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Intervenção Psicológica Em Abrigo Para Mulheres Em Situação De Violência:

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Por:   •  22/10/2014  •  3.997 Palavras (16 Páginas)  •  360 Visualizações

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Este artigo tem por objetivo relatar a experiência profissional de psicólogas no âmbito de uma instituição pública. Será apresentado o processo de mudança nas referências da intervenção psicológica realizada em uma instituição governamental - Casa Abrigo Mãe da Mata do Governo do Estado do Acre, cuja missão é abrigar mulheres em situação de violência intrafamiliar e de gênero juntamente com seus filhos e filhas por um período máximo de 90 dias. Durante esse período, o abrigo oferece proteção e oportunidade para que elas reflitam sobre a vida em situação de violência, assim como as formas de enfrentar essa situação. Na seqüência, serão relatadas as mudanças realizadas nas atribuições do Serviço de Psicologia do abrigo. Para fundamentar a nova proposta, foram feitas discussões sobre as bases que sustentavam a proposta inicial, os resultados obtidos até então e sobre os textos de Severo (1993) e da Secretaria de Políticas para as Mulheres (Brasil, 2003), com o objetivo de promover mudanças na prática institucional.

A principal motivação para escrever este texto foi a constatação da falta de referências para estruturar um serviço de psicologia no contexto de violência contra a mulher. Na época que iniciamos o trabalho, não encontramos textos que apresentassem propostas para a implementação de um serviço de psicologia numa casa abrigo para mulheres. Assim, pensamos que a apresentação de nossa experiência poderá ajudar psicólogas que estejam iniciando um trabalho num abrigo desse tipo.

O atendimento psicológico e as políticas públicas para as mulheres

O atendimento psicológico aparece como uma das intervenções relevantes nas políticas públicas de enfrentamento da violência contra a mulher (Brasil, 2003). Existe uma preocupação de garantir à mulher um acolhimento especializado, de forma que não apenas receba a mulher, mas também a ajude a mudar sua vida. (Brasil, 2003; Soares, 2005). Os aspectos psicológicos ganham destaque também diante da queixa recorrente nos serviços especializados de atendimento às mulheres que vivem em situação de violência - delegacias especializadas, casas-abrigo, centros de referência e unidades de saúde - de que a intervenção é difícil ou o atendimento é inútil (Brandão, 1998; Franco, 2002; Meneghel & cols., 2000; Porto, 2006). Isso porque as mulheres negam a violência, apesar dos sintomas, desistem de prosseguir na responsabilização do agressor ou porque reclamam da situação que vivem e continuam no relacionamento. Assim, há uma expectativa de que a psicologia tem como dar respostas a essas questões.

O feminismo, como referência política e teórica para a organização das mulheres, promoveu uma significativa transformação na compreensão das relações humanas e da organização econômica, política e social do mundo (Pinto, 2003). A trajetória do movimento feminista promoveu a construção de políticas de inclusão e valorização das mulheres, culminando no início do século XXI, no Brasil, com a criação da Secretaria Especial de Política para as Mulheres - SPM, a realização das I e II Conferências Nacionais de Política para as Mulheres e, por fim, o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres - fruto da primeira conferência, que é o documento básico para a implementação das políticas específicas para as mulheres. A SPM está vinculada à Presidência da República, tem status de ministério e possui um orçamento definido (Brasil, 2004). O plano apresenta, como estratégia de proteção às mulheres e consolidação das políticas públicas de enfrentamento à violência, o estabelecimento de redes de cidadania e parcerias. Todavia, já em 2003, um documento elaborado pela SPM apresenta um protocolo de intervenção, entre outros documentos de referência, que orienta e espera que as cuidadoras - trabalhadoras que atendem as mulheres em situação de violência - compreendam as relações de gênero e a violência como um fenômeno relacional. Aponta como ação ideal a abordagem integral, aliando a reestruturação de condições materiais à reestruturação afetiva, emocional e de fortalecimento da condição de cidadania das mulheres. Também destaca a necessidade do conhecimento e manejo dos aspectos cíclicos do processo de violência, de modo que estabeleça mudanças nas construções sociais de identidades e subjetividades, a partir de uma escuta não julgadora.

Outras publicações também apresentam este tipo de demanda, as mais recentes são Soares (2005), Brasil (2006b) e Taquette (2007). Para o desenvolvimento de tal intervenção, a estratégia apresentada consiste de: intervenção em equipe multiprofissional, tendo como referência a interdisciplinaridade para a assistência integral; constituição de redes de parceria; abordagem de grupo e crítica às questões de gênero e da violência contra a mulher (Brasil, 2003). Contudo, não há especificações para a realização do atendimento psicológico nesse contexto e a intervenção a ser realizada é apresentada de forma superficial. Parece haver o entendimento de que a formação em psicologia em si garantiria a realização dessas demandas.

Violência e saúde mental

Pensar sobre a relação entre a subjetividade e a violência contra as mulheres ainda gera desconforto. As discussões sociológicas apresentam a categoria gênero como explicativa das causas da violência em contraposição às explicações que argumentam a violência como uma patologia mental do agressor ou da vítima. Desse modo, defendem uma forma de responsabilização dos homens autores de violência.

[...] a violência [...] tinha a ver com a discriminação e a submissão das mulheres. [...] Nós em nenhum momento admitimos nenhuma atenção, mais técnica ou um pronto atendimento psicológico, advogado, assistente, para nós isso [...] não tinha nada a ver com a nossa proposta feminista (Diniz, 2006, p. 18, grifo nosso).

Todavia, dentro do próprio movimento, começa a aparecer uma reflexão em que a vitimização começa a ser relativizada. Por exemplo, para Saffioti (2004, p. 125), "[...] o gênero não é tão somente social, dele participando também o corpo, quer como mão-de-obra, quer como objeto sexual, quer, ainda, como reprodutor de seres humanos". A autora refere, ainda, "[...] que se considera errôneo não enxergar no patriarcado uma relação, na qual, obviamente, atuam as duas partes. Tampouco se considera correta a interpretação de que sob a ordem patriarcal de gênero as mulheres não detêm nenhum poder" (Saffioti, 2004, p. 118).

Nesse processo de reformulação, reflexão, inclusive das próprias experiências pensadas ao longo da trajetória feminista, os aspectos referentes à saúde mental começam

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