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A Lírica Trovadoresca Na Música Popular Brasileira

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Por:   •  24/3/2014  •  2.854 Palavras (12 Páginas)  •  514 Visualizações

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A Lírica Trovadoresca na Música Popular Brasileira

A lírica trovadoresca medieval, exemplificada nas “cantigas de amor” e “de amigo”, nas “cantigas de escárnio” e “de maldizer”, permanece nas diversas formas e estilos da poesia e da música brasileiras. Vinculada à tradição oral, essa expressão artística foi disseminada entre povos de tempos e territórios diversos através dos jograis, homens do povo, cantadores andarilhos que, nas suas peregrinações, romarias e procissões, entoavam ao som do alaúde, da flauta e da viola as composições de autoria própria ou dos trovadores e menestréis. Estes últimos eram músicos profissionais conceituados da corte, enquanto os primeiros eram compositores de origem nobre.

No percurso de tempos e geografias, as cantigas líricas foram sendo modificadas. Porém, foram preservados os aspectos pertinentes a sua origem grega: uma poesia composta para ser cantada ao som da lira, em que o texto poético mantém a intersecção com o texto musical, uma regularidade métrica e rítmica, nas construções estróficas em sextilhas, em décimas, e nos versos emparelhados.

Nesse trabalho, objetivamos demonstrar a presença do Trovadorismo na música popular brasileira, destacando os traços da poesia medieval nas letras de três músicas contemporâneas, através da interpretação de canções que resgatam o sentido das cantigas de amigo e cantigas de amor, nos seus aspectos formais e temáticos. Concentramo-nos mais nos aspectos temáticos, considerando que a cantiga, nem mesmo quando se destinava ao registro escrito, era elaborada em um molde fixo, justificando-se, talvez nesse dado, a flexibilidade do molde.

Para tanto, lançamos mão de leituras sobre as canções “Queixa” de Caetano Veloso, considerada pela crítica como uma cantiga de amor, e “Sozinho”, de Peninha, como uma cantiga de amigo; e “Incelençapro amorritirante”, de Elomar Figueira. Esta última trata-se da junção de tipos diferentes de cantigas e se distancia das duas primeiras, não somente pela mescla de tipologias, mas também pela ambientação no universo do sertanejo e pela maior fidelidade ao registro oral. Antes, porém, faremos uma incursão no contexto geral do Trovadorismo, suas origens e características.

O surgimento Trovadorismo, na Península Ibérica, se deu no século XI, momento em que a Europa alcançou o ápice do feudalismo, modelo econômico sustentado na relação de senhorio e vassalagem, tão bem representada nas cantigas de amor. O período também é marcado pelas Cruzadas, expedições guerreiras, empreendidas por cristãos e mulçumanos, sob o argumento de libertar os lugares de adoração que se encontravam sob o domínio árabe. Razão pela qual o homem amado das cantigas de amigo está sempre distante.

No período medieval, a transmissão cultural se dava, quase sempre, por meio da oralidade, através dos jograis, recitadores e cantadores de origem comum que, diferente dos trovadores, nobres que compunham por prazer, andavam pelas aldeias, nas romarias e cortejos, fazendo demonstrações de seu repertório poético e musical, ou mesmo na lida tangendo animais, ou realizando negócios (SARAIVA & LOPES, 1995).

Da extensa produção literária de Portugal, dos séculos XII ao XIV, chegaram até nossos dias os textos que compõem o Cancioneiro da Ajuda, o Cancioneiro da Biblioteca Nacional, e o Cancioneiro da Vaticana. Avultuam nessas coletâneas as obras de monarcas portugueses, com destaque para a obra de D. Diniz (1279-1325), o rei trovador, encontradas em um fragmento de pergaminho na Torre do Tombo. A D. Diniz, além da herança poética, é atribuída a ordem para que fossem organizadas as antologias contendo sua vasta produção lítero-musical e a de seu avô, D. Afonso X, bem como de outros trovadores de linhagem real.

Vale lembrar que nem sempre a composição e a letra de uma cantiga eram feitas por um único autor. Muitas melodias, compostas por pessoas do povo, como os já citados jograis, eram adaptadas às letras compostas pelos trovadores e menestréis, aos quais era dado o status de artistas superiores pelo usufruto do título de nobre ou por serem poetas que estavam sob as graças da corte.

No Brasil, a herança trovadoresca se faz presente da entrada do povo português nas terras de “Caramuru” ao projeto nacionalizante do Modernismo. Na poesia catequética do Padre José de Anchieta, apenas para ilustrar, as técnicas orais de repetição mnemônicas percorrem as quadras de versos curtos e musicados, em freqüente louvação à “senhora toda-poderosa”, representada pela mãe de Jesus Cristo.

Na lírica do Arcadismo, os cenários campesinos, de fontes cristalinas e musas-pastoras evocam os motivos da cantiga de amigo. A referência aos bosques, aos encontros marcados à beira dos mananciais e os desencontros dos namorados perpassam do Neoclassicicmo ao Romantismo, no qual o lastro do Trovadorismo é dado, dentre outros, nos motivos da cavalaria, na concepção idealizante do herói e da mulher, e na simbiose do homem-natureza.

Os artistas do Modernismo não diferem de seus antecessores e até intensificam, pela pesquisa das origens brasileiras, a apropriação da herança trovadoresca medieval. Nas palavras de MALEVAL (1999, p. 03), “essa apropriação redundou também na recriação de numerosas cantigas de amigo paralelísticas que, como sabemos, é o mais autóctone dos gêneros dos Cancioneiros medievais”. Segundo a autora, no início do século XX houve um movimento artístico denominado neotrovadorismo que teve como expoentes escritores brasileiros de renome, como Guilherme de Almeida, Manuel Bandeira e Augusto Meyer. É também consenso para a crítica literária a presença de marcas ibéricas na poética de Cecília Meireles, notadas na escolha do tipo de metro, na cadência dos seus versos melódicos e na estrofação com preferência para as quadras e sextilhas ora em dísticos, ora em tercetos.

A cantiga lírica ibérica resgatada ao longo da história da formação de uma cultura brasileira de inspiração européia, segundo a maior parte dos estudos já realizados sobre o assunto, é a que a que se filia aos trovadores provençais do Sul da França, região que, a partir do século XII, se tornou um centro difusor da atividade poética. De onde D. Diniz declara a influência: “Quer eu em maneira de proençal/ fazer agora un cantar d amor” nos seus galanteios amorosos “e querreimuit i loar mia senhor”.

Para o trovador provençal, o amor equivale a um princípio e, ainda que seja inatingível, não espera recompensas. Da temática e da posição assumida pelo eu-lírico, em relação à pessoa amada, é que as cantigas líricas são classificadas, como sendo cantiga de amigo ou de amor.

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