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Casos Clínicos De Dolto

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Por:   •  21/11/2014  •  8.207 Palavras (33 Páginas)  •  1.141 Visualizações

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Estilos clin ., São Paulo, v. 17, n. 2, jul./dez. 2012, 206-227.

RESUMO Este artigo se embasa no tra- balho e teoria de Françoise Dolto. Tivemos como objetivos compreender os pressupostos básicos de sua teoria; caracteri- zar as intervenções do psicana- lista na análise com crianças; e exemplificar seu método através do recorte das principais inter- venções realizadas no Caso Dominique e no caso Bernadette. Como resultado, constatamos que Dolto traba- lhava com maestria o fenômeno da transferência e as situações de interpretação; providenciava a oferta de recursos adequados à condição da criança; conduzia o trabalho com os pais permi- tindo a efetivação do sentimento de confiança neles, em aderirem ao tratamento analítico de seus filhos. Descritores: psicanálise com crianças; Françoise Dolto; transferência; interpretação; tra- balho com pais.

Dossiê

A PRÁTICA PSICANALÍTICA DE FRANÇOISE DOLTO A PARTIR DE SEUS CASOS CLÍNICOS

Vanessa Tramontin da Soler Leda Mariza Fischer Bernardino

1. Introdução

reud, apesar de ter argumentando que a psicanálise deveria ser ampliada ao longo dos anos, apresentava algumas dificuldades para a análise com crianças (Freud,1996a). Sabemos hoje que essas di- ficuldades estão superadas, e que a análise com cri- anças é possível. Melanie Klein (1981), Anna Freud (1971), Donald W. Winnicott (1984), Maud Mannoni F

Mestranda em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil.

Psicanalista. Docente da Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Curitiba, PR, Brasil.

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(1999) e Françoise Dolto (1980) demonstraram com o seu trabalho e suas teorias a importância de voltarmos nossa atenção para o tra- balho psicanalítico com crianças. Cada um deles, ao seu modo, cons- truiu uma maneira de conceber a criança e consequentemente de analisá-la. Segundo Bernardino (2004) a análise com crianças necessita de uma teorização própria, pois a demanda, a transferência e o fim de análise vão ser permeados pelas vicissitudes de um sujeito ainda em constituição. Outra questão particular da análise de crianças trata de que, além do desejo da criança, há o desejo dos pais, desejo que os próprios não conhecem, mas que se faz presente no processo de análise:

Vai estar em jogo lidar com a presença destes pais que, mesmo não entrando fisica- mente na sessão do filho ... continuam se manifestando: seja nos atrasos para trazer o filho à sessão, ou mesmo nas faltas que o fazem ter, seja nos diversos trâmites que impõem ao pagamento, e até na interrupção abrupta do tratamento do filho (Bernardino, 2004, p.65, itálico do autor).

A análise com crianças difere da análise com adultos também pelo método empregado: no atendimento psicanalítico à criança a associação livre não é possível, sendo assim é utilizado o método do brinquedo, da conversação e do desenho (Dolto, 1988). Frente a essas diferenciações, fica evidente a necessidade de uma teorização própria sobre a análise de crianças. No presente trabalho, focamos nossa atenção sobre a teoria de Françoise Dolto. No campo da psicanálise, a teoria construída por Dolto e a prática por ela realizada se firmaram como uma obra revolucionária para a sociedade. Fora do campo da teoria, ela “é uma exploradora, descobrindo a infância como outros descobrem um continente” (Halmos, 1989, p.74). Sua teoria ofereceu um novo lugar às crianças, um lugar próprio. “Ouvindo as crianças, em lugar de falar delas e em seu lugar, Françoise Dolto fez uma ruptura e um escândalo” (Halmos, 1989, p.83). O atendimento psicanalítico iniciado por Françoise Dolto, na década de 30, foi a primeira possibilidade de tratamento analítico na França com crianças ditas anormais que apresentavam distúrbios nervosos ou de caráter. Dolto, juntamente com Sophie Morgenstern foram, nessa época, as duas únicas analistas na França a mostrar interesse e competência face aos problemas da infância (Manonni, 1986).

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Estilos clin ., São Paulo, v. 17, n. 2, jul./dez. 2012, 206-227.

Em sua prática, Dolto trata a criança como uma pessoa autônoma e responsável, orienta-se através da interrogação face ao desejo da crian- ça e permanece atenta às diferentes posições da criança, nos momentos de tensões conflitivas em que ela se encontra (Manonni, 1986). Diante de toda a contribuição de Françoise Dolto ao campo da psica- nálise de crianças, tivemos como ob- jetivo, neste trabalho, compreender os pressupostos básicos da teoria de Françoise Dolto; caracterizar, segun- do ela, as intervenções do psicanalis- ta na análise de crianças; e exemplifi- car o método de Dolto através do recorte das principais intervenções realizadas em O caso Dominique (Dol- to, 1981) e no “caso Bernadette” (Dolto, 1996). Esse estudo foi realizado através de pesquisa bibliográfica. Foram ana- lisados o “caso Dominique” (Dolto, 1981) e o “caso Bernadette” (Dolto, 1996) atendidos por Dolto, por se tra- tarem de casos que receberam uma descrição minuciosa, devido à neces- sidade da presença detalhada das in- tervenções para a realização desta pesquisa. Para a análise dos casos, uti- lizaremos a Análise do Discurso, tal como proposta por Marilene Guirado (1995). Através da leitura e da análise dos discursos, foram identificadas algu- mas categorias comuns entre eles. Essas categorias foram agrupadas da seguinte forma: o manejo da transfe- rência; as situações de interpretação;

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a oferta de recursos expressivos; o trabalho com os pais.

2. A clínica de Françoise Dolto

Em sua teoria e prática, Françoise Dolto propôs um lugar novo às crianças ouvindo-as, em lu- gar de falar delas, ou falar por elas (Halmos, 1989, p.83). Posicionamento que tem extrema relação com a con- cepção de criança em que a autora se pautava em sua prática como médica e psicanalista. A criança, para ela, é um sujeito, e não encarada como um ‘mini-adulto’, ela compartilha as vi- cissitudes e as alegrias da vida. Assim,

como o adulto, ela ama, odeia, sofre e goza; como ele, a criança pode falar em seu nome, ela compreende tudo, desde a aurora de sua vida. Colérica, anoréxica, doente ou

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