TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

ORRÓ ESTILIZADO E AS PARADAS DE SUCESSO: UMA ANALISE DA REPRESENTAÇÃO PERJORATIVA DO FEMININO

Pesquisas Acadêmicas: ORRÓ ESTILIZADO E AS PARADAS DE SUCESSO: UMA ANALISE DA REPRESENTAÇÃO PERJORATIVA DO FEMININO. Pesquise 860.000+ trabalhos acadêmicos

Por:   •  18/5/2013  •  3.373 Palavras (14 Páginas)  •  744 Visualizações

Página 1 de 14

FORRÓ ESTILIZADO E AS PARADAS DE SUCESSO: UMA ANALISE DA REPRESENTAÇÃO PERJORATIVA DO FEMININO

Sônia de Melo Feitosa1

Telma Gurgel Silva2 1. INTRODUÇÃO A violência é um fenômeno que perpassa, de diferentes maneiras, a vida das mulheres, resultado de uma cultura historicamente construída, baseada em relações desiguais de gênero, norteadas pela ideologia patriarcal machista, que produz uma hierarquização social, com a supremacia do masculino frente ao feminino, no seio das sociedades patriarcais, constrói-se uma identidade ambígua, classificando a mulher ora como “santa”, ora como “profana”. As mudanças socioeconômicas decorrentes do processo da revolução industrial, ocorrido no século XVIII, mais precisamente a partir da década de 1780, na Inglaterra e, posteriormente no século XIX com a “consolidação do capitalista a nascente revolução provocou um conjunto de alterações na ordem econômica, social e política que tiveram repercussão na vida das mulheres” (GURGEL, 2009 p. 12). É neste contexto que se intensificam as lutas travadas pelo movimento feminista, e que perduram até os dias atuais. Lutas estas que proporcionaram as mulheres conquistas como: o acesso ao trabalho assalariado, ao direito de votar e ser votada, à educação, aos contraceptivos, a desfrutar de certa autonomia para o exercício da sexualidade. Para Faria e Nobre um “exemplo da maior autonomia das mulheres é representado pelo fato de elas poderem andar fora de casa sozinha, e não, como antes sempre acompanhadas de um homem” (1997, p. 17). Esta conquista traz, entretanto, efeitos indesejados para as mulheres: crescem o desrespeito e a agressividade em direção a elas. Parecem naturalizados os vários tipos de violência cometidos contra as mulheres, a exemplo da violência física, simbólica, sexual, patrimonial etc. presentes em todos os âmbitos de socialização: social, político, econômico e cultural.

No entanto, discriminações e violências dirigidas à mulher em ações isoladas ou coletivas, longe de serem ignoradas pelas mulheres foram denunciadas ao longo da história, por meio de organizações de mulheres e movimentos feministas. Na virada do século XIX, as manifestações contra a discriminação feminina adquiriram maior visibilidade expressa no

1 Mestranda em Serviço Social na Universidade Federal do Rio Grande Norte _ UFRN – Email: soniafeminsita@gmail.com.

2 Profª Drª na Universidade do estado do Rio Grande do Norte – UERN, e Professora colaboradora na Universidade Federal do Rio Grande do Norte –UFRN – Email Telmagurgel@uern.br.

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009.

“sufragismo3”, movimento voltado para estender o direito de voto às mulheres. No desdobramento da “segunda onda”, que se inicia no final da década de 1960, o feminismo além de se preocupar com as questões sociais e políticas, todo volta-se para a produção teórica, engendra e problematiza o conceito de gênero, evidenciando, assim, a construção social das desigualdades entre homens e mulheres e a supremacia masculina (FEITOSA, 2007, p. 12)

Na atualidade, no Brasil, uma das bandeiras levantada pelo feminismo é o combate à violência contra a mulher, problema grave e antigo que atinge níveis elevados no país4 que apenas nas últimas décadas vem ganhando visibilidade graças às denúncias do movimento feminista.

Este estudo pretende problematizar as letras das músicas de forró que trazem em seu conteúdo expressões do patriarcado, pondo em evidência formas sutis e mesmo camufladas de violência. Essas expressões estão presentes na linguagem utilizada nas músicas, que têm conotações pejorativas e depreciativas do feminino, constituindo-se em violência simbólica5 que passa despercebida, devido a sua naturalização na sociedade. Nesta análise pretende-se mostrar como as músicas de forró que mais fazem sucesso e atingem uma grande massa da população, vão de encontro à luta das mulheres por igualdade de gênero, promoção dos direitos humanos, e direito a uma vida sem violência e discriminação. Ao contrário, ao depreciarem o feminino, ao banalizarem os corpos, os atributos e qualidades que lhe são inerentes, colocam-se como limite-se “invisíveis”, à construção de sujeitos sociais autônomos e capazes.

Para a realização da pesquisa fundamentamo-nos nas seguintes categorias teórico-metodológicas: relações sociais de gênero, patriarcado, uma vez que ambas categorias referem-se a uma dada realidade social, histórica e cultural, que se estrutura na divisão de classe, a qual corresponde a uma divisão do trabalho social e sexual. Sendo assim, as letras das músicas funcionam como instrumento de práxis, marcadas pelas condições cotidianas em que se estabelecem a relação entre homem e mulher. Relação estas fundamentada na construção de representações simbólicas, do ser homem e do ser mulher. E na categoria violência simbólica, na qual foi trabalhado o processo de destruição da auto-estima da mulher por intermédio da desvalorização de sua imagem nas letras das músicas de forró elencadas para analise. Compreendendo tais categorias numa relação de

3 Este movimento ficou conhecido como a primeira onda feminista. “Na luta sufragista, as mulheres defendiam que o sufrágio universal possibilitaria o acesso das mulheres ao parlamento e por conseguinte abriria a possibilidade de mudança no conjunto das leis e instituições, a luta sufragista também possibilitaria uma ampla aliança entre mulheres, unificando posições” (GURGEL, 2009 p. 13). 4 Em pesquisa realizada exclusivamente com mulheres pelo DataSenado, citado pelo Instituto Patrícia Galvão a respeito da Violência Doméstica contra a Mulher, 15% das mulheres entrevistadas declararam espontaneamente já ter sofrido algum tipo de violência. A situação é mais grave na Região Norte, onde 1 em cada 5 mulheres afirmaram que já foram vítimas de violência. 5 Para Bourdieu, os [...] ¨sistemas simbólicos” cumprem a sua função política de instrumento de imposição ou de legitimação da dominação, que contribui para assegurar a dominação de um classe sobre a outra (violência simbólica) [...] (2003, p. 11)

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009.

totalidade e contradição, inseridas no contexto das relações capitalistas de produção” (QUEIROZ, 2007) e na lógica patriarcal, produtor e indutor de relações socais desiguais de gênero, que impõem à mulher uma condição de subordinação em relação ao homem e que, conseqüentemente, naturalizam as várias formas de violência praticada contra ela. 2. GÊNERO E PATRIARCADO: PILARES DA OPRESSÃO FEMININA O patriarcado é um sistema de dominação, que destina o poder ao homem, ou ao masculino, como categoria social. O homem exerce o poder de mando sobre tudo e todos que estão a sua volta, sob pretexto de ser superior, por causa de sua formação biológica. Por muito tempo, os homens tiveram o direito de vida e morte sobre escravos, esposas e filhos. Segundo Safiotti (2002), sua constituição como base de orientação da sociedade, deu-se com o advento da propriedade privada dos meios de produção, com a produção de excedentes e com a constatação da participação do homem no ato da fecundação. Safiotti estabelece a noção de “nó” para fazer referência à relação intrínseca entre capitalismo, racismo e patriarcado, considerando que as três categorias formam um tripé, em que cada haste tem uma ideologia própria que confluem para um mesmo fim: gênero, raça/etnia e classe social articulam-se no sentido de reforçar o poder de dominação-exploração sobre as minorias: mulheres, negras (os) e pobres (SAFIOTTI, 2002). Assim, para esta autora, “é preciso atacar, simultaneamente, as três contradições fundamentais da sociedade brasileira expressas na simbiose patriarcado-racismo-capitalismo” (SAFIOTTI, 2002, p. 89), para que possamos construir uma democracia plena, em que o ser humano seja respeitado e valorizado independentemente de sua cor, raça, sexo, orientação sexual ou classe social. A categoria relações sociais de gênero possibilita-nos perceber como se estabelecem as relações entre homens e mulheres. Analisando estas relações é possível entender como as desigualdades são construídas historicamente em uma relação de poder, dominação e exploração que privilegia o masculino. Segundo Faria e Nobre (1997), o ser humano nasce bebê macho ou fêmea, em sociedade, por intermédio do aprendizado desde cedo é orientado a se identificar com o que a sociedade define como sendo masculino e feminino. Essas construções são materializadas, principalmente, pelas instituições sociais (religião, família, estado, escola e etc.). São elas que estabelecem papéis distintos para mulheres e homens nos seus primeiros aprendizados em sociedades, por meio de valores culturais.

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009.

3. VIOLÊNCIA SIMBÓLICA E O PROCESSO DE DESTRUIÇÃO DA AUTO ESTIMA DAS MULHERES A violência simbólica ao contrário da violência física dirigida à mulher que ocorre prioritariamente no ambiente doméstico, está presente em todos os espaços de socialização e, em todos os grupos sócio-econômicos. Os agressores não são necessariamente seus companheiros, maridos ou namorados, mas sim, toda a sociedade que apresenta um grau elevado de tolerância a esse tipo de violência, naturalizando sua prática. A violência simbólica faz parte das relações interpessoais cotidianas do ser humano. Ela se afirma na linguagem, principal meio de comunicação entre as pessoas. É um tipo de violência que passa despercebida, por não deixar marcas no corpo, no entanto deixa marcas profundas na alma das mulheres, e influencia substancialmente o comportamento dos indivíduos, constituindo-se como uma espécie de ideologia destrutiva que orienta as ações nas relações entre homens e mulher. De certa forma, a violência simbólica respalda a violência física, uma vez que é permitido e bem aceito o desrespeito às mulheres por meio da palavra, a agressão física pode constituir uma conseqüência natural (FEITOSA, 2007, p 34). Segundo Queiroz: Esta violência está presente no sistema de relações sociais vigentes e é estruturada naquilo que se poderia chamar de construção sócio-cultural diferenciada para homens e mulheres. É também conhecida como violência não física ou “violência doce”, existindo de forma tão sutil, que as mulheres, muitas vezes, não conseguem reconhecê-la. Tem como objetivo destruir o respeito e a auto-estima das mulheres, assumindo várias formas que vão desde xingamento à humilhação em público [...] entre outros. (2004, p. 68). As músicas de forró de maior aceitação pelo gosto popular, em especial, por jovens, trazem em suas letras uma linguagem altamente depreciativa que reifica a figura do feminino e incentiva a violência contra mulher por intermédio da violência simbólica, colocando a violência como base fundamental das relações sociais. É um estilo musical conhecido como forró estilizado, também conhecido como forró moderno, uma versão contemporânea do forró eletrônico. É um estilo de forró cujas letras são cantadas por bandas oriundas de várias regiões do nordeste brasileiro, a exemplo de Cheiro de Menina, Calcinha Preta, Moleca sem Vergonha, Garota Safada, Ferro na boneca, Cheiro de Menina etc. São bandas que trazem em suas designações nomenclaturas referindo-se ao comportamento das mulheres em relação ao exercício da sua sexualidade, além de enfatizarem a preferência dos homens por meninas, sugerem que a mulher, desde a mais tenra idade é marcada pelo poder sedutor. O resultado é a redução da mulher a objeto sexual.

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009.

A música é um instrumento cultural de comunicação muito presente no cotidiano. Ela circula em todos os meios de comunicação como cinema, televisão, propaganda publicitária, rádios, internet entre outros, dessa forma “ela muito pode revelar de nós mesmos e do mundo em que vivemos” (RIBEIRO, 2007). Contudo, interessa – nos desvendar os elementos presentes na ideologia que está sendo passada para os indivíduos por meio deste estilo musical. 4. A IMAGEM DEPRECIATIVA DA MULHER NAS MÚSICAS MASSIFICADAS DE FORRÓ Na atualidade, o repertório que vem se consagrando como representante das músicas de forró faz culto ao comportamento opressivo e incentiva, por excelência, a violência contra mulher, por meio de xingamentos, como “rapariga”, “puta”, “fuleira” e etc. e referências discriminatórios ao exercício da sexualidade da mulher etc. Portanto, as letras de forró analisadas, trazem implícitas em seu conteúdo a violência simbólica. Sem querer fazer juízo de valor, chamamos atenção para as músicas de forró que trazem em suas letras uma desvalorização pública do feminino. Como destaca Faria, a maior participação feminina na vida pública gera estranhamentos: O processo de saída da mulher para a vida pública, principalmente através do mercado de trabalho gerou no universo da sociedade machista, patriarcal certo estranhamento. A mulher tornou-se mais visível sexualmente, expressando mais seu desejo, aumenta também a sua vulnerabilidade, pois ficam mais expostas, uma vez que se deslocam naquilo que é considerado o limite entre virtuosas ou profanas (FARIA, 1998, p.17). Na sociedade patriarcal, machista, a saída da mulher da esfera privada para a esfera pública, conquistando o direito de exercer sua sexualidade de forma mais livre propiciou, em contrapartida, formas explicitas e veladas de julgamento da sua vivência sexual. A constatação deste fato será apresentada nas nossas análises das letras das canções de forró que trazem linguagem com conotação agressiva, e, muitas vezes, ambígua direcionada às mulheres. São letras que pregam a banalização do sexo e uma desvalorização feminina mostrando a mulher apenas como um objeto de satisfação dos desejos sexuais ou da libido dos homens. A exemplo da música ´Lapada na Rachada´ (2007) de autoria de Felipe Frazão, que alcançou um sucesso estrondoso na interpretação da banda Aviôes do Forró:

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009.

A música possui um refrão que é repetido várias vezes, trazendo explicitamente a banalização do orgão sexual feminino e a violência masculina às mulheres: Tooooooma gostosa, lapada na rachada.../ Você pede e eu te dou, lapada na rachada/ E aí, tá gostoso?/Lapada na rachada. A expressão “lapada” se refere a tapas e “rachada” designa o órgão genital feminino. Então bater nas partes íntimas da mulher é algo muito divertido segundo o verso. Nas estrofes seguintes podemos perceber que a letra da música volta-se para uma mulher muito jovem, uma menina, por meio da expressão mina, muito comum nas músicas de forrós: Pense numa mina linda, a danada enlouqueceu/ A macharada la festa quando ela apareceu/ Um sorriso envolvente um jeitinho sensual/ Pra acabar de completar me deu mole no final / Juro não acreditava no que estava acontecendo/ Ela sorria e me olhava e o clima foi crescendo/ Fui direto ao assunto e não pude acreditar/. A referência aqui não é só uma menina, é , ainda, muito sensual que elouquece os homens, é também á uma “mina” oferecida, ou seja, a um tipo de menina que habita o imaginário erótico masculino e alimenta seu libido. A violência contra a mulher, tanto física quanto simbólica nesta música é colocada como um mecanismo que dá prazer à mulher, alimentando, assim, um mito de que “mulher gosta mesmo é de panhar”. É esta a idéia transmitida do ser mulher. As expressões de violência, discriminação e preconceito protogonizadas nas canções de forró, vão sendo cada vez mais aprofundadas de uma música para outra, atacando diretamente a consquista das mulheres a ter uma vida sexual com mais liberdade, para o prazer e não só para a procriação. Por isso, são rotuladas de raparigas, fuleiras ou putas, como expressa a letra da música “Bomba no Cabaré” (2007), de autoria de Dadá di Moreno e Maninho, cantada pela banda Mastruz com Leite. Em Bomba no Cabaré encontramos o ápice da violência contra a mulher, expresso tanto na violência simbólica como na incitação à violência física. Como: Jogaram uma bomba no cabaré/ voou pra todo canto pedaço de mulher [...]. A idéia aqui repassada é que a vida da mulher que faz programas sexuais não tem valor algum. As profissionais do sexo são chamadas de “puta” (“puta” no dicionário significa mulher pervertida). Pervertida é uma expressão utilizada para identificar mulheres que ousam assumir sua sexualidade, deixando de ser considerada virtuosa pela sociedade machista.

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009.

[...] foi tanto caco de pauta voando pra todo lado/ dava pra apanhar de pá, de enxada e de colher!/ no meio da rua tava os braços da Tereza/No meio fio tava as perna (sic) de Rache/ Em cima da telha os cabelo (sic) de Maria/ No terraço de uma casa os peito (sic) de Isabé!/. Ressalta-se, ainda, nesta estrofe que as mulheres que freqüentam o cabaré, ao mesmo tempo em que são condenadas às mais cruéis violências, não podem deixar de existir, pois elas são a “outra”, a que dá prazer sexual ao homem. Tal fato pode ser identificado na estrofe seguinte: Aí eu juntei tudo e colei bem direitinho/ fiz uma rapariga mista, agora todo homem quer/ pode jogar uma bomba lá no cabaré/que eu junto os cacos das fitas pra fazer outra mulher. Essa estrofe deixa claro, também, que para atender aos caprichos eróticos dos homens a mulher tem que possuir todas as características que permeiam o imaginário masculino, unindo beleza, sensualidade e libido, enfim tem que ser uma mulher esteticamente “perfeita”. O discurso agressivo e desrespeitoso à mulher presentes nestas músicas influencia a identidade subjetiva das pessoas, uma vez que essas produções têm boa aceitação pública, sendo, conseqüentemente, tocadas em espaços de diversão que aglomeram número expressivo de pessoas, sendo também repetidas nas rádios ao longo do dia, fazendo com que os sujeitos internalizem as mensagens subjacentes e explicitas sem nenhuma reflexão crítica. Tal incorporação acrítica de valores discriminatórios constitui-se em expressão viva e empírica do patriarcado, traduzindo-se em variados tipos de violência como a violência física, psicológica, sexual, social e etc. É exatamente isto que encontramos nas composições das músicas analisadas. CONCLUSÃO

Uma vida sem violência e sem discriminação é um direito inerente a todos os seres humanos. A naturalização da violência contra a mulher é uma realidade que faz parte do imaginário brasileiro há muito tempo, como mostram diversos estudos voltados para a temática. No entanto, este estudo tem evidenciado que este direito tem sido objeto de lutas e reivindicações dos movimentos de feministas que, apesar de grande dinamismo, ainda estão longe de torná-lo realidade para todas as mulheres. Mas, cabe indagar, não seriam a violência e a discriminação resultantes de uma sociabilidade própria às nossas formações sociais capitalistas que delas se servem para consolidar dominação e hegemonia? E, assim sendo, qual o sentido das lutas feministas? A pesquisa que vimos desenvolvendo, insere-se

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009.

no esforço coletivo de desvendamentos das formas de violência, explicitando as novas roupagens, que camuflam idéias preconceituosas, e ainda a adesão daquelas cuja imagem atingem diretamente, que, contraditoriamente, se constituem reprodutoras e legitimadoras “inconscientes”, de formas de lazer que contribuem para oprimi-las. O patriarcado que antes tentava controlar a vida sexual das mulheres sobre o discurso da proteção do “sexo forte” sobre “o sexo frágil”, hoje pensa controlar a vida das mulheres por meio da degradação da sua imagem. É o patriarcado, vestindo nova roupagem, levantando novas bandeiras, apropriando-se da conquista das mulheres a ter uma vida sexual com mais liberdade garantindo, assim, a sua perpetuação. REFERÊNCIAS FARIA, Nalu e NOBRE, Miriam. Gênero e desigualdade. São Paulo: Sempreviva Organização Feminista, 1997. FEITOSA, Sônia de Melo. As Expressões do Patriarcado na Letras das Músicas de Forró: uma analise de gênero. Monografia de Graduação em Serviço Social. UERN, Mossoró-RN, 2007. GURGEL, Telma. Feminismo e Luta de Classe: A auto-organização das mulheres pela história. Consulta Popular.Cadernos de Debates. Consulta Popular e Feminismo. Nº 1. junho 2009 PINTO, Célia Regina Jardim. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003 – (Coleção Histórica do Povo Brasileiro), 119p. QUEIROZ, Fernanda Marques de. Violência contra a mulher: o pessoal é político. IN: Não se rima amor e dor: representações sociais sobre violência conjugal. Tese de doutorado em Serviço Social. UFPE, Recife, 2005. RIBEIRO, Mariângela. “Cacos de Fitas”: a imagem da mulher na canção massificada. Livratemundo, maio 200.

http://livratemundo4.blogspot.com/2007/05/cacos-das-putas-imagem-da-mulher-na.html SAFIOTTI, Heleieth Iara B. Gênero e Patriarcado: Violência contra mulheres. IN: A mulher nos espaços público e privado. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2002. www.patriciagalvao.org.br/apc-aa-patriciagalvao/home/noticias.shtml?x=671-14k - consultado em 28/07/08

III SEMINÁRIO REGIONAL DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

ABEPSS – NORDESTE

SERVIÇO SOCIAL EM DEBATE: desafios à formação acadêmica na contemporaneidade

III Seminário Regional de Graduação e Pós-Graduação Natal-RN, 27 a 29 de outubro de 2009

...

Baixar como  txt (23 Kb)  
Continuar por mais 13 páginas »