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A História No Pensamento De Marx

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Por:   •  18/3/2014  •  9.938 Palavras (40 Páginas)  •  308 Visualizações

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A história no pensamento de Marx

* Professora titular do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, com especialização em história da filosofia moderna, filosofia política e filosofia contemporânea.

Desenvolvimento e devir

Ao evidenciar que a distribuição dos constituintes do processo de trabalho determina a forma da produção, isto é, as relações de produção determinam as forças produtivas, e que a distribuição, pressuposto do processo de produção, é reposta por este como um momento que lhe é imanente, Marx pode elaborar o conceito de modo de produção. Este se define como a determinação das forças produtivas pelas relações de produção e pela capacidade do processo produtivo de repor como um momento interno necessário aquilo que, de início, lhe era externo.

O conceito de modo de produção esclarece uma distinção que opera no tratamento dado por Marx à história: a distinção entre devir e desenvolvimento. O devir é a sucessão temporal dos modos de produção ou o movimento pelo qual os pressupostos de um novo modo de produção são condições sociais que foram postas pelo modo de produção anterior e serão repostas pelo o novo modo. O desenvolvimento é o movimento interno de um modo de produção para repor seu pressuposto, transformando-o em algo posto; refere-se, portanto, a uma forma histórica particular, ou melhor, é a história particular de um modo de produção, cujo desenvolvimento é dito completo quando o sistema tem a capacidade para repor internamente e por inteiro o seu pressuposto. Uma forma histórica está desenvolvida quando se tornou capaz de transformar num momento interior a si aquilo que, no início, lhe era exterior, proveniente de uma forma histórica anterior, ou seja, quando realiza uma reflexão, de tal maneira que a exterioridade é negada como exterioridade para ser posta como interioridade na nova formação social.

O devir temporal se refere ao surgimento das forças produtivas, portanto, às mudanças nas relações dos homens com a natureza, podendo ser pensado como linear, sucessivo e contínuo. O desenvolvimento imanente de uma forma histórica se refere à reflexão realizada pelo modo de produção ou o movimento cíclico pelo qual retoma seu ponto de partida para repor seus pressupostos. No entanto, justamente porque se trata de uma reflexão realizada pela forma histórica, o retorno ao ponto de partida o altera, de maneira que o desenvolvimento não é um eterno retorno do mesmo e sim dialético, atividade imanente transformadora que nega a exterioridade do ponto de partida ao interiorizá-lo para poder conservar-se e, ao fazê-lo, põe uma nova contradição no sistema.

A distinção entre devir e desenvolvimento não significa que Marx não os tenha pensado juntos, pois o devir depende do desenvolvimento, ou seja, do que acontece à forma completa de um modo de produção para que ela possa colocar os pressupostos do modo de produção seguinte: a forma completa termina quando, ao repor completamente seus pressupostos, ela põe uma contradição interna nova que ela não pode resolver sem se destruir. Essa contradição insolúvel é posta por ela e se torna pressuposta na forma social seguinte. O desenvolvimento completo revela a finitude da forma histórica e a expõe à infinitude do devir. Em outras palavras, é impossível pensar o devir sem o desenvolvimento e este sem aquele, pois a sucessão temporal das formas históricas ou dos modos de produção depende da reflexão de cada uma delas ou de seu desenvolvimento completo . O entrecruzamento necessário do devir e do desenvolvimento explica a afirmação “o novo nasce dos escombros do velho”.

Formas pré-capitalistas e forma capitalista

Em Trabalho e Reflexão, J. A. Giannotti (1983) acompanha a exposição sobre as formas históricas pré-capitalistas e a forma capitalista, apresentada de Marx nos Grundrisse, enfatizando que sua principal lição está em mostrar que não podemos encontrar uma matriz única para o social.

Na medida em que a produção pressupõe a distribuição dos componentes do processo de trabalho, verifica-se que um modo de produção tem duas faces, constituídas pelo processo de trabalho: a face ativa do processo, isto é, a divisão social do trabalho, e a face passiva do processo, isto é, a forma da propriedade, determinada pelo modo de apropriação de um dos componentes do processo de trabalho. Nos Grundrisse, Marx denomina situação histórica 1 aquela em que a propriedade é a do objeto de trabalho, da matéria do trabalho. Essa situação histórica ocorre nas formações sociais mais antigas, nas quais a propriedade é a propriedade da terra, ainda que em cada formação social varie a maneira como essa propriedade se realiza (donde a diferença entre a formação asiática, a greco-romana e a germânica). Na situação histórica 2, a propriedade é a do instrumento de trabalho, como é o caso, por exemplo, das corporações medievais, pois embora os artesãos não tenham a propriedade da terra, que pertence aos senhores feudais, entretanto, no interior do processo de trabalho, são proprietários dos instrumentos de trabalho. Na situação histórica 3, a propriedade é o trabalho, ou seja, o trabalhador é escravo. Essas formas de propriedade não são excludentes, mas podem combinar-se de várias maneiras sendo por isso mais importante determinar qual é a propriedade que, embora co-existindo com as outras, predomina e define a formação social, decidindo todo o restante do processo de trabalho e determinando as relações sociais. As situações históricas 1, 2 e 3 constituem o que Marx chama de formas pré-capitalistas da economia.

Como observa Giannotti (1983), ao apresentá-las como situações históricas possíveis, Marx evidencia a impossibilidade objetiva de subordinar o social a uma única matriz, pois esta matriz variará dependendo da forma da propriedade dos componentes do processo de trabalho. Por esse motivo, Giannotti considera que a apresentação das formas históricas possíveis não é a apresentação do devir dos modos de produzir (não é a sucessão temporal dessas formas): o emprego do termo “histórica” para referir-se a cada uma das situações tem o significado amplo de oposição ao que é natural, pois cada situação está referida aos componentes do processo de trabalho e, por conseguinte, à diferença entre o propriamente humano e a natureza. Assim sendo, a expressão pré-capitalista não é tomada no sentido de antecedente do capitalismo, mas o “pré” significa “tudo o que não é capitalista”. É bem verdade, escreve Giannotti, que Marx poderia ter substituído “pré-capitalista” por “não-capitalista”, e se

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