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Conceptualização do princípio da função social da propriedade

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Por:   •  9/6/2014  •  Tese  •  5.658 Palavras (23 Páginas)  •  233 Visualizações

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Conceituação do Princípio da Função Social da Propriedade

Assim, a preocupação em dar à propriedade, mesmo que privada, uma destinação mais vinculada ao benefício coletivo não se faz presente apenas em relação à produtividade, embora seja inegável que a economia tem papel fundamental na busca de uma existência mais digna para todos. Recentemente, a moradia vem sendo uma grande preocupação. A má distribuição das terras gera injustiça e, conseqüentemente, violência no seio da comunidade. Deve haver, por isso, maior solidariedade no uso das coisas materiais. Trata-se de uma salutar reação do ordenamento contra o desperdício de potencialidade para satisfazer as necessidades humanas, materiais e pessoais.

O conceito do princípio em testilha, portanto, é relativo e flexível, podendo variar de acordo com a doutrina e o sistema positivo de cada época e região. O direito de propriedade pode ser compreendido sob dois aspectos: um estrutural, e outro funcional, sendo que a doutrina, via de regra, dá mais atenção ao primeiro.

Os poderes do proprietário de usar, gozar e dispor da coisa, e reivindicá-la contra quem a possua injustamente, compõem a estrutura do direito. Dessa estrutura pode ser extraído um elemento econômico, ou interno, e outro jurídico, ou externo. O elemento econômico está ligado às faculdades de usar, gozar e dispor, pois é por intermédio delas que o proprietário obtém vantagens econômicas. Ao seu turno, o elemento jurídico seria a exclusão das ingerências alheias, ou seja, os meios de defesa concedidos pelo ordenamento jurídico para tutelar o proprietário contra ataques externos indevidos. [11] Nesse tocante, o direito é oponível erga omnes, pois é sabido que toda a coletividade deve sempre respeitar a propriedade alheia. A soma desses dois elementos resulta na estrutura do direito de propriedade.

O aspecto funcional é a ideologia inerente, o aspecto dinâmico da propriedade. É o papel que ela desempenha em uma determinada sociedade, operando no mundo concreto. Ela sempre exerceu uma função na sociedade, seja para demonstrar claramente a supremacia do capital sobre o trabalho na época liberal, seja para servir de instrumento para uma sociedade mais justa e igualitária, como hoje, no Estado Social. Quando o ordenamento reconheceu que esse direito deve proteger o interesse coletivo, e não o individual, a função da propriedade tornou-se social. [12]

A partir de então, a titularidade da situação proprietária passa a impor ao seu titular o respeito às situações não-proprietárias. Hoje a propriedade é caracterizada menos pelo seu conteúdo estrutural e mais pela finalidade econômica e social do bem sobre a qual incide. A função social, portanto, incide sobre o conteúdo e conceito do direito de propriedade. Sobre essa questão, entretanto, cabe ser frisado que parte considerável da doutrina entende que o princípio da função social não interfere na substância do direito, mas apenas no seu exercício. Pela explanação já feita, fica clara nossa discordância, pois acreditamos que a função social incide na substância do direito, sendo inviável conceituar o direito de propriedade, nos dias de hoje, sem mencioná-la. Caso contrário, estaríamos tratando de mera limitação.

Deve haver compatibilização da situação jurídica de propriedade com situações não-proprietárias, sendo que estas, na hipótese de conflito, receberam da sistemática constitucional uma situação de vantagem. Chegaram a ser encarados pela doutrina como contra-direitos, mas merecedores de tutela. É o caso dos interesses difusos, como a questão do meio ambiente. Hoje em dia, esses contra-direitos são protegidos pela Carta Fundamental, estando inclusive em situação de vantagem, visto que são princípios do ordenamento. Para alguns autores, a expressão contra-direito pode ser entendida, em sentido diverso ao da idéia mais antiga, como os direitos das pessoas menos favorecidas ou de toda a sociedade, como é caso do direito à saúde e ao meio ambiente equilibrado, por exemplo, não sendo protegidos apenas no momento da violação. [13]

No ordenamento jurídico pátrio, a Constituição Federal de 1988 provocou essa profunda alteração da visão do direito de propriedade. Antes de analisarmos o modo como foi feita essa operação, faz-se necessário um breve histórico do direito de propriedade em nossos sistemas constitucionais, para assim ser entendido o motivo pelo qual chegamos ao atual estágio.

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3. Tratamento Concedido pelas Constituições Brasileiras Anteriores

A Constituição Federal de 1824, que foi a primeira do Brasil independente, ainda na época do Império, incluiu o direito de propriedade no rol dos direitos individuais, em seu artigo 179. Era um direito absoluto, podendo ser excepcionado apenas pela desapropriação, que tinha como requisito básico a indenização em dinheiro. Cabe ressaltar que o poder de desapropriar não está vinculado à função social, visto que a força expropriatória pode incidir mesmo sobre bens cumpridores da função social, desde que haja indenização prévia, justa e em dinheiro. A desapropriação não possui a natureza jurídica de sanção, mas é o exercício de um poder estatal em razão da necessidade pública. É mera limitação pública ao direito de propriedade, possibilitando a transferência compulsória de um bem para o patrimônio público. A função social supera a questão do poder expropriante, pois está ligada à estrutura do direito de propriedade, influenciando seu conceito, exercício e tutela.

Em nada inovou a Carta Política de 1891, que inaugurou a República em nosso país. A propriedade continuava sendo um direito absoluto, nos mesmos moldes do Código Napoleônico. O artigo 72, § 17, que enfrentava a questão, era resultado das conveniências políticas da época, visto que a economia nacional estava amparada na agricultura do café. Não era de interesse dos latifundiários uma noção mais social do direito de propriedade, obviamente.

A Constituição Federal de 1934, por sua vez, trouxe inovações nessa seara ao afirmar no artigo 113, 17, que o direito de propriedade não podia ser exercido de forma contrária ao interesse social ou coletivo. Não foi eficaz na tutela de interesses não-proprietários, uma vez que a lei complementar necessária para a regulamentação nunca foi editada. Mesmo assim, foi salutar a influência exercida pelas constituições mexicana (1917) e alemã (1919). [14]

Esse texto constitucional teve vida curta, porque já em 1937 foi promulgada uma nova Constituição, que representou verdadeiro retrocesso. No art. 122, 14, não foi proibido o exercício contrário

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