamentos, ideias, costumes, preceitos, regras, tradições artística;
        Por outro lado, entendem-se os materiais físicos com os quais se forma a obra de arte: palavras para a poesia, sons para a música, cores para a pintura, mármores para as escultura, pedras para a arquitetura, e assim por diante;
- Para Pareyson, são matéria da arte os materiais físicos de que se servem os artistas, vistos na sua constituição natural, no seu uso comum.
        Em primeiro lugar a matéria de arte tem uma constituição natural, que o artista não pode, de modo algum, violar: as palavras tem relação estrutural entre som e significado, os sons são ondas sonoras que se propagam de um certo modo, a visão das cores obedece certas leis e gera determinadas percepções, os materiais de construção são mensuráveis quanto a seu peso, sua resistência e sua elasticidade. Em suma, trata-se de leis determinantes e necessárias;
        A matéria artística tem, depois, um uso comum, como o uso corrente da língua destinado à significação, à expressão, à comunicação; o uso de sons, cores e linhas como signos ou sinais; o uso puramente utilitário dos materiais e construção, e assim por diante. Trata-se de um uso pré-artístico, e se trata então de utilidade, em que a matéria é assumida como meio para atingir certos objetivos segundo uma técnica codificável e aprimorável;
- Além disso a matéria chega ao artista carregadas de regras, preceitos, prenhe de modos operativos, coisas que com frequência impõe ao artista o peso da autoridade ou da tradição;

5. ADOÇÃO DE UMA MATÉRIA ARTÍSTICA:

- A matéria apresenta dois aspectos que dão lugar a duas concepções opostas:
        Por um lado, a matéria tal como se encontra na obra é totalmente diversa daquela que era primeiro (ex: o mármore tem uma aparência diversa, a pedra um aspecto inédito), o fim utilitário é absorvido na figura artística e parece não preexistir no desígnio do autor, mas emanar da mesma realidade da obra: técnica, tradição, escola penetram no gesto original do criador;
        Por outro lado, a obra resulta como é precisamente pela natureza da sua matéria. A escolha de uma matéria é operada com base na sua natureza: não é indiferente para uma figura o ser pintado a óleo ou em afresco, a um estátua o ser em mármore, bronze ou madeira. Com frequência, é a matéria que impõe ou sugere ao artista a ideia de uma obra. Os preceitos e as regras podem, frequentemente, sustentar e muitas vezes até encaminhar a inspiração;
- Originadas das duas legitimas constatações, eis duas posições opostas e extremas. Por um lado, a matéria doravante é tal só enquanto idêntica à obra, e, por outro, preexistente a ela, numa independência dela. Por um lado, a relação entre o artista e a matéria é de absoluta criação, já que o artista cria no próprio ato que lhe resgata a preexistência; por outro, é de determinação, no sentido de que o artista sobre as exigências da matéria e está obrigado a sujeitar-se a ela e servi-la;

- É o artista aquele que nem violando a matéria e nem padecendo dela, secunda a sua vontade e procura suas resistências, até chegar ao ponto em que, por um lado, consegue fazer a própria vontade precisamente fazendo a vontade da matéria, e por outro, procede de modo que as suas resistências sejam não rêmoras mas solicitações, e os seus limites não proibições mas sugestões. O diálogo entre a matéria é uma espécie de 'obediência criadora';
* Separar a obra da sua matéria é impossível: a obra nasce como adoção de uma matéria e triunfa como matéria formada;

6. O PROBLEMA TÉCNICO NA ARTE:

- Em arte, poucos termos são tão ambíguos como o termo 'técnica';
- No falar corrente ele pode aludir ao estilo irrepetível e personalíssimo de um artista, como quando se diz que ele tem 'uma técnica sua'; ou melhor, inerente a todo um estilo, passando a considera-la 'sob aspecto técnico', pretendendo com isso examinar sua conformidade à 'linguagem' de uma escola ou de um estilo; ou ainda qualquer coisa de inferior à arte, de preferência, inerente ao ofício, como quando da habilidade de uma artista;

- Também Croce, que no entanto, procurou levar ordem para esta questão, usa este termo pelo menos com três significados: ele distingue antes de tudo 'Técnica Interna' e 'Técnica Externa', referindo a segunda ao ato prático da 'comunicação', e a primeira como o próprio ato de criação da imagem artística;
- Em suma, há quem, na arte fala caso sobretudo da originalidade, da inspiração, da carga espiritual, e portanto, diante disso, é levado a desvalorizar os valores formais; E pelo contrário há quem, na consideração de uma obra, parta antes de tudo dos aspectos formais.;
- De um lado se afirma a autonomia da técnica, singularizável fora das obras do artista, comum às obras de uma mesma arte, transmissível de um artista para outro, separável da criação artística; E de outro, pelo contrário, afirma-se que a técnica diz respeito à arte na medida em que se identifica sem resíduo com a criação, irrepetível e individual como a obra singular e a possibilidade artística, inseparável da atividade do artista;

7. DISCIPLINA, OFÍCIO E RETÓRICA:

- Predomínio dos técnicos levou à aridez do mero ofício;
- Educação Romântica por sua vez: desbrinda o artista de qualquer disciplina e autorizando-lhe a máxima liberdade;
- Em primeiro lugar, o discurso sobre a técnica significa que há na arte alguma coisa que se aprenda. Porém é preciso admitir que em arte só aprende quem sabe aprender, mas isto não elimina o fato de que aquele que alcança ser artista tenha, certamente, aprendido se-lo. E a primeira coisa que se aprende é precisamente a técnica, a qual, repare-se, não consiste absolutamente na prática do uso comum de uma certa matéria de arte, mas é precisamente TÉCNICA DE ARTE: conhecimento da destinação artística de uma matéria e prática de sua manipulação artística. Há portanto, para cada arte uma técnica, transmissível de um artista para o outro e separável das obras individuais;
- Se pensarmos que a originalidade não é nunca um começo absoluto ou uma ruptura completa com a situação precedente, veremos que não há outra introdução à originalidade sem a imitação;
- Em segundo lugar, o reclamo à técnica significa que não há arte sem ofício. Certamente, pode haver ofício sem arte, ou no sentido honesto do trabalho do artesão, que não tem pretensões de originalidade artística. O ofício tem uma curiosa prerrogativa: pode existir sem arte, enquanto, pelo contrário, a arte não pode passar sem ele. Com o ofício penetram na arte os aspectos que lhe são indivisivelmente conexos, isto é, a disciplina, o trabalho, a habilidade;
- Em terceiro lugar, a admoestação da técnica significa atrair a atenção sobre a RETÓRICA, isto é, sobre aquelas regras que poderiam ser chamadas as leis 'positivas' da arte. Essas regras param de ser cânones e preceitos, fórmulas ou receitas, mas tornam-se prescrições provocadoras e estimulantes;
- Esse tríplice significado de um discurso sobre técnica se liga ao conceito de matéria artística: incluem-se nas matérias de arte as retóricas, é diálogo com a matéria o ofício, e está ligada à matéria a técnica transmissível;

8. O PROBLEMA DA MULTIPLICIDADE DAS ARTES:

- Com a matéria artística está também ligado o problema da multiplicidade das artes;
- Os primeiros esboços de uma filosofia de arte, se encontram na filosofia grega, tendem já a subsumir no único gênero da imitação três espécies de imitação:
        A de figurar ou retratar (como na pintura)
        A do mimar ou refazer (como no drama)
        A de representar ou exprimir (como na música)
- Em diversas formulações, a teoria da unidade da arte como imitação e a diferença das artes como pluralidade de modos de imitar reina até quase os umbrais do romantismo.
Diversos critérios foram adotados para explicar a diferença das artes, que vêm diferenciadas segunda o órgão do sentido ao qual se dirigem: a pintura à visão, a escultura ao tato, e a música ao ouvido. Ou então segundo o espaço e o tempo, de modo que as artes espaciais as artes plásticos-figurativas, e temporais a poesia e a música;
        Artes Plasticos-Figurativos: pintura (vista), escultura (tato), música (ouvido)
        Artes Temporais: poesia e música
- Nos dias de hoje, o campo está dividido em duas atitudes extremas. Por um lado acentua-se a diversidade das artes, por outro, acentua-se, a unidade das artes. De um lado uma atitude empirista, que sacrifica a unidade da arte à diferença entre as artes, e de outro, uma atitude abstrata;
- É preciso ultrapassar a ambas numa posição mais aberta e compreensiva. De uma parte, a multiplicidade das artes é um dado que a estética não pode limitar-se a registrar ou pressupor: ela deve explica-lo, o que não pode fazer sem refirir-se à essência mesma da arte e, por isso, ao principio da unidade das artes;
- A unidade e a diferença das artes só se afirmam e se explicam juntas, e ambas são problemas da estética, isto é, problemas estritamente filosóficos;

9. O FUNDAMENTO DA DIVERSIDADE DAS ARTES:

- Que a diferença entre as artes seja diversidade de matéria, é bastante evidente: aquilo pelo qual uma arte se diferencia das outras e a 'linguagem' que usa, a 'técnica que adota', o 'meio' em que se encarna, o 'específico' que a distingue, 'os instrumentos' que adota;
- Naturalmente, a 'matéria' está entendida no significado complexo que procurei definir anteriormente, isto é, não limitada à bruta naturalidade, mas vista no interior de um ato de adoção que destina a um uso espiritual e a predispõe para a arte;
- É preciso não esquecer que cada arte propõe problemas espaciais e diversos ao filósofo, os quais, por isso, interessam não só à técnica artística, mas também, diretamente, à estética;
- Impossível estabelecer o número de artes, mas não menos impossível instituir entre elas uma hierarquia ou uma ordem que implique uma recíproca e constante tomada de posição, apesar de que este assunto tenha sido tentado na história da estética por mais de mil vezes. Um sistema das artes cada um o faz, concretamente, por sua própria conta, com base na própria cultura, na própria sensibilidade, nas próprias preferências, nas próprias aberturas espirituais;
- Além disso, o significado e a importância de uma arte em relação às outras mudam segundo as condições culturais e espirituais, segundo o tempo e os povos;
- Por estas razões um sistema das artes tem uma importância mais histórica e cultural do que filosófica e especulativa;

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