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A PERCEPÇÃO E A FENOMENOLOGIA

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Por:   •  9/9/2013  •  5.494 Palavras (22 Páginas)  •  649 Visualizações

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A PERCEPÇÃO E A FENOMENOLOGIA

(Do livro: Convite à filosofia, de Marilena Chauí. Ed. Ática, 2000, pp. 120-125)

1. Sensação e percepção

O conhecimento sensível também é chamado de conhecimento empírico ou experiência sensível e suas formas principais são a sensação e a percepção.

A tradição filosófica, até o século XX, distinguia sensação de percepção pelo grau de complexidade.

A sensação é o que nos dá as qualidades exteriores e interiores, isto é, as qualidades dos objetos e os efeitos internos dessas qualidades sobre nós. Na sensação vemos, tocamos, sentimos, ouvimos qualidades puras e diretas: cores, odores, sabores, texturas. Sentimos o quente e o frio, o doce e o amargo, o liso e o rugoso, o vermelho e o verde, etc.

Sentir é algo ambíguo, pois o sensível é, ao mesmo tempo, a qualidade que está no objeto e o sentimento interno que nosso corpo possui das qualidades sentidas. Por isso, a tradição costuma dizer que a sensação é uma reação corporal imediata a um estímulo ou excitação externa, sem que seja possível distinguir, no ato da sensação, o estímulo exterior e o sentimento interior. Essa distinção só poderia ser feita num laboratório, com análise de nossa anatomia, fisiologia e sistema nervoso.

Quando examinamos a sensação, notamos que ninguém diz que sente o quente, vê o azul e engole o amargo. Pelo contrário, dizemos que a água está quente, que o céu é azul e que o alimento está amargo. Isto é, sentimos as qualidades como integrantes de seres mais amplos e complexos do que a sensação isolada de cada qualidade. Por isso, se diz que, na realidade, só temos sensações sob a forma de percepções, isto é, de sínteses de sensações.

Empirismo e intelectualismo

Duas grandes concepções sobre a sensação e a percepção fazem parte da tradição filosófica: a empirista e a intelectualista.

Para os empiristas, a sensação e a percepção dependem das coisas exteriores, isto é, são causadas por estímulos externos que agem sobre nossos sentidos e sobre o nosso sistema nervoso, recebendo uma resposta que parte de nosso cérebro, volta a percorrer nosso sistema nervoso e chega aos nossos sentidos sob a forma de uma sensação (uma cor, um sabor, um odor), ou de uma associação de sensações numa percepção (vejo um objeto vermelho, sinto o sabor de uma carne, sinto o cheiro da rosa, etc.).

A sensação seria pontual, isto é, um ponto do objeto externo toca um de meus órgãos dos sentidos e faz um percurso no interior do meu corpo, indo ao cérebro e voltando às extremidades sensoriais. Cada sensação é independente das outras e cabe à percepção unificá-las e organizá-las numa síntese. A causa do conhecimento sensível é a coisa externa, de modo que a sensação e a percepção são efeitos passivos de uma atividade dos corpos exteriores sobre o nosso corpo. O conhecimento é obtido por soma e associação das sensações na percepção e tal soma e associação dependem da freqüência, da repetição e da sucessão dos estímulos externos e de nossos hábitos.

Para os intelectualistas, a sensação e a percepção dependem do sujeito do conhecimento e a coisa exterior é apenas a ocasião para que tenhamos a sensação ou a percepção. Nesse caso, o sujeito é ativo e a coisa externa é passiva, ou seja, sentir e perceber são fenômenos que dependem da capacidade do sujeito para decompor um objeto em suas qualidades simples (a sensação) e de recompor o objeto como um todo, dando-lhe organização e interpretação (a percepção).

A passagem da sensação para a percepção é, neste caso, um ato realizado pelo intelecto do sujeito do conhecimento, que confere organização e sentido às sensações. Não haveria algo propriamente chamado percepção, mas sensações dispersas ou elementares; sua organização ou síntese seria feita pela inteligência e receberia o nome de percepção. Assim, na sensação, “sentimos” qualidades pontuais, dispersas, elementares e, na percepção, “sabemos” que estamos tendo sensação de um objeto que possui as qualidades sentidas por nós. Como disse um filósofo, perceber é “saber que percebo”; ver é “pensamento de ver”; ouvir é “pensamento de ouvir”, e assim por diante.

Para os empiristas, a sensação conduz à percepção como uma síntese passiva, isto é, que depende do objeto exterior. Para os intelectualistas, a sensação conduz à percepção como síntese ativa, isto é, que depende da atividade do entendimento.

Para os empiristas, as idéias são provenientes das percepções. Para os intelectualistas, a sensação e a percepção são sempre confusas e devem ser abandonadas quando o pensamento formula as idéias puras.

Psicologia da forma e fenomenologia

Em nosso século, porém, a Filosofia alterou bastante essas duas tradições e as superou numa nova concepção do conhecimento sensível. As mudanças foram trazidas pelo fenomenologia de Husserl e pela Psicologia da Forma ou teoria da Gestalt (Gestalt é uma palavra alemã que significa: configuração, figura estruturada, forma). Ambas mostraram:

● contra o empirismo, que a sensação não é reflexo pontual ou uma resposta físico-fisiológica a um estímulo externo também pontual;

● contra o intelectualismo, que a percepção não é uma atividade sintética feita pelo pensamento sobre as sensações;

● contra o empirismo e o intelectualismo, que não há diferença entre sensação e percepção.

Empiristas e intelectualistas, apesar de suas diferenças, concordavam num aspecto: julgavam que a sensação era uma relação de causa e efeito entre pontos das coisas e pontos de nosso corpo. As coisas seriam como mosaicos de qualidades isoladas justapostas e nosso aparelho sensorial (órgãos dos sentidos, sistema nervoso e cérebro) também seria um mosaico de receptores isolados e justapostos. Por isso, a percepção era considerada a atividade que “somava” ou “juntava” as partes numa síntese que seria o objeto percebido.

Fenomenologia e Gestalt, porém, mostram que não há diferença entre sensação e percepção porque nunca temos sensações parciais, pontuais ou elementares, isto é, sensações separadas de cada qualidade, que depois o espírito juntaria e organizaria como percepção de um único objeto. Sentimos e percebemos formas, isto é, totalidades estruturadas dotadas de sentido ou de significação.

Assim, por exemplo, ter a sensação

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