Análise da personagem Cecily Koertner

Análise da personagem Cecily Koertner

Freud – Além da Alma (1962), filme do diretor John Huston e inspirado no roteiro escrito por Jean-Paul Sartre, aborda o surgimento da teoria psicanalítica, desde a época em que Sigmund Freud trabalhou com Meynert até a exposição de sua Teoria da Sexualidade Infantil, ilustrado através do tratamento diversos pacientes histéricos – baseados em pacientes reais ou na combinação destes.

Dentre estes, a principal é a personagem Cecily Koertner, uma jovem com uma grave crise histérica, inicialmente tratada por Breuer e posteriormente por Freud. Cecily pode ser considerada uma fusão das cinco pacientes histéricas tratadas no livro “Estudos sobre a Histeria”, principalmente Anna O. – em cujo tratamento Breuer desenvolveu o método catártico –, embora seu nome possa ser inspirado em um 6° caso excluído do livro por motivos pessoais, o de Cäcilie M.

Em sua primeira aparição, Cecily não consegue ingerir água, impedida pela memória recalcada de ter visto seu cão beber de sua xícara e associada com outra, a de seu pai dizendo que a água (em Nápoles) era suja. Breuer torna memória consciente utilizando-se do método catártico, no qual a paciente fala da causa do sintoma sob efeito da hipnose, e através da sugestão a faz lembrar-se do que foi dito e tornar a beber o liquido.

A cegueira é outro dos sintomas apresentados por ela. Ao ser hipnotizada, conta que foi obrigada a reconhecer o corpo de seu pai em um hospital protestante, mas não conseguia ou queria olhar para ele. Entretanto, Freud percebe furos no relato e a estimula a se lembrar da verdade – seu pai na verdade morreu em um bordel. Ou seja, houve um deslocamento da memória real, a qual ameaçava seu amor pelo pai, para outra potencialmente menos agressiva. A substituição da lembrança estava ligada à semelhança entre as palavras “prostituta” e “protestante”.

Cecily apresenta uma melhora do quadro histérico, mas ao saber que Breuer irá viajar, desenvolve uma gravidez psicológica, com a qual o médico não é capaz de lidar e para preservar seu casamento abandona o caso, passando-o integralmente para Freud.

A paciente não se deixa ser hipnotizada por ele, pois achava que estaria traindo Breuer – havia uma atribuição erótica ao fato –. Passa então a falar sobre recordações que lhe vem espontaneamente à cabeça, iniciando o método da Associação Livre.

Conta do período feliz que teve com o pai, enquanto sua mãe estava se recuperando de um grave acidente, e podia se vestir como uma dama e ficar acordada até tarde; do sonho recorrente, ambientado em uma praia com uma torre vermelha, no qual via uma mulher egípcia tentando por um anel em um homem bem vestido, o qual fugia em direção ao mar, caia e sumia, deixando apenas as roupas – Freud interpreta que a mulher é Cecily tentando seduzir Breuer, depois percebe ser o pai, o qual morre por tê-la rejeitado –; de como  ganhou sua boneca favorita, presente dado pelo pai após a mãe ter brigado com ela; dos sonhos nos quais matava a mãe e de como ela era rígida e tão diferente de seu pai; do desmaio motivado por ciúmes na Rua da Torre Vermelha, após ter seguido seu pai, o qual havia cancelado uma ida à Ópera com ela na mesma noite, e o visto de braços dados com outra mulher – a princípio a memória era de ela ter saído com o pai e este ter entrado numa loja deixando-a sozinha do lado de fora, ocasionando o desmaio –; e por fim, a recordação que a fez recuperar o movimento das pernas, de ter sido abusada pelo pai na noite na qual ele prometeu-lhe a boneca (simbolizando um filho dos dois). Entretanto, tal recordação revelou-se apenas uma fantasia da menina, a qual sentiu-se culpada por ter manchado a memória do amado pai. Era a repressão do desejo e não da falsa lembrança a causa do sintoma histérico.

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