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A SOCIEDADE BRASILEIRA EM MOVIMENTO

Por:   •  1/9/2021  •  Trabalho acadêmico  •  6.327 Palavras (26 Páginas)  •  146 Visualizações

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A SOCIEDADE BRASILEIRA EM MOVIMENTO: vozes das ruas

e seus ecos políticos e sociais

Maria da Glória Gohn*

O texto tem por objetivo analisar as especificidades e novidades presentes nas manifestações de

Junho de 2013 no Brasil, por meio de algumas questões-chave, a saber: como eram compostas,

as identidades, o pertencimento, os valores e as ideologias que tinham; o que demandavam,

como se articulavam no plano interno e internacional; quais as relações com estado, partidos e

outros movimentos sociais; como surge a violência nas manifestações; qual a concepção de

democracia dos ativistas; como foi pautada a ideia de reformas etc. Uma questão central é

colocada: por que uma grande massa da população aderiu aos protestos em Junho de 2013?

Inicialmente, faz-se a reconstrução dos momentos iniciais das manifestações, especialmente

em São Paulo, analisando-as a seguir segundo seus impactos na sociedade e na política. As

fontes dos dados advêm de arquivos sistematizados via diferentes mídias, entrevistas, pesqui-

sas de opinião pública, e publicações recentes.

PALAVRAS-CHAVE: Manifestações. Protestos. Movimentos sociais. Mobilização da sociedade civil.

Ativismo sociopolítico.

Em Junho de 2013, ocorreu, em 12 capitais

brasileiras e em várias outras cidades de médio

porte, uma onda de manifestações populares que

reuniu mais de um milhão de pessoas, com simi-

lares em apenas três momentos da história do país:

em 1992, no impeachment do ex-presidente Collor

de Melo; em 1984, no movimento Diretas Já, no

período do regime militar, na luta pelo retorno à

democracia; e nos anos de 1960, nas greves e

paralizações pré-golpe militar de 1964, e nas pas-

seatas estudantis de 68. Os protestos rapidamente

se espalharam e se transformaram em revolta po-

pular de massa. Os movimentos foram denomina-

dos pela mídia e outros como “manifestações”. De

fato, eles foram, na maioria das vezes, manifesta-

ções que expressam estados de indignação face à

conjuntura política nacional. As mobilizações ad-

quiriram, nesses eventos, um caráter de movimento

de massa, de protesto, de revolta coletiva,

aglutinando a indignação de diferentes classes e

camadas sociais, predominando a classe média

propriamente dita, e diferentes faixas etárias, des-

tacando-se os jovens. Sabe-se que elas foram

desencadeadas em São Paulo por coletivos organi-

zados, com o predomínio do Movimento Passe

Livre (MPL), a partir de uma demanda pontual –

contra o aumento da tarifa dos transportes coleti-

vos. Quando o ‘povo’ viu, na TV e jornais, jovens

sendo espancados por lutarem por bandeiras que

eram também suas, como a mobilidade urbana, ele

também saiu às ruas. O crescimento das manifes-

tações levou à ampliação das demandas com um

foco central: a má qualidade dos serviços públi-

cos, especialmente transportes, saúde, educação e

segurança pública. As manifestações fazem parte

de uma nova forma de movimento social, que se

caracteriza por participação de uma maioria de jo-

vens escolarizados, predominância de camadas

médias, conexão por e em redes digitais, organiza-

ção horizontal e de forma autônoma, e crítica às

formas tradicionais da política da atualidade – es-

pecialmente os partidos e os sindicatos. As con-

vocações para os atos foram feitas através das re-

*Doutora em Ciência Política. Professor titular da Facul-

dade de Educação da Universidade Estadual de Campi-

nas (UNICAMP).

Rua Bertrand Russel 801. Barão Geraldo. Caixa-postal:

6120. Cep: 13083-970. Campinas – São Paulo – Brasil.

mgohn@uol.com.br

CADERNO CRH, Salvador, v. 27, n. 71, p. 431-441, Maio/Ago. 2014

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A SOCIEDADE BRASILEIRA EM MOVIMENTO ...

des sociais, e a grande mídia contribuiu para a ade-

são da população ao noticiar a agenda, os locais e a

hora das manifestações. Há uma estética particular

nas manifestações: em cima da demanda-foco, sem

carros de som o batuque ou as palmas são utiliza-

dos no percurso das marchas. Os jovens

organizadores das chamadas para as manifestações

atuam em coletivos organizados na última década.

Muitos dos jovens que respondem às convocações

e vão às manifestações estão em fase de batismo na

política. Os coletivos inspiram-se em variadas fon-

tes, segundo o grupo de pertencimento de cada um.

Como rejeitam lideranças verticalizadas,

centralizadoras, também não há hegemonia de ape-

nas uma ideologia ou utopia. O que os motiva é um

sentimento de descontentamento, desencantamen-

to e indignação contra a conjuntura ético-política

de dirigentes e representantes civis eleitos nas es-

truturas de poder estatal, assim como as priorida-

des nas obras e ações selecionadas e seus efeitos na

sociedade. O movimento acontece “em se fazendo”

e não via grandes planos de organizações com coor-

denações verticalizadas. Há processos de

subjetivação na construção dos sujeitos em ação.

Cada um leva seu cartaz em cartolina; uma nova

mensagem pode gerar uma decisão tomada no calor

da hora, em cima da demanda-foco; sem carros de

...

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