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Oralidade E Escrita

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Por:   •  30/10/2013  •  9.365 Palavras (38 Páginas)  •  505 Visualizações

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ORALIDADE E ESCRITA

A EMERGÊNCIA DO CAMPO DE ESTUDOS

Os estudos que buscam investigar culturas orais e escritas emergiram, sistematicamente, no início dos anos 1960.

Havelock (1995) localiza, entre 1962 e 1963, quatro publicações fundamentais que contribuíram para a constituição desse novo campo de pesquisas. Esses trabalhos, versando sobre temas diferentes e originários de países diversos, tinham em comum o fato de colocarem a oralidade em destaque: em 1962, foram publicados The Gutenberg Galaxy1, de McLuhan, no Canadá, e La pensée sauvage2, de LéviStrauss, na França; em 1963, Jack Goody e Ian Watt publicaram o artigo “The consequences of literacy”3 na Inglaterra, e Eric Havelock publicou Preface to Plato4 nos Estados Unidos.

Naquele momento, as próprias transformações porque passavam os meios de comunicação contribuíram para que a oralidade e a escrita fossem reconsideradas objeto de estudo de destaque, segundo Havelock (1995).

Na mesma direção, Ong (1998) situa nas décadas de 1960 e 1970 esse movimento acadêmico de análise das relações entre culturas orais e escritas.

Os trabalhos realizados nesse período, em diversas áreas de conhecimento, como a Antropologia, a Sociologia e a Psicologia, enfatizaram o caráter oral da linguagem e as profundas implicações, em todos os níveis, da introdução da escrita em culturas tradicionais. Muitas dessas pesquisas debruçaram-se, por meio de trabalhos de campo, sobre sociedades ainda orais, buscando vestígios daquilo que se convencionou denominar oralidade primária: “melodias, cantos, epopeias, danças, exibições e músicas, ainda preservados oralmente e transmitidos de geração a geração entre as sociedades tribais...” (Havelock, 1995).

De maneira semelhante, Cook-Gumperz e Gumperz (1981) situam as origens das pesquisas sobre os efeitos culturais do letramento nos estudos de folcloristas e pesquisadores da área de literatura que investigaram os processos pelos quais os grandes épicos eram transmitidos nas sociedades não letradas, como é o caso dos trabalhos de Lord (1960) e Havelock (1963).

Na avaliação de Ong (1998), pode-se considerar a emergência desses estudos com preocupações semelhantes em um mesmo período histórico como um movimento de redescoberta da oralidade, decorrente do estabelecimento, por Saussure, do primado oral da linguagem. Do mesmo modo, trabalhos de antropólogos estruturalistas realizados anteriormente haviam analisado a tradição oral em sociedades sem escrita. Para Ong (1998), a “novidade” dos estudos mais recentes estava na preocupação dos pesquisadores em contrastar, realizando oposições, a oralidade e a escrita, em diversos níveis. Nesse sentido, diversos autores (por exemplo, Ong, 1998 e Havelock, 1995) citam o trabalho de Milmam Parry, na área de estudos literários, ainda nos anos 1920 na Iugoslávia, como um dos marcos iniciais desse novo campo de estudos. Na tese L’épithète traditionelle dans Homère5, publicada em Paris em 1928, Parry analisou a Ilíada e a Odisseia, trabalho que teve prosseguimento na obra de seu discípulo Albert Lord que, em 1960, publicou The single of the tales6.

Naquele momento, Lord divulgou o material que Parry havia recolhido entre bardos, com uma análise dos cantores tradicionais iugoslavos. Havelock cita ainda diversos outros trabalhos que antecederam a década de 60 e que, de algum modo, haviam se dedicado ao contraste entre oralidade e escrita como, Ramus: method and decay of dialogue7, de Walter Ong, publicado em1958.

Estudos dessa ordem provocaram também um novo interesse pela palavra escrita e seu principal suporte contemporâneo: o texto impresso e, em particular, o livro. Nessa direção, destacam-se algumas obras que centraram suas análises nas consequências da palavra escrita e impressa em sociedades e épocas determinadas, como é o caso de L’apparition du livre8, de Henri-Jean Martin e Lucien Febvre, publicado em 1958, e The printing press as an agent of change: communication and cultural transformation in early modern Europe9, de Elizabeth Eisenstein, publicado em 1979. Os efeitos da introdução da escrita e da imprensa em sociedades não letradas têm sido, pois, uma das principais questões que norteiam esse novo campo de estudos.

Segundo Havelock, o desenvolvimento crescente, a partir dos anos 60, de pesquisas no campo de estudos que investiga as relações entre o oral e o escrito, coloca, na atualidade (o texto foi escrito em 1987), os conceitos de oralidade e de oralismo em uma situação diferente da que ocupavam anteriormente, ganhando maior importância acadêmica. Esses conceitos contribuem para a caracterização de sociedades que, dispensando o uso da escrita, têm se valido da linguagem oral em seus processos de comunicação.

As expressões têm sido utilizadas também para identificar certo tipo de consciência, supostamente criada pela oralidade (Havelock, 1995). Essas preocupações têm sido centrais nos estudos realizados nesse campo.

Os diversos tipos de culturas

Alguns autores, em estudos realizados sobre as relações entre oralidade e escrita, têm, pois, tipificado as diferentes culturas, a partir do papel que nelas ocupam as palavras oral e escrita. Ginzburg (1987), por exemplo, ao estudar as leituras do moleiro Menocchio, buscou investigar se o fato de os leitores estarem mergulhados em uma cultura predominantemente oral não interferia na recepção do texto, modificando-o, remodelando-o, chegando mesmo a alterar sua natureza. Em que medida, então, a oralidade modelava certos padrões de leitura, que interferiam na relação com o texto escrito? Mas o que seria um “contexto marcado pela oralidade”? As culturas pouco letradas possuiriam características tão particulares que as fariam distintas das demais? Existiria um modo de pensar especificamente “oral”? De que “oralidade” se está falando? As tipificações realizadas pelos autores não provocariam uma dicotomia entre o oral e o escrito, que não corresponderia à grande parte das realidades?

Ong (1998) estabelece uma distinção entre o que denomina “oralidade primária” e “oralidade secundária”. A primeira refere-se à oralidade das culturas intocadas pelo letramento ou por qualquer conhecimento da escrita ou da imprensa ou, ainda, a das pessoas totalmente não familiarizadas com a escrita.

Por sua vez, a “oralidade secundária” refere-se à atual cultura de alta tecnologia, em que uma nova oralidade é sustentada pelo telefone, rádio, televisão e outros meios eletrônicos que, para existirem e funcionarem, dependem da escrita e da imprensa. Segundo Ong, na atualidade, não existe cultura de oralidade primária no sentido

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