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TCC SOBRE CLÁSSICOS

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Por:   •  1/9/2014  •  10.098 Palavras (41 Páginas)  •  1.159 Visualizações

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UMA VISÃO SOBRE O INCENTIVO DA LEITURA DOS CLÁSSICOS ORIGINAIS A PARTIR DE SUAS ADAPTAÇÕES

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado à Universidade Paulista – UNIP – como requisito para obtenção do título de graduação em Letras –Português/Inglês

Orientação: Prof.ª Ana Lúcia Machado

Pólo Itajobi

2013

BELENICE APARECIDA SCHINCAGLIA GONÇALVES

DAIANA DI PAULA DEFENDI

UMA VISÃO SOBRE O INCENTIVO DA LEITURA DOS CLÁSSICOS ORIGINAIS A PARTIR DE SUAS ADAPTAÇÕES

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado à Universidade Paulista - UNIP, como requisito para obtenção do título de graduação em Letras –Português/Inglês.

Aprovado em:

BANCA EXAMINADORA

_______________________/__/___

Prof. Nome do Professor

Universidade Paulista – UNIP

_______________________/__/___

Prof. Nome do Professor

Universidade Paulista – UNIP

_______________________/__/___

Prof. Nome do Professor

Universidade Paulista UNIP

DEDICATÓRIA

De Belenice Aparecida Schincáglia Gonçalves,

Dedico este trabalho, às minhas três pequenas princesas, Júlia, Maria Clara e Isabela, que, em sua inocência souberam ser pacientes e compreensivas.

Ao meu esposo Júlio César, por me dar força e apoio em cada obstáculo encontrado no caminho.

Ao meu pai, Wilson, por estar ao meu lado em todos os momentos de minha vida e à minha mãe, Luíza, que, apesar de não estar mais em nosso meio, sei que torce por mim onde quer que esteja.

À minha sogra Odette, que, na ausência de minha mãe tenta suprir esta falta, me dando forças quando mais preciso.

À minha colega de curso Daiana, que no decorrer destes três anos se mostrou muito amiga e companheira.

De Daiana di Paula Defendi,

Dedico este trabalho à minha amiga Belenice, que me deu infinitos exemplos de determinação e comprometimento, e à Marisa, que me ajudou a compreender que todos os objetivos traçados com amor são as decisões mais acertadas e que podem se tornar realidades concretas.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos em primeiro lugar a Deus, por nos dar força, serenidade e paciência para vencermos cada etapa desta caminhada.

Agradecemos às nossas famílias por serem os esteios de nossas vidas.

Agradecemos à professora orientadora Ana Maria Machado por nos direcionar nesta pesquisa, nos ajudando a atingir os objetivos desejados.

Agradecemos ao professor Bruno César dos Santos, por nos ajudar nas prévias do trabalho de curso, sempre colaborando e pronto a responder nossos questionamentos.

Agradecemos ao professor e tutor presencial Clesner Menegoli, por ter sido extremamente presente e incentivador nestes três anos de caminhada, se prontificando a nos esclarecer todas e quaisquer dúvidas.

Agradecemos à secretária do Pólo, Dona Arlete, pelo apoio e dedicação.

.

“A leitura é uma fonte inesgotável

de prazer mas por incrível que pareça,

a quase totalidade, não sente esta sede”.

(Carlos Drummond de Andrade)

RESUMO

A inapetência dos jovens pela leitura de obras da literatura clássica é algo preocupante, pois a tecnologia com a qual estão habituados muitas vezes oferece muitos outros atrativos, o que os distancia desta atividade e faz com que sua formação pessoal e profissional seja prejudicada; é necessário, portanto, que sejam incentivados a realizar tal prática. O objetivo deste trabalho é analisar as possibilidades de incentivar a leitura de obras clássicas pelos alunos do ensino fundamental por meio de clássicos adaptados, as mudanças estruturais existentes em tais obras em relação às originais e verificar se realmente suprem a necessidade da leitura do jovem e sob quais aspectos. Esta pesquisa teve como objetos de estudo duas obras, Iracema, de José de Alencar, e uma obra adaptada deste clássico, Iracema em cena, de Walcyr Carrasco, que foram analisadas a fim de comparar as diferenças estilísticas e lingüísticas existentes entre elas e a partir deste estudo podem ser observados os ganhos e perdas que podem ocorrer quando da leitura das obras adaptadas antes das originais. Neste trabalho pode ser analisada a importância da leitura dos clássicos originais em oposição à das obras adaptadas.

Palavras-chave: Leitura. Obras adaptadas.

ABSTRACT

The appetite of young people for reading classic literature books is a matter of concern because technology, which they are used to, offers many attractions, distances themselves from such activity and makes both their personal and professional training to be impaired. Therefore, they need to be encouraged to reading. This work aims to analyze the possibilities of reading incentives by young people through adapted books, structural changes found in such works compared to original ones and to verify whether they meet young people’s reading needs and in which aspects. This research has two works as its study objects, Iracema, written by José de Alencar, and its adapted version Iracema em cena, written by Walcyr Carrasco, which were analyzed in order to compare stylistic and linguistic differences found between them. Thus, gains and losses that may occur when adapted books are read before original ones are observed. Through this work the importance of reading original books rather than adapted ones can be analyzed.

Keywords: Reading, adapted books.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

CAPÍTULO 1: A LEITURA DOS CLÁSSICOS 14

1.1 literatura de massa 21

1.2 a presença dos clássicos na formação crítica do cidadão 22

CAPÍTULO 2: OS CLÁSSICOS ADAPTADOS 24

2.1 técnicas de adaptação de obra 28

2.2 a presença de metáforas nas obras literárias 30

CAPÍTULO 3: A ANÁLISE CONTRASTIVA ENTRE A OBRA “IRACEMA” DE JOSÉ DE ALENCAR E A ADAPTAÇÃO “IRACEMA EM CENA” DE WALCYR CARRASCO 32

3.1 a simplificação do vocabulário: substituição lexical 35

3.2 a ocorrência das metáforas e comparações na obra original 38

3.2.1 caracterização das personagens 40

3.2.2 A expressão dos sentimentos 41

3.3 a substituição das metáforas e a ausência de comparações na adaptação 42

CONCLUSÃO 44

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 45

INTRODUÇÃO

Dentre a população alfabetizada, os indivíduos que desenvolvem apetência pela leitura e capacidade de leitura crítica representam uma pequena porcentagem e, em se tratando de literatura, principalmente clássica, o número de leitores é ainda menor.

Uma das funções da escola é a formação de leitores, contudo, as novas gerações, hábeis na utilização de novas tecnologias encontradas na televisão, computadores, celulares, internet e redes sociais dedicam muito pouco tempo à leitura. Os alunos se sentem muitas vezes obrigados a ler apenas para fazer provas, ou seja, a leitura é algo imposto em um determinado período de tempo, o que torna o hábito de ler inatrativo e os afasta dos livros, pois passam a entender a leitura como um dever e não algo capaz de proporcionar prazer, novos conhecimentos e descobertas.

Cabe ao professor e também à escola encontrar a melhor maneira de despertar o interesse dos alunos para a leitura de bons livros e o conhecimento das obras clássicas, bem como de seus personagens, para que possam se tornar leitores críticos e formadores de suas próprias opiniões. O conhecimento das obras leva o leitor a formular seus ideais, muitas vezes por meio da identificação com seus personagens. Assim, a utilização de livros de adaptações das obras clássicas pode ser uma boa alternativa para estimular o jovem leitor a querer ler mais e despertar a curiosidade sobre as obras originais; contudo, o livro adaptado pode não levar ao leitor a riqueza literária que a literatura clássica, por possuir uma linguagem mais elaborada, propicia.

A finalidade deste trabalho é comparar uma obra clássica original e sua adaptação realizando um estudo sobre as metáforas e comparações existente nas duas obras, observando se as adaptações dos livros clássicos podem despertar o interesse dos alunos pela leitura sem empobrecer os textos originais.

Esta pesquisa tem como objetivo estudar possibilidades de incentivar a leitura de obras clássicas pelos alunos do ensino fundamental por meio dos clássicos adaptados, também observar se em tais obras há ou não perdas de recursos lingüísticos e os objetivos específicos são estudar o uso de metáforas e comparações na obra clássica original Iracema de José de Alencar, verificar se há a permanência destas na obra Iracema em cena escrita por Walcyr Carrasco e analisar as vantagens e desvantagens da leitura de uma obra adaptada em relação à original.

A linguagem rebuscada encontrada em muitas obras clássicas geralmente faz com que os alunos do ensino fundamental considerem sua leitura cansativa e entediante e a alternativa de se utilizar resumos faz com que seja perdida a riqueza estética das obras.

Assim, a leitura de livros clássicos adaptados para serem lidos por jovens oferece a possibilidade de se preservar fragmentos importantes da obra original e de se utilizar uma linguagem mais apropriada à faixa etária desses leitores, de modo a despertar a curiosidade e o interesse pelas tramas de tais leituras. Como afirma Machado (2002), um primeiro contato com essas obras pode ser útil para despertar o interesse do aluno de maneira que posteriormente ele sinta vontade e necessidade de explorar o território dos clássicos originais, quando for escolher as leituras por conta própria.

Este trabalho se justifica no sentido de que o aluno precisa estar apto a realizar leitura crítica, ser capaz de analisar e argumentar o que lê; não se pode – nas atividades da área da educação - simplesmente formar um leitor que decodifica o texto, mas não o interpreta e não consegue expressar sua opinião sobre ele de forma coerente. De acordo com o PCN de Língua Portuguesa, o aluno deve ter um posicionamento crítico diante dos textos que lê, reconhecendo argumentos neles utilizados, posições ideológicas e possíveis conteúdos discriminatórios ali presentes.

O mundo moderno oferece variadas oportunidades de crescimento pessoal e profissional e entre elas destaca-se a leitura, pois oferece condições para que a pessoa aprenda a adquirir conhecimento crítico e expor suas opiniões com maior clareza e sensatez. Todo homem tem acesso à leitura, todos herdam este legado, só é necessário utilizá-lo, pois, segundo Machado (2002), recebemos de herança o patrimônio da leitura e seria um absurdo não usufruir dela ou simplesmente dispensa-la.

As personagens clássicas despertam no leitor certa curiosidade em relação a sua psicologia, a seu modo de ser e agir e muitas vezes o leitor acaba identificando-se com elas. Ao ler um clássico, o leitor sempre acrescenta algo em sua vida, uma nova experiência, um novo conhecimento. Depara-se, frequentemente, com comentários como: “para que ler isso?”, “usarei essa leitura em quê?”. “Os clássicos servem para entender quem somos e aonde chegamos”. (CALVINO, 2007, p. 16).

Portanto, é necessário que se estimule o aluno a ler, que se acenda uma luz, para que ele possa ter vontade de ler, para que possa despertar sua curiosidade pela leitura, e não forçá-lo a ler para conseguir boas notas ou ser aprovado no vestibular. Segundo Machado (2002), ninguém deve ser obrigado a ler; ler é um direito, não um dever, portanto, deve proporcionar prazer e não uma frustração.

Os jovens encaram o livro clássico como velho, antigo e sem valor, o que não deve ser considerado desta forma, pois a cada vez que é relido, encontram-se nele novos valores. Ainda, de acordo com a autora, “Clássico não é livro antigo e fora de moda. É livro eterno que não sai de moda”. (MACHADO, 2002, p.15).

Portanto, é necessário levar os alunos a descobrirem a mágica da leitura, fazer com que mergulhem nos livros, protagonizando cada obra que lerem, pois desta maneira será aguçada a curiosidade destas crianças e adolescentes, levando-os a sentirem vontade e necessidade de estar em contato com bons livros.

Este trabalho será realizado por meio de pesquisa bibliográfica com base em livros e sites acadêmicos de autores que discorram sobre o assunto, bem como daqueles que falam sobre aplicação de leituras para o ensino fundamental. Como objetos de estudo serão abordadas duas obras, o clássico original Iracema, de José de Alencar, e o livro adaptado de Walcyr Carrasco, nos quais será analisada a presença de metáforas e comparações na obra original e se estas foram preservadas na obra adaptada. Deste modo, será realizada uma reflexão se há ou não, nos adaptados, uma carência da riqueza linguística presente nas obras clássicas.

No primeiro capítulo serão abordados alguns pontos de vista sobre a leitura dos clássicos, sua importância para a formação crítica, cultural e intelectual do cidadão. Também será abordada uma breve exposição da literatura de massa e sua influência na formação do indivíduo. O segundo capítulo versará sobre as obras adaptadas, sua construção textual, as técnicas utilizadas pelos escritores para adaptar uma determinada obra e a ocorrência de metáforas que figuram, com certa freqüência, a obra canônica.

O terceiro capítulo será analítico, no qual serão comparadas as duas obras, “Iracema” de José Alencar e “Iracema em cena” de Walcyr Carrasco. Serão analisados alguns aspectos específicos nas duas obras, como a trama linear, as metáforas e comparações existentes na caracterização das personagens e da natureza, o vocabulário rebuscado no livro de Alencar e o simplificado no de Carrasco. Finalmente, serão expostas as conclusões do trabalho.

CAPÍTULO 1

A LEITURA DOS CLÁSSICOS

Os livros clássicos da literatura universal podem ser mencionados como aqueles que são lidos e relidos ao longo dos tempos, que permanecem vivos e atuais a despeito da época em que se encontra a sociedade e que, a cada nova leitura, proporcionam diferentes experiências ao leitor. Segundo Calvino (2007), “um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer”.

As escolas se encarregam de exigir a leitura de livros clássicos e de fazer com que os alunos conheçam certo número de obras que são cobradas em vestibulares e concursos; a partir de então, é comum que cada aluno se identifique com uma obra e a considere como livro predileto, o qual se torna o seu clássico. Contudo, é necessário todo um trabalho de incentivo à leitura e não simplesmente a exigência da leitura do livro. Na maioria das vezes os professores acabam se prendendo ao antigo costume de cobrar a leitura do livro, em seguida realizar questionários diversos em relação a seu enredo, personagens, ponto mais importante e desfecho e, muitas vezes, acabam se equivocando quanto ao aprendizado do aluno, que precisa ir além dessa visão, pois precisa enxergar a relevância da obra e, talvez, essa falta de preparo e incentivo para a leitura é que faz com que os jovens sejam desmotivados para tal prática. Segundo Calvino (2007), os clássicos são lidos por amor e não apenas por dever ou respeito.

O aprimoramento gradual da leitura, principalmente de textos literários, faz com que o sujeito melhore o seu desempenho em relação a esta, que lhe seja cada vez mais fácil lidar com as palavras e, também, que crie gosto por este tipo de leitura, já que, quanto mais se lê, mais fácil torna-se a compreensão daquilo que é lido. O vocabulário rebuscado faz com que o leitor aprimore e amplie seu próprio vocabulário, tornando-se uma pessoa culta e apreciadora das belas artes, grupo no qual é inserida a literatura clássica. Somente com a prática continuada é que se consegue fazer uso da língua com clareza, concisão e coesão. Conforme Cordeiro e Oliveira (2013, p.3), “construir na prática a capacidade de ler, compreender e analisar textos de diferentes gêneros, em especial os literários requer um aprendizado contínuo”.

Desse modo observa-se que o incentivo à leitura deve ser realizado desde a infância, pois é por meio dela que o cidadão constrói suas noções de respeito a si mesmo e ao próximo para uma convivência harmoniosa e é esta a fase na qual as histórias e seus personagens são memorizados, pois, de acordo com Machado (2002), talvez seja porque ainda tenham a mente livre de preocupações ou porque as histórias são comoventes, então, marcam este período e nunca mais são esquecidas. As histórias narradas para as crianças com ênfase e emoção com certeza serão guardadas eternamente em suas mentes, além de acrescentar muito ao seu crescimento e à sua formação.

Quando a pessoa é privada do conhecimento, seja por opção, por necessidade ou por falta de oportunidade, independente do motivo, lhe é retirado o direito de desenvolver a leitura crítica, cuja ausência no dia a dia torna-a limitada, uma vez que ela não se desenvolve de modo suficiente para resolver sozinha seus impasses, o que pode torná-la insegura e com sensação de capacidade e inferioridade quando se depara com obstáculos em sua vida pessoal ou profissional. Segundo Cordeiro e Oliveira:

“No âmbito social, a leitura permite o acesso às mais diversas formas de socialização da vida cidadã. Em contrapartida, o indivíduo que não sabe ler será um cidadão que sempre vai depender dos outros e terá muitas limitações em sua vida profissional.” (CORDEIRO E OLIVEIRA, 2013, p. 2):

Os contos de fada são ótimas observações a serem feitas neste momento, pois são narrativas clássicas contadas desde muito tempo, que de fato encantavam e continuam encantando crianças e adultos; são histórias repetidas ao longo do tempo, reescritas, adaptadas para o cinema, enfim, histórias que marcaram a vida da maioria das crianças. Que menina nunca quis ter um sapatinho de cristal, e que menino nunca quis viver as aventuras de Peter Pan? Geralmente, essas são histórias que se eternizam com o passar do tempo, são clássicos implantados no coração e na mente do ser humano. Embora muitas vezes não sejam consideradas como obras clássicas e simplesmente histórias infantis, são narrativas carregadas da essência cultural. Segundo Machado (2002, p. 69), “o alto nível de sua qualidade artística e sua força cultural são atestados pela sua universalidade e sua permanência”.

Além dos clássicos escritos para adultos, há os clássicos realmente infantis, aqueles especificamente escritos para crianças. A princípio pode-se imaginar uma simples “historinha infantil”, mas, se analisados, perceber-se-á que oferecem muito mais do que apenas o enredo cativante que segura a atenção dos pequenos: muitas vezes são trabalhados a parte psicológica e o desenvolvimento das pessoas como seres humanos. Quanto à obra “Alice no país das maravilhas”, observa-se o seguinte comentário de Machado:

“Às vezes as situações dos livros são um pouco angustiantes, apresentando a protagonista meio perdida, sem saber seu verdadeiro tamanho ou exatamente quem é, e encontrando uns seres muito esquisitos que a deixam pouco a vontade. Bem como são as ansiedades de crescer e de procurar nosso lugar no mundo, de ter coragem de sair explorando tudo e enfrentando circunstâncias inesperadas.” (MACHADO, 2002, p.113).

Outro bom exemplo de narrativa infantil utilizada com muita freqüência até os dias de hoje são as fábulas de Esopo, é quase impossível encontrar alguém que nunca ouviu, leu ou mesmo contou as pequenas fábulas com fundo moral, em alguma fase de sua vida.

As obras clássicas sobrevivem ao tempo, se propagam mesmo com o passar dos anos, continuam sempre novas e vivas e ajudam a gerar a autonomia de cada jovem e a desenvolver a sociedade. Os clássicos, quando lidos desde muito cedo, dão um gosto especial à leitura, pois a mente é capaz de viajar para lugares nunca sequer imaginados pelo leitor. Talvez as obras clássicas originais se tornem de fato de difícil compreensão quando o leitor ainda é muito jovem, e para isso há as adaptações tão citadas por Machado, as quais serão abordadas mais adiante.

As histórias da Grécia antiga são narradas por meio das obras clássicas. As histórias dos deuses da mitologia, a literatura nacional e a literatura universal são formas de perpetuação da cultura e dos costumes que algum dia existiram, são a base para a construção do ser humano como um ser social.

As construções, os grandes monumentos são destruídos com o passar dos anos, porém o que é construído com palavras permanece intacto, assim como diz Machado (2002), os grandes monumentos, o esplendor dos grandes teatros foram levados pelo vento, porém as palavras permaneceram, estas o vento não levou e nunca as levará, pois se tornaram um verdadeiro acervo patrimonial do mundo.

Sempre que alguém pega um livro clássico em mãos para ler, que faz renascer todo o glamour das fascinantes histórias gregas, as tristes histórias de amor, a formação da sociedade ou a miscigenação das raças, toma conhecimento de diversos outros temas que estão distribuídos em milhares de histórias clássicas, as quais estão sempre ao alcance de cada um, só é necessário se atrever a abrir o baú do tesouro e então se satisfazer com a leitura.

Para que haja essa satisfação na leitura das belas histórias existentes, deve ser trabalhado na escola um modo de desenvolver o gosto pela leitura e não a imposição desta. O estudante precisa do apoio do professor para que aprenda a apreciar os livros clássicos, pois é por meio deles que formará sua capacidade de interpretar e de decidir sobre si, estar apto a reconhecer os valores humanos, a ser solidário, ético e a desenvolver o senso de convivência em grupo de forma pacífica.

O estudo da literatura e o conhecimento dos clássicos precisam ser desenvolvidos para que o homem consiga entender a história, a formação cultural e futuramente se torne um leitor capaz de não apenas ler uma obra em prosa, um poema, decifrando suas palavras e frases, mas entendendo o que a obra está dizendo além de suas palavras; ele precisa ser capaz de refletir sobre os fatos ali descritos, criticar construtivamente os acontecimentos e chegar a uma opinião própria sem ser influenciado. Desta forma, o indivíduo será capaz de tomar suas decisões conscientemente.

Um clássico que não pode ser deixado de lado, quando comentamos os grandes clássicos universais, independentemente de religiões, é a bíblia - um livro cheio de histórias que colaboraram e colaboram até hoje para a formação do caráter do ser humano. Todos, em algum momento da vida, entram em contato com este livro, sendo religioso ou não. De acordo com Machado (2002), “foi com esse livro que se iniciou a grande tradição narrativa que permitiu construir toda uma civilização em cima de histórias”. Ademais, a bíblia colabora muito com o conhecimento, é repleta de expressões comumente usadas no dia a dia que, com certeza, se ouvirá durante toda a vida e, tendo o prévio conhecimento destas, seu entendimento poderá ser facilitado. Vejamos:

“Assim elas podem ficar sabendo o que são tempos de vacas magras, e em que consiste vender a primogenitura por um prato de lentilhas. Ao transportar um bebê num moisés, saberá porque o cestinho tem esse nome. Quando encontrar expressões como “separa o joio do trigo”, “lavar as mãos”, “mudar da água para o vinho” ou “dar a outra face”, ou quando por acaso ler num jornal uma referência ao farisaísmo ou a sepulcros caiados. Saberá exatamente a que o texto está fazendo alusão. Reconhecerá as referências ao bom pastor ou ao bom ladrão, ao bezerro de ouro, ao grão de mostarda ou à folha de parreira. Conhecerá o que é uma mulher forte, entenderá por que deixar vir as criancinhas”. (MACHADO, 2002, p.39).

Os clássicos originais, quando lidos na íntegra, trazem um conhecimento intelectual diferenciado em decorrência de sua riqueza linguística. Estes tem um vocabulário aprimorado, não foram simplesmente escritos sem preparo, mas trabalhados com um vocabulário escolhido, justamente para enriquecer o livro. A obra original é capaz de mostrar uma essência desconhecida, afinal, quando se faz a escolha de uma obra para ler, seja pela capa, pelo título, ou por alguma resenha informativa, tem-se certa curiosidade em relação ao conteúdo, apesar de se imaginar o que será encontrado. Assim:

A leitura de um clássico deve oferecer-nos alguma surpresa em relação à imagem que dele tínhamos. Por isso, nunca será demais recomendar a leitura direta dos textos originais, evitando o mais possível bibliografia crítica, comentários, interpretações. A escola e a universidade deveriam servir para fazer entender que nenhum livro que fala de outro livro diz mais sobre o livro em questão...” (CALVINO, 2007, p.12).

Reforçando que o clássico lido integralmente é capaz de transmitir a mensagem além da mensagem, ou seja, é possível perceber em cada linha, em cada parágrafo, que se esconde um problema, uma crítica, é possível entender as entrelinhas do livro, buscando além do que está escrito, e é devido a isso que é necessário que se leia o clássico, pois, analisando as obras, pode-se trazer o conhecimento para si, desenvolvendo assim a capacidade de tomada de decisões por conta própria, ser capaz de opinar, de se impor na sociedade, não servindo apenas como um fantoche. O cidadão precisa ter o conhecimento ao ponto de entender não só o que está explícito, mas também o que está implícito no texto. Calvino nos afirma isso no trecho abaixo, quando menciona Xenofonte:

“O segredo ao ler a Anábase, é jamais pular nada, acompanhar tudo ponto por ponto. Em cada um daqueles discursos existe um problema político: de política externa(as tentativas de relações diplomáticas com os príncipes e os chefes de territórios através dos quais se pede passagem) ou de política interna (as discussões entre os chefes helênicos, com as habituais rivalidades entre atenienses e espartanos etc.). E como o livro é escrito em polêmica com outros generais, sobre as responsabilidades de cada um na condução daquela retirada, o fundo de polêmicas abertas ou apenas referidas precisa ser extraído daquelas páginas.” (CALVINO, 2007, p.27)

A cultura da sociedade é formada a partir da leitura, que é a base para esse acontecimento. A criança depois que aprende a ler demonstra um interesse muito grande em relação a textos descritos em murais, em faixas, em outdoors. Isso pode ser observado quando se está no carro com uma criança na faixa dos seis a sete anos, que é a fase do aprendizado da leitura, ela vai acompanhando as leituras, é um fato muito interessante para ser observado. Por isso é o ponto ideal para instigar a criança na leitura, e dessa forma ele sentirá necessidade de ler, praticando continuadamente, desenvolvendo então, com o passar dos anos a capacidade de decifrar a escrita, mas com senso de entendimento e não somente com as palavras soltas.

Muito é aprendido com a literatura, e mantido até os dias atuais, talvez de forma diferenciada, mas com o mesmo intuito e o mesmo objetivo. Uma passagem interessante na obra de Machado é a mesa redonda, que veio dos tempos do rei Arthur com os cavaleiros da távola redonda e até hoje ouvimos este termo corriqueiramente. A mesa muitas vezes não é redonda, mas leva este nome porque tem o mesmo objetivo. Vê-se a mesa redonda em debates políticos, onde todos devem ser questionados igualmente, e participar de forma equivalente, independente da preferência do apresentador. Na mesa redonda em debates escolares, na qual um grupo de alunos defende determinado assunto e outro grupo combate a ideia, o professor deve ser neutro e, independentemente de sua opinião, deve comandar o debate se comportando sempre de forma mais imparcial possível. Como diz Machado (2002, p.42), “era um símbolo concreto de um ideal de igualdade, de uma equipe onde o rei fazia questão de tratar a todos da mesma forma”. Com isso percebe-se que a cultura vem sendo aprendida ao longo dos tempos.

De acordo com Machado (2002), os mitos e as lendas clássicas, estão presentes a todo momento na vida do ser humano. Em toda e qualquer situação pode-se ouvir referências a estes. Este é um dos muitos motivos pelos quais as obras clássicas devem ser conhecidas pelo homem, e nada melhor do que começar a criar o gosto e a curiosidade pela descoberta na época da escola, e que a criança está em fase de aprendizagem rápida e é capaz de fantasiar, de viajar pelas histórias, ou mesmo na fase da adolescência que, ao ler Romeu e Julieta, não há como não se emocionar e se colocar no lugar das personagens, vivenciar o amor quase como se estivesse acontecendo consigo mesmo.

Os maiores filmes de Hollywood trazem para as telas as histórias mitológicas e sentimentais, talvez por serem algo que interessa e dá sucesso de bilheteria, o que demonstra que o público gosta do clássico. E pode-se apreciar muito mais uma história vista nas telas, quando já se conhece o enredo, de preferência quando já se leu a obra, ainda que tenha sido uma boa adaptação. O cinema nacional vem trazendo inúmeras obras da literatura brasileira e portuguesa e, quando o leitor já conhece o enredo, já leu o romance, o conhecimento é muito mais proveitoso.

Os clássicos são oferecidos para cada pessoa, como um acervo valioso e está ao alcance de todos. Hoje não se pode dizer que é difícil ter acesso às boas leituras, visto que há bibliotecas espalhadas por todos os lados, bibliotecas virtuais que disponibilizam muitas das melhores obras clássicas existentes, as escolas e as bibliotecas ambulantes, vão onde o acesso aos livros é mais complicado. Só cabe às pessoas, ao menos as que têm possibilidades de acesso ao conhecimento, não deixar passar esta oportunidade desperdiçando o tempo com coisas fúteis, bastando, para tanto, se conscientizar e encarar a leitura dos clássicos como um desafio, e este certamente será vencido com muita categoria. Calvino diz:

“A realidade do mundo se apresenta a nossos olhos múltipla, espinhosa, com estratos densamente sobrepostos. Como uma alcachofra. O que conta para nós na obra literária é a possibilidade de continuar a desfolhá-la como uma alcachofra infinita, descobrindo dimensões de leitura sempre novas.” (CALVINO, 2007, p.210).

Crescimento, descoberta, cultura, prazer, enfim, há uma infinidade de motivos para se ler os clássicos, para fazer com que façam parte da vida e, de acordo com Machado (2002), a leitura dos clássicos é uma experiência inigualável.

1.1 Literatura de massa

A literatura de massa é caracterizada por conter uma linguagem simples e não rebuscada mas, em se tratando de leitores iniciantes ou ainda imaturos, uma obra com vocabulário mais bem preparado realmente se torna difícil para entender e de certa forma acaba afastando os leitores, fazendo com que não criem o gosto pela leitura: é sobre isso que se fala quando do incentivo à leitura de crianças e jovens. Percebe-se grande número de obras estrangeiras circulando entre o público, principalmente entre os jovens.

A leitura poderia ser feita de maneira alternada, já que atualmente o leitor precisa ler jornais, revistas, relatórios, em função de trabalho ou de informação, mas deve-se ater à leitura de boas obras também, como a literatura clássica, pois este tipo de leitura o enriquece culturalmente.

O problema é que a escolha de leitura pelos jovens, na maioria das vezes, é feita de forma não balanceada, ou seja, não há uma alternação entre boas leituras e literatura de massa. Os estudiosos de literatura dizem que quase sempre os jovens apreciam leituras não proveitosas. De acordo com Neto e Dering (2013), os best sellers, livros que estão na lista dos mais vendidos, geralmente são apontados como ruins por estudiosos que acreditam que eles possuem uma linguagem simples e são voltados para um grande número de pessoas consumistas, então são considerados inferiores à chamada Literatura. Os jovens leitores preferem este tipo de leitura por ser de fácil entendimento, isto é, de linguagem simples, e por tratarem de assuntos que prendem a atenção, sendo assim a literatura clássica é deixada de lado, por ser considerada entediante e cansativa.

A literatura de massa é criticada também pelo fato de estar ligada ao consumismo, pois estão quase sempre na lista dos mais vendidos e são de fácil acesso. Mas Neto e Dering (2013) afirmam que os clássicos também são de fácil acesso, pois são vendidos até mesmo em bancas e existem até impressões em exemplares de bolso.

Embora muitos intelectuais e críticos literários reneguem a literatura de massa, por não levar o leitor à reflexão enquanto as obras clássicas cumprem este papel, ela também colabora na formação do caráter, pois aborda temas sociais, traz lições de vida, o que pode fazer com que o indivíduo tenha outra visão de mundo e que desenvolva seu senso crítico.

Então, talvez seja melhor acolher este tipo de literatura, afinal esta pode ser um caminho para o incentivo da leitura, despertando interesse pelos livros, fazendo com que os jovens leitores abram suas mentes para as fantásticas viagens ao desconhecido, e possam, dessa forma, se direcionar para posteriores leituras que realmente ajudem em sua formação para o exercício da cidadania e para o desenvolvimento intelectual, que seriam os gloriosos clássicos universais da literatura.

1.2 A presença dos clássicos na formação crítica do cidadão

As leituras incentivadas pelos professores e defendidas por muitos dos grandes estudiosos são as obras clássicas da literatura universal. Estas leituras são de grande importância para a formação do cidadão em relação aos valores sociais, psicológicos e culturais e, consequentemente, para a construção de valores de toda uma sociedade.

As obras clássicas conhecidas desde a tenra infância vão formando a capacidade crítica do cidadão, aguçam seus sentidos para reconhecer quem ele é e que papel exerce na sociedade. Machado (2002, p.11) comenta “[...] esses diferentes livros foram lidos cedo, na infância ou adolescência, e passaram a fazer parte indissociável da bagagem cultural e afetiva que seu leitor incorporou pela vida afora, ajudando-o a ser quem foi”.

Com a prática da leitura, o aluno se torna cada vez mais capaz de refletir, de se posicionar criticamente em relação a suas atitudes e à sociedade e, ao começar a se dedicar à leitura dos clássicos, o aluno começa a descobrir que além do que está escrito, há sempre algo a mais e assim consegue responder questionamentos mais profundos relativos a tudo que lê, não fica somente naquela velha decodificação, respondendo apenas o que está descrito no texto.

De acordo com Santos, a leitura não pode ser feita mecanicamente, mas de forma clara e compreensível, para que assim seja possível questionar o que está sendo lido e interpretar o que está escrito, enxergando o sentido implícito do texto:

Aprender a ler, mais do que decodificar o código lingüístico, é trazer a experiência de mundo para o texto lido, fazendo com que as palavras impressas tenham um significado que vai além do que está escrito, por passarem a fazer parte, também, da experiência do leitor. SANTOS (2005, p.5)

Segundo Machado (2002), a leitura de uma obra clássica é um jogo a dois, pois quando se lê um clássico, ele, por sua vez, também lê o leitor, o significado do que ele vive. Dessa forma, pode ser observado que a leitura dos clássicos leva o leitor à reflexão de sua vida, colaborando com a formação do social, psicológica e crítica do ser humano.

O gosto pela leitura, quando despertado em jovens e adolescentes, ajuda em seu desenvolvimento intelectual. Os clássicos de forma geral auxiliam no amadurecimento das idéias, geram uma reflexão positiva em relação à visão de mundo e colaboram, desta forma, para que se desenvolva a capacidade de escrever de forma mais elaborada, coesa e concisa.

CAPÍTULO 2

OS CLÁSSICOS ADAPTADOS

O hábito da leitura de obras literárias no Brasil é muito incomum tanto entre leitores jovens quanto nos mais velhos e isso pode ser observado por meio da venda de livros. Algumas pessoas compram os livros espontaneamente, por vontade própria, por gosto pela leitura, mas a maioria das pessoas acaba lendo por obrigação, muitas vezes porque a escola cobra a leitura, ou porque será assunto do vestibular.

Feijó (2002) classifica essas compras de livros como “venda por impulso”, quando o leitor busca nas livrarias um livro pelo qual se interessa e compra a obra por vontade própria, e “venda por adoção”, quando um professor adota a obra e a cobra em prova, então o aluno precisa comprar e ler para tirar nota. No Brasil, as vendas por adoção superam em disparada as vendas por impulso, o que demonstra que o público em geral realmente não procura livros se estes não forem exigidos pelas escolas.

A falta da busca por livros no Brasil pode se dar em decorrência de fatores socioeconômicos, pois faltam investimentos em toda a estrutura educacional.

Pensando em incentivar os alunos a ler, simplesmente para que tomem gosto pela leitura, há um grande número de obras adaptadas que são disponibilizadas nas escolas por incentivo do governo, que as oferece gratuitamente às bibliotecas escolares.

Adaptações são clássicos voltados para os leitores em fase escolar, com uma linguagem mais apropriada para a idade, como diz Feijó (2010) são “apropriações, filhas dos melhores cânones”. As adaptações são escritas para que as obras permaneçam vivas nas futuras gerações e é por meio destas que os clássicos são apresentados para as crianças e jovens desde cedo.

As adaptações existem e são necessárias porque toda e qualquer sociedade precisa atualizar seus discursos, sejam eles artísticos, filosóficos, jurídicos, científicos, políticos, religiosos. São alicerces fundamentais. Toda sociedade, em qualquer época, é construída por meio de uma rede sofisticada e complexa de valores, a fim de se manter coesa ou se reconstruir de modo constante, se corrigir se ajustar. Portanto, toda sociedade precisa que esses valores estejam devidamente atualizados. (FEIJÓ, 2010, p.42).

A leitura de clássicos originais se torna cansativa para o leitor jovem que ainda está entrando em contato com a leitura, se acostumando com o mundo das letras. Devido a isso, existe já há algum tempo as famosas adaptações de obras literárias. Estas são utilizadas para despertar o interesse das crianças e adolescentes instigando-os a lerem obras de cunho literário, as chamadas obras canônicas ou eruditas.

A literatura, tal como a sociedade, vem se modificando com o passar dos anos e algo precisa ser feito para que sejam perpetuadas as belas histórias e mitos escritos no passado; uma das formas de fazê-lo é reescrevendo estas histórias, mesmo que de forma transformada, com modificações que não prejudiquem a obra original em relação ao seu enredo, e que também mantenha de certa forma o texto estético, o que enobrece a escrita. Segundo Vieira (2010), “a literatura pode ser comparada à metamorfose, pois igualmente agrega diversas características que a vão modificando, aprimorando-a mas sem negar suas fases anteriores”.

Com o passar dos anos os livros antigos podem ficar esquecidos e acabar se perdendo e a adaptação vem corrigir a possibilidade disto acontecer, pois faz com que a leitura de tais livros sobreviva com o decorrer dos anos e a melhor maneira de fazê-lo é garantir que os leitores mais jovens passem o conhecimento adiante. Contudo, há controvérsias quanto às adaptações que são vistas, no Brasil, como uma maneira de gerar lucro, pois a vendagem de tais livros é muito grande e movimenta muito dinheiro. Talvez seja devido a este fato que há tanta divergência entre as opiniões em relação aos livros adaptados, conforme mencionado por Feijó:

No capitalismo moderno, e na prática escolar brasileira, os cânones literários devem ser considerados como produtos culturais de alto valor de mercado. Os chamados “clássicos escolares”, mesmo em edições baratas, movimentam fortunas impressionantes e desempenham papel deveras importante na manutenção da “indústria do livro didático” em seus períodos de entressafra (o livro didático é sazonal). (FEIJÓ, 2002, p.2).

O uso de obras adaptadas nas escolas gera muita polêmica e discussão, pois há quem apoia, quem se opõe radicalmente e há quem mede os resultados, ponderando entre os benefícios e as perdas na leitura das traduções e adaptações.

Há opiniões diversas em relação à leitura destes livros, sejam traduzidos ou adaptados. Muitos estudiosos e críticos literários não apoiam a introdução da leitura de adaptados aos jovens porque alegam que os alunos perdem a essência das obras, limitam-se apenas ao enredo, não se aprofundam na estrutura da escrita e se privam, assim, do contato com a linguagem rebuscada e com as figuras de linguagem que tanto valorizam as obras canônicas. Alegam que a adaptação, de qualquer forma, destrói a arte, faz com que se perca a originalidade e o valor da obra. No entanto, é necessário avaliar a qualidade da obra adaptada, sua fidelidade ao enredo original, seus objetivos, se foram preservadas suas características mais importantes e se a essência da história não foi corrompida, conforme o que diz Brown:

“Quando se adapta uma obra literária para que ela seja compreendida mais facilmente, está se fazendo com que o discurso utilitário assuma o primeiro plano e prevaleça sobre o estético. Desfigura-se, assim, a obra de arte enquanto arte das palavras, literatura. Fica-se com o sentido por ser mais fácil e, o que tornava artística a obra – sua construção, seu modo próprio e único de expressão linguística – pode perder-se. Tenha-se em mente, contudo, que o mesmo ocorre com traduções. Assim sendo, a questão não é se a obra adaptada e as traduções têm validade, uma vez que perderam sua peculiaridade estética, mas se sobra delas mérito suficiente para serem utilizadas no processo de formação educacional.” (BROWN, 2013, p.30)

Há também quem defenda a obra adaptada, pois os estudantes, ou todos os que estão entrando em contato com a leitura de modo imaturo, não têm conhecimento de um vocabulário muito vasto, ainda não têm acesso à cultura erudita, então, precisam ser lapidados para depois começar a mergulhar nas leituras de clássicos originais. De nada adianta colocar um livro clássico com um vocabulário de difícil entendimento nas mãos de um leitor iniciante, pois ele não se proporá a ler utilizando um dicionário para cada palavra que não entenda, o que seria entediante e o desestimularia à leitura.

De acordo com Lopes (2007), defensores da adaptação dizem que estes livros poderiam ser a porta aberta para que os leitores ainda em formação, no caso estudantes, posteriormente se interessassem pela leitura dos cânones. Já os adeptos à leitura das obras originais na íntegra vêem como uma “mutilação” dos originais e alegam ser apenas um apelo para a conquista do público, o que cai no fator econômico, como já foi visto anteriormente.

O que se espera dos jovens leitores é que estes consigam lidar com textos escritos de forma bem elaborada, que sejam capazes de lidar com a sintaxe, que tenham acesso a um vocabulário mais amplo e mais rico que, no caso, são encontrados nas obras canônicas. Algo considerado como imprescindível é que o trabalho com os clássicos precisa ser bem orientado, ou seja, o professor ou orientador da leitura precisa ter conhecimento da importância da leitura de clássicos e saber introduzir o clássico adaptado como um prévio conhecimento da obra, deixando um ponto de interrogação que desperte a curiosidade e aguce o desejo de conhecer o original. Se isso acontecer, a previsão é de que os jovens tenham interesse na obra canônica original. Porém, muitas vezes a obra adaptada é utilizada pelos professores mas praticamente sem saber por que, pois, como diz Vieira (2010), obras adaptadas são cobradas nas escolas pelos professores sem o mínimo critério de uso e esclarecimentos ao estudante sobre o porquê de sua leitura.

As técnicas de adaptação de obra são utilizadas pelos autores para que possam passar a obra canônica para uma linguagem mais acessível ao jovem leitor. São mantidas as características literárias com uma linguagem mais simples, menos rebuscada, modificada a ponto de ser entendida e interessante para o leitor. As adaptações podem ser transcritas com o vocabulário elaborado com maior simplicidade, de forma direta e não poética, o que facilita a compreensão em se tratando do leitor ainda imaturo.

É necessário analisar as obras adaptadas de modo a classificá-las como boas e valiosas, com características válidas no prévio estudo dos originais. As adaptações são nada mais nada menos do que paráfrases dos originais, só é necessário que se mantenha o enredo, sem alterar a escrita dos antigos e famosos autores. Se for mantido o enredo, e mudada a forma de escrever, o clássico não perde seu valor, fica mais simplificado e, embora não enriqueça o conhecimento de vocabulário do leitor, lhe transmite os devidos valores provindos da obra. De acordo com Bal citado por Feijó (2010),

“As adaptações literárias baseadas em clássicos da literatura, por serem paráfrases, não se referem mais aos textos anteriormente escritos (e canonizados), mas aos relatos e às fábulas preexistentes. As melhores adaptações do ponto de vista literário são as que se referem aos relatos (stories). As que se propões a ser apenas fábulas, mesmo que corretas e válidas pedagogicamente, são as que tendem a ser classificadas como medíocres”. (BAL, 2002, p. 9 apud FEIJÓ, 2010, p.107).

Segundo Feijó (2002), na década de 30, as paráfrases sobre obras originais tinham grande prestígio, pois o Brasil estava formando leitores a partir de livros brasileiros e não mais utilizando somente a literatura portuguesa. Mas foi a partir daí que começaram a surgir críticas acerca de tais paráfrases e começaram a imprimir o livro com a identificação “adaptação” escrito na folha de rosto. Depois desta época passaram a ser criticadas as obras que vinham de clássicos, pois muitos estudiosos de literatura consideravam que as ditas adaptações estavam destruindo os cânones e afastando as pessoas da literatura considerada culta, definida como arte literária.

Feijó (2010) explica ainda que este preconceito relativo à adaptação surgiu porque alguns autores traduziam a obra de língua portuguesa, francesa ou de outro idioma para o português do Brasil, mas agiam de má fé - apenas suprimiam partes da obra, retiravam determinadas expressões vindas do português de Portugal e lançavam como uma tradução, simplesmente para vender e ganhar dinheiro, ou pegavam uma obra de outro idioma, adquiriam uma adaptação da obra para crianças em português e adaptava para o português do Brasil – e este foi um dos principais fatores que deram início ao preconceito e à crítica de adaptações no Brasil.

2.1 Técnicas de adaptação de obra

As adaptações são realizadas por meio de diversas técnicas que tendem a não deixar que se perca o valor da obra canônica. O texto é parafraseado, reescrito, mas de maneira mais suave ao leitor ainda em fase de formação, muitas vezes pode haver cortes, porém necessários. O mais importante é que não se fuja ao enredo, senão torna-se uma história paralela e não uma adaptação. Muitos livros são escritos fazendo referência a obras clássicas, no entanto não podem ser classificados como uma adaptação da obra, visto que o leitor entra em contato com algumas passagens da obra original, na verdade pequenos trechos do texto transcritos na íntegra, mas a história escrita paralelamente rouba todo o cenário e envolve o leitor, fixando sua mente e seu entendimento para este enredo e não para o enredo do clássico, e o intuito da adaptação é fazer com que o leitor tenha um primeiro contato com a obra e lhe surja, posteriormente, o interesse em se aprofundar e ler o original.

Segundo Feijó (2002), é necessário que o adaptador tenha amor, respeito e competência para redigir uma boa paráfrase.

Podem ser consideradas diferentes maneiras de se adaptar uma obra. De acordo com Feijó (2002), um adaptador precisa decidir se vai adaptar o livro “com base na fábula ou no relato da obra canônica”. A fábula apenas informa sem se preocupar com o valor estético do texto, já o relato é uma “mimese”, ou seja, se preocupa com a estética literária do texto. Dessa forma, a adaptação realizada a partir da fábula acaba por não merecer o mesmo mérito das escritas a partir do relato, o que caracteriza a segunda como mais proveitosa e produtiva quando trabalhada com os alunos, pois se aproxima mais da obra clássica original, demonstra o valor estético e não se limita apenas ao enredo.

Há algumas técnicas de adaptações que são utilizadas pelos escritores. Entre elas pode ser destacada a técnica de conflação, que suprime o texto sem que este perca a autenticidade. É necessário que o autor tenha muito cuidado ao realizar este tipo de corte na narrativa, pois pode suprimir passagens importantes e que não deveriam ser tiradas. A história é contada fazendo determinados cortes, até mesmo modificando-a, porém sem perder o fio da narrativa e sem se desviar do enredo real. De acordo com Feijó (2002, p.110), “O maior desafio do adaptador, para resumir e reescrever, é decidir o que cortar”.

Em seu livro, Feijó menciona a adaptação da Odisséia de Ruth Rocha, uma obra elaborada de forma convencional, linear, de acordo com a exigência da indústria. É uma narrativa relato que preserva a estética do texto, mas que trabalha com conflações que não foram muito bem sucedidas, pois acabaram tirando partes do relato que modificaram a situação deixando o texto a desejar, com um sentido desviado do enredo.

Os cortes de Ruth Rocha são muitos e profundos, e revelam sua preocupação com o ritmo da narrativa. Ela quer garantir ao leitor o prazer da leitura, inclusive nas cenas capitais, por isso não tenta fugir de passagens polêmicas, mas amenizá-las. Em cenas fortes, de sexo ou violência, ela opta pela discrição. (FEIJÓ, 2002, p.118)

Conforme explicado por Feijó, na adaptação de Ana Maria Machado, “Rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda”, também é utilizada a técnica de conflação, mas principalmente em objetos:

As duas espadas mágicas de Arthur tornam-se uma só. A primeira foi espada da pedra (ou bigorna), que o fez rei da Inglaterra, e mais tarde se quebrou em combate. A segunda, seu símbolo de poder, chamada Excalibur, foi presente da Dama do Lago (ou Senhora do Lago), e para o lago voltou quando Arthur estava à morte. Mas, na adaptação, a espada da pedra já era Excalibur. E quando esta quebrou, a Dama do Lago apareceu para o rei seu mago, “segurando a espada belíssima inteira novamente.” (FEIJO, 2002, p.124)

É necessário avaliar de forma justa os clássicos traduzidos ou adaptados, pois é mais fácil criticar do que elogiar. Diversos fatores devem ser considerados quando é realizada uma crítica a uma obra adaptada. Deve ser avaliado o seu valor em um conjunto e não de forma isolada.

Para se avaliar com critério e justiça, seria preciso comparar sempre as várias adaptações entre si e com o próprio texto original. E, no meu entender, os quesitos obrigatórios para qualquer julgamento comparativo seriam: a fidelidade ao enredo, o possível encantamento do jovem leitor e o emprego de linguagem adequada à faixa etária e ao ambiente escolar. (FEIJÓ, 2002, p.19).

A técnica de conflação faz com que haja cortes no texto original, mas o precisa ser preservado o sentido real do enredo. O que pode ser suprimido são cenas de violência, que mexam com o caráter dos personagens, afinal o herói é aplaudido, admirado e mesmo seguido pelas crianças e adolescentes, que o transformam num exemplo de vida e isso precisa ser meticulosamente calculado quando se escreve uma obra para crianças, pois elas precisam ver o herói idealizado, com moral e bom caráter, uma vez que isso influenciará sua formação cultural, crítica, social e psicológica.

2.2 A presença de metáforas nas obras literárias

As obras literárias são elaboradas com diversificadas figuras de linguagem, o que a torna rica em detalhes e faz com que o texto seja caracterizado com uma linguagem poética. A metáfora é uma das figuras de linguagem presentes tanto na linguagem do cotidiano quanto na literatura. As obras originais apresentam muitas metáforas, o que faz com que o sentido dos sujeitos ou dos objetos se torne fantasticamente diferenciado, pois deixa de ser algo comum para se transformar em algo até mais artístico enriquecendo o conteúdo estético do texto.

Observa-se a passagem do livro de Calvino ao mencionar as Sete Princesas de Nezami:

“O onagro, burro selvagem do altiplano iraniano – que, visto nas enciclopédias e, se bem me lembro, nos zoológicos, tem todo o jeito de um modesto burrinho – , nos versos de Nezami se reveste da dignidade dos mais nobres animais heráldicos, e podemos dizer que aparece em cada página. Nas caçadas do príncipe Bahram, os onagros constituem a presa mais ambicionada e difícil, frequentemente citados ao lado dos leões como adversários contra os quais o caçador mede sua força e destreza. E nas metáforas o onagro é imagem de força, inclusive de força sexual viril, mas igualmente de presa amorosa (o burro presa do leão) e de beleza feminina e em geral de juventude. E, como possui também uma carne deliciosa, eis que ‘donzelas com olhos de onagro assavam no forno coxas de onagro’”. (CALVINO, 2007, p.59).

É comum encontrar muitas metáforas nas obras clássicas, porém, quando se fala em adaptação acaba sendo mais difícil encontrar estas figuras, provavelmente devido à dificuldade de se encontrar metáforas equivalentes, que faz com que permaneça o mesmo valor da obra original, que não denigra a obra ou mesmo mude o sentido original da mensagem. Isso ainda se torna mais complicado quando se fala em adaptação traduzida de outro idioma. Segundo Bassani (2008):

Entretanto, quando se está lidando com uma língua não nativa – como é caso do tradutor – constitui-se um desafio encontrar na língua meta as metáforas equivalentes, principalmente no que concerne a uma identidade estrutural e semântica. (BASSANI, 2008, p.234)

No romance “Iracema” de José Alencar, que será analisado posteriormente, pode-se observar a ocorrência de muitas metáforas e comparações. Essas figuras de linguagem enriquecem a obra, deixando-a esteticamente bem produzida e valorizada aos olhos dos críticos literários, ao passo que a obra adaptada não apresenta tanta ocorrência de metáforas.

CAPÍTULO 3

ANÁLISE CONTRASTIVA ENTRE A OBRA “IRACEMA” DE JOSÉ DE ALENCAR E A ADAPTAÇÃO “IRACEMA EM CENA” DE WALCYR CARRASCO.

Neste capítulo serão analisadas as obras “Iracema” de José de Alencar e sua adaptação “Iracema em Cena” do escritor contemporâneo Walcyr Carrasco. Serão abordados alguns aspectos dos livros, sempre considerando a construção metafórica e comparativa entre os dois textos.

Será feita uma análise das características físicas e psicológicas das principais personagens na obra de Alencar, observando as comparações destas com a natureza.

A substituição das metáforas por termos mais corriqueiros e comuns e a escassez destas no livro adaptado também são aspectos importante da análise, que merecem ser destacados.

A comparação do vocabulário entre as duas obras é também um fator relevante e de muita importância, já que há uma diferença muito grande na linguagem usada por Alencar, rebuscada e artística, e a escrita de Carrasco, simplificada e com vocabulário comum. A simplificação da escrita, ou seja, a substituição do vocabulário rebuscado por palavras simples e coloquiais é uma das características que acabam, muitas vezes, por empobrecer determinadas obras adaptadas. Além disso, a leitura dos clássicos na íntegra tende a expressar exatamente o que ele quer, sem influências externas e atravessadoras. Como afirma Calvino,

“existe uma inversão de valores muito difundida segundo a qual a introdução, o instrumental crítico, a bibliografia são usados como cortina de fumaça para esconder aquilo que o texto tem a dizer e que só pode dizer se o deixarmos falar sem intermediários que pretendam saber mais do que ele.” (CALVINO, 2007, p.12).

Pode ser observado também que o sentimentalismo expresso nos dois textos se dá de forma diferenciada - a elaboração lingüística de Alencar torna o livro extremamente romantizado, o que não ocorre com a escrita de Carrasco, que não deixa de trazer um romance entre as duas personagens centrais, porém apresenta um foco maior na história da ânsia de Adamo em se tornar um escritor. Dessa forma, o romance entre ele e Joana não tem a mesma profundidade existente em Iracema, o que pode ser observado nas passagens dos textos de Alencar e de Carrasco, respectivamente:

“Cedendo à meiga pressão, a virgem reclinou-se ao peito do guerreiro, e ficou ali trêmula e palpitante como a tímida perdiz, quando o terno companheiro lhe arrufa com o bico a macia penugem. O lábio guerreiro suspirou mais uma vez o doce nome e soluçou, como se chamara outro lábio amante. Iracema sentiu que sua alma se escapava para embeber-se no ósculo ardente. A fronte reclinara, e a flor do sorriso expandia-se como o nenúfar ao beijo do sol.” (ALENCAR, 1980, p.24).

“E de repente eu a beijei. Só isso. Nosso lábios se tocaram, de início bem devagar, bem de leve, mas depois o beijo foi se tornando mais profundo. Nós nos sentamos na beira do rio e nos beijamos ainda mais longamente, mais envolvidos. Meu coração batia sem parar, o dela também batia com força”. (CARRASCO, 2008, p.68)

Nestes dois trechos apresentados, é possível observar a diferença existente na linguagem utilizada nas duas obras. Percebe-se a riqueza lingüística na obra de Alencar, o que faz com que a obra expresse o sentimento profundo e verdadeiro entre as personagens centrais e, em contrapartida, apesar de conseguir prender a atenção do jovem leitor, a linguagem simples utilizada por Carrasco faz com que o amor entre as personagens seja mais superficial, não tão forte quanto o de Iracema e Martim, levado até as últimas conseqüências. Isso pode ser observado no momento da guerra em que Iracema defende Martin de seu próprio irmão, Caubi. “___Senhor de Iracema, ouve o rogo de tua escrava; não derrama o sangue do filho de Araquém. Se o guerreiro Caubi tem de morrer, morra ele por esta mão, não pela tua.” (ALENCAR, 1980, p.53).

Há também o fato do autor de Iracema em Cena trabalhar duas histórias paralelamente, trazendo pequenos trechos do livro original e explicando indiretamente, ou seja, por meio das falas das personagens, como pode ser observado no seguinte trecho:

Ceará, na língua indígena, significa o “canto da jandaia”, segundo José de Alencar. E, na lenda, a jandaia canta a morte de Iracema. Na praia de Fortaleza há uma estátua em homenagem a ela! A gente não pode desvirtuar. Ela fica na mata, tem o filho sozinha. Esse filho é, pela lenda, o primeiro cearense, e também o símbolo da união entre brancos e índios, dando origem a um novo povo, o brasileiro. Iracema chama o filho de Moacir, que significa “filho da dor”. (CARRASCO, 2008. p.32)

Ao mesmo tempo em que transcreve pequenas passagens de Iracema, Carrasco desenvolve a narrativa principal, na qual também há um amor difícil de ser vivido, atentando para o fato de que as referências feitas ao cânone são apenas pinceladas sem a preocupação com detalhamentos. Na verdade são pequenas transcrições do original, com breves comentários, mas referindo-se à minissérie. Tais passagens ajudam o leitor a se direcionar na história de Alencar, porém não transmitem todo o conteúdo artístico da obra canônica, se limitam apenas a transmitir o enredo.

O autor de “Iracema em cena” não fez uso da técnica abordada no capítulo anterior, que seria a técnica de conflação, por meio da qual o autor suprime partes do texto para fazer com que este fique mais curto e de fácil acesso ao estudante ou ao leitor iniciante e também aplica uma linguagem mais simples e coloquial. Na verdade ele escreveu uma história nova, mas com referência ao enredo original de Alencar.

A personagem Joana, tal como Iracema, é idealizada, linda, perfeita, tanto aos olhos de Adamo quanto de todos os outros personagens. Por este fato é comparada à Iracema, apesar do tempo diferente em que cada uma se situa, elas relacionam-se sob os aspectos físicos e psicológicos, tratando-se de mulheres fortes e determinadas, pois, tal como Iracema, Joana também se posiciona como uma guerreira de seu tempo por ser uma menina ainda e já ter tantas responsabilidades, perdendo até mesmo a possibilidade de ter uma vida normal como toda e qualquer jovem de sua idade.

Outro aspecto importante observado neste estudo é que o livro de Alencar segue uma trama linear, com foco na história de Iracema e Martin do começo ao fim, numa sequência lógica, e o livro de Carrasco segue uma linearidade na história de Joana, mas com interrupções pelas citações de pequenos trechos de Iracema, os quais dão uma idéia de como seja o livro, porém não detalhando a seqüência da história, o que pode vir a prejudicar o jovem leitor, na questão do interesse pela leitura integral posteriormente, passando a ele a idéia do livro e mesmo do enredo, mas isso pode fazer com que ele perca as expectativas do livro, visto que o adolescente enquanto leitor tende a se prender à leitura pelo conflito e pela expectativa do desfecho do livro.

Observa-se também na obra de Carrasco que o autor procura explicar a história de Iracema e a época em que a obra foi escrita. E embora sejam pequenas explicações, pode ajudar o leitor a se posicionar na leitura, tendo uma visão, embora longínqua, da obra original.

__ Veja como o autor descreve a beleza de Iracema, comparando-a à beleza da própria natureza tropical, o que era muito importante num momento de afirmação da nacionalidade. O Brasil tinha acabado de se tornar independente de Portugal, precisava formar uma imagem positiva de si mesmo... (CARRASCO, 2008, p.16).

Estas breves explicativas sobre Iracema trazidas por Carrasco facilitam de certa forma o acompanhamento do enredo, o entendimento no desenrolar da trama e a descoberta do final da história. Dessa forma pode-se perceber que a obra de Carrasco conta, mesmo que extremamente suprimida, a história de Alencar, dando a entender que se trata do romance entre um português e uma índia, que gerou um fruto, o primeiro cearense, e que no final da história ela morre, ou seja, a obra prende-se ao enredo.

A construção metafórica e comparativa é a essência da obra canônica de Alencar, pois a figuração transforma o livro em uma verdadeira obra-prima, valorizando cada parágrafo deste. O livro adaptado não apresenta este acervo de metáforas e comparações, sendo por diversas vezes substituídas por vocábulos simples e colocações diretas, o que pode torná-lo comum em relação ao cânone.

3.1 A simplificação do vocabulário: substituição lexical

Num primeiro momento observa-se a ocorrência da linguagem extremamente elaborada na obra original, com vocabulário erudito e rebuscado, em contraste com a obra adaptada que vem escrita de forma direta, sem preocupação em trabalhar o jogo das palavras, com intuito apenas de despertar o interesse do leitor, como pode ser observado nos seguintes trechos: “o rulo das vagas precipita. O barco salta sobre as ondas e desaparece no horizonte. Abre-se a imensidade dos mares, e a borrasca enverga, como o condor, as foscas asas sobre o abismo

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