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Memórias do sargento da milícia

Seminário: Memórias do sargento da milícia. Pesquise 860.000+ trabalhos acadêmicos

Por:   •  11/6/2014  •  Seminário  •  1.204 Palavras (5 Páginas)  •  526 Visualizações

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Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antonio de Almeida

Fonte:

ALMEIDA, Manuel Antônio de. Memórias de um sargento de milícias. 25. ed. São Paulo: Ática,

1996. (Bom Livro).

Texto proveniente de:

A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro <http://www.bibvirt.futuro.usp.br>

A Escola do Futuro da Universidade de São Paulo

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MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILÍCIAS

Manuel Antonio de Almeida

I ORIGEM, NASCIMENTO E BATISMO

Era no tempo do rei.

Uma das quatro esquinas que formam as ruas do Ouvidor e da Quitanda, cortando-se

mutuamente, chamava-se nesse tempo-O canto dos meirinhos-; e bem lhe assentava o nome, porque

era aí o lugar de encontro favorito de todos os indivíduos dessa classe (que gozava então de não

pequena consideração). Os meirinhos de hoje não são mais do que a sombra caricata dos meirinhos

do tempo do rei; esses eram gente temível e temida, respeitável e respeitada; formavam um dos

extremos da formidável cadeia judiciária que envolvia todo o Rio de Janeiro no tempo em que a

demanda era entre nós um elemento de vida: o extremo oposto eram os desembargadores. Ora, os

extremos se tocam, e estes, tocando-se, fechavam o círculo dentro do qual se passavam os terríveis

combates das citações, provarás, razões principais e finais, e todos esses trejeitos judiciais que se

chamava o processo.

Daí sua influência moral.

Mas tinham ainda outra influência, que é justamente a que falta aos de hoje: era a influência

que derivava de suas condições físicas. Os meirinhos de hoje são homens como quaisquer outros;

nada têm de imponentes, nem no seu semblante nem no seu trajar, confundem-se com qualquer

procurador, escrevente de cartório ou contínuo de repartição. Os meirinhos desse belo tempo não,

não se confundiam com ninguém; eram originais, eram tipos, nos seus semblantes transluzia um

certo ar de majestade forense, seus olhares calculados e sagazes significavam chicana. Trajavam

sisuda casaca preta, calção e meias da mesma cor, sapato afivelado, ao lado esquerdo aristocrático

espadim, e na ilharga direita penduravam um círculo branco, cuja significação ignoramos, e

coroavam tudo isto por um grave chapéu armado. Colocado sob a importância vantajosa destas

condições, o meirinho usava e abusava de sua posição. Era terrível quando, ao voltar uma esquina

ou ao sair de manhã de sua casa, o cidadão esbarrava com uma daquelas solenes figuras que,

desdobrando junto dele uma folha de papel, começava a lê-la em tom confidencial! Por mais que se

fizesse não havia remédio em tais circunstâncias senão deixar escapar dos lábios o terrível-Dou-me

por citado.-Ninguém sabe que significação fatalíssima e cruel tinham estas poucas palavras! eram

uma sentença de peregrinação eterna que se pronunciava contra si mesmo; queriam dizer que se

começava uma longa e afadigosa viagem, cujo termo bem distante era a caixa da Relação, e durante

a qual se tinha de pagar importe de passagem em um sem-número de pontos; o advogado, o

procurador, o inquiridor, o escrivão, o juiz, inexoráveis Carontes, estavam à porta de mão estendida,

e ninguém passava sem que lhes tivesse deixado, não um óbolo, porém todo o conteúdo de suas

algibeiras, e até a última parcela de sua paciência,

Mas voltemos à esquina. Quem passasse por aí em qualquer dia útil dessa abençoada época

veria sentado em assentos baixos, então usados, de couro, e que se denominavam-cadeiras de

campanha-um grupo mais ou menos numeroso dessa nobre gente conversando pacificamente em

tudo sobre que era lícito conversar: na vida dos fidalgos, nas notícias do Reino e nas astúcias

policiais do Vidigal. Entre os termos que formavam essa equação meirinhal pregada na esquina

havia uma quantidade constante, era o Leonardo-Pataca. Chamavam assim a uma rotunda e

gordíssima personagem de cabelos brancos e carão avermelhado, que era o decano da corporação, o

mais antigo dos meirinhos que viviam nesse tempo. A velhice tinha-o tornado moleirão e

pachorrento; com sua vagareza atrasava o negócio das partes; não o procuravam; e por isso jamais

saía da esquina; passava ali os dias sentado na sua cadeira, com as pernas estendidas e o queixo

apoiado sobre uma grossa bengala, que depois dos cinqüenta era a sua infalível

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