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Jurisprudência: A Teoria Pura do Direito e a Jurisprudência Analítica

Por:   •  24/4/2016  •  Dissertação  •  1.535 Palavras (7 Páginas)  •  1.780 Visualizações

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HANS KELSEN

JURISPRUDÊNCIA NORMATIVA E SOCIOLÓGICA (do ensaio “A Teoria Pura do Direito e a Jurisprudência Analítica” in La Idea del Derecho Natural Y outros Ensayos, pp. 215-220, Ed. Losada, Buenos Aires, 1946 - tradução de A. L. Machado Neto)

Texto inserido na obra “O direito e a vida social - leituras básicas de sociologia jurídica”, de Antonio Luiz Machado Neto e Zahidê Machado Neto. São Paulo: Companhia Editora Nacional - Editora da Universidade de São Paulo, 1966, pp. 16-20.

Trata-se de obra publicada com a colaboração da Universidade de São Paulo.

        “As normas jurídicas podem ser de caráter geral ou individual. Elas podem regular por antecipação, em uma forma abstrata, um indeterminado número de casos, como o faz aquela norma segundo a qual se alguém rouba deve ser castigado por um tribunal; ou podem referir-se a um caso particular, como o faz a sentença que decreta que A deve sofrer prisão por seis meses porque roubou um cavalo a B. A Jurisprudência vê o Direito como um sistema de normas gerais e individuais. Os fatos são considerados nesta Jurisprudência apenas enquanto são o conteúdo das normas jurídicas. Por exemplo. A Jurisprudência toma conhecimento do procedimento por meio do qual se criam as normas de Direito, pois êste procedimento está prescrito pelas normas da constituição do ilícito, porque êle está definido por uma norma como condição da sanção; da sanção, porque está ordenada por uma norma jurídica como conseqüência de um ilícito. Sòmente as normas, disposições que estabelecem como os indivíduos devem comportar-se, são objeto de Jurisprudência, nunca a conduta real dos indivíduos.”

OBS. NOSSA: como se vê da parte grifada, Kelsen admite a decisão jurídica como norma, da espécie individual. Ou seja, ao contrário do que a denominada Teoria Pura do Direito parece sustentar, o julgador tem um papel criador não apenas do Direito, mas também da Norma Jurídica de caráter individual, no dizer do subscritor da referida teoria.

        

        Depois, no texto, o autor aborda a questão da norma ter validade (com eficácia geral - o ‘dever ser’ que atinge as pessoas em seus gerais comportamentos) e eficácia (específica no caso concreto): “Se uma ordem jurídica perde sua eficácia por qualquer causa, então a Jurisprudência já não considera mais suas normas como válidas. Ainda assim, a distinção entre validez e eficácia é uma distinção necessária, pois é possível que numa ordem jurídica eficaz em conjunto, e portanto considerada como válida, uma norma jurídica isolada possa ser válida mas não eficaz em um caso concreto, porque, de fato, não foi obedecida ou aplicada ainda que devesse ter sido. A Jurisprudência considera o Direito como um sistema de normas válidas. Não pode prescindir do conceito de validez enquanto diferente do de eficácia, se deseja apresentar o sentido específico do ‘dever ser’ com que as normas do Direito se aplicam aos indivíduos cuja conduta regulam. É êste ‘dever ser’ o que está expresso no conceito de validez como distinto da eficácia.

Se a Jurisprudência tem de apresentar o Direito como um sistema de normas válidas, as proposições com que descreve seu objeto têm de ser proposições de ‘dever ser’, asserções nas quais se expresse um ‘dever’, não um ‘ser’. Mas as proposições da Jurisprudência não são por si mesmas normas. Elas não estabelecem nem deveres nem direitos. As normas por meio das quais os indivíduos são obrigados ou facultados emanam apenas da autoridade criadora do Direito.”

[...]

Depois de explicitar a razão da denominada Teoria Normativa do Direito, Kelsen adentra na diferenciação da “Jurisprudência Normativa” de outra, que ele denomina “Jurisprudência Sociológica”.

“Esta classe de Jurisprudência há de ser claramente distinta dessa outra que possa ser chamada sociológica. Esta última pretende descrever os fenômenos do Direito não em proposições que enunciem como os homens devem comportar-se sob certas circunstâncias, mas em proposições que digam como se comportam em realidade; igualmente como a Física descreve como se comportam certos objetos naturais. Assim, o objeto da Jurisprudência Sociológica não são as normas jurídicas em seu específico sentido de ‘afirmações de dever ser’ mas a conduta jurídica (ou antijurídica) dos homens. Supõe-se que é possível obter, pela observação dos fatos sociais reais, um sistema de regras por meio do qual esta conduta, caracterizada como ‘direito’, pode ser descrita. Supõe-se que estas regras são da mesma classe que as leis da natureza e, portanto, que, como elas, proporcionam os meios para predizer os sucessos futuros dentro da comunidade jurídica, conduta futura que será caracterizada como Direito.

A Teoria Pura do Direito de maneira alguma nega a validade dessa Jurisprudência Sociológica, mas recusa-se a ver nela a única ciência do Direito, como o fazem muitos de seus expositores. A Jurisprudência Sociológica mantém-se paralela à Jurisprudência Normativa e nenhuma pode substituir a outra porque cada uma trata com problemas completamente diversos. É sobre êste ponto, justamente, que a Teoria Pura do Direito insiste, para distingui-las claramente uma da outra, com o fim de evitar êsse sincretismo de método que é a causa de numerosos erros. O que a todo custo deve evitar-se é a confusão - tão freqüente como enganosa - do conhecimento dirigido para um ‘dever ser’ jurídico, com o conhecimento dirigido para um ‘é’ real.

A Jurisprudência Normativa versa sôbre a validez do Direito; a Jurisprudência Sociológica sôbre sua eficácia; mas, assim como a validez e a eficácia são dois aspectos diferentes do Direito que têm de conservar-se claramente separados, ainda que ambos se mantenham em uma definida relação mútua, assim também existe entre a Jurisprudência Normativa e a Sociológica, apesar da diferença na direção de seus conhecimentos, uma considerável relação. A Sociologia do Direito não pode traçar uma linha entre seu objeto - o Direito - e os outros fenômenos sociais; não pode definir seu especial objeto como distinto do objeto da Sociologia Geral - a sociedade - sem que, ao fazer isto, pressuponha o conceito do Direito como definido pela Jurisprudência Normativa. A questão de que a conduta humana, como Direito, pode constituir o objeto da Sociologia; de como a conduta real dos homens, ao ser caracterizada como Direito, se distingue de outra conduta, provàvelmente só pode ser respondida como se segue: ‘direito’ no sentido sociológico é a conduta real que está estipulada numa norma jurídica - no sentido da Jurisprudência Normativa - como condição ou conseqüência. O sociólogo não vê esta conduta - como o faz o jurista - como o conteúdo da norma, mas como um fenômeno existente na realidade natural, isto é, num nexo causal. O sociólogo busca suas causas e seus efeitos. A norma jurídica como expressão de um ‘dever ser’ não é para ele, como é para o jurista, o objeto de seu conhecimento; para o sociólogo é um princípio de uma seleção. A função da norma jurídica para a Sociologia do Direito é a de indicar seu próprio objeto particular, e separá-lo do conjunto dos fatos sociais. Nessa medida, a Jurisprudência Sociológica pressupõe a Jurisprudência Normativa. É um complemento da Jurisprudência Normativa.

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