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DA CÂMARA ESCURA AO CELULAR

Por:   •  18/10/2018  •  Artigo  •  3.944 Palavras (16 Páginas)  •  132 Visualizações

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DA CÂMARA ESCURA AO CELULAR: Reflexões Sobre a Fotografia na Pós Modernidade[1]

Juliana Alves dos Santos [2]

Resumo: O presente artigo observa a conexão entre a fotografia pós-moderna e as novas tecnologias relacionadas ao ato de fotografar. O objetivo é refletir acerca dos impactos do aumento significativo no número de fotografias feitas nos dias atuais e da supervalorização da imagem, bem como de sua constante exposição, na fotografia como suporte artístico. Para isso a pesquisa foi baseada em revisão bibliográfica, partindo especialmente dos pensamentos de Vilém Flusser, Norval Baitello Junior e Susan Sontag, entre outros autores.

Palavras-Chave: Fotografia, Imagem, Pós Modernidade.

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1. Introdução

Desde a popularização da internet e das máquinas fotográficas digitais e, mais recentemente, com o advento dos celulares equipados com câmeras e das redes sociais, é visível, impressionante e significativo o aumento no número de fotografias produzidas ao redor do mundo.

Em uma reportagem publicada no site da Revista Veja, em abril de 2012, uma estimativa feita a partir de dados coletados na Enciclopédia Digital de Negócios e em relatórios da Kodak , contabilizava que o número de imagens produzidas por ano em todo o mundo saltou de três bilhões, em 1960, para 380 bilhões, em 2011.

De acordo com dados da empresa americana de marketing digital Zephoria, em 2017 o número de imagens postadas no Facebook, a maior rede social do planeta em número de usuários, está na casa dos 300 milhões por dia – enquanto isso, o Instagram, comprado pelo Facebook em 2012, atingiu esse ano a marca de 700 milhões de contas ativas.

Muito mais do que as 12, 24 ou 36 poses de um rolo de filme usado em câmeras analógicas – que, não faz muito tempo, precisava ser revelado a um determinado custo, sem nenhuma certeza quanto ao resultado –, nos dias atuais, com a ajuda da tecnologia, é possível registrar e compartilhar um retrato, uma paisagem ou um momento incontáveis vezes, sem custo e com a certeza de estar expondo o melhor enquadramento, a melhor composição e o melhor ângulo – já que experimentamos e visualizamos previamente todos os outros.

Em seu ensaio A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica, escrito em 1936 – menos de cem anos após a produção da primeira imagem fotográfica –, Walter Benjamin, crítico e filósofo alemão, já refletia sobre como a técnica de desenhar com luz libertou a mão do artista no processo de reprodução de imagens, acelerando, a partir de então, esse movimento:

Com a fotografia, a mão foi desencarregada, no processo de reprodução de imagens, pela primeira vez, das mais importantes incumbências artísticas, que a partir de então cabiam unicamente ao olho. Como o olho apreende mais rápido do que a mão desenha, o processo de reprodução de imagem foi acelerado tão gigantescamente que pôde manter o passo com a fala (2014, p.15).

Para Benjamin, o advento da reprodutibilidade técnica traria consequências positivas, uma vez que poderia servir como meio para democratizar o acesso à informação, à arte, ao conhecimento. No entanto, baseado em estudos e observações mais recentes, o professor doutor em Ciências da Comunicação, Norval Baitello Junior, em seu livro A Era da Iconofagia, desconstrói essa ideia, ao expor a supervalorização da imagem, que toma conta dos dias atuais, e analisar as consequências de seu consumo e reprodução compulsivos.

 A desmedida proliferação das imagens, sobretudo comprovadamente das imagens exógenas, fruto das imensas facilidades da reprodutibilidade técnica, trouxe muito mais do que a democratização da informação prometida pelo prognóstico benjaminiano; ela trouxe o surgimento de uma instância crescente de imagens que se insinuam para serem vistas enquanto decresce em igual proporção a capacidade humana de enxergá-las (BAITELLO JUNIOR, 2014, p.129).

A partir desses pensamentos, podemos levantar a questão: até que ponto a supervalorização da imagem e a banalização do ato de fotografar impactam na fotografia como suporte artístico? Segundo a diretora de criação do Museu Nacional de Mídia do Reino Unido, Charlotte Cotton, em seu livro A fotografia como arte contemporânea:

Em termos gerais, a fotografia digital – e a velocidade de sua disseminação – remodelou radicalmente tanto a indústria comercial da fotografia como as maneiras como a usamos em nossa vida pessoal e profissional. Houve uma mudança no modo como atualmente entendemos o que a fotografia abarca e o que quer dizer propor trabalhos fotográficos como obra de arte. Mais do que nunca, isso implica revelar o contexto e as condições em que a peça final de arte é composta e concluída. A fotografia artística contemporânea tornou-se menos a aplicação de uma tecnologia visual preexistente e plenamente funcional e mais uma iniciativa que envolve escolhas positivas a cada passo do processo. Esse fato se encontra nitidamente ligado a uma decidida valorização da materialidade e da qualidade objetal desse meio de expressão, numa retomada das raízes da fotografia dos idos do início do século XIX. (COTTON, 2013, p.219)

Nesse contexto, o objetivo desse artigo é refletir sobre essas questões, a partir da investigação de elementos históricos e filosóficos, bem como da investigação acerca da difusão massiva do ato de fotografar, a fim de entender melhor a relação da sociedade com as imagens na atualidade.

2. Da câmara escura ao celular: um breve percurso

Sob o ponto de vista de datas e descoberta de máquinas, equipamentos e processos, poderíamos criar uma linha do tempo que, considerando a produção da primeira imagem fotográfica, se iniciaria no século XIX e chegaria aos dias de hoje – passando pela invenção do daguerreotipo, do calótipo, do fotograma, do filme em rolo, da primeira câmera portátil, da câmera 35 mm, do filme colorido, do flash, do slide e do zoom até chegar às câmeras instantâneas, às câmeras digitais e aos celulares com câmera.

No entanto, sob a luz de um pensamento mais filosófico, o autor e pesquisador francês Phillip Dubois traça, em O ato fotográfico e outros ensaios, um percurso das diversas posições ocupadas pela fotografia ao longo da história, que nos interessa mais – condensando esses momentos em três tempos, desde a sua invenção até a modernidade.

Em um primeiro momento temos a fotografia como espelho do real, onde a imagem fotográfica é percebida como um análogo daquilo que existe e parece ser essencialmente mimética.

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