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Política Externa Brasileira

Por:   •  2/5/2015  •  Artigo  •  2.971 Palavras (12 Páginas)  •  234 Visualizações

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UM FANTASMA RONDA O BRASIL: SERÁ O COMUNISMO OU O BENEDITO?

A ROUND THE GHOST BRAZIL: COMMUNISM WILL OR BENEDITO?

Sidnei Ferreira de Vares[1]

COUTINHO, João Pereira; PONDÉ, Luiz Felipe; ROSENFIELD, Denis. Por que virei à direita: três intelectuais explicam sua opção pelo conservadorismo. 1. ed. São Paulo: Três Estrelas, 2014.  p. 111.

João Pereira Coutinho, Luiz Felipe Pondé e Denis Rosenfield são três importantes intelectuais assumidamente identificados ao conservadorismo liberal. O português Coutinho é jornalista e cientista político de formação, com doutorado em ciência política pela Universidade Católica Portuguesa. Também é colunista da Folha de São Paulo e do Correio da Manhã. Pondé é doutor em filosofia pela USP. Ademais é professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), além de colunista da Folha de São Paulo. Rosenfield é analista político. Possui doutorado em filosofia pela Universidade de Paris I. Atua como professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

O livro “Por que virei à direita: três intelectuais explicam sua opção pelo conservadorismo”, está dividido em três partes, cada qual escrita por autor. Todavia, o texto principal é precedido de um belo prefácio escrito por Marcelo Consentino, no qual o ensaísta e editor da Revista Dita & Contradita, introduz o leitor no universo do debate direita/esquerda.

O referido prefácio, intitulado “Quase irmãos”, é muito bem escrito – de leitura fácil e agradável. Há um esforço tácito por parte do autor em alavancar o tema que dá título ao livro.  Inicialmente, Consentino atenta para a tipificação que recai sobre o homem de direita e o homem de esquerda, entendidos, respectivamente, como o “burguês satisfeito de si e indiferente a todo o resto” e o “poeta militante que avança entre barricadas urbanas combatendo todas as forças de opressão com um mosquete e uma flor nas mãos” (CONSENTINO, 2014, p. 7). Afirma, entretanto, que esses estereótipos podem ser facilmente invertidos. Segundo o autor, a dicotomia esquerda/direita não deve ser tomada, a exemplo do filósofo francês Jean-Paul Sartre ou do revolucionário russo Vladimir Lênin, como sinônimo de bem/mal. Isso porque, em termos históricos, os regimes surgidos a partir de processos revolucionários foram marcados pelo radicalismo e pela truculência, conquanto, contrariamente aos regimes fascistas, também radicais e truculentos, não tenham sido punidos pela consciência do tempo. De maneira divertida, o autor argumenta que esquerda e direita identificam-se, nesta ordem, com o progressismo e o conservadorismo. Aliás, sobre esse par de conceitos, Consentino invoca a magnífica obra de Machado de Assis, Esaú e Jacó, cujos personagens, os irmãos Pedro e Paulo – ambos apaixonados pela mesma mulher, Flora – se debatem o tempo todo. Um, monarquista e conservador; o outro, republicano e progressista.  A partir da divertida metáfora machadiana a respeito dos rumos da política brasileira no fim do período monárquico, Consentino procura suavizar possíveis radicalidades contidas nas análises de Coutinho, Pondé e Rosenfield, mostrando que, a despeito dos exageros tanto à esquerda quanto à direita, os três autores primam pela razoabilidade. Porém, ao fim e ao cabo, Consentino defende que, enquanto os esquerdistas (entenda-se revolucionários em geral, marxistas, comunistas, socialistas e afins) pagam pela crença na possibilidade de criar, a partir do zero, uma nova sociedade, os conservadores, mais lúcidos, tendem a rejeitar o ideal de perfeição, à medida que reconhecem a falibilidade humana e, consequentemente, os limites da ação política. Em suma, a apresentação de Consentino, embora erudita e comedida, antecipa o que virá pela frente, a saber, um pesado ataque ao pensamento de esquerda.

Em “Dez notas para a definição de uma direita”, João Pereira Coutinho afirma, não sem uma dose generosa de sarcasmo, que “virar à direita” acontece tanto nas “melhores” quanto nas “piores” famílias. Começa por invocar duas passagens celebres de Jean-Jacques Rousseau – “Os homens nascem livres, mas, no entanto, encontram-se aprisionados em toda parte”, e também, “O homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe” – para demonstrar que, embora atrativo, o discurso de Rousseau – patriarca do sentimentalismo – é, na verdade, falso. Na visão de Coutinho, Rousseau, o inaugurador da filosofia política moderna, é a representação mais fiel do pensamento utópico, perfeccionista e racionalista ao extremo. Crítico ferrenho desse utopismo desmedido, para o autor o pensamento utópico constitui, mutatis mutandis, um discurso unitário, monolítico e, por isso, incapaz de abarcar a complexidade do gênero humano. De início, o autor procura manter-se distante da discussão esquerda/direita, alegando que, para além dessa querela, existem problemas muito mais profundos. Sem dúvida, o mérito de Coutinho está em reconhecer que tanto a esquerda quanto a direita comportam nuances e, certamente, versões mais ou menos radicais. Desta feita, talvez seja mais correto falar-se em “direitas” e “esquerdas”, no plural. Daí afirmar que “um esquerdista moderado é preferível a um direitista reacionário” (COUTINHO, 2014, p.27). É nesse sentido que a discussão que Coutinho envereda por outro caminho. Tributário de Michel Oakeshott, que distingue a “política da fé” da “política do ceticismo”, Coutinho critica as “religiões seculares” – termo criado por Raymond Aron – as quais, em sua visão, tendem à busca da perfeição humana num plano político, vulgarizando a própria noção de política. Não obstante, o autor português aponta, a partir de alguns dos mais importantes representantes do conservadorismo moderno e contemporâneo como Edmund Burke, Friedrich Hayek, Isaiah Berlin e John Kekes, a impossibilidade de se alcançar essa condição de perfectibilidade. Disso decorre sua simpatia pela “política do ceticismo”, segundo a qual o governo é uma necessidade e não como uma solução para os problemas humanos. Avesso às concepções utópicas, Coutinho indica a necessidade de uma “ordem superficial” conduzida por um Estado “mínimo”, sem que isso signifique a reificação deste, pois, em última instância, são os indivíduos, e não as instituições, que dão a tônica da vida social.

A mesma prudência de Coutinho falta ao ensaio de Luiz Felipe Pondé “A formação de um pessimista”. O texto do filósofo pernambucano lembra, inicialmente, um memorial. Porém, conforme avança torna-se trágico e, por fim, cômico. Algumas de suas afirmações são realmente dignas de risos, tais como “aqueles que são mais capazes se incumbem dos encargos mais difíceis, enquanto os demais se aproveitam e, se são de esquerda, valem-se de uma série de argumentos para justificar sua preguiça e sua mediocridade” (PONDÉ, 2014, p. 55). Em que se baseia o autor para fazer tal afirmação? Tratar-se-ia de uma simples opinião, tal como nas conversas filosóficas de boteco? Quem sabe. Voltando ao texto, Pondé relata sua trajetória intelectual, que passa não só pelo ceticismo antigo e moderno, mas também pela tragédia grega, pelo conservadorismo moderno, pelo niilismo e até pelo evolucionismo. Seu “conservadorismo cético” assenta-se em autores muito heterogêneos como Aristóteles, Agostinho, Montaigne, Pascal, Hume, Tocqueville, Burke, Darwin, Dostoiévsky, Nietzsche, Freud, Lacan, Sartre, Oakeshott, Kirk e até mesmo Nelson Rodrigues.  De modo geral, o filósofo sustenta uma visão pessimista da “natureza humana”. Acredita que a “miserável” raça humana está inevitavelmente condenada ao fracasso, sendo a morte a marca mais emblemática de seu melancólico futuro. Paixão, sofrimento e doença dão forma ao horizonte triste, contingencial e sem sentido de Pondé. Talvez isso explique porque a morte (e não a vida) seja o ponto de partida e de chegada de sua análise. Fica a impressão que, ao homem, a única possibilidade é resignar-se frente ao seu fatídico destino. No que se refere à vida em sociedade, Pondé empreende uma longa e enfadonha reflexão teológica, recorrendo inclusive a passagens bíblicas, com vistas a justificar as diferenças entre os indivíduos. Deus, na perspectiva do autor, seria mais benevolente com alguns de seus filhos. A partir de uma visão essencialista, o filósofo defende abertamente a superioridade de alguns poucos homens – grupo do qual ele, Pondé, aposta fazer parte. Daí os riscos da democracia, sistema político onde todos – superiores e inferiores – podem se manifestar. Com efeito, através de sua crítica à razão ocidental, Pondé desloca claramente a discussão do campo da lógica para o campo da passionalidade. O resultado é simples. Parafraseando Dostoiévsky, uma de suas referências, se a razão nada vale quando comparada às paixões, então, tudo é permitido! Em um último delírio, talvez para redimir-se de sua própria miséria, sua condição de intelectual tupiniquim, este estudioso de Nelson Rodrigues deixa entrever a “síndrome do vira-lata” ao afirmar: “Penso como um britânico. Sou, de certa maneira, um iluminista britânico” (PONDÉ, 2014, p.81).

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