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APROXIMAÇÕES DISCURSIVAS E LITERARIAS SOBRE A CARTA DE PERA VAZ DE CAMINHA

Por:   •  26/8/2019  •  Artigo  •  4.406 Palavras (18 Páginas)  •  202 Visualizações

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RESUMO:

O presente trabalho busca realizar aproximações entre conceitos de Análise do Discurso e Literatura através da noção de texto, analisando sua materialidade linguística, sua relação com a historicidade e com as condições de produção. Para tanto reuni alguns fragmentos da carta endereçada ao Rei D Manuel de Portugal enviada em 1500 D.C. por Pero Vaz de Caminha, em que relata sua chegada ao que ficaria conhecido como Brasil e os primeiros contatos do colonizador com os povos autóctones. Através de pressupostos teórico-metodológicos da Analise do Discurso de linha francesa e de conceitos apresentados por PECHEUX (1998) ORLANDI (2008/2015) BOSI (2006) e OUTROS, procuro observar entre outros aspectos, as formações discursivas e ideológicas presentes no texto.

Palavras-Chave: Analise do Discurso, Literatura, Colonização.

INTRODUÇÃO:

        Este trabalho, desenvolvido como atividade avaliativa para a disciplina de Estudos Linguísticos: Discurso da Universidade Federal de São Carlos, direcionado e embasado pelos pressupostos teórico-metodológicos da Analise do Discurso (AD) francesa, tem como tema o discurso do colonizador presente na Carta de Pero Vaz de Caminha, observado na descrição que faz do Outro e da terra; um discurso que se considera detentor do poder e da razão e que “justifica” as diversas atrocidades cometidas aos povos originários dessa terra.

        O dialogo que busco estabelecer com a literatura visa observar como se deu a recepção deste documento em seu contexto de publicação no Brasil já em 1817, anos que antecedem a independência do país e toda a discussão sobre os conceitos de História nacional, identidade e nacionalidade que seriam impulsionados principalmente pelos movimentos literários do séc XIX, a saber, o Romantismo e o Realismo.

        Esses são aspectos fundamentais para compreender a natureza desse dialogo. Diante do que foi exposto, apresentarei a seguir apenas algumas ferramentas disponibilizadas pela AD para auxiliar a analise da Carta. Posteriormente, antes de enfim nos debruçarmos sobre o documento, o situarei em seu contexto histórico de escritura e publicação (quando o vemos alçado a categoria de literatura de informação) e verificaremos por meio da língua em uso conceitos como o de Ideologia, Sujeito, Formação Ideológica e Formação Discursiva.

1. PRESSUPOSTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS

1.1 A Analise do Discurso de linha francesa

        A AD surge no final da década de 1960, na França e tem como seus precursores Michel Pêcheux e Jean Dubois, através das releituras que realizam de pensadores como Louis Althusser e a leitura que faz de Karl Marx e o Materialismo Histórico, e Jacques Lacan e sua leitura de Freud e a Psicanalise. Orlandi (2015, p.18), assim define a AD:

“Herdeira das três regiões de conhecimento – Psicanalise, Linguística, Marxismo – não o é de modo servil e trabalha uma noção – a de discurso – que não se reduz ao objeto da Linguística, nem se deixa absorver pela Teoria Marxista e tampouco corresponde ao que teoriza a Psicanalise. Interroga a Linguística pela historicidade que ela deixa de lado, questiona o Materialismo perguntando pelo simbólico e se demarca da Psicanalise pelo modo como, considerando a historicidade, trabalha a ideologia como materialmente relacionada ao inconsciente sem ser absorvida por ele.”

Esse referencial teórico nos possibilita compreender que nenhum discurso é individual e tem origem no sujeito, mas se mostra como uma sobredeterminação de outras falas. E, não sendo individual, possibilita-nos observar as fontes que compõe esse discurso. Ou seja, a AD não concebe os indivíduos como donos de suas vontades, livres para dizer o que quiserem, com intenções dirigidas por plena consciência. A noção de sujeito da AD é a de um sujeito constituído pela língua, pela historia, pela ideologia e pelo esquecimento. Nesse aspecto, Orlandi (2015 p.30) nos esclarece que “o dizer não é propriedade particular. As palavras não são apenas nossas. Elas significam pela história e pela língua. O que é dito em outro lugar também significa nas nossas palavras”.

Tendo em vista algumas das perspectivas teóricas apresentadas que norteiam a noção de discurso, podemos observar em Caminha, não apenas um sujeito que escreve em meados do século XVI, mas sim, muitos discursos que falam por meio do texto escrito por ele. Nesse sentido, passarei a partir de agora a delinear alguns dos conceitos referidos acima e que serviram de base para a análise da Carta.

1. O conceito de Ideologia

Segundo Chaui (apud Brandão, 2014, p.19), esse conceito nasce como sinônimo de atividade científica que busca analisar as faculdades mentais, mais especificamente os atos de pensar, os enxergando como formas naturais que exprimem a relação do corpo com o ambiente.

Contrariando esse significado original, a ideologia passa a ser vista então como uma doutrina sectária, sem fundamento objetivo e, acima de tudo, como um perigo a ordem até então estabelecida.

A partir dos diálogos traçados pela AD temos uma definição de ideologia que não pode ser desvinculada da língua, pois sua materialidade se da na produção discursiva. Em concordância a essa afirmação, Orlandi (2008, p.55) expressa que “a ideologia tem uma materialidade, e o discurso é o lugar em que temos acesso a essa materialidade”.

Nesse sentido, temos, na Carta de Caminha, a materialização do discurso do colonizador português, ou então, a materialidade do discurso de que Caminha é reprodutor. Seria impossível que fosse diferente. Caminha não consegue não inserir-se em um determinado campo ideológico, ele é na verdade submerso por essa ideologia que o interpela como sujeito, que significa suas palavras ao escrever e descrever os nativos, seus costumes e a terra.

1.3 O conceito de Sujeito

        O sujeito, como vimos, não é o autor do discurso, ou aquele que inaugura com seu texto uma significação para aquilo que esta textualizando. Caminha também não o é. Ao descrever os nativos, não o faz por meio de suas próprias escolhas de palavras, pois, como já vimos ele é interpelado pela ideologia que o constitui em sujeito.

        Essa constituição do sujeito se situa paradoxalmente no interior desse individuo que não sendo totalmente livre nem totalmente submetido, se forma em um espaço de tensão, pois ao mesmo tempo em que é interpelado pela ideologia que o determina, também ocupa um espaço que é somente seu.

        Caminha, portanto, escreve a partir de um lugar único, uma posição que ocupa enquanto escrivão, que determina o quem diz dentro do discurso. Entretanto, o sujeito para quem é dito, nesse caso o rei de Portugal, também determina a escrita da Carta, por limitar as possibilidades do que dizer e como dizer.

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