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Pobre Cidade Rica

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Por:   •  16/11/2014  •  1.204 Palavras (5 Páginas)  •  297 Visualizações

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Pobre cidade rica

JOSÉ DE SOUZA MARTINS*

O antigo eixo das funções civilizatórias da capital se perdeu sem que um novo fosse definido, o que a vem enriquecendo especulativamente e empobrecendo socialmente

O caos que São Paulo aparenta nos dias de hoje não é tão caos assim. Apesar de ser hoje a cidade do desencontro, a própria negação do urbano, nos crescentes e amargos problemas sociais dos moradores de rua, das cracolândias, da violência, dos roubos e assaltos, das manifestações populares destrutivas e ineficazes. Nem a cidade foi sempre desse jeito. A cidade que hoje conhecemos substituiu outra, que começou a nascer aí por 1873, no começo do esplendor do café, uma nova e monumental cidade, coisa de gente grande e sábia. Eurípedes Simões de Paula, professor de História na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, chamou aquele momento de "segunda fundação de São Paulo". E o foi.

Por essa época, a velha cidade colonial de taipa começou a ser demolida. No chamado Triângulo, formado pelas atuais Ruas São Bento, Direita e Quinze de Novembro, no lugar de velhas casas de pau a pique foram edificados altos edifícios de pedra e concreto, ecléticos no estilo, no geral reproduzindo formas arquitetônicas europeias, mas nem por isso alheias a inspirações americanas. Como é o caso do Edifício Sampaio Moreira, de 1924, o primeiro arranha-céu de São Paulo, projeto do arquiteto Cristiano Stockler das Neves. Belo e refinado, ainda orna a Rua Líbero Badaró, sufocado pelas linhas retas de edifícios sem graça da pós-modernidade da terceira fundação de São Paulo, a dos anos 1960. Stockler das Neves projetou e construiu também a terceira, última e monumental Estação Sorocabana, na Praça Júlio Prestes, que hoje abriga a Sala São Paulo.

Esse período de pouco menos de um século foi o da São Paulo concebida como uma Paris tropical. É o período da criação de instituições públicas que revolucionariam nossa mentalidade caipira, as escolas superiores, os institutos de pesquisa, o Instituto de Educação, o Theatro Municipal, em 1911. Não só a cultura erudita nos vinha da Europa, mas uma cultura erudita nativa, nascendo em contraponto com os acordes da viola e as histórias de Pedro Malasartes no marco da Semana de Arte Moderna.

Esse período civilizador foi o único momento civilizado da história urbana de São Paulo, quando a cidade foi de fato cidade. Pouco tempo depois dos fulgurantes festejos comemorativos do quarto centenário de sua fundação, em 25 de janeiro de 1954, explodiu a especulação imobiliária que derrotaria a capital paulista. A pós-modernidade de São Paulo nascia presidida pela lógica do caos, do rentismo especulativo sobrepondo-se ao bem-estar de todos.

Até então, a cidade se desenvolvera. Desde então, a cidade apenas incha, derrotada nas insuficiências. Tudo aqui é insuficiente. Quanto mais metrô se faz, mais insuficiente o metrô fica. Quanto mais hospitais se constroem e se instalam, mais hospitais são necessários. Quanto mais escolas se tem, mais escolas se precisa e menos ensino se consegue. Estamos no reinado de Alice do outro lado do espelho: quanto mais andava, mais distante ficava. Chegamos, finalmente, à lógica dos avessos. Nem o povo é inocente nessa história. Uma cidade que reclama da falta de transporte e queima ônibus todos os dias é uma cidade louca. É melhor chamar o Alienista, de Machado de Assis.

Mas não é só São Paulo. Outras cidades brasileiras tiveram seu momento de esplendor e vivem hoje sua agonia. O caos do Rio de Janeiro, a cidade que já foi maravilhosa e que é hoje a cidade de maravilhas escassas. Até raio cai no Cristo Redentor. Há décadas que o transporte ferroviário em ruínas desafia a paciência dos cariocas, de gente sacrificada no vai e vem cotidiano para o ganho do mal contado pão nosso de cada dia. Os trens ruins e perigosos põem em risco a vida de seus passageiros todo o tempo, com episódios frequentes de terror nos desastres, nas panes, nos bloqueios.

Com muita facilidade e sem muito critério, se fala hoje em cidade e metrópole no Brasil para lamentar o que não temos e o que não somos. Amontoamento de prédios não faz uma cidade. Cidade é um modo de vida em que o redesenho e a racionalização do espaço deve tornar a vida mais fácil, mais simples. Deve agregar qualidade à existência, rapidez, conforto, bem-estar, alegria.

As populações

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