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Diferentes concepções de história a partir das diferentes concepções dialéticas entre Marx e Hegel.

Por:   •  18/10/2016  •  Dissertação  •  2.073 Palavras (9 Páginas)  •  419 Visualizações

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As diferentes concepções de história a partir das diferentes concepções dialéticas entre Marx e Hegel.

Sobre este trabalho, cabe já estabelecer o cerne da discussão, que consistirá em apresentar as diferentes concepções dialéticas entre Marx e Hegel para, paulatinamente, compreender-se as diferentes concepções de História entre ambos. Contudo, ao acolher tal questão central, não pretende-se deixar de incluir outras questões entre os dois pensadores que poderão incitar tanto a reflexão como o aprofundamento desta análise, pois o pensamento de ambos, comumente, não são facilmente desmembráveis (e nem devem ser).
Dado o caminho que este texto seguirá, é importante explicitar os diferentes conceitos de tempo, indispensáveis para se pensar na História. Enquanto os gregos antigos pensavam em um tempo cíclico, uma história em decadência que em sua extremidade daria início a um novo ciclo, surge uma nova concepção a partir do Cristianismo: sua lógica escatológica, isto é, que dita o final da espécie humana e do mundo, coloca em voga um tempo linear e, por último, apresenta-se como uma teleologia. Eis que surge, então, Hegel para propor uma outra forma, ainda original, de tempo, entendendo este como uma espiral. Tal concepção será explicada melhor ao longo da análise, porém já é de se supor que é uma junção, ainda que muito complexa, das ideias de tempo cíclico dos gregos com a do tempo linear dos cristãos, podendo-se adiantar que o tempo em espiral, ou a História em espiral, ao mesmo tempo que ocorre em ciclos distintos, também aponta-se para frente, positivamente, através de sua renovação, ou num sentido mais marxista, através de revoluções.
Tal História em espiral se conforma dentro da visão dialética de mundo, como uma forma de se negar o universalismo da Razão, e também negando a expressão mais romântica, como em Rousseau, que faz apologia à paixão, ao desejo, em detrimento da própria Razão. Ao contrário de conclusões mais apressadas, a de que Hegel se coloca neste meio termo, ele na verdade propõe algo muito mais complexo e inovador, tentando prestar conta às lacunas deixadas naquelas outras teorias. Pois, se o tempo segue uma ordem progressiva, mas não mais simplesmente linear, deve haver na história do homem algo de comum, que não cessa aos fins dos ciclos, portanto universal, e também algo de particular em cada uma dessas passagens cíclicas que vão se renovando. É precisamente daí que já inicia-se a análise dialética em Hegel, que é a lógica do mundo que dá conta de pensar no particular e no universal, simultaneamente.
Se se pensar que há algo de universal no mundo, como uma “vontade divina”, entende-se que, por exemplo, ao pensar no ser humano, deve haver alguma característica de tal forma fundamental em todos eles, para que possamos pensar nessa categoria particular e diferenciar dos demais seres vivos. Então, o que diferencia o Ser Humano? Para Hegel, a natureza do ser humano é variável e histórica, pensando no tempo em espiral. Portanto, o ser humano é naturalmente histórico, e a História é a própria natureza humana, e é em virtude dessa máxima que Hegel não deslocará o humano do percurso da História. Agora a Filosofia e a História não se cindem mais, pois a História é essencialmente filosófica, enquanto a Filosofia, por sua vez, é essencialmente histórica, isto é, Hegel pensa em um substrato comum em todo esse movimento, que chama de Espírito Universal (Ratio), o qual é a essência natural da vida.
Deve-se, para Hegel, buscar na História aquilo que há de essencial, o “fim universal”, uma atenção filosófica que retire as circunstâncias exteriores, pois “importa levar à história a fé e o pensamento de que o mundo do querer não está abandonado ao acaso” (1), o que pressupõe a “razão divina”, que é o ordenamento que impulsiona o espírito na História, dialeticamente. A partir daí é que se eleva a “história universal filosófica”, em que dará conta da totalidade dos diversos pontos de vista, escamoteando sempre a contingência de suas preocupações. Porém, surge um problema: como identificar aquilo de universal na história? Hegel responde que “determina o essencial e o inessencial segundo o fim que, no tratamento da história, persegue” (2), e desta forma a razão, o poder infinito das coisas se realizarem, aparece como uma organização hierárquica dos sentimentos, aquilo que ultrapassa e dá conta das contradições do que é particular e do que é universal na História, restando aquilo que é mais positivo mediante a determinação recíproca do Universal com o particular.
Um exemplo deste movimento dialético mostra-se quando Hegel, ao tentar demonstrar sua concepção de tempo em espiral e suas consequências, expõe que “o rejuvenescimento do espírito não é um simples retorno à mesma figura; é purificação e elaboração de si mesmo” (3). Ou seja, é o movimento dialético do progresso, pois concilia o particular, que são os momentos de transição de diferentes histórias, ciclos efêmeros e passageiros, com o universal, que constitui o bem maior, conformando-se com a razão divina e, desta forma, apontando para um movimento positivo. O que cai no fracasso, perde o potencial de essência do espírito.
Assim posto, é possível compreender que a História para Hegel é a constante formação da auto-consciência, sempre se renovando e se elaborando, como demonstra o parágrafo anterior. O espírito, enquanto uma comunidade de auto-consciências que se alteram umas às outras, não se destroem, e sim se constroem recíproca e positivamente. Todos os fenômenos da história, tanto os mais particulares, devem ser explicados pelos caminhos dessa providência divina, ou melhor dizendo, dessa Razão Universal, que possui o seu dever-ser do mundo (Telos). Logo, para captar a realidade, cabe ao historiador se atentar à forma da divina providência, a que se chama de “Deus”, segundo ordena a convicção de que é a Razão governou e governa o mundo.
Portanto, cada povo em particular, com suas diversas paixões em enfrentamento, conduzirá à conciliação com o fim universal. Nessa dialética, então, as paixões dentro de um povo específico, particular, em confronto, irão determinar historicamente um novo fim, e inversamente, o Universal terá de dar harmonia a este espírito. A razão tem que ser capaz de compreender em si as multiplicidades das paixões para estas se realizarem no universal, através do que se chamou de hierarquização dos sentimentos. É justamente por isso, concluindo o pensamento de História para Hegel, que se deve compreender a lógica universal dentro das próprias particularidades no movimento histórico em espiral.
Enquanto que para Hegel o sujeito histórico era o espírito, mediado segundo as leis da providência divina (razão), para Karl Marx o sujeito histórico surge através da luta de classes, e estaria aí a História de todas as sociedades até hoje. Porém, é quando Marx vai analisar especificamente a sociedade Capitalista, que se vê diante um mundo historicamente dialético. É no contexto da economia política do Capital que este último pensador percebe um movimento contraditório, portanto dialético, só que desta vez, distinto do de Hegel. Jorge Grespan chama isso de “dialética do avesso”, que empresta de Hegel toda sua parte racional para depois negar o componente “mistificador” de tal lógica.
Para Marx, quando há “coisas que aparecem de forma distinta do que são essencialmente distinguem-se dois níveis de realidade - o da essência e o de suas manifestações. (…) É a própria essência, contudo, que determina esta sua forma diferente de manifestação, e só o faz por ser contraditória” (4). Cabe ressaltar, então, que não é em qualquer objeto que Marx vai enxergar movimentos dialéticos, apenas fazendo uso dessa lógica hegeliana quando se depara com um objeto contraditório, tal qual será o capitalismo histórico. Por isso, a dialética dentro da realidade material é uma condição histórica, e não mais em qualquer realidade como pensava Hegel.
A partir da constatação desse idealismo hegeliano que transfigura a lógica dialética para além da realidade, de fato, é que Marx vai diferenciar sua dialética, agora materialista, da “mistificada” de Hegel. A dialética, agora, não pode subir ao céu, ou seja, situar-se acima de qualquer suspeita da sua realidade enquanto um tempo determinado, pois a Natureza e o Espírito são contraditórios historicamente, tanto nas sociedades de classe, em geral, quanto da capitalista, em especial. Para Marx, ao contrário de Hegel, “o ideal não é mais do que material, transposto e traduzido na cabeça do homem” (5), desta forma, é a própria materialidade que rege toda a história do capitalismo e suas manifestações espirituais.
Em relação à dialética, o irredutível não é mais a ideia ou o espírito, como antes, mas a vida material, e entende-se que os homens não realizam mais os ideais do Espírito Universal regidos por providência, sendo assim, o processo histórico passa a ter seu princípio neste próprio mundo material. Na realidade, seria esse Espírito Universal que se realizaria, ilusoriamente, a partir de processos materiais dentro do capitalismo, como a propriedade privada dos meios de produção e a divisão social (imposta) do trabalho. Tudo passa a ser determinado pela economia, e a dialética consiste em que a separação dos indivíduos, quanto às maneiras de produção, vão os tornando, inversamente, mais dependentes uns dos outros,  configurando a plena dependência ao mercado como fonte máxima de subsistência de todos. Resumindo, a partir da dialética do todo com o particular, quanto maior esse tipo de individualização (separação dos meios de produção e a divisão social do trabalho), maior o poder do todo, e doravante, menos o poder dos indivíduos na história.
Como o processo da História ocorre pelas exigências materiais e das relações sociais que delas emergem, a sociedade se movimenta, evolutivamente, determinando-se por meio da dialética de grupos antagônicos, que agora convém chamar de “classes”. Essa análise, que inverte a dialética hegeliana, demonstra um caráter transformador, ou para muitos, revolucionário: o antagonismo de classes, com seu princípio na vida material, não terá competência para conciliar harmoniosamente as contradições do aparente como no idealismo, e dessa forma, travará uma eterna disputa pelo fim destas mesmas contradições. As contradições do fenômeno, portanto, explicar-se-á numa contradição ainda mais irredutível, a realidade material do capitalismo, a saber o mercado (global), que será compreendido como um evento da História, como um processo, que, naturalmente histórico, deverá ser superado através de elementos transformadores e revolucionários. Afinal, este é a teleologia da lógica dialética em Marx, que definitivamente é resgatada a partir do próprio Hegel, fundamentada na ideia de tempo em espiral, ou seja, ciclos que se encerram e se reciclam, criando novas formas históricas de vida (material), positivamente.
Concluindo, Marx não parece ver o processo histórico como providencial. As leis não surgem para satisfazer uma razão divina, como em outro momento foi o Estado para Hegel o potencial conciliador das pendências privadas, pois a própria organização jurídica funda-se a partir dos preceitos da propriedade privada, que ,em seus mais altos graus de complexidade, torna-se um verdadeiro monstro em relação a subjetividade dos homens, um poder estranho muito diferente do poder conciliador do Estado hegeliano.
Entretanto, a História marxista não deixa de estar nas mãos dos próprios homens, e é nesse sentido que a práxis entra em vigor, que é a de exercer, coletivamente, a consciência de que são sujeitos da História, ao invés de deixar o Capital se transfigurar como um suposto agente da mesma, como muito se acreditou na “mão invisível” de Adam Smith. Por último, o fim universal de Marx é a suplantação do Mercado Mundial, este que deverá passar a ser visto durante um processo histórico futuro como um mero objeto e não mais como sujeito, como antes era determinado através do fetichismo, onde se cria o mundo mas não se reconhece.





Notas:

(1) -
HEGEL, G. A Razão na História. Introdução à filosofia da historia universal. Lisboa: Edições 70, 1995. Pág. 32.

(2) -
HEGEL, G. A Razão na História. Introdução à filosofia da historia universal. Lisboa: Edições 70, 1995. Pág. 35.

(3) -
HEGEL, G. A Razão na História. Introdução à filosofia da historia universal. Lisboa: Edições 70, 1995. Pág. 37.

(4) -
GRESPAN, Jorge. “A dialética do avesso”. In: Crítica Marxista nº14. São Paulo: Boitempo, 2002, Pág. 27.

(5) -MARX, Karl.
O Capital : crítica da economia política : Livro I : o processo de produção do capital; [tradução de Rubens Enderle]. - São Paulo : Boitempo, 2013. Pág. 90.


Bibliografia:

-
GRESPAN, Jorge. “A dialética do avesso”. In: Crítica Marxista nº14. São Paulo: Boitempo, 2002.

- HEGEL, G.
A Razão na História. Introdução à filosofia da historia universal. Lisboa: Edições 70, 1995.

- MARX, Karl.
A Ideologia Alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.

- MARX, Karl.
O Capital : crítica da economia política : Livro I : o processo de produção do capital; [tradução de Rubens Enderle]. - São Paulo: Boitempo, 2013.

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